Eu comprei esse caderno justamente para poder escrever dicas, talvez contar um pouco do meu dia-a-dia, para se sobreviver num acampamento assustador como aquele do Senhor Turner. Não se enganem, acampamentos não são como pensamos... Por isso, vou dizendo logo a minha Dica Número #1: Negue na primeira oportunidade que tiver!

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Sean ficou correndo por todos os cantos e eu tive o súbito desejo de amarrar aquela âncora pregada na parede no meu pescoço e me jogar no rio. E juro pelos céus que o motivo não foi a vergonha tamanha que ele me fazia passar, mas o barulho ensurdecedor que ele fazia toda vez que se chocava contra a parede.

Céus, o que eu tinha feito para merecer aquilo como irmão?

– Sean! Fique quieto só um pouco! – berrei, chamando sua atenção. Mas ele só olhou para mim, sorriu, e continuou a se bater, desta vez, na porta que dava entrada ao escritório do diretor do acampamento.

– Deixa ele em paz. – murmurou Ed com um risinho no rosto. – Quanto mais barulho ele fizer, talvez, mais mamãe e papai ficarão com vergonha e demorarão menos.

– Talvez até desistam dessa ideia maluca, não é? – completei seu pensamento.

Trocamos um olhar realmente rápido e caímos na real. Nunca que iam desistir daquela ideia maluca. Não enquanto um de nós dois não se afogasse ou perdesse a perna.

A princípio eu tinha planejado passar minhas férias em casa, talvez viajar com meus tios e participar da Comic Con no final das contas – meu lado nerd tinha aflorado exuberantemente naqueles últimos dias. Entretanto fim de semana passado minha irmã mais velha, Kendall, chegou em casa com um bendito panfleto...

“Acampamento de férias para jovens super dotados”.

Não pense besteira, não tinha nada a ver com a escolha de Charles Xavier dos X-men nem nada. Significava um acampamento para jovens nerds com aparelhos sujos de sanduíche caseiro e melequentos.

Quando vi logo pensei “Nossa, deve ser algo para o Sean”. Pobre coitada da minha alma, uma reles mortal prestes a ser jogada num lugar cheio de mosquitos, crianças sem noção da vida, escoteiros, ou seja lá o que fossem!

Ao menos um de meus irmãos, Ed, estava me acompanhando, enquanto nossos pais viajavam pelo caribe, Sean, Kendall e Darcy iam para Nova Iorque com nossos tios e Cameron morria no seu tédio incompreensível na França...

Enfim, o que posso dizer mais? Eu sou a melhor colocada da minha sala e Ed é aspirante a bolsista em uma faculdade da Carolina do Norte... Fomos escalados por pura e espontânea pressão para nos trancafiarmos num acampamento.

– Obrigada, senhor Turner! – a voz de mamãe se deixou ouvir quando a porta, na qual Sean se batia, abriu-se.

– Não se arrependerá de tê-la com você, é um anjo de garota. – dizia papai saindo pela porta acompanhado de mamãe e um senhor velho e de cabelos grisalhos.

– Tenho certeza de que ela amará o acampamento dos Turner! – falou o velho.

Nisso ele me olhou com um sorriso um tanto desconcertado, como se estivesse me julgando com seus olhos azuis assombrosos por causa do cabelo ruivo que tingi na primavera passada ou as roupas rasgadas que comprei no brechó perto de casa. Ah, por favor, os rasgos eram propositais!

– Querida, temos boas novas! – disse papai – Está tudo confirmado para suas semanas no acampamento do senhor Turner aqui.

Suas? Ahnm? Como assim?

– Minhas e do Ed, o senhor diz, não? – repliquei com um risinho amarelo.

– Oh, não, querida. – riu-se, minha mãe – Ed não conseguiu entrar, as vagas já estavam esgotadas. Digamos que foi obra do destino para você crescer como pessoa!

“Crescer como pessoa num acampamento ou negar, espernear, chorar, berrar e não ir para o acampamento, mas viajar para Nova Iorque com meus tios...?” foi o que pensei naquele instante sem conseguir me mover, enquanto via meu irmão rir da minha feição atrás dos meus pais.

– E pelo que vejo, senhorita Farrell, gostará muito de nossas instalações! Os jovens estão cada vez mais animados com as atividades. – ria o grande senhor Turner.

Porque era lógico que eu amaria o manicômio dos nerds em pleno verão! FÉRIAS DE VERÃO, POXA! Eu queria ir para algum lugar com pessoas interessantes e não ser uma das poucas novatas naquele lugar. Eu tinha que negar. Eu ia negar!

– Mamãe, acho melhor que nós...

– Vamos, querida. – riu minha doce mãe – Temos que comprar algumas coisas para que você possa levar em sua viagem. Pegue um panfleto de atividades ali em cima da mesa para mim, Sean.

– Mas, mããe...!

– Venha rápido, meu bem! – berrou meu pai já do lado de fora, na frente do carro – Temos muito que fazer antes da sua partida.

Aquela era a hora certa para eu negar de uma vez!

– Mãe! Pai! Não entenderam que eu não quero ir para esse acampamento?! – berrei de uma vez quando estávamos na frente do carro.

Os dois olharam assustados para mim por causa do berro, eles realmente não esperavam por aquilo e teriam que mudar minha inscrição com o Sean, ou seja, trocaríamos de lugar e seria eu quem iria rir dele! Ou era o que eu pensava, não tinha contado com a habilidade de surdez dos meus progenitores.

– Oh, querido – disse mamãe – está vendo? Ela vai sentir nossa falta! Não se preocupe, Lucy, querida, nós ligamos todo dia para você, ok?! Agora entre no carro, seu pai e eu ainda temos que arrumar nossas malas para a viagem.

E assim começava minha “aventura” naquele empolgante acampamento. E exatamente por isso resolvi, primeiramente, comprar um caderno para escrever dicas para meus futuros... Amigos com cérebro o suficiente para não se deixarem levar pelas agonias da sociedade, seus pais sem-noção, irmãos que são projetos de diabretes, inimigos perfeitinhos e etc...