A Sombra Do Príncipe 1 escrita por Peamaps


Capítulo 1
Capítulo 1




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Título: A sombra do Príncipe

Sumário: Legolas nunca recebeu muito amor ou carinho e sempre foi muito só. Seu único amigo é seu guarda pessoal, Haldir. O elfo nem sabia o quanto desejava ser amado até encontrar Aragorn. Paralelamente uma trama ocorre muito próximo ao Príncipe e ele sequer desconfia o que é que o assombra. Yaoi/Slash.

Autora: Peamaps

Gênero: Mistério, Romance, Drama

Avisos: Yaoi, Slash, Lemon, Angústia, AU (Universo completamente alternativo)

180112

Direitos: Os elfinhos não me pertencem. Apenas sou obcecada pelo Legolas.

Dedicado a todos que deixaram reviews nas últimas fics (7 fics? Perdi a conta.). Respondi a todos pessoalmente mas acho que vocês não tem ideia de como me ajudam, que o incentivo é que me fez continuar a escrever quando tudo parecia negro.

Muito obrigada!

Não só peço que me deixem reviews mas para qualquer autor que vocês gostem. Tem uma coisa interessante que vi no Nyah! Fanfiction de que a cada review que você deixa de enviar significa a morte de um autor.

*

Era primavera em Mirkwood e Legolas caminhava à passos leves sob a grama. Seu coração estava leve, como não ficava há muito tempo e aquele prometia ser um bom dia.

Ele sentou-se à beira do rio, ouvindo o barulho da água. Um casal de elfos caminhava de mãos dadas, alheio a tudo que estava à volta. Três crianças corriam do outro lado, imersas em brincadeira de faz de conta.

Legolas observou-as.

Um dia ele seria o rei daquelas terras e ele não se sentia seguro o suficiente de si para isso. A insegurança não melhorara. Ele se sentia assim desde há muitos anos atrás.

Como era costumeiro, seu ânimo foi diminuindo e ele sentiu-se só, como sempre.

Algo acertou seu rosto de repente e doeu um pouco. Legolas fez uma careta e viu as crianças olhando para ele. Elas haviam jogado um galho, pelos seus rostinhos foi sem querer. Até mesmo para os elfinhos de seu reino, ele era invisível. Duas delas nem pediram desculpas e se foram, a terceira, uma menina juntou uma mão na outra, nervosa e então fez uma reverência; antes de partir.

Para se saber o quanto se é respeitado, só é preciso ver como as crianças lhe tratam, e o príncipe sentiu seu coração ainda mais pesado. Ele ouviu passos leves mas não precisou virar para identificar a companhia. Ele era o único que sempre voltava:

-Ora, sente-se aqui comigo Haldir.

O elfo sorriu e aceitou o convite. Legolas sentiu algo pesado cair em seu colo e olhou.

-Miruvor?

-Exatamente.

-À essa hora da manhã? Você está virando alcoólatra, Haldir?

O elfo de corpo mais largo sorriu. Suas feições ficavam bem melhor quando o fazia ao invés de sua eterna expressão de desdém.

-Não precisa tomar agora.

-E como que você conseguiu acesso à isto?

Haldir olhou para os lados, então o chamou para perto e disse em seu ouvido, conspiratoriamente:

-Eu roubei.

-Você o que? - Legolas riu e foi acompanhado. - Se meu pai soubesse...

-Então é melhor que tomemos logo antes que ele descubra.

-Você sabia que ele conta quantas garrafas foram feitas?

-Vai ter uma festa em breve. Ele pensará que ficou generoso demais e acabou dando tudo para os visitantes.

Legolas suspirou discretamente mas Haldir não pode deixar de franzir o cenho. Ele nunca viu um filho temer tanto o próprio pai.

Eles olharam ao redor novamente. Legolas então foi abrir a garrafa:

-Vejo que você já deu um jeito nisso. - Ele conferiu, precisando somente remover a rolha com o dedo. - O que me garante que você não estava tomando antes de mim?

-Você vai ter que confiar em minha palavra. - Haldir piscou.

O príncipe gostava apenas de atormentar seu guarda pessoal, ele confiava no outro elfo de olhos fechados. Na verdade, se não fosse por Haldir Legolas não acreditava que poderia suportar sua vida como ela era.

-Algo o incomoda. O que é? - Haldir observou.

Legolas virou o rosto, apenas o suficiente para não ser mais visto. Só era preciso que Haldir visse sua expressão para saber o que lhe ia à alma pois o conhecia bem demais, desde que ele era um bebê.

-Não é nada.

-Conte-me Legolas.

-É o de sempre.

Haldir apertou o ombro magro do amigo e protegido, suspirando e sentindo-se derrotado.

-Você sabe que eu sempre vou estar aqui.

-Eu sei. E agradeço.

-Não aqui em Mirkwood. Aqui ao seu lado. Sempre, não importa o que aconteça.

-Sabe. Estive pensando em ir embora.

Legolas sabia que encontraria Haldir surpreso quando olhasse para ele.

-Embora? E para onde vamos?

Legolas riu:

-E quem disse que você vai junto?

-Você está brincando não é? É claro que irei.

-Se eu saísse daqui, não desejaria que você se tornasse um andarilho. Sem reino, sem lar, sem um lugar para voltar.

-E para você seria ainda pior. Se descobrissem sua identidade poderiam usá-lo para chantagear seu pai, ou até conseguirem uma recompensa.

-Se eu saísse daqui jamais diria quem sou. Usaria outro nome. Como Elladan ou Elrohir.

-Só existe um Elladan ou Elrohir, você seria descoberto logo.

-Você entendeu a ideia.

Haldir gostava de tirar a mente do príncipe de sua melancolia. Ele entendia o porque Legolas era assim. Era o único que assistira tudo de perto, e mais de dois milênios se passaram mas o guarda ainda sentia o estômago revirar de revolta toda vez que acontecia de novo. Ele desejava que Legolas fosse feliz, coisa que não aconteceu ainda. Havia sempre aquele que tirava sua alegria como se realmente desejasse mal ao príncipe. Ele viu a insegurança de Legolas se tornar um pânico que está lá, constantemente em seus olhos e também em seus pesadelos, quando ficou postado contra a porta durante as madrugadas em que algo lhe dizia para ir verificar como Legolas estava.

Haldir sabia que ele era a tábua de salvação para que o príncipe não perdesse sua sanidade. Ele era livre, um príncipe, com grandes possibilidades e na verdade, o direito de fazer o que quisesse da vida, mas Legolas vivia em uma prisão.

Às vezes ele precisava enxugar correndo uma lágrima que ameaçava cair de seus olhos, pois muitas vezes, ele sentia pena do príncipe.

-Eu não o condeno por pensar em fugir. Eu até entendo. -Haldir mostrou seu apoio.

-Fugir? Eu não precisaria fazer isso. Ele me deixaria ir no mesmo instante. - Ele sorriu tristemente.

Haldir passou o braço por sobre o ombro de seu protegido, e após perceber a relutância do outro, puxou a delicada cabeça para pousar sobre seu ombro.

O miruvor era uma bebida que trazia bem-estar instantaneamente. Legolas nunca tinha acesso à bebida e no começo Haldir fingiu tomar mas assim que o efeito começou à aparecer no príncipe, ele parou. O vinho deveria ser somente para o entretenimento de Legolas, como um bálsamo já que ele precisava tanto esquecer.

Haldir foi quem tomou conta da tarefa de estar atento à sua volta para que ninguém visse o príncipe acabando com uma garrafa inteira sozinho. Quando voltou à observar o outro elfo, Haldir se surpreendeu em ver que ele tinha bebido tudo.

-Dê-me. - Ele disse e Legolas entregou-lhe a garrafa. Ele a levou até uma moita, bem próxima à agua e escondeu-a ali. Voltaria para pegar e jogar em outro lugar, mas agora precisava usar seus dois braços e toda sua força na tarefa à seguir: carregar Legolas até sua casa.

Haldir sabia exatamente onde Thranduil estava e que eles não se encontrariam. A manhã era crucial para o rei reunir-se com seus conselheiros e ver como as coisas andavam. Portanto foi por corredores vazios que eles andaram.

Legolas estava cantando e Haldir não podia imaginar como alguém podia ficar bêbado com tão pouco, mas aquele era seu protegido. Ele era diferente de outras pessoas, ele era, especial.

Haldir ria tanto que as lágrimas caíam quando abriu a porta dos aposentos de Legolas:

-O que você está cantando?

-Uma canção... sobre a criação... ou seria sobre o mar?

-E misturando sindarin com weston?

-Mas você entendeu.

-Sabe, eu nunca vi alguém tão engraçado quando bebe.

-E você me enganou de novo. Deveria ter bebido comigo, não sabe como estava bom.

-Quem sabe se você decidir partir, então não roubamos umas dez garrafas também?

Legolas caiu na cama, seus olhos revirando:

-Eu não vou fugir Haldir.

-É mesmo? E por que não?

-Por que eu não tenho coragem para isso. Por que eu sou um covarde e um perdedor.

Haldir imediatamente sentou-se na beirada da cama:

-Não Lass, - ele acariciou a testa macia. - Não diga isso. Você é muito mais do que pensa. Está apenas descobrindo do que é capaz.

-Mas olhe para você. Você não se sente assim.

-Eu também tive muitas inseguranças até ter certeza de quem eu era. É normal o que acontece com você. Ainda mais que você está chegando à maturidade agora.

-Eu me sinto tão só Haldir... - Uma lágrima escorreu pela lateral do rosto pálido. - Tão terrivelmente só...

-Oh Legolas...

-Eu não quero ser ingrato. Sei o que faz por mim e eu lhe devo tudo, - Legolas apertou a mão do amigo. - Mas não é normal ter-se somente uma pessoa no mundo. Eu olho em volta e as pessoas tem família, ou amigos, bons relacionamentos e com várias pessoas. Os Valar me enviou você senão teria enlouquecido.

-Eu não fiquei ofendido. Eu entendo bem Lass, e lamento.

-Sabe a festa que teremos esta noite? Eu estou tenso com a chegada deles. E sabe por que? Por que eu invejo Elladan, Elrohir e até Arwen. Não é patético?

Haldir aproximou seu rosto e juntou a testa dele ao de Legolas.

-Escute aqui, você precisa parar de se referir à si mesmo dessa forma, Lass. É claro que você sente alguma forma de ciúmes, é normal. Eles tem tudo o que você não tem. Agora o que você não vê é que você é muito especial. Você é tão diferente que é até difícil de enxergar. E eu o conheço bem e digo que lhe admiro pois é sua força que o tem mantido em pé todos esses anos.

-Ele me culpa pela morte de naneth, - o rosto de Legolas se contorceu. As lágrimas começaram à cair em maior número agora.

-Ele nunca deveria ter dito isso quando você era criança. É claro que não é sua culpa.

Legolas perdera a mãe em seu próprio parto. Quando pequenino ele procurava o aconchego do pai mas era sempre mandado para longe. As primeiras palavras de que se lembrava era do pai lhe dizendo que a criança matara a própria mãe.

Talvez não fossem essas as primeiras palavras, mas a memória jamais se apagou e Legolas era muito pequeno para sua mente se defender, e ele assim acreditou, culpando-se sempre.

Haldir venceu a pouca distância que havia entre eles e abraçou aquele que ele considerava como um elfinho. Ele se deitou e fez Legolas encostar a cabeça em seu peito, acariciando os sedosos cabelos. Mergulhado em sua agonia sem fim, Legolas adormeceu, sentindo-se seguro.

Quando despertou, ele estava sozinho na cama. Ele olhou em volta no quarto e nem sinal do guarda.

-Haldir? - Ele chamou, mas não houve resposta como era esperado.

Ao perceber que a noite estava chegando, ele levantou-se em pânico.

A festa! Não havia tempo para um banho então Legolas e despiu depressa, suas vestes caindo no chão pelo caminho que ele fez. Ele vestiu a primeira túnica longa e calça apertada que achou, então apenas ajeitou um pouco os cabelos e saiu.

No saguão de entrada, ele engoliu seco ao ver seu pai. Parado com as mãos para trás, Thranduil mantinha-se completamente ereto na melhor pose de rei que sabia fazer. Seu pai estava de costas para ele e Legolas ainda teve alguns segundos para respirar normalmente.

-Ada.

Thranduil olhou-o de soslaio. Seus lábios se apertaram e Legolas sabia que ele estava zangado.

-Onde você esteve?

-Perdoe-me...

-Eu não quero saber. Não tenho lhe falado sobre esta reunião à tanto tempo?

Legolas olhou à volta e o rei leu sua ação:

-Não adianta procurar seu serviçal. Eu o mandei ir buscar a família na fronteira.

-Sozinho? - Legolas perguntou com a voz esganiçada.

Thranduil apenas olhou-o ameaçador e Legolas se encolheu.

-Ao menos o senhor podia ter deixado ele me avisar que era hora antes de partir.

-Não. Eu queria ver como você se saía hoje, cuidando de tudo sozinho. - Thranduil olhou para o cabelo cor de sol um pouco à desalinho. - Como era de se esperar, você foi um fracasso.

Legolas olhou para a ponta dos pés.

Seu pensamento foi então à Haldir. Com tantas aranhas gigantescas, orcs patrulhando as fronteiras... Haldir corria grande perigo indo sozinho. Se ele tivesse coragem para enfrentar o pai, pegaria seu cavalo e iria atrás de Haldir. Se fizesse isso não só seria punido como também a ira de Thranduil cairia sobre Haldir, que também sofria por causa do rei. Às vezes Legolas rezava pedindo paciência à Haldir, com medo que este partisse algum dia.

Ele poderia ajudar o guarda. Fora treinado desde muito pequeno na arte da luta. Era até considerado o melhor arqueiro.

A ansiedade estava além dos limites quando eles ouviram o barulho que indicava a chegada dos visitantes. Cascos de cavalo batiam contra o chão e as rodas das carroças diminuíam o movimento. Legolas correu mas sentiu um baque no peito. Seu pai, o causador lhe indicava para que ficasse atrás dele.

Thranduil caminhou mais ereto do que nunca. Gostava de se impor para os que vinham de fora e vivia na defensiva. Legolas massageou o peito enquanto seguia o pai.

Seus olhos procuraram Haldir. Lá estava ele, em frente a todos e desmontando de seu cavalo. Ele olhou para Legolas e curvou o canto dos lábios. Legolas respirou aliviado.

Então a atenção se voltou aos recém-chegados. Haldir estendeu a mão para Arwen, ajudando-a a descer da carroça. Elrond apareceu em seguida. Elladan e Elrohir desciam de seus próprios cavalos e pelo jeito faziam parte da guarda que vinha com eles pois seus arcos, flechas e espadas estavam visíveis. Os guardas atrás deles também desciam e entregavam seus cavalos aos elfos de Mirkwood, confiando que seriam bem cuidados. Por fim a carroça se foi.

Aos guardas de Rivendell foi mostrado um outro caminho, onde ficariam descansando. A família Elrondion seguiu com Thranduil. Foi então que Legolas notou um rosto diferente.

Um homem barbudo e cabelos ligeiramente longos, vinha caminhando junto com a família, no meio dos gêmeos. Ele claramente não era elfo mas Legolas conferiu suas orelhas e ficou surpreso em constatar o fato.

Ele lembrou-se de seguir atrás do pai, receoso de receber uma reprimenda na frente dos gêmeos, o que seria muito humilhante.

Arwen sorria para ele e Legolas sentiu o bem-estar tomar conta de seu coração.

Elladan e Elrohir também lançaram-lhe um olhar, os três claramente ansiosos por vê-lo. Eles se conheciam há muito tempo e encontravam-se raramente, somente quando Elrond vinha visitá-los, mas jamais foi permitido à Legolas ir à Rivendell. E nas ocasiões em que se encontraram, Legolas afeiçoou-se aos três irmãos, apesar de o fazer com todo mundo.

Sua mente estava presa ao intrigante desconhecido e ele arriscou uma olhada ao homem. Ele o olhava e Legolas arregalou os olhos. Um frio percorreu sua espinha ante o olhar que ele não entendeu o que queria dizer, e era muito intenso.

Legolas olhou para a frente. Estavam prestes à virar o corredor e chegar na ala de visitantes.

-Haldir mostrará seus aposentos. Como sempre, os gêmeos ficarão em um quarto só. - Thranduil fez uma reverência.

-Eu agradeço, - Elrond fez cortês.

-Assim que se refrescarem um pouco, eu os chamarei para o jantar.

A família fez uma reverência e os elfos de Mirkwood corresponderam o gesto. Então se foram.

No fim do corredor, Legolas arriscou-se olhar para trás e viu que o estranho o observava. Desta vez com um sorriso nos lábios. Ele andou depressa.

-Lass? - Haldir sussurrou. Estavam a uma boa distância atrás de Thranduil.

Legolas agitou a cabeça, mostrando que não era nada.

Os dois foram para fora, tomar um ar fresco antes das festividades. A cada fim de estação, Mirkwood comemorava a passagem.

-Arwen está muito bem. - Haldir comentou pensativo.

-Eu sei que você tem uma “queda” por ela, - Legolas sorriu.

-Claro que não, por que pensa isso?

-Ela é sempre a primeira coisa que você comenta quando eles vem.

Haldir agitou a cabeça como se Legolas não soubesse do que falava.

-Está feliz que eles vieram?

-Muito!

Haldir sorriu. Era mesmo possível ver a alegria do sensível Legolas. Ele queria apenas que aquilo durasse.

-Haldir, eu não quero mais que vá sozinho para a floresta. Mesmo que meu pai mande. Você é o número um aqui, quando sair de seu campo de visão, comande para os guardas irem com você.

-Seu pai está aprontando alguma coisa. Ele queria que eu estivesse longe do palácio. Perdoe-me por não acordá-lo.

-Pare Haldir.

-Quando ele me mandou nessa tarefa, fiquei preocupado que você não fosse acordar.

-Eu bebi tanto assim?

-Não se lembra? Talvez seja melhor se acostumar mais ao álcool para ficar mais forte, Lass.

-Eu me lembro de estar lá no rio. Depois disso, não me lembro de mais nada.

Haldir sentiu uma fisgada no coração. Então todo o desabafo que ele ouvira vinha do mais fundo de seu ser. Ele só podia imaginar o quanto Legolas sofria.

-Lass.

-Sim?

-Curta esta noite, está bem? Pense em coisas boas. Converse com seus amigos de infância. Esqueça-se de todo o resto.

Legolas consentiu animado.

-E você, aproveite seus momentos com Arwen. - Legolas deu uma piscadela.

Haldir deu uma empurrada de leve nele.

Os dois entraram no salão de jantar e muitas cabeças voltaram-se para olhar.

Legolas era muito admirado por sua beleza mas não notava isso. Naquela noite muitos acharam que ele estava estonteante, havia algo diferente nele e mal sabiam que desta vez ele não se arrumara como deveria. A situação acentuara seu brilho já que ele sempre estava impecável por ordens do seu pai, mas parecendo então artificial. Hoje ele usava os cabelos ligeiramente à desalinho e sua postura não era tão ereta como à do pai, pois não estava ao lado dele.

Legolas fazia uma reverência para um e outro convidado enquanto passava. Ele sabia de cor onde os “mais importantes” convidados sentavam, de acordo com seu pai e era a eles que Legolas dava maior atenção. Os elfos de Rivendell já estavam à mesa, próximo à seu pai e Legolas parou. O olhar daquele humano incomodando-o novamente. Ele suspirou aliviado então ao ver as costas de Haldir à sua frente. Imaginou que ele fosse puxar-lhe a cadeira e ficou aguardando, mas o tempo passou e ele sussurrou para ser discreto:

-Haldir? Posso me sentar?

O elfo então se moveu e Legolas forçou seu olhar à se pregar na mesa. Ele arriscou uma olhadela à seu pai mas logo se arrependeu. Thranduil o estudava como se ele fosse fazer alguma coisa errada a qualquer instante, e Legolas estremeceu de leve.

Havia outra pessoa observando-o, e ele não pode deixar de sentir todo seu corpo relaxar ao ver os grandes olhos azuis de Arwen. Eles estavam apertados porque sorria. Ele retribuiu e não mais desviou o olhar, sentindo que aquele jantar seria uma guerra à ser enfrentada.

-Legolas, como você cresceu. - Ela disse pegando sua mão.

-Do que está falando? Eu já era um adulto quando nos vemos da última vez.

-Não era antes e ainda não o é. Mas você está todo bonito, um homem feito!

Legolas ruborizou e Haldir ergueu sua taça para ele. O príncipe entortou o canto do lábio ao perceber a chacota. Seu guarda adorava vê-lo sem jeito.

Elrond ria e observava aquele que para ele sempre seria um menino:

-Por que nunca foi nos visitar Las? Já me esqueci de quantas vezes eu enviei convites para que viesse fazer um intercâmbio. Poderia ensinar uma e outra coisa sobre o arco e flecha enquanto Elladan e Elrohir lhe ensinariam sobre espadas.

Legolas não conseguiu esconder o brilho desejoso ao ouvir aquilo. Sem precisar olhar para o severo pai, ele deu a resposta à muito decorada pois ele sempre repetia o mesmo, até por cartas quando recusava a oferta:

-Eu não acho que seja uma boa ideia ainda me aventurar para fora de Mirkwood, Milorde.

Elrond voltou-se para o rei:

-Vamos lá Thranduil. O grande Oropher permitiu que você se aventurasse pelo mundo muito antes de sua maioridade não é mesmo?

-Ele é quem não quer ir. - Thranduil falou, bebericando seu miruvor. - Tem medo.

O humano voltou-se e Legolas sentiu seu rosto queimar. Aquilo era uma verdadeira mentira. Ele mesmo sim, achava-se um covarde. Para muitas coisas, como para enfrentar seu pai. Mas Legolas era um guerreiro treinado e ele sempre quis sair de Mirkwood e conhecer outros lugares. Ele justamente quis começar por Rivendell e estender sua jornada até a famosa Lórien, mas seu pai jamais o permitiu. Ele o faria passar vergonha, dizia.

Esse era ainda um dos motivos porque Legolas era tão magro. Desanimado com a humilhação que ia começar mais cedo nesse jantar, ele perdeu o pouco apetite que sentira. Seus olhos baixaram até seu prato e o delicioso cheiro dos legumes grelhados não mais remexeram seu estômago.

-Ao menos deixe-o então mostrar-nos seu talento.

Todos se viraram para quem falava.

Elladan fixou seus olhos de um cinzento e azul em Thranduil. Eles mantiveram o contato por um tempo e foi o rei quem desviou:

-O que sugere, filho de Elrond?

-Eu gostaria de aprimorar o treinamento de Legolas com a espada, e aprender tudo o que ele sabe sobre arco e flecha.

-Conte comigo! - Elrohir fez, aprovador.

Thranduil olhou de um gêmeo para o outro. Eles eram idênticos.

Os longos cabelos negros tinham um brilho sobrenatural, deixando-os quase azuis de tão pretos. Onde Elladan era força e desafio, Elrohir era gentileza e humor. Tão diferentes de Arwen, que parecia sempre ter um leve sorriso simpático, mesmo por baixo do olhar sério.

Então seu olhar parou em Elladan, que o olhava sem temor, o que era tão raro. Ele era certamente o herdeiro do guerreiro que honrou a aliança entre Homens e Elfos e certamente a melhor opção para um dia tomar o poder em Rivendell. Elladan exalava força e parecia ser alguém que não sabia ouvir não.

-Se for aqui em volta e sob minha supervisão, então ele pode. - Thranduil disse por fim.

-Ora, mas que desafio seria esse então, eu me pergunto? -Elladan riu. - Estel aqui é alguns milênios mais jovem do que Legolas e já conhece toda a Terra-Média. Acho que está na hora de Legolas acampar um pouco longe daqui, e conhecer os limites de Mirkwood. Eu garanto que não sairemos de seus limites.

Todos se voltaram para Thranduil e o rei não gostou de ser o centro da atenção. Legolas viu que o pai o culpava por tudo aquilo. Mas o rei deveria saber que Legolas não tivera tempo para falar com os gêmeos. Eles prensavam o rei contra a parede porque aquilo estava realmente ficando ridículo. Ele tinha certeza que após completar a maioridade, seu pai inventaria ainda alguma outra desculpa para continuar à prendê-lo.

-Está bem, mas somente por uma noite. - Thranduil fez e bufou para o gêmeo mais velho.

Elladan perfurava-o com o olhar e Legolas sentiu um arrepio percorrer pelas suas costas. Imaginando como Dan tinha coragem de olhar para seu pai daquele jeito. E o admirou.

-Estel... - Thranduil disse após algum silêncio. - Mas esse nome é um tanto forte não é mesmo?

Mesmo tentando evitar o homem a qualquer custo, os olhos de Legolas voaram para ele no mesmo instante.

-Assim quis me chamar meu pai. - Estel levantou sua taça. Ele também não temia Thranduil. Mas Legolas imaginou que era porque não o conhecia.

-Você sabe falar nosso dialeto?

-Sei sim. Durante alguns anos Ada não usou weston para que eu aprendesse à dominar o élfico. - Estel fez questão de usar as palavras. E definitivamente não parecia gostar do rei.

Talvez ninguém ali o fizesse. Arwen não olhou para o rei vez alguma. Elrohir lançava alguns sorrisos e consentia com a cabeça, mas evitava olhar. Elrond parecia achar Thranduil engraçado, com suas manias e anti socialismo mas ao mesmo tempo não tinha exatamente uma grande estima pelo sindar. E Legolas sabia exatamente o que o pai pensava do noldor.

-Você também gostaria de participar desta... aventura com meu filho?

Estel olhou para Legolas e então para quem lhe dirigiu a palavra.

-Claro. - Estel olhou para Thranduil. - Pensei que todos meus irmãos fossem.

-Você acha seguro Elrond? - Thanduil voltou-se para o curandeiro. - Ele nem conhece aqui. Pode se perder ou...

-Ele é um guardião Thranduil, eu já lhe falei sobre isso. Aliás eu contei-lhe quase tudo sobre ele. - Havia uma sombra pairando sobre Elrond, mas ela se dissipou depressa. - Ele sabe se cuidar.

Elrond certamente não poderia acreditar que Thranduil se preocupasse com a segurança do homem. Não só Legolas, mas metade da Terra-Média sabia de seu ódio pelos humanos. Thranduil dizia que os Homens era tudo o que havia de errado com o mundo, só era preciso que eles fossem retirados para que tudo voltasse como era.

-Está bem, está bem. - Thranduil agitou as mãos irritado.

Por baixo da mesa, Arwen colocou sua mão na coxa de Legolas.

O jantar seguiu com assuntos amenos. Mas não era mais possível ignorar o mal humor do anfitrião. Legolas estava suando então, preocupado com o momento em que estaria à sós com seu pai. Ele sempre lhe culpava por tudo e ele sabia que deveria ter interferido várias vezes durante a conversa, mas como ele poderia se os noldor estavam tão certos? A essa altura ele sabia o quanto seu pai era irracional. Encontrar com elfos vindos de fora sempre mostrava à Thranduil o quanto ele vivia de forma errada, mas em sua idade, o rei jamais iria mudar. Legolas já se cansara de esperar a aceitação do pai, mas em momentos como esses ele realmente o temia pois sua ira caía sempre sobre o filho.

-Las, o que foi? - A voz suave de Arwen se fez.

Legolas percebeu que sua angústia devia ter transparecido e tentou recompor-se.

-Não é nada... - Então ele pensou rapidamente. - Eu realmente tenho medo da floresta.

Arwen se surpreendeu um pouco. Que ela achasse mesmo que ele era o covarde que todos diziam que ele era. Legolas sabia que as más línguas faziam piadas sobre ele. Que Arwen achasse que tudo estava confirmado então, ele não poderia descer ainda mais não é? Como ser mais humilhado se ele nem possuía orgulho?

Finalmente o jantar terminou e Haldir estava à seu lado antes mesmo dele levantar. Legolas o olhou com gratidão e tudo o que ele queria era que sumissem dali. Um à um todos foram saindo, se despedindo. Os noldor em especial iriam querer se recolher cedo.

Legolas se encolhia, tentando sair logo dali e parou de repente quando ouviu a voz dele.

-Legolas! - Chamou Thranduil.

O príncipe se virou lentamente.

-Você, - Thranduil viu que estavam à sós então. E disse para Haldir, - suma daqui.

-Mas alteza eu ainda preciso ajudar o príncipe com...

-Fora! - Thranduil gritou.

Legolas sempre se surpreendia com seu guarda. Haldir jamais se assustava com as explosões. Ele também encarou o rei por mais tempo do que devia, e o príncipe se perguntou se ele fora o único covarde sentado à mesa. Então fazendo uma reverência, somente para Legolas, Haldir se foi.

Quando a pesada porta se fechou os músculos de seu corpo se contraíram ainda mais. O som da porta parecia o anúncio do fim. Era sempre assim.

Thranduil fechou a distância entre eles rapidamente, e então ele sentiu o baque em seu rosto. O golpe fora tão forte que Legolas olhou para a mão do pai. Ela não estava aberta mas em punho. Então ele deveria estar muito bravo.

-Não... Eu não vou mais acertar seu rosto. - Thranduil estava ofegante. - Veja como ficou vermelho. Eu não vou dar mais motivos para você se fazer de vítima.

-Pai eu não falei nada com Elladan! Eu juro!

Legolas teve de ser rápido para não receber o chute em seu ombro, pois ele levantou as mãos para se proteger. No lugar disso, ele recebeu o golpe no ombro. Ele pensou que Thranduil iria se recompor antes de começar de novo, mas então ele ergueu sua outra longa perna e Legolas sentiu o golpe atrás de sua cabeça.

Ele caiu deitado no chão, se arrependendo de não ser mais forte. Sua barriga ficou exposta e ali ele perdeu as contas de quantas vezes ele foi chutado.

Legolas tentava respirar mas um golpe no estômago tirara todo o ar de dentro dele.

-Por que sempre que eles vem aqui eles parecem saber que você está preso aqui?

-Eu... -Legolas tentou respirar, mas seu pulmão parecia ter perdido a capacidade de se expandir. Ele estava quase sufocando. -...Juro.

Outro golpe e Legolas começou à se arrastar no chão. Seu pai estava indo longe demais, ele não era assim. Se ele não se afastasse, o pior poderia acontecer. Por que ele estava tão furioso?

Mas Thranduil não o chutou mais. Talvez tenha percebido que ele estava no limite de sua consciência.

Talvez o rei estava ainda mais nervoso por não poder acertar em seu rosto. Quando o fazia, Legolas tinha de ficar trancado por semanas até que o roxo sumisse. Parecia que quando sua face era ferida, a raiva de Thranduil passava mais rápido.

Mas ainda não havia acabado.

Legolas sentiu seu rosto ser apertado em mão forte, fazendo seus olhos encherem-se de lágrimas tamanha a dor. Thranduil aproximou seu rosto ao dele:

-Uma palavra, um desabafo, qualquer coisa que você soltar para eles amanhã... - Ele ele disse o restante lentamente, para atemorizar o filho. - ...e eu mato você. Sem lâmina, sem nada. Com minhas próprias mãos. Nem Haldir irá te salvar, está me ouvindo?

-Sim senhor. - Legolas disse trêmulo. As lágrimas caindo então.

-Eu te mato. - Thranduil repetiu. E o lançou com tanta força para trás que Legolas bateu a cabeça no chão. A dor dilacerante e por um momento ele sentiu-se próximo à desmaiar.

Ele forçou-se à levantar mas não conseguiu ficar ereto. E saiu pela porta, o mais rápido que pode.

Naquela noite, ele foi dormir em sua árvore preferida. Haldir não poderia vê-lo assim.


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Notas finais do capítulo

Aguardo seu review, obrigada pela leitura!