Lendas Do Acampamento: Vingança De Urano escrita por V i n e


Capítulo 23
Fogo e Gelo




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A cena que eu havia presenciado ficava piscando e latejando em minha cabeça. As lágrimas ardiam em meus olhos, Emma soluçava e gritava, seu corpo contorcia-se em soluços de partir o coração. Tudo ficou em segundo plano, vozes, imagens, sentimentos. Um frio emanava de meus movimentos, de minha alma. O ódio queimava tudo que era combustível dento de mim. Minhas lembranças, meus sentimentos, os que amo, tudo que foi bom para mim desde que me entendo por gente, foi consumido pelo fogo. Nada pôde apagá-lo, ele e o gelo trabalharam juntos para me tornar mais forte. A fúria e a frieza quando combinadas podem ser mortíferas. É assim que eu me sentia. Frio, furioso e fatal. Apenas uma coisa não foi queimada. O próprio ódio que eu sentia. Esse sim foi uma fonte ilimitada de labaredas. Queimando tudo rápido. A vida me obrigou a ser forte, porém apenas uma coisa pode fazer com que você cresça e fique realmente forte. A perda. A perda de alguém que você realmente aprecie e que tenha respeito, alguém que fez parte do seu passado, faz do seu presente e faria do seu futuro. Alguém que te fez rir de coisas idiotas, chorar de alegria.

Emma, Julie e Jake me encontraram numa praia. Eu tinha dez anos, eu tinha fugido de casa e não queria voltar. Eles me convenceram a voltar, falaram com minha mãe e me levaram para o acampamento. Eles foram o mais perto de família que eu já tive em todos meus dez anos de vida. Emma era doce gentil e adorava minhas piadas toscas. Julie eram mais realista e fixa nos planos que dariam continuidade a sua vida. Jake se tornou meu melhor amigo logo de cara. Emma e Julie eram muito novas e não sabiam como lidar conosco, dois semideuses filhos dos Três Grandes. Mesmo assim elas sempre me deram o que eu precisei, uma família. Minha mãe não conseguia me controlar, o TDAH e a dislexia me tornavam difícil de conter. Ela chorou muito quando parti, mas eu queria provar para todos que eu era capaz de viver sozinho, eu queria deixá-la orgulhosa. Julie, Emma e Jake eram parte desse propósito, eles seriam meus guias naquela busca. Julie sempre foi importante na minha vida, assim como Emma e Jake.

Vendo-a ser morta brutalmente era mais terrível que assistir minha própria morte. O fogo que ardeu em meu peito e achou seu par, o frio que assolou minha alma. Ambos iriam por fim ao mal que destruiu meu passado, meu presente e meu futuro, antes que ele pudesse destruir algo mais.

Levantei minha cabeça, quase imperceptivelmente, Jake andou até Emma e a consolou com palavras inúteis para o sofrimento que ela estava sentindo. Meu corpo exclamou em protesto quando a raiva e a frieza falaram mais alto. Quando corri com uma espada em punho. O basilisco sibilou e rastejou em minha direção.

Gritos ecoaram sem efeito em meus ouvidos, meus amigos sentiram o perigo mas sem coragem para abrir os olhos. Sem olhar para os olhos da besta, desviei de um bote mortal. Olhando para o corpo esguio e musculoso da serpente, finquei minha espada em seu dorso. De olhos fechados deixei meu pai me guiar. Sua voz era clara e límpida em minha mente. Eu apenas obedecia enquanto ele me livrava da morte, eu lutei de olhos fechados, apenas sentia os movimentos, mas na verdade eu estava flutuando em algo gelado se macio. Água. Meu pai queria me dizer que não poderia me ajudar mais. Minha espada se transformou em uma clava. Esmaguei o focinho da fera. Depois ela se transformou em uma zarabatana e dardos fincaram-se em suas escamas.  Meus olhos eram fendas apertadas quando escalei uma pilastra de mármore negro. Firmei meu pé esquerdo no topo da pilastra e com o direito chutei a face ofídica do basilisco. O arco de bronze celestial estava em meu punho, e uma flecha apontada diretamente para o olho esquerdo da fera. O cordão de couro liberou o projétil mortal, a flecha passou certeira por sua córnea. O basilisco sibilou e bateu a cabeça na pilastra, estilhaçando-a e me fazendo ir de encontro ao chão. O ar desaparece dos meus pulmões quando minhas costas fazem contato com o chão frio. As risadas de Brius e Kimberly me despertaram do frenesi melancólico. Uma voz calma e ao mesmo tempo cheia de sabedoria planta uma ideia em minha cabeça. Fogo e Gelo. Separados são catastróficos, juntos invencíveis!

- Jake! Ataque padrão beta! Fusão de Fogo! – Gritei.

Ele se levantou e chamas negras brotaram em suas mãos. Fogo do inferno! As chamas sombrias se enrolaram no basilisco, o frio dentro de mim se concentrou em meu estômago, águas cristalinas jorram de minhas mãos congelando a besta. Mais uma vez minha espada se transforma, dessa vez em uma lança de um metro e oitenta. Minhas pernas se cooperaram sem hesitar, sem tropeçar. Brius tentou me impedir, mas Jake lançou suas chamas contra o semititã, pude ouvir a pele dele chiando e borbulhando com as queimaduras. Kimberly soltou um grito e saiu do meu caminho. Sorte a dela. Minha lança produziu um som de coisa rachando quando a lâmina cravou a carne do basilisco. Seus olhos se contorceram em sangue, lágrimas de sangue jorravam de seus olhos e queimavam seu corpo. Ele evaporava lentamente, queimando, da mesma forma que tinha feito com Julie. 

- NÃO! – O grito de Brius chacoalhou a montanha. O lado esquerdo de seu corpo estava completamente desfigurado. A pele enrugada e ressecada por causa da queimadura. Fogo. A água cobriu seu braço e ele tentou se libertar da pressão esmagadora, a água congelou seu braço queimando ainda mais a pele. Gelo. O grito de agonia que escapou pelos lábios de Brius foi o som mais reconfortante que eu já ouvira em toda minha vida.

Kimberly ergueu a espada e avançou em minha direção. Seus olhos clamavam para que eu fugisse dali, ela não queria me machucar. Sophie entrou na minha frente e ergueu a espada.

- Não chegue mais perto sua traidora! – Gritou a Srta. Wikipédia.

- Poderíamos ter sido reis Will, por favor. Venha comigo! – Ela falava sério.

- Piranha! – Sophie atacou.

Kimberly desviou da estocada de Sophie, e contra atacou com a parte chata da lâmina. Ambas lutaram com raiva, fúria e ódio.

- Kimberly! – Gritou Brius – Sua idiota! Vamos sair daqui! Urano foi derrotado ele não pode mais renascer!

Era verdade, as nuvens negras tinham sumido, Atlas gemia e resmungava. O céu estava límpido e resplandecente.

- Mas...

- Sem mas sua vadia estúpida! – Urrou ele. – Acabe com isso agora!

Kim se virou para mim, seus olhos eram tristes e furiosos.

- Durma... – Sua voz era firme, e me senti obrigado a obedecer. 

O mundo ficou negro, o sono me envolveu. Não sei quanto tempo dormi, apenas senti uma pressão esmagadora, eu ouvia as pessoas me fazerem perguntas, tentarem me acordar.

- Quíron, ele esta em coma? – Ouvi uma voz masculina perguntar, Denis, um campista de Hefesto. Nunca fomos amigos, mas eu o havia salvado há alguns anos. Embora a pergunta tenha sido dirigida a Quíron, foi Sophie quem respondeu.

- Sim. Kimberly usou um tipo de feitiço nele. – Sua voz era profunda e cansada como de quem não dorme há dias. Ela apertou minha mão, mas eu não consegui responder.

- A mente dele é um poço escuro impenetrável. – Ela disse.

Então era isso? Eu estava em coma. Não conseguia me mover e nem ao mesmo responder, dizer que estou consciente, pelo menos quase consciente.

Resista meu filho, atrás da tempestade sempre haverá a luz do Sol.

Deixei-me afundar nas águas frias de meu sono profundo e inescapável. Deixando-me flutuar.  


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