Baú de Ossos escrita por Julia Valentine


Capítulo 7
Capítulo 6 - Bobos alegres.


Notas iniciais do capítulo

Oi, gente! :)
Será que existe alguém ainda? Haha, desculpa a demora, mas eu fico com mais preguiça nas férias. ~~ estranho
Desculpe qualquer erro. Aproveite a leitura! Tem uma ceninha legal no fim *---* Uma que eu esperava há muito tempo.



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Você já notou que quando alguém tem um hábito irritante, é geralmente a última a notá-lo? E o que isso nos sugere quanto aos nossos próprios hábitos irritantes? Ora, que nós também somos os últimos a notá-los!

Nas últimas semanas, eu havia adquirido um novo hábito. Irritante em demasiada, aliás. Esse hábito tinha nome, endereço, cor e tudo mais: Ryan.

E posso dizer, com todo certeza, que aquele que te irrita, te domina. Mas era impossível ser diferente.

Eu finalmente havia conseguido o que procurava. O emprego no restaurante de Olivier estava sendo maravilhoso. Minha rotina não era apertada: saía da escola, ia direto ao restaurante de ônibus, trabalhava até as onze e voltava para casa. As gorjetas eram gordas, ainda mais se você conseguisse servir algum velho rico tarado. Bastava um sorrisinho e chegava a ganhar vinte dólares!  Eu me pergunto onde está se enfiado minha dignidade.

O problema começou há pouco menos de duas semanas... Um problema que se tornara um hábito.

... Duas semanas atrás.

Vasculhava minha bolsa. Aquele fundo preto nunca fora de grande ajuda – ainda mais agora. Joguei todas as coisas no chão, esparramando-as. Não estava lá! Onde eu as havia deixado? Só não perde a cabeça porque está grudada no corpo, Georgiana.

- Procurando por isso aqui? – vi um pé se aproximar das minhas coisas. Ele estendeu as chaves na frente do meu rosto, balançando-as. Aproximei minhas mãos para pegá-las, mas ele as deixou acima de sua cabeça.

- Se você pensa que vou ficar pulando para pegá-las, está enganado, Kemper! – disse fitando agora seus olhos, me levantando.

- Tampinha, como você é sem graça. – me mostrou a língua, ainda mantendo as chaves para o alto. Eu nunca poderia alcançá-las. Ele queria me fazer de boba, pulando em cima dele.

O encarei nervosamente. Estiquei as mãos para ele me entregar as chaves. Ele sorriu travesso, me fazendo arregalar os olhos. O que Ryan faria agora?

Foi se aproximando, mantendo seus olhos nos meus. Estava ficando mais perto, mais perto. Senti sua respiração sobre mim. Eu não queria mais manter meu olhar no dele, mas parecia impossível desfazer essa conexão. Sua boca estava em uma distancia tão curta que era possível sentir seu halito. Era menta e coke. Separei meus lábios, em um ato impensado. Ele sorriu de lado e senti suas mãos nas minhas, onde ele deixou as chaves.

- Está com pressa? – disse distanciando-se.

Argh, estúpida! Burra! Por que diabos eu fui esperar um beijo? Eu deveria apenas me enfiar embaixo da terra. Cavar um buraco bem fundo onde eu possa me enterrar e nunca ninguém me encontrar.

Eu realmente esperava um beijo? Não...

Virei-me e saí dali marchando para fora. Dirigi até em casa pensando na besteira que tinha acabado de fazer. Como eu consigo fazer isso? Responda-me, o que você tem na cabeça, Georgiana?

O incrível era que não conseguia parar de grunhir. Argh. Ia me transformar em um homem das cavernas. Comunicar apenas com rangidos e grunhidos. Até que não era uma má ideia.

Estava no ônibus em direção ao restaurante. Essa brincadeirinha havia me custado tempo. Já estava atrasada.

O caminho andando me ajudou a recuperar um pouco da minha estima. Se ainda havia restado alguma... Chegando ao restaurante, entrei pelos fundos – entrada dos funcionários.

- Ma petit, ça va? – ouvi Olivier falar assim que cheguei à cozinha.

- Ça va bien... – obrigada Suzanne, suas aulas foram ótimas.

- Então, - disse aproximando suas mãos do meu rosto – por que parece que não?

Sorri torto. O que poderia dizer? “Pensei que um garoto ia me beijar. Dei maior brecha. Fiquei que nem uma idiota esperando que ele o fizesse. Afinal, por que ele iria querer quando tem uma namorada!?”. Não, né?

- Apenas cansada. – respondi o que me pareceu mais sensato. Minha avó costumava dizer que a mentira deriva, em geral, do medo injustificado. Vovó, você sempre foi tão sábia.

Desvencilhei-me dele e fui ao vestiário. Havia me acostumado com aquele uniforme. Era bem normal, tipicamente normal – para servir um bando de gente onde não tem onde enfiar dinheiro.

Saí dali e me encontrei com Trevor. Dentre todos os funcionários do restaurante, ele fora o único que não me destratara. Sério, parecia que todos não gostavam de mim. Paranoia será?... Eu sempre tive uma mania de perseguição.

- Oi, Ge!

- Preparado pra mais uma noite com as velhas assanhadas? – era hilário assistir Trevor servindo suas clientes. Para ganharmos mais gorjetas, combinamos que serviríamos os sexos opostos de cada um. Assim, eu ganhava mais dos velhos e ele, das velhas. Um esquema que até hoje tinha dado certo.

- Essas gorjetas têm ajudado...

- Eu que o diga. – disse me lembrando da hipoteca da casa que eu ainda teria de quitar.

Ele sorriu. E dessa maneira, entendo como ele consegue ganhar tanto das mulheres desesperadas. Tinha dentes branquinhos, um sorriso largo e gentil – não debochado como de um certo alguém – e seus olhos sorriam junto. Um perfeito eyesmile.

A noite não estava muito agitada por ser no meio da semana. Quando acabo de sair da cozinha, me deparo com um grupo de quatro pessoas sentado em um canto próximo a janela. Aproximo-me e logo desisto da ideia. É culpa do destino. Minha má sorte. O que foi que eu fiz pra merecer isso? Olho em volta, porém não encontro Trevor. Merda, merda, merda.

Eu não podia evitar. Respirei fundo. Uma, duas, três vezes. Andei até a mesa e fiz o de sempre.

- Bonne nuit, posso pegar o pedido dos senhores?

- Tampinha! – disse Kemper, sorrindo de orelha a orelha. Garoto, pare de sorrir. Suas bochechas não doem, não?

- Você a conhece, Ryan? – disse uma mulher por volta dos quarenta anos. Muito bonita, por sinal. Tinha cabelos castanhos como os dele, porém os olhos eram da cor de avelã.

- Nós fazemos algumas aulas juntos, não é Polly...

- Eu já disse pra não me chamar assim. – disse sorrindo, tentando amenizar o som de ameaça na minha voz. Não sei se deu certo.

- Não ligue, Georgiana. Ryan aqui adora arranjar apelidos para todo mundo. – disse a ruiva ao seu lado, a namorada dele.

Dei um sorriso torto me contorcendo por dentro. Eu não gostei do meu nome sendo dito por aquela garota.

- Não sabia que trabalhava aqui.

- Pois é.

Ouvi dizer que as pessoas costumam dizer ‘pois é’ quando não tem o que falar.

- Já irão pedir? – perguntei delicadamente. Será que eu convencia?

Anotei os pratos e me retirei educadamente, suspirando aliviada. A noite foi longa. Kemper não parava de me provocar. Pediu várias coisas. Não sei como aguentou aquilo tudo. No fim, eles pagaram a conta me deixando duas notas de dez. Fiquei feliz e comecei a arrumar o restaurante.

Quando já era quase onze horas, todos se despediram. Eu iria fechar o restaurante naquela noite.

Terminei de arrumar a última mesa e fui ao vestiário. Estava tirando a blusa do uniforme quando ouvi um barulho. Assustei-me. Até então, achava que não havia ninguém ali. Peguei na minha bolsa o spray de pimenta. Tinha ganhado em uma palestra sobre prevenção.

Andei até onde eu julgava vir o barulho com o spray fortemente em minhas mãos. Comecei a suar frio. Andei cautelosamente pelo corredor em direção à porta dos fundos. Larga de ser medrosa, Georgiana. Não é nada! Decidi ignorar aquilo. Virei-me e bati em algo. Algo não, alguém! Comecei a espirrar o spray na direção onde eu julgava ser os olhos do meu assaltante/estuprador/sequestrador/alien enquanto gritava.

- Georgiana, pára! – ouvi o homem estranho pedir. O homem estranho tinha uma voz conhecida. – Tampinha, porra.

- Ah, meu Deus! Kemper, Kemper, me desculpa. – joguei a latinha de spray para longe. Corri para a cozinha buscar um pano. Molhei-o e voltei até ele.

Ryan estava sentado, encostado na parede, com os olhos fechados. Tinha uma expressão de dor. Levei o pano umedecido até seu rosto. Passei sobre seus olhos calmamente.

Estava agachada a sua frente enquanto tentava fazer seus olhos pararem de arder. Ryan grunhia um pouco. Resolvi assoprar. Estava desesperada. E se eu nunca mais pudesse ver aqueles olhos?

- Por favor, me diga que você não ficou cego! – a culpa era quase visível em minha voz. – Me desculpa, por favor. – continuei assoprando enquanto cobria um dos olhos com o pano.

Kemper segurou meu pulso. Estava tentando abrir os olhos. Quando abertos, estavam muito vermelhos.

- Não se preocupe, não foi tão ruim. Ainda bem que não é alta o suficiente pra jogar diretamente nos meus olhos. – disse essa última parte segurando o riso.

- Arsh, e eu aqui me preocupando com você! – disse me levantando, porém ele impediu apertando mais forte meu pulso. – Você... O que estava fazendo aqui?

- Queria falar com você. Me desculpar...

- Pelo que?

- Não sei ao certo... Tudo? – disse esforçando-se para me olhar nos olhos. Eu não via mais suas íris verdes. Apenas a vermelhidão.

- Hum... Kemper, por que acha que deve se desculpar?

- Eu sinto que você me odeia. Talvez nós começamos com o pé esquerdo, sei lá.

- Você não está tão errado. – ri - Bom, eu não... te odeio. – eu acho – De qualquer jeito, você não deveria estar aqui comigo. E a sua... er, namorada?

- Quem?

- Ah, você sabe, aquela ruiva.

- A Iza?

- É... Ah, eu não sei o nome dela, porra. – soltei meio nervosa - Vai voltar pra ela, vai. – disse me desvencilhando de seus braços, já me levantando.

- Tampinha... – disse também de pé – Ferrugem é minha irmã. Não viu a semelhança?

- Oi?... Ir-irmã? – disse meio incrédula – I-Isso não me importa também. – virei-me de costas para ele. – Eu acho melhor você ir embora, não é?

Senti seus braços me segurando pelos ombros, me jogando contra a parede, forçando-me a encará-lo. Apoiou um dos braços na parede, em cima da minha cabeça, ficando com o rosto a centímetros do meu.

- Kemper, o que você pensa que está fazendo?... – disse com firmeza na voz. Eu não seria uma garotinha que começa a gaguejar quando um garoto te imprensa na parede, até porque eu estava gostando daquilo.

- Georgiana, - disse perto dos meus ouvidos – está com ciúmes?

- Ciúmes? Ah, faça-me o favor, garoto. – será que era isso?

- Não precisa se sentir assim, Ge. – voltou a boca para perto da minha.

Cada movimento me provocava uma sensação diferente.

- Eu te garanto... – disse encarando mais seus olhos que estavam voltando ao normal – que não é isso.

Ele sorriu travesso, de lado. Encantador. Aproximou seus lábios dos meus e depositou um beijo no canto da minha boca. Permaneceu alguns segundos assim. Fechei meus olhos. Eu esperava por mais? Talvez… Provavelmente.

Afastou-se e abri meus olhos para encará-lo. Verde-paz encontra negro da noite. Senti meu coração se acelerar. Eu ansiava por mais.

Levei minhas mãos ao seu pescoço, puxando-o para mim. Encontrei seus lábios entreabertos, esperando por mim. Eu o beijei. Suas mãos foram para minha cintura, levantando meu corpo para ele. Como um jogo, travamos uma disputa com nossas línguas. Eu nunca gostei de não fazer nada. Toda vez que nos encontrávamos dentro de nossas bocas, sentia um arrepio percorrer meu corpo. Passei minhas mãos pelos seus cabelos e nuca. Ele percorria as mãos pelas minhas costas. O poder de dominar é tentador. Mas sem Ryan, não tem graça. Continuamos em nossa sincronia dessincronizada até que o ar faltou para ambos.

Encostamos nossas testas, fitei sua grama verde que agora parecia incendiada. Fogo. Comecei a rir. Ele também. Foi uma vontade involuntária. Só queria rir... Kemper encostou sua cabeça em meus ombros e me apertou. Inspirou entre meus cabelos me provocando cócegas. Senti que minhas bochechas ficaram vermelhas.

Depois do ocorrido, permanecemos em silêncio. Não foi desagradável. Pelo contrário, cada qual em seu pensamento. Despedimos-nos com um aceno de cabeça.

... Agora.

Eu precisava esvaziar minha mente. O pior foi que, no dia seguinte, na escola, fingimos que nada tinha acontecido. Eu não sei por quê. E isso me irrita.

Será que dá pra alguém me explicar o que está acontecendo?

Kemper continua sendo Kemper. Me azucrinando. Ele não podia gastar essa energia beijando a minha boca? Credo, to carente.

Eu estou evitando-o a todo custo. Evito olhar seus olhos. Evito encontrá-lo no corredor. Evito pensar no beijo e, principalmente, me arrepiar só de pensar nisso. Evito pensar em Ryan Kemper. Mas... Por que isso está se tornando cada vez mais difícil?

Quem escreverá a historia do que poderia ter sido?


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Notas finais do capítulo

Então, gostaram? O que vocês tem a dizer dessas atitudes da Ge? Menina louca, né.
Finalmente um beijo ~.~ Não sei se foi rápido demais, ou lento demais, me contem o que acharam por favor. Eu tenho um timing e tem muita coisa para acontecer na história ainda. Muita!
Eu só fico triste com uma coisa. Eu tenho dez leitoras. Dez! Mas nem perto disso de review/cap. Triste :(
Enfim, obrigada por ler!