Running Away From Hell escrita por GabanaF


Capítulo 7
Cap. VII — Load, Aim, Shoot


Notas iniciais do capítulo

Oi gente, como vocês estão? Eu queria agradecer aos comentários e recomendações para esta fic, muito mesmo. Vocês sabem que reviews são um combustível e tanto para os autores e realmente me anima muito que vocês estejam gostando tanto da fic.
Espero agradar vocês com esse capítulo, por que, bem, nele tem uma coisa que talvez vocês estejam esperando a um tempão... Espero que gostem!



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15 de Março de 2012

Horn Springs, Lebanon, TN

03:20 PM

Santana crescera numa comunidade violenta mesmo sendo filha de um dos maiores médicos de Lima. Ele não conseguia abandonar as raízes em Lima Heights e sua família tinha vivido lá até aquele apocalipse todo começar.

E para Santana, a casa que Sam tinha invadido não era em nada parecida com uma fazenda. O gramado possuía a aparência que não era cortado há dias, e mesmo assim conservava uma forma imponente. Os portões aparentavam ter pedaços de ouro misturado com o ferro com que fora construído. Se houvesse a tal horta que ele tinha mencionado antes, estava no quintal dos fundos, por que nenhuma coisa comestível plantada na terra se encontrava na parte da frente.

Ela soltou um assovio impressionado ao levantar os olhos para a casa. Não era uma casa normal, tampouco aquelas casas simples do interior como havia visto horas antes no vilarejo macabro. Era uma mansão. Enorme, de três andares, pelo que Santana pôde contar. Sam comentava sobre o quanto estava feliz por elas terem conseguido chegar ali, mas ela não dava atenção. Seu queixo caía à medida que chegavam perto daquele monstro que Sam chamava de fazenda.

Ele abriu as portas de madeira gigante e Santana deparou-se com Mercedes e Puck, com Beth no colo. Atrás deles estavam Rory, Sugar e Harmony, todos eles com sorrisos enormes nos rostos. Ela lançou um olhar rápido à decoração vitoriana do hall e pulou nos braços de Puck quando ele deixou Quinn segurar Beth.

Já tinha perdido a conta de quantas vezes havia transado com ele. Ela tinha perdido as esperanças de conquistar Brittany quando Puck foi à sua casa para consolá-la e falar que tudo ficaria bem, que Artie havia entendido o quanto as duas se amavam. Puck fora seu melhor amigo e melhor combatente quando Quinn se aventurava em outras missões, sozinha. E ele tinha sido o pivô para que voltasse com Brittany, meses antes desse pesadelo começar.

Santana o amava. Não pelas transas ou pelos conselhos ou pela grande ajuda que ele fora. Ela o amava por que, depois de Brittany, a única pessoa que conseguia acessar sua dor com conversas melosas e que ela achava extremamente chatas (com Quinn era mais fácil por que nenhuma das duas precisava de muitas palavras para se entender) era Noah Puckerman.

— Shelby... — disse Puck num sussurro no ombro de Santana após alguns minutos. — Ela... E-ela...

— OK, Puck, tudo bem — consolou Santana, o choque da notícia lhe dando um soco. Shelby era a única adulta entre eles que conseguira escapar, a única pessoa legalmente responsável. O que eles fariam sem ela? — Vai ficar tudo bem.

É claro que não ficaria. Quem cuidaria de Beth? Quem poria juízo na cabeça daqueles garotos quando a conversa não parecesse ser o suficiente? Eles estavam salvos naquela mansão gigante, mas até quando?

— Claro — murmurou Puck, um resquício de seu tom sarcástico passando por ali. — Claro que vai.

Ele soltou-se de Santana e foi cumprimentar Rachel.

Santana ficou parada no mesmo lugar durante vários minutos. Se Sugar não tivesse lhe chamado tão insistentemente para que fossem à sala de jantar, provavelmente teria ficado no hall até escurecer. Estava um pouco fora do lugar ali. A perspectiva de não trocar de turnos no meio da noite com Quinn para que pudesse vigiar a casa ou não dormir nada por que estava no meio da estrada e tudo poderia acontecer era estranha. Ela surpreendeu, por que ter um pingo da normalidade que possuía antes de tudo lhe assustava.

***

15 de Março de 2012

Horn Springs, Lebanon, TN

07:12 PM

— Como foi a viagem de vocês? — perguntou Sam sentando-se na ponta da mesa enorme da sala de jantar.

Quinn demorou algum tempo para processar a pergunta. Ela encarava os talheres postos na sua frente com admiração, por que a última vez que comera com garfos e colheres de prataria francesa fora na sua casa, um pouco antes de ir ver Rachel no hospital, a memória agora lhe parecendo de anos atrás. Sam tossiu para chamar-lhe sua atenção. Ela levantou os olhos, assustada.

Percebeu que não era só ela que estava tendo problemas com a comodidade ali. Santana batucava o garfo e a faca de prata na mesa de vidro, criando batidas totalmente sem ritmo e lançando um olhar mortal toda vez que alguém tentava fazer com que ela parasse. Brittany fitava o prato com uma concentração que dava inveja a Quinn, a mão indo e voltando em direção aos talheres, como se estivesse indecisa se eles estavam amaldiçoados ou não. Até Rachel observava confusa todos na mesa, a sua expressão deixando claro que ela tinha esquecido como se comia com talheres nos meses de coma.

— Foi ótima — respondeu Quinn sem pensar, enfiando a colher na sopa que Mercedes fizera e tomando um pouco. O líquido queimou em sua garganta, e ela o engoliu rapidamente, os olhos começando a se encher de lágrimas. — Não faz ideia do quanto.

— Vocês parecem meio chocados — comentou Sugar com a boca cheia. — A comida não está infectada, vocês podem comer, é sério.

Quinn meneou com a cabeça, enfiando outra colherada da sopa na sua boca, assoprando antes. Dessa vez, ela conseguiu saborear mais a refeição e deu graças por ter pedido à Santana para pegar os pacotes de sopa na última vez em que saquearam o supermercado. Os olhares dela e de Puck, do outro lado da mesa, se encontraram; ele deu um aceno enquanto tentava alimentar Beth.

A morte de Shelby não era algo bom, ela pensara quando Santana tinha lhe contado. Puck poderia ter sido a grande babá de Beth durante as primeiras semanas em Lima, mas eles estavam longe da civilização. Todos tinham que cuidar de Beth, Quinn não admitiria que seu bebê fosse levado embora dela mais uma vez. Ela checara o quanto Puck tinha trazido de fraldas e leite e as outras coisas que um nenê precisa e tinham para três semanas, no máximo. Era muita coisa, sabia, mas quando todos aqueles recursos acabassem, teria que juntar seu exército para deixá-la a salvo.

— Ei, Quinn — chamou Rory animado enquanto terminava a latinha de Coca-Cola (acima de qualquer luta com zumbis que já tinha tido nas últimas semanas, tirar os refrigerantes de Santana Lopez tinha sido a pior delas). — Harmony me disse que você enfrentou uma cidade inteira de walkers, conta pra gente.

Ela assentiu dando um sorriso bondoso. Rory chegara da Irlanda como o novo estudante estrangeiro para o ano letivo na McKinley High e tinha ido morar com Brittany. Quando as coisas pioraram, Brittany não hesitou em levá-lo aonde se escondiam. No entanto, metros antes de os dois chegarem, eles foram cercados por walkers. Brittany conseguiu se salvar, porém Rory quase morreu se não fosse pelos tiros rápidos de Quinn vindo do telhado da casa. Desde então, ele a idolatrava.

— Espera aí que não foi só a Quinn, não, ok — interferiu Santana, seu tom aumentando uma oitava. Seu prato já estava vazio e Mercedes se oferecera para buscar-lhe outro. — Eu também estava lá.

Todas nós estávamos lá, Santana — retrucou Rachel revirando os olhos. — Por favor.

— Ei, mas é você que ainda não se acostumou com o fedor deles — rebateu a outra garota exaltada.

Quinn passou a língua pelos lábios e bateu um dos talheres na mesa para chamar a atenção.

— Fiquem quietas, vocês duas — ralhou. — Rory, foi assustador, beleza? Eles haviam feito um pacto. Os pais mataram os filhos e depois se mataram. Era estranho por que todos os estavam em posições quase normais, como nós aqui. — Harmony fingiu que estava vomitando sobre o prato. — Porém, antes do patriarca morrer, ele escrevia na parede com sangue de seus parentes uma frase: “Deus nos perdoe”. Acredito que tenha sido ao mesmo tempo em todas as casas. Da mesma forma, ao que nós chegamos lá, eles estavam se transformando. Tivemos que sair o mais rápido possível.

— Mas pegamos primeiro as Cocas — completou Santana, fitando com uma inveja considerável as quatro latinhas de refrigerante que o grupo dividia. — Foi a melhor parte, com certeza.

Brittany, que estava ao seu lado, começou a ralhar com ela. Sam apartou a briga contando como havia chegado ali com sua mini-van, e Quinn achou interessante que nenhum dos perigos na sua viagem se comparava aos da viagem dele. Descobriu também que ele passara pela reserva florestal onde Rachel tinha passado mal e que Sugar e Harmony tinham detonado mais da metade dos walkers lá enquanto os outros dormiam. Era hilário pensar que Sugar ainda tinha medo de baratas, mas dominava walkers com uma facilidade enorme.

A conversa durou até tarde da noite. Sam, Quinn, Puck e Santana sentaram-se na sala de estar — a TV de plasma encarando Quinn como se pedisse para ser ligada a incomodando horrivelmente — e discutiram por um bom tempo o que deveriam fazer para cercar a mansão. Sam levantara que o uso das cercas que já era suficiente, pois havia quase uma semana que estavam ali, e apenas três ou quatro errantes tinha aparecido.

Santana sugeriu que visitassem o conjunto habitacional ali perto para a busca de mais suprimentos e o extermínio de alguns walkers que ainda continuavam perdidos por aquela região. Quinn concordou, mas seus olhos estavam cansados e a perspectiva de deitar numa cama quentinha com lençóis de primeira linha não a ajudava a se concentrar.

— Sam... — ela chamou aos bocejos depois de alguns minutos. — Onde eu posso dormir?

— Segundo andar, terceira porta à direita, Quinn — respondeu Sam prontamente sem tirar os olhos dos planos que Santana escrevia em alguns papéis à luz de velas: o gerador parara de funcionar outra vez. — O quarto de Puck é ao lado do seu, Beth está dormindo lá.

Ela concordou, receando a próxima pergunta.

— E Rachel? — disse timidamente, o sono e a vergonha fazendo seu rosto corar. — Em que quarto ela está?

— No quarto em frente ao seu — disse o garoto, ainda olhando os papéis, porém Quinn percebeu que as risadinhas de Santana e Puck. Se não estivesse tão cansada, teria caçado briga.

Ao invés disso, saiu do cômodo e subiu as escadas em direção ao seu novo quarto quente e confortável.


16 de Março de 2012

Horn Springs, Lebanon, TN

12:02 AM

Chegando ao segundo andar, Quinn não resistiu.

Ela precisava olhar Beth. Ver como ela estava; observar seu sono. Se entristecer por uma mente tão pura e inocente ter caído num mundo daquele. Tinha que ver Beth. Não por ela, Quinn, mas pela garota. Sem Shelby, Beth perdera o mais próximo de mãe que tinha. Quinn poderia ser a mãe biológica, mas Shelby sempre seria a mãe de verdade.

Talvez pudesse mudar isso. Talvez pudesse ser a garota corajosa que não fora dois anos antes. Talvez pudesse salvar uma alma dali. Era o fim do mundo, afinal de contas, o que ela tinha a perder?

Quinn esgueirou-se pelas portas do segundo andar suntuoso da mansão de Sam, contando-as mentalmente. Ela parou na quarta porta e encarou-a, na sua mente sendo esse ali seu maior desafio. Respirou fundo, contou até dez, deu uma volta inteira no corredor e finalmente entrou na ponta dos pés.

A cama de casal de Puck estava intacta. Ao lado desta, um berço preenchia o lugar. A respiração de Quinn se perdeu por um instante. Seus olhos brilhavam de lágrimas e os passos cada vez mais lentos lhe deram um tempo para acostumar-se àquilo.

Beth dormia numa paz que lhe deu inveja. Que daria a qualquer um daquela casa inveja. Suas mãozinhas agarravam um cachorro de pelúcia de Quinn que ela dera na sua primeira visita a Shelby, há muito tempo atrás. Os cabelos loiros embaraçados lembravam a Quinn de si, e tinha certeza de que se a garotinha estivesse acordada, os olhos verdes também.

Ela deu um sorriso, tentando conter as lágrimas. Beth era linda. Perfeita. Quinn não queria que seu futuro se resumisse a matar zumbis e sobreviver de comida enlatada e Cocas achadas randomicamente. Ela não queria que Beth crescesse para lutar e sobreviver. Queria que Beth tivesse lembranças do mundo antigo, queria que ela pudesse escolher uma faculdade, ter sua família, viver feliz.

Quinn queria que Beth vivesse.

Um pigarro atrás dela tirou completamente sua atenção do berço onde Beth dormia. Quinn virou-se apressada, procurando tirar a pistola do coldre em sua cintura, porém ela apenas respirou aliviada ao notar que era Rachel.

— Estamos seguras agora — comentou Rachel num sussurro, seu sorriso iluminando Quinn mais que a pouca luz que vinha da vela no corredor. — Não precisa apontar essa arma pra todo mundo.

Rachel se aproximou sorrateiramente enquanto Quinn punha a arma de volta ao coldre, ainda apreensiva. Enxugou as lágrimas de seu rosto rapidamente e sentou ao lado de Rachel na cama de Puck, seus olhos sempre fixados no berço de Beth.

— Ela é igualzinha a você — disse Rachel impressionada. Quinn lembrou que Rachel nunca vira Beth em nenhuma ocasião antes do coma. Era um desconto se considerasse o tanto que ela havia perdido com a perda de memória. — Chega a ser assustador.

— Beth nunca terá uma chance — Quinn desabafou; as lágrimas retornando insistentemente a seus olhos. — Maldito mundo!

Quinn não tinha intenção, mas seu tom fora alto o bastante para que os garotos do andar de baixo parassem de conversar um tempo. Ela olhou instantaneamente para o berço, porém Beth continuava em sono profundo.

Ela enfiou-se no peito de Rachel chorando terrivelmente. Estava cansada, só isso. Só queria um pouco de paz, queria um futuro para ela e a filha. Queria um futuro para Rachel, era pedir demais? Ela havia prometido a si que faria Rachel lembrar-se de tudo antes do acidente, mas tudo seria muito mais fácil se elas não tivessem que sobreviver de lembranças, de contos ou de imagens que só eram reais na cabeça de Quinn.

— Quinn, ei. — Ela ouviu Rachel lhe chamar num sussurro acima de seus cabelos rosados, sentindo pequenos beijos neles. — Você disse que a gente iria sobreviver a esse inferno, ok? E nós vamos. Perdemos alguns no caminho, mas continuamos. Eu tenho você e você tem a mim, beleza?

Lentamente, Quinn se desvencilhou de Rachel e concordou. Ela deixou que a garota limpasse seu rosto molhado de lágrimas, querendo se desviar, mas sabendo que não podia. Rachel e ela compartilhavam uma conexão, uma coisa que havia impedido ela de sair de Lima sem passar no hospital, algo que fez Rachel acordar no momento exato em que passava lá. Ela não podia desviar, não podia.

A luz fraca que vinha do corredor tornava os olhos castanhos de Rachel estranhamente maiores. Eles cintilavam terrivelmente em sua direção. Quinn tentou recuar, mas aquilo era o que ela desejava desde a primeira vez em que vira Rachel, desde o dia em que fora a casa dela buscar dicas para musicais com óbvias segundas intenções.

Ela não podia evitar.

Os lábios de Rachel estavam próximos. Muito próximos. Quinn se inclinou os centímetros faltantes e fechou os olhos para finalmente pôr seus lábios nos de Rachel.

A sensação era surpreendente. Os lábios de Rachel eram macios e estranhamente confortáveis, como se fossem feitos especialmente para ela. As duas se encaixavam de forma perfeita. Rachel passou os braços em torno de sua nuca e Quinn deixou que suas mãos a levassem até a cintura da garota, aproximando-a de seu corpo como sempre desejara.

Quando pararam para respirar, Rachel encarou o chão de forma culpada. Arrependeu-se no mesmo instante ter deixado os instintos ter guiado ela. Rachel estaria pronta para aceitar seu amor? Elas não se encontravam no mesmo mundo de antes. Ela não namorava Finn mais. Era uma garota livre.

Então, para sua completa surpresa, Rachel levantou os olhos com um sorriso apaixonado escondido pelas sombras. Ela sorriu também, agradecida, apertando a mão de Rachel de leve. Lançou um último olhar à Beth e levantou-se para sair do quarto.

Talvez o mundo não fosse o mesmo. Talvez sua filha jamais visse o que tinha de bom antes, mas agora Quinn tinha certeza: ela tentaria. O mais forte possível, o mais rápido possível. Ela tentaria construir algo melhor, não só para Beth, mas também para a garota que caminhava ao seu lado.

***

16 de Março de 2012

Horn Springs, Lebanon, TN

07:28 AM

— Não! — gritou Santana entusiasmada. — Eu não acredito!

— Santana, por favor! — sibilou Quinn irritada. Encheu a tigela de cereal olhando para os lados, tensa. — Eu nem deveria ter contado a você, então fique quieta.

Santana revirou os olhos. Quinn havia acabado de lhe contar que finalmente conseguira algum movimento de Rachel na noite anterior, e ela simplesmente não poderia comemorar? Ela estava ao lado de Quinn desde sempre, apoiara a maioria de suas decisões em relação a Rachel, sentia-se orgulhosa e feliz por um pouco de alegria estar surgindo para a melhor amiga no meio daquele inferno todo.

Ela pegou a caixa de cereais que Quinn deixou em cima da mesa e colocou grande parte em sua tigela. Sam mencionara racionamento na noite anterior enquanto discutiam os planos para manter a mansão viva, mas Santana sentia falta demais de Corn Flakes para pensar de forma racional. Quer dizer, a dispensa que Sam mostrara a ela e Puck estava lotada de alimentos enlatados, cereais e macarrão instantâneo. Pensava que eles poderiam sobreviver sem algumas gramas de Corn Flakes essa manhã.

— O que eu tô dizendo é... — ela correu atrás de Quinn e sentou ao lado dela na mesa enorme; Rachel não estava à vista — isso é ótimo. Você conseguiu o que queria.

— Eu não consegui nada — retrucou Quinn num sussurro. — Ela não é um prêmio ou coisa do tipo. Rachel é o amor da minha vida.

Quinn corou furiosamente ao terminar a frase, pois Rachel descia as escadas com uma das camisas flanelas dela. Santana sorriu para Quinn de forma maliciosa. A garota procurava se ocupar enchendo a boca de cereal e evitar dizer qualquer outra coisa constrangedora.

— Puxa Fabray, eu sempre pensei que você fosse lerda nos seus relacionamentos — comentou Santana maldosamente, deixando Quinn mais vermelha.

— Credo, Santana! — exclamou Quinn depois sofrer um pequeno acesso de tosse. — Não, não foi assim! Nós não...

Ela não terminou a frase para tomar seu suco de laranja.

E Santana sabia perfeitamente de que as duas não tinham tido relações sexuais. Quinn poderia ser expert quando se tratava em esconder sentimentos, mas se falasse de qualquer outro relacionamento dela, a garota simplesmente não conseguia mentir. Ela só achava era divertido torturá-la com isso.

Rachel evitou Quinn e Santana e acabou indo se sentar do outro lado da mesa perto de Mercedes, iniciando uma conversa com ela. Sam, ao lado da namorada, lançou um olhar indagador a Quinn, que apenas deu de ombros e terminou seu café-da-manhã rapidamente.

Santana queria ir atrás de Quinn para tentar convencê-la de que fugir de Rachel não era um bom negócio quando a voz de sinos de sua namorada invadiu seus ouvidos. Ela esqueceu-se de tudo e deu um beijo demorado em Brittany assim que ela ocupou a cadeira vaga ao seu lado.

Brittany e ela tinham um quarto juntas, e Santana agradeceria a Sam por isso mais tarde. Não achava que o garoto seria capaz de pô-las separadas depois de tudo que haviam passado. Sam entendia seu amor e necessidade por Brittany; passar uma noite separada dela seria como se o pesadelo de todos os dias se tornasse mais real.

— O que faremos hoje? — questionou Brittany animada a Sam, ainda distraído com a presença de Rachel ao seu lado. Pelo jeito, Santana não havia sido a única a reparar no ciúme de Rachel quando tinham chegado no dia anterior.

— Santana disse ontem que precisávamos invadir as casas nas redondezas, apenas por precaução — respondeu Sam sério. — E se você ainda possui aquele dom mágico de consertar coisas tecnológicas, algo está errado com o gerador.

— Claro — disse a outra com um sorriso. — É só me apresentar a ele e eu faço o serviço.

Santana terminara a tigela de cereal, porém permaneceu na mesa conversando com Brittany e Sam até Puck chegar com Beth em seu colo. Ela viu os olhos de Rachel brilhando na direção da garotinha e ficou se perguntando o que Quinn faria em relação às duas.

Beth fez a alegria de todos na sala de jantar. Puck sentou à frente de Santana, a cadeirinha da época de Lima posta ao seu lado. O garoto pegou Beth dos braços de Sugar e a colocou na cadeira. Ele começou a amassar alguns pedaços do Corn Flakes misturados com um leite ainda milagrosamente não estragado enquanto era continuamente observado por Santana. Quando seus olhares se encontraram, ele deu um aceno com a cabeça. Na língua da amizade deles, isso significava que ele tinha chorado um pouco à noite, mas que sobreviveria a tudo.

Ela concordou tristemente. Rachel chegou mais perto de Beth e a paparicou enquanto conversava com Puck. A risada deles sobrepunha a de qualquer um naquela sala, Santana só queria saber por que.

Aquela atmosfera de felicidade não estava lhe assustando mais, pensou. De fato, ela esperava que durasse por um tempo. Dependendo do que acontecesse ali, do quanto de alimento que encontrasse naquele conjunto habitacional, eles poderiam passar bons meses na mansão.

Um novo futuro, uma nova forma de ver a vida.

Era só o que ela queria.


16 de Março de 2012

Horn Springs, Lebanon, TN

07:40 AM

Quinn tinha lhe beijado.

Um beijo. Quinn lhe beijara.

A informação ainda confundia a cabeça de Rachel, mesmo depois de horas do ocorrido. Ela não conseguia acreditar. Parecia um sonho muito bom dentro do apocalipse que acontecia do lado de fora. Ela não evitara os lábios carnudos de Quinn, ela não saíra pedindo desculpas, ela não negara que tinha gostado.

Ela também tinha beijado Quinn.

Mal dormira à noite. Rachel tinha todas as razões para finalmente deitar-se nos lençóis de tecidos chineses e dormir profundamente, mas continuou revirando na cama fofa até o sol nascer, pensando, pois não havia motivo mais óbvio para Quinn ter iniciado o beijo se não estivesse apaixonada por ela.

Rachel riu. Sabia dos sentimentos de Quinn em relação a ela, da admiração que a garota tinha para com ela, porém pensar que Quinn se apaixonara por ela era potencialmente estranho. Rachel Berry não era apaixonável, principalmente no meio daquele tanto de zumbis, já que não conhecia praticamente nada sobre eles ou como sobreviver sozinha.

— Rachel? — A voz distante de Puck a tirou de seus pensamentos de Quinn. — Tudo bem?

Ela acordou de seu devaneio, percebendo que estava com Beth no colo. A garotinha ria e apontava para seu colar de estrela como se fosse a coisa mais engraçada do mundo. Rachel observou-a com um olhar de admiração. Ela fez algumas caretas, dando a Beth mais um motivo para dar mais uma de suas gostosas gargalhadas. Seu olhar encontrou o de Puck e o garoto sorriu também.

Pelo pouco que ela observara nas horas que não estava trancada em seu quarto ou dando um amasso em Quinn (suas bochechas ainda coravam ao pensar nisso), Beth era uma menina tranqüila. Não deveria ser difícil para Puck tê-la trazido até ali, afinal para ela era apenas uma viagem de carro. Beth ainda não conhecia o mundo em que estava, nem o mundo durante pouco mais de um ano e meio de sua vida.

Ao pensar dessa forma, Rachel não resistiu e acabou lembrando-se dela própria. Não reconhecia as pessoas que estavam sentadas ali, a maioria crescera demais nos meses em que estivera desacordada. Ela também não conhecia muita coisa daquela nova realidade, zumbis e o resto ainda lhe causavam calafrios. Ela e Beth eram parecidas no fundo, Rachel na maioria das vezes se sentia como um bebê que precisava de cuidado e proteção o tempo todo.

— Rachel? — Puck tornou a chamar, agora insistindo para que ela devolvesse Beth aos seus braços. — Por favor.

— Ah — fez ela, sorrindo desconcertada e colocando a garotinha, ainda rindo, no colo dele. — Eu, ahm, vou lá fora.

Ela não tinha ideia por que falara aquilo, mas toda a mesa, cheia de conversas, parou para olhá-la. Sam assentiu com uma expressão confusa no rosto, e Rachel se arrependeu de no dia anterior ter sentido uma gota de ciúmes dele por causa de Quinn. Dava para ver nos olhos dos dois (e nos beijos que ele e Mercedes compartilhavam) que não era nada além de pura amizade.

Santana deu um sorrisinho malicioso direção de Rachel e a garota fez o que pôde para esconder o rubor que subia pelo seu rosto. Por sorte, Brittany deu uma cotovelada no braço da namorada, o que fez as duas iniciar uma discussão. Rachel aproveitou a piscadela que Brittany dera para ela e fugiu logo pela porta dos fundos.

Encontrou três walkers mortos.

Quinn andava pelo perímetro concentrada, o facão balançando na sua perna esquerda e a pistola em seu coldre na cintura. Ela assoviava uma música que Rachel sabia ser de uma banda de rock, somente não lembrava qual. Quando ela deu uma volta completa, notou Rachel ali e engasgou nas próximas notas que cantaria, parando para encará-la.

— Oi — disse Quinn com um sorriso bobo no rosto.

Rachel sorriu também e abaixou os olhos. Nunca imaginou que ficar cara a cara com a pessoa que havia lhe beijado na noite anterior pudesse ser tão assustador. Bom, não tão assustador quanto os zumbis sem cabeça aos seus pés.

— O que você tava fazendo? — indagou Rachel, respirando fundo e tomando coragem para ultrapassar o pequeno monte de carne morta para se aproximar um pouco de Quinn.

— Sam disse que só a cerca pode segurar os walkers, mas eu não concordo — respondeu Quinn com seriedade. — Quando cheguei aqui, esses aí estavam tentando abrir a porta. Eu não queria chamar atenção de ninguém, por isso usei o facão.

Ela apontou para a arma em sua perna, e Rachel notou o sangue ainda escorrendo, exprimindo uma careta de nojo.

Quinn riu.

— Incrível. Você precisa de treinamento urgente — falou ela.

— Talvez sim, talvez não — disse Rachel.

Ela deu um sorriso esnobe. Chegou perto de onde Quinn estava e fitou aqueles olhos verdes com intensidade. Ficaram se encarando por longos segundos até que Rachel finalmente quebrou o contato, virando-se para os fundos da mansão.

— A coisa mais próxima que tem desse quintal é a outra mansão, e ainda assim fica a mais de um quilômetro de distância — observou. — Não vai ser difícil vigiar, nós só precisamos montar guardas nos quartos vagos no terceiro andar.

Quinn assoviou impressionada. Rachel levantou a sobrancelha com um ar convencido.

— Viu? Eu não preciso de treino.

— Então me mostre como usar uma arma.

A frase de Quinn pegou Rachel de surpresa. Ela poderia sentir a seriedade no tom da garota por baixo da brincadeira. Quinn queria que ela fosse hábil para que pudesse se defender sozinha, porém Rachel não se via empunhando uma arma, ainda mais do calibre de Quinn.

— Não hoje — disse evasiva.

— Ah, hoje sim — retrucou Quinn, tirando sua pistola do coldre e oferecendo o cabo a Rachel. — É uma Browning Hi-Power, fácil de usar.

Rachel olhou da pistola para o rosto risonho de Quinn, apavorada. Jamais tocara numa arma de fogo antes, sequer gostava de jogar com seus pais os jogos de guerra no videogame. Ela engoliu em seco, tempos desesperados requeriam medidas desesperadas, certo?

Certo.

Por isso, sentindo as mãos tremerem de leve, ela pegou a pistola da mão de Quinn. A garota levantou o dedão positivamente, mas Rachel não sentia ainda nada de bom ao segurar o peso que era aquela arma. Não se sentia confortável com ela e pensou que talvez jamais sentisse. Talvez fosse mais fácil pegar uma das facas de prataria francesa da cozinha e lutar contra os errantes com ela, pensou irritada.

— Beleza — disse Quinn, arrumando as mãos de Rachel para que ficassem na posição certa. — Isso é fácil, Rach, ok? O que você tem que fazer é carregar, mirar e atirar.

— É mais fácil quando você faz isso — replicou Rachel emburrada. — Talvez eu deva voltar e cuidar de Beth enquanto os adultos resolvem tudo.

— Ei! — exclamou a garota, dando um soco no ombro de Rachel. — Eu já falei que você não é desperdício de espaço, então fique quieta. Sugar e Harmony sabem usar uma arma, Rory também. Você não vai ser a única aqui sem saber se proteger sozinha, entendeu? Se alguma coisa acontecer comigo e...

Quinn parou de falar, mas Rachel percebeu o final de sua frase: “se algo acontecer comigo e você não for capaz de se defender até o fim desse inferno...” e mais outra coisa que ela não conseguiu identificar. Rachel abaixou a arma por um segundo e levantou os olhos para Quinn, que agora estava distante, a dor que a expressão dela passava de novo lhe dando uma vontade desconhecida de socar quem a fazia senti-la daquela forma, até a verdade bater em sua cara e perceber que sempre era ela mesma que a deixava assim.

— Enfim — disse Quinn, sorrindo forçadamente. Ela levantou os braços de Rachel, apontando-os para o mato que crescia ao redor da mansão. — Isso é sempre importante: mantenha a guarda. Não fique nervosa, não surte. Ou senão vai virar comida de walker rapidinho.

— Por que está me dizendo isso agora? — indagou Rachel confusa, distraída com o perfume do corpo de Quinn tão perto do seu.

— Olha pra frente — sussurrou a outra em seu ouvido.

Rachel obedeceu.

Desejou ter continuado encarando os olhos da outra garota.

Um errante caminhava lerdamente em sua direção, a dez ou onze metros de distância. Não era um perigo eminente, mas à medida que ele identificava com seus olhos opacos a presença de dois humanos, seus passos apertavam.

Ele tropeçava repetidas vezes, o que era uma das dificuldades de Rachel. As mãos da garota não paravam de tremer, o nervosismo não deixando sua mira ficar perfeita. Suas mãos suavam terrivelmente. Ela olhou para Quinn, desesperada, porém a garota havia se afastado uns metros dela com um olhar convidativo na direção do zumbi, deixando-a sem escolha.

O walker se aproximava mais rápido. Oito, sete, seis metros. E ela continuava tentando apontar a pistola para o zumbi. O que Quinn tinha dito mesmo? Carregar, mirar, atirar. Cinco metros. Parecia fácil. Afinal, quantas vezes, nos três dias em que elas estavam juntas, ela vira Quinn fazer aquilo?

Carregar, mirar, atirar. Vamos, Rachel. Quatro metros. Era fácil. Carregar. Ela puxou o ferrolho da Hi-Power; estava pronta para atirar. Três metros. Mirar. Respirou fundo, tentando se concentrar. A cabeça do errante estava bem na sua frente. Isso era mira, certo? Agora, nos seus modos, era. Dois metros. Atirar. Fechou os olhos e apertou o gatilho com força.

Para Rachel, o estrondo teria acordado qualquer walker num raio de dez quilômetros. Abriu os olhos lentamente, encontrando a cabeça do errante caída a seus pés. Afastou-se prontamente, o fedor invadindo suas narinas. Quinn ria em comemoração, socando o ar. Ela respirou aliviada, sentindo seus pés saindo do chão quando Quinn a englobou num abraço de quebrar os ossos.

— Quinn, menos! — ela reclamou, mas estava feliz. Passara em pelo menos um desses testes malucos. Um ponto a mais se tivesse que sobreviver sozinha, ela pensou animada. — Foi só um tiro, credo.

Quinn não se importou com o falatório de Rachel, mas a colocou no chão, sem soltá-la. Seus braços englobavam a cintura de Rachel, que não conseguiu ar para formular uma frase; estava ocupada demais para isso enquanto trocava olhares com a garota.

Era uma comemoração boba, então por que Rachel sentia vontade de beijar Quinn? A história de sua conexão com ela entrou novamente na sua cabeça. Droga, ela estava tão perto, podia beijá-la mais uma vez, não podia? Não havia nada contra isso na constituição.

Rachel subiu nas pontas dos pés para poder alcançar os lábios de Quinn outra vez. E de novo, aquela sensação do primeiro beijo, de que as duas se pertenciam e se completavam, invadiu sua mente.

Bem, se fosse verdade ou não, Rachel adoraria passar o resto do apocalipse zumbi tentando descobrir.



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Notas finais do capítulo

O que vocês acharam? Correspondeu à suas expectativas? Ficou bom?
E só um extra, acho que um dos meus ships aqui nessa fic é Santana e Coca-Cola, não concordam? KKKKKK
Mandem seus reviews e até o próximo capítulo!