Agora vocês já devem saber mais ou menos porque eu o odeio tanto. Se não sabem... Ah, irão descobrir depois. Aquela tinha sido uma noite difícil pra mim. E aposto que para ele também, afinal... Middleford chorou enquanto dormia. Murmurando algo sobre: “Por favor, não levem o papai de mim.” Provavelmente um pesadelo. Eu não me importava. Ou achava que não me importava. Só vamos descobrir isso depois que eu descobrir porque saí correndo atrás de água para jogar na cara de Jullian para fazê-lo acordar. E foi isso que eu fiz. Tadinho, o mais velho abriu os olhos rapidamente e até abriu a boca para gritar, mas foi impedido. Por quem? Pelo super man! Mentira, foi só a minha mão mesmo.

— Shhh, não podem saber que estamos acordados. Aquele tal de Stephan, Marcos... Aeromoça macho, Guia, sei lá... É louco. — Quando me dei conta da cena, ela estava mais ou menos assim: Escuro, duas cadeiras sem aqueles braços lá para se apoiar, um garoto deitado enquanto o outro estava em cima dele com sua mão tapando a sua boca, como se não quisesse fazer barulho. Esse avião estava me deixando muito estranho. Porém, rapidamente saí de cima de Jullian. — Desculpe.

— T-Tudo bem... M-Mas... Por que me acordou, Romeo?

— Você estava... Chorando, sei lá. Murmurando algumas coisas do tipo: “Não levem ele de mim” e etc. E como esse seu choro atrapalhava meu sono, eu procurei te acordar. Sabe como é.

— Ah. Me desculpe, então... Hikaru.

— Por que isso agora?

— Isso o que?

— Eu te contei que odiava que me chamassem pelo sobrenome, mesmo morando no Japão.

— É que... Ah, me desculpe, eu esqueci. E você sabe, eu leio muitos mangás, me acostumo a chamar as pessoas assim.

— Tudo bem. Vamos dormir?

E antes que eu pudesse dizer alguma coisa, Jullian já desmaiava em cima de mim, ficando com a cabeça apoiada em meu ombro. Nem liguei, pois dormi logo em seguida.

Eu não sonhei nem nada. Nunca sonhava. Devia ser um produto com defeito de fábrica, porque eu te juro que nunca sonhei na minha vida toda. E não foi diferente nessa noite no avião. Demoraria mais ou menos uns 2 dias para chegarmos em Madri, nossa próxima parada. Porém, todo o dia teríamos alguma atividade ou jogo para fazer. Eu acho que a dessa manhã seria um simples jogo de verdade ou desafio. Mas eu não tinha certeza total. Não sem aquelas garotas gritando no meu ouvido.

— ACORDA, ACORDA, ACORDA! VAMOS JOGAR! — Disse uma delas, me balançando de um jeito animal. Quem elas achavam que eram para ficar me balançando daquele jeito?

Abri meus olhos e lancei para elas um olhar de ódio, porém elas continuavam sorrindo que nem duas idiotas. Quando perceberam que eu acordei, elas sorriram ainda mais, e então lançaram um olhar para Jullian.

— Agora só falta acordar o ruivo lindo!

— Vamos acorda-lo com um beijo! — Então, eu sei explicar muito bem porque eu fiz aquilo. Não sei mesmo. Foi uma coisa automática, sabe?

Empurrei as duas com o maior sorriso no rosto, fazendo-as cair do outro lado do avião.

— Ah, queridas! Desculpe! Deixem que eu acordo ele, ok? Podem ir descendo lá para baixo, haha! — Elas me obedeceram, mas foram embora de perto de nós reclamando e murmurando coisas do tipo: “Quem ele pensa que é para nos empurrar?” ou “ Não beijamos o ruivo lindo...” entre outras coisas que eu me recusei a ouvir. Eram nojentas... Encarei Jullian por um momento. Ele dormia encostado na janela do avião, abraçado com suas próprias pernas e babava. Um sorriso ocupava seu rosto pálido e cheio de algumas sardinhas nas bochechas. Tinha que acorda-lo, se não mais daquelas vadias chegavam perto dele. Do meu Jullian.

Espera... O que?! Só conheço o cara faz uns dias, estou muito estranho. Tenho que parar com isso, meu deus. Me aproximei do mesmo, o cutucando.

— Ju...

E nenhuma resposta. Daqui a pouco teria de usar a água de novo. Mas... Fiquei com vontade de experimentar outra coisa: Cheguei o mais perto que podia, e com uma mão em seu rosto, eu fui em direção a orelha de Jullian, dando uma mordida na mesma. E então sussurrei em seu ouvido:

— Ju... Acorde...

E ele acordou com um pulo. Um pulo mesmo, me jogou para trás e tudo. Magrelo forte pra caralho. Ele estava corado e me olhando com aqueles olhos enormes, azuis e super arregalados. Eu sorri, era muito legal acorda-lo dessa forma. Faria isso mais vezes.

— Estão nos chamando lá em baixo.

— A-Ah, é? Que horas são? — E então, eu fui para cima dele de novo, com as minhas pernas entre as dele e encostei minha cabeça em seu ombro.

E aí eu abri a janela no avião.

— Parece que está... De noite. Hm, vamos.

O puxei pelo braço para fora da nossa fileira de cadeiras, e descemos as escadas. O andar de baixo não era nada demais, era praticamente igual ao nosso, só que dessa vez tinha um concentrado de adolescentes sentados em uma roda, todos rindo e se divertindo. Ah, já contei das bebidas? E quando tem bebidas, quer dizer que eles querem Hikaru Romeo ali.

Cheguei puxando Jullian e me sentando no meio de duas garotas: Uma loira e a outra parecia ser chinesa, sei lá. Devia ser americana também, enfim. Jullian ficou do meu lado, mas ainda estava meio que em choque por causa daquela nossa ultima cena. Eu ri sozinho e tentei me enturmar, porém quando eu ia falar alguma coisa, percebi que todos olhavam para mim. E então o Guia/Stephan/Marco/Aeromoça macho me encarou e disse sem animação:

— Então, como vocês viram, depois que chegamos em Tóquio, temos mais três coleguinhas. Estes são aqueles três ali. O cara com nome de história de romance, a garota do óculos quadrado e aquela de cabelo azul. Japoneses, tinha que ser. Agora se apresentem. Primeiro você, Romeu.

— É Romeo. Com “o” e se pronuncia “Rômê-ô”. Então, eu sou o Hikaru Romeo.

E então, a garota de óculos se levantou toda animada e disse:

— Eu sou Akira Konichi!

E então, a de cabelo azul se levantou e se pendurou em Akira.

— E eu sou Misao Konichi!

Elas riram e sentaram. GENTE MAIS ESTRANHA QUE EU, AW YEAAAAAAAH. E então, eu senti que todos os olhares estavam pra cima de mim. E tentei visualizar a cena novamente, para ver se tinha alguma coisa errada. E não era nada. Só uma coisinha: Jullian estava deitado no meu ombro e estava... Tendo um ataque epilético? Que porra era aquela? E então, só entedi quando ele começou a gritar.

— TEM UM RATO AQUI, AAAAAAAAAAAAAAAA QUE ISSO, SOCORRO SEUS MERDAS COMO VOCÊS PENSAM QUE EU VOU FICAR EU SOU ALÉRGICO A RATOS EU VOU MORRER SOCORRO ROMEOOO.

Ele falava sem vírgulas mesmo, sem pontos nem nada. E falava mais, porém ninguém entendia. Iríamos caçar um rato esta noite.