Safe And Sound escrita por Kyra_Spring


Capítulo 2
Capítulo 2: Iron Man


Notas iniciais do capítulo

N/A: bem, esse capítulo vai explicar menos ainda que o anterior, haha. Mas é necessário para apresentar todas as peças do jogo. No capítulo 3, sem falta, as coisas vão começar a se encaixar. Espero que gostem, beijos a todos e até mais!



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- Onde diabos você esteve por todo esse tempo, Bonnefoy? Por que não tentou entrar em contato? Tem idéia do que passamos por sua causa aqui?

- Arthur, pega leve com ele. Se fosse fácil assim entrar em contato, não passaríamos tanto tempo sem notícias das outras bases.

- Mas ele devia ter dito pelo menos alguma coisa quando saiu daqui!

- Sobrancelhas, quer parar de reclamar por um segundo e me ouvir? Essa temporada fora daqui foi bem produtiva. Passei por algumas outras áreas, alguns focos de rebelião estão ganhando muita força por aí.

- Mas mesmo assim. Você não sabe usar a droga do rádio?

- E entregar a posição de vocês? Tem razão, isso é muito sábio.

- Não é lindo? Eles mal voltam a se ver e já começam a brigar como um casal de velhos.

- Ah, cale-se, Emily.

- É, Emily, cuide da sua vida.

            Eles voltaram a dirigir por mais alguns minutos, até por fim pararem num desvio. Sophie mantinha-se firme em sua decisão de não pensar absolutamente nada até que eles parassem e ela pudesse, por fim, fazer todas as perguntas possíveis.

            E elas só aumentavam a cada segundo.

            Ela estava num carro com três pessoas, além de Francis. Uma mulher, aparentemente mais jovem que ela, um homem muito grande e um outro de sobrancelhas espessas com quem Francis discutia. Ela forçou a si mesma a ignorar a palavra “rebelião”. Foi nessa hora que o carro parou em frente ao portão.

- Agora, senhorita... qual é o seu nome mesmo, mocinha? – disse o homem de sobrancelhas grossas.

- Sophie – ela respondeu rápido – Sophie Zimmermann.

- Então... Sophie – ele disse – Já que o Francis foi estúpido o bastante para trazê-la para cá, precisamos debater uma pequena questão.

- Q-questão? – ela começou a entrar em pânico. Quem eram aquelas pessoas com quem ela havia se envolvido? – Eu não vou dizer nada a ninguém, eu juro!

- É, é exatamente com isso que estamos contando. Mas não podemos correr riscos – o outro homem replicou – A Omni possui formas muito eficientes de obter informações, a menos que sua história seja muito convincente. E é exatamente isso que vamos providenciar.

- Como... como assim?

- A partir de agora você é nossa refém, srta. Zimmermann – o sorriso com o qual Francis disse aquelas palavras era de alguma forma perturbador. Não mais perturbador do que as palavras dele, obviamente – É claro, não iremos feri-la, e a libertaremos em breve. Mas será bem mais fácil para você alegar que foi sequestrada, não concorda?

- Mas... mas... – era como se a mente dela tivesse entrado em curto – Eu não entendo...

- É o seguinte, mocinha – explicou o homem mais alto – Se a liberarmos agora, os agentes da Omni virão atrás de você. Eles lhe farão perguntas, e acredito que a senhorita saiba que os métodos de obtenção de informação deles não são exatamente amistosos. Por isso, não a deixaremos saber mais do que o necessário. Se a transformarmos numa vítima, eles não a verão como suspeita.

- N-não... – o pânico começou a tomar conta dela – Eu não direi nada, juro!

- Acredite, eles sabem fazer uma pessoa falar – o tom de Emily era sério demais – Não iremos feri-la, e em poucos dias deixaremos você ir.

            Ela ficou em silêncio, sem saber o que a assustava mais. Mas, quando uma venda foi colocada em seus olhos, todos os seus sensos de auto-defesa a forçaram a tomar uma atitude, e ela começou a gritar.

- Droga, Bonnefoy, por que diabos você a trouxe? – a voz de Arthur estava visivelmente irritada.

- E eu ia deixar a pobre moça no meio da confusão que vocês arrumaram? – Francis, por outro lado, soava completamente despreocupado – Vocês precisam aprender a ser sutis.

- Sutileza estava completamente fora de questão, Francis – Emily respondeu com uma risada alta – Precisávamos de barulho para enganar aqueles imbecis, e foi o que conseguimos.

- Vai chegar o momento em que essas táticas não vão funcionar... – ele observou – Precisamos de uma nova estratégia, não podemos manter essa guerrilha por muito tempo.

- Não devíamos falar dessas coisas perto da nossa convidada – Ivan disse, num tom amável.

            Mas Sophie nem sequer conseguia mais acompanhar a conversa deles. O que era aquilo? Eles eram algum tipo de grupo terrorista? Aquilo era possível, ela vivia ouvindo falar sobre um grande grupo terrorista que ameaçava a segurança de todas as Áreas. E como diabos ela foi parar entre eles? Aquele era apenas mais um dia normal, certo? Um dia normal em que ela passava no hospital para visitar sua irmã e perdia a noção do tempo e tinha que correr até o trabalho e... e...

            ...e então aquelas pessoas estranhas apareceram.

            Havia algo nelas que ela não conseguia explicar. Uma... aura, talvez? Mas era diferente de qualquer outra pessoa que ela já havia encontrado, e isso só tornava toda aquela situação ainda mais absurda. Por fim, ela decidiu parar de resistir, e cooperar ao máximo. Se eles estivessem falando a verdade, ela seria libertada em breve, sem ferimentos. Se não...

            Se não... bem, aquela era uma possibilidade que ela não queria considerar.

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            Naquela noite, Gilbert decidiu visitar um bar próximo à sede depois do expediente. Ele estava exausto. As últimas semanas estavam sendo terrivelmente desgastantes, e ele só queria, por algumas horas, esquecer tudo o que havia acontecido. Especialmente naquele dia. Quando eles aprenderiam? Ele não queria ver o nome de nenhum deles em um obituário por aquelas missões insanas.

            O bar era pequeno, mas aconchegante e charmoso. Ele havia sido aberto há poucas semanas, e lembrava um pouco seus bares favoritos, que ele visitara anos atrás, antes de tudo mudar. Por um momento, ele se perguntou se eles ainda existiam, para no segundo seguinte sacudir a cabeça e sorrir com sarcasmo para si mesmo. Aquela era uma idéia tola e sem sentido.

- Uma cerveja, por favor – ele pediu à mulher no balcão – Quanto mais gelada, melhor. Se você p... – mas, quando ela se virou, a frase morreu, dando lugar à um choque mudo. Quando finalmente conseguiu voltar a falar, balbuciou, incrédulo – Lizzie?!

- Ora, vejam só quem está aqui – ela abriu um sorriso malicioso – Gilbert Beilschmidt. Ou deveria dizer Pr...

- Shh. Não aqui – ele a cortou – Mas o que diabos você está fazendo aqui?

- O mesmo que você, tentando me adaptar aos novos tempos – ela deu de ombros, enquanto abria uma garrafa de cerveja e colocava no balcão na frente dele – Você e seus amiguinhos da Omni são mesmo um pé no saco, eles não dão mais paz aos Neutros! Tive que me mudar para cá para tentar viver com um pouco de sossego, porque eles parecem convencidos que eu sou algum tipo de informante.

            Ele a encarou. De todas as pessoas, por que justamente ela? Elizaveta Herdeváry era provavelmente uma das mulheres mais marcantes da vida dele. Ela estava diferente, sem dúvida – os cabelos castanhos e ondulados agora estavam bem mais curtos, e ao invés da flor que ela costumava usar, agora havia uma pequena presilha. Mas o olhar era o mesmo, sem dúvida.

- Não me culpe, eu só preencho formulários – ele deu de ombros – Mas, tirando isso, como você está? E por que você resolveu vir justamente para o centro do caos?

- Eu estou bem. Tão bem quanto possível, pelo menos. Depois de passar muito tempo tentando entrar em contato com os outros, decidi sossegar e abrir um bar. É um bom trabalho. Paga as minhas contas e me dá a chance de espancar alguns bêbados abusados se eu estiver de mau humor.

- Você ainda usa a frigideira? – ele sorriu, e ela deu uma risada.

- Às vezes. Mas, quando não dá tempo, eu uso uma garrafa vazia de vodca mesmo – o tom dela o fez engolir em seco – De qualquer forma, descobri o paradeiro de alguns outros Neutros por acidente. Vash e Lilli estão morando na Área 80, ele está trabalhando numa loja de eletrônicos e ela abriu uma lojinha de doces. Meg estava na Área 31 há até algumas semanas atrás, mas não sei onde ela está agora. Não tive notícias muito consistentes a respeito do Yao, mas ele provavelmente deve estar bem também. Ouvi alguém dizer que ele está por aqui trabalhando num antiquário.

- Entendo... – Gilbert tomou um gole da cerveja antes de continuar.

- E você? O que anda fazendo? – ela o encarou – Vários dos nossos estão trabalhando com você, não estão?

- Sim, sim. Alice e Sakura ainda estão na mesma divisão em que começamos. Roderich foi transferido há alguns meses.

- Espere, Roderich está aqui? – ela arregalou os olhos – Como assim? Eu achei que ele nunca iria sair da Área 29!

- Isso também me pegou de surpresa, Liz. De qualquer forma, se você quiser falar com ele eu posso pedir que ele venha aqui.

            Ela pensou por um instante, antes de responder, com um ar desolado:

- Não... melhor não. Não sei se quero falar com ele.

- Bem... de qualquer forma ele está bem. Pedante e insuportável como sempre, é verdade, mas ainda assim bem. – Gilbert entendeu o motivo da reação dela, e decidiu que o melhor era não fazer perguntas – Bem... é bem possível que você não acredite em mim, mas fico feliz em ver que você está bem.

- Gil – ela o encarou de novo – Eu vi o que aconteceu hoje. E eu sei quem estava lá. Todos nós sabemos. Entenda, vai chegar uma hora em que você vai ter que escolher um lado, e não acho que você realmente queira estar contra todos os outros.

- Falou a primeira pessoa que assinou a lista de Neutros.

- Não seja idiota, isso não quer dizer que eu esteja do lado da Omni – ela estreitou os olhos – A minha prioridade é sobreviver até o momento em que possamos virar o jogo. Acha mesmo que eu não preferia estar num daqueles carros hoje?

- Você tem plena consciência de que eu posso reportar tudo isso aos meus superiores e isso a levaria a uma acusação de traição, certo?

- É claro que sei.

- Então...?

- Eu ainda não sei o que diabos está se passando na sua cabeça, Gilbert, mas não quero acreditar que você realmente está contra nós.

            Eles se encararam, um silêncio tenso entre eles. Droga. Aquela era a segunda vez naquele dia em que ele era obrigado a ouvir exatamente a mesma coisa... As duas tinham um ponto, é verdade, mas... elas não entenderiam.

- Bem, acho que eu preciso ir agora – ele terminou a cerveja e se levantou, deixando uma nota sobre o balcão – Amanhã preciso acordar cedo, ou meu chefe vai me encher outra vez. Foi ótimo te ver, Liz, fico feliz que você esteja bem.

- Gil...

- Por favor, não – ele evitou encará-la – Não faça perguntas. Eu sei o que estou fazendo.

            Seguiu-se um momento de silêncio, quebrado pela própria Elizaveta.

- Apareça por aqui mais vezes, então – ela abriu um sorriso triste – Ainda sei a sua marca favorita de cerveja, posso fazer um desconto pra você.

            Ele parou por um instante. E sorriu, ainda evitando cuidadosamente os olhos dela:

- Como eu poderia recusar um convite tão gentil, não é? Cuide-se bem, Liz. Auf wiedersehen.

            E saiu, sem olhar para trás, engolindo em seco e tentando se decidir se aquele encontro era a melhor ou a pior coisa que poderia ter acontecido naquele dia.

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            Longe dali, muito longe, um homem corria nas sombras das ruas.

            Suas ações já haviam se tornado uma lenda. E quase ninguém nem sequer sonhava com a sua verdadeira identidade. Tudo o que sabiam é que aquela pessoa, quem quer que fosse, representava a própria morte, e a trilha de assassinatos que ele deixava atrás de si crescia a cada semana.

            O mundo o chamava de terrorista. Ele via a si mesmo como um revolucionário.

            Desta vez, ele havia chegado perigosamente perto de ser pego. A vítima mais recente era um importante líder regional da organização conhecida como Omni. Desde sua última missão – um banho de sangue, como foi chamada pela imprensa, em que ele explodiu um prédio de escritórios pertencente à mesma organização – a vigilância havia aumentado muito. De qualquer forma, não importava. Um tiro pela janela foi o suficiente.

            Porém, aquilo acabou chamando a atenção dos guardas. Uma falha, sem dúvida, ele precisava de métodos mais silenciosos. E, agora, ele usava todas as suas habilidades para fugir. Captura ou rendição não eram opções consideráveis. Ele ainda tinha uma missão a cumprir e uma longa lista de pessoas que deviam ser eliminadas.

            Acabou se dirigindo, não completamente por acaso, ao subúrbio da cidade. A capital da Área 85 era um excelente lugar para se esconder, em especial as áreas mais isoladas da cidade. As ruas estavam desertas, e alguém andando por ali no meio da noite com certeza despertaria suspeitas, então ele tentava se esconder nos becos e ruas mais escuras. Por fim, acabou chegando a um velho prédio de apartamentos.

            Engoliu em seco. Ele conhecia aquele lugar.

            A princípio, pensou em se afastar, mas algo o prendeu ali. Não fazia muito tempo desde a última vez que estivera lá, mas tanta coisa havia mudado desde então... Não tinha certeza se entrar lá era a coisa certa a se fazer. Mas não podia correr mais. Estava exausto, e precisava de um esconderijo seguro o quanto antes.

            Por fim, decidiu subir pela escada de incêndio e entrar pela janela. Elas nunca eram trancadas, então seria fácil.

            No momento em que colocou os pés na sala, porém, ouviu o som de uma arma sendo engatilhada. E uma voz sem emoção, terrivelmente familiar, dizendo:

- Kiku. Já faz um bom tempo, não? Agora, se não quiser que eu atire no meio da sua cara, sugiro que saia da minha casa agora mesmo.

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            Depois do que pareceu uma eternidade, o carro em que Sophie estava parou. Ela pôde ouvir o som seco de um portão enferrujado se abrindo, e um crescente de vozes à medida que se aproximavam. Quando pararam, Francis retirou a venda dos olhos dela, dizendo numa voz suave:

- Sinto muito por tudo isso, Sophie. Acredite em mim, isso é para a sua própria proteção.

            Ela o encarou com olhos baços e sem emoção. Quem poderia dizer que aquele homem tão bonito e gentil era um criminoso?

            Quando desceu do carro, porém, percebeu que era algo muito maior do que esperava.

            À primeira vista, aquele lugar parecia uma grande empresa. Muitas pessoas andavam apressadas de um lado para o outro, carregando caixas, falando em rádios, lendo relatórios. O antigo túnel do metrô havia sido, de alguma forma, transformado numa grande galeria, com vários pequenos cômodos construídos no que um dia foram as plataformas. Os trilhos haviam sido pavimentados, e havia vários carros parados por ali. Aquilo a impressionou muito. Como uma estrutura daquelas foi construída sem que ninguém soubesse?

- Ah, não há lugar como o lar! – Emily disse, em voz alta, sorrindo – Rapazes, acham que devemos convocar uma reunião agora? A missão foi muito produtiva.

- Nah, ainda não – respondeu Arthur – Não é nada urgente, podemos deixar para a reunião geral de amanhã. Além do mais... – lançou um longo olhar a Sophie, que recuou instintivamente – temos que pensar no que vamos fazer com ela.

            Aquilo a fez estremecer. Claro, eles não podiam simplesmente deixá-la ir embora como se nada tivesse acontecido. Ela era uma refém, e provavelmente seria usada para algum tipo de negociação. Talvez, eles tentariam trocá-la por algum outro preso importante. Ou ameaçá-la para forçar alguém a lhes dar dinheiro. Isso se tivesse sorte, e eles pretendessem deixá-la viva no fim de tudo aquilo. Se não fosse esse o caso, porém...

- Bem, isso é com a Meg, ela sabe o que fazer – Emily deu de ombros – Hey... Sophie, não é? Você tem algum parente ou amigo para entrarmos em contato?

- Ahn...? – a mente dela ainda não funcionava bem o bastante para que ela desse uma resposta coerente. Algum parente...? Ah, então eles realmente a estavam seqüestrando e agora pediriam um resgate. Menos mal, ela ainda tinha uma chance. Mas... – Eu... bem... mas eles não podem pagar...

- Pobrezinha, a moça ainda está em choque – Francis meneou a cabeça – Vamos dar a ela algum tempo para se recuperar. Emily, pode chamar a Meg, por favor?

            Emily assentiu com a cabeça e saiu correndo para uma das cabines, voltando logo depois com uma outra mulher, um pouco mais alta, com longos cabelos louros presos numa trança e uma mecha proeminente na testa. Ela era muito parecida com a primeira, exceto pelos intensos olhos cor de violeta.

- Vocês tem que traumatizar pelo menos uma pessoa por missão, não é? – foi a primeira coisa que ela disse, num tom de censura – Pobre criança... venha comigo, tem um lugar para você descansar aqui. Eu sou Marguerite Williams, mas você pode me chamar de Meg. Qual o seu nome?

- S-sophie Zim-mermann – ela respondeu, em voz baixa. De alguma forma, Meg lhe transmitia uma estranha sensação de segurança. E, mesmo que ela parecesse até mais jovem que os outros, sua voz soava madura e sábia. Naquele momento, ela percebeu realmente o quão exausta estava, e sem oferecer resistência deixou-se conduzir a uma das cabines próximas, onde havia algumas camas. E, em questão de minutos, deixou-se cair num sono profundo e sem sonhos.

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            Aquele seria o primeiro dia de trabalho de Louise naquela Área. E ela não estava preparada para aquilo de maneira alguma.

            De certa forma, aquilo era uma volta para casa. Fazia eras que ela não andava por aquelas ruas, e isso, por si só, era incrível. Mas tudo parecia diferente, errado e fora do lugar. Aquela não era mais a sua terra natal. Não, agora aquela era a Área 18, uma das mais poderosas daquele continente.

            E não cabia a ela questionar aquele fato. Ainda.

- Srta. Beilschmidt? A senhorita está bem? – uma voz vinda do banco ao seu lado a despertou do seu torpor. Ela sacudiu a cabeça e abriu um sorriso discreto, respondendo:

- Estou sim, Anne. Só estou um pouco cansada, ontem fiquei preenchendo formulários até tarde.

- Louise é sempre muito eficiente – outra voz, muito mais imponente, veio do banco de trás e fez com que ela engolisse em seco – Você deveria tirar férias, Srta. Beilschmidt. Acho que posso dispensá-la por uma semana.

- Não será necessário, Srta. Hughes. – ela respondeu, polidamente – Só preciso de uma boa noite de sono.

            Tudo aquilo era mentira e falsidade, obviamente. Mas ela sabia que não podia compartilhar suas reais preocupações com elas. Louise manteve-se em silêncio, apenas observando as ruas pelo vidro do carro, até pararem em frente a um enorme e moderno prédio. Ela foi a primeira a descer do carro, olhando ao redor com olhos atentos. Quando ela teve certeza de que estava tudo bem, sinalizou para que Anne descesse. E, logo depois, a outra ocupante do carro também desembarcou.

            Aquela, Rosemary Hughes, era simplesmente a mulher mais poderosa do mundo. E a Louise cabia organizar e liderar o pequeno exército pessoal de guarda-costas dela.

            Quem visse Rosemary, a princípio, poderia não imaginar que aquela mulher tinha literalmente o mundo nas mãos. Baixinha, rechonchuda, cabelos muito negros cortados na altura do pescoço e escovados para fora, lábios cobertos com um batom vermelho muito intenso e um vestido florido que ia até os joelhos, ela parecia-se mais com uma apresentadora de programas de culinária ou uma protagonista de uma série antiga. Mas aquelas feições gentis escondiam um gênio implacável e uma personalidade fria. Era não era a líder da Omni à toa, disso não havia dúvida.

            Louise, por outro lado, era o oposto de Rosemary em todos os aspectos. Alta e de compleição atlética, tinha cabelos louros bem curtos e grandes olhos de um tom pálido de azul. A expressão séria e austera, porém, escondia uma personalidade sensível e delicada, e era uma forma de disfarçar sua timidez e ocultar seus temores.

            E, naquele tempo, eles eram muitos.

- Louise, Anne, eu gostaria que vocês me deixassem sozinha por hora. Se necessário, ligarei para vocês, mas peço que fiquem na sede. Tudo bem?

- Sim, senhora – assentiu a primeira – Estarei na sala de treinamento.

- Louise, você leva as coisas a sério demais – Rosemary sorriu – É por isso que eu não confiaria minha segurança a ninguém mais. Até mais tarde, senhoritas!

            Elas observaram enquanto Rosemary entrava no prédio, e então Anne suspirou. Ela era uma das novatas da guarda pessoal dela, e ainda não havia se acostumado ao trabalho ou à pesada carga de treinamentos que Louise impunha. Com uma expressão de preocupação, ela perguntou:

- Sala de treinamento? Quer dizer que eu também...

- Não, não – Louise sorriu – Não desta vez, eu vou treinar sozinha. A menos que você queira me acompanhar, claro...

- Ah, não, obrigada! – a outra recusou tão rápido quanto possível – Eu tenho algumas coisas para fazer. Até mais!

            Ela observou a outra sumir correndo e deu uma risadinha triste. Ela conhecia duas pessoas que também agiam daquela forma, fugindo do treinamento sempre que possível. Onde elas estariam agora...? Aqueles pensamentos a acompanharam até a sala de treinamento, enquanto trocava o austero terninho negro pelas roupas de ginástica.

            E, então, seu corpo passou a trabalhar por conta própria. Seus punhos, velozes e implacáveis, golpeavam os sacos de areia com fúria. Quem a visse treinando na hora entenderia porque ela era a chefe da guarda pessoal de Rosemary. Não havia outra pessoa mais qualificada ou disciplinada que ela para assumir aquela função.

            E, mesmo assim, aquela era uma traição inominável.

            Treinar era a forma que ela encontrava para não pensar no caos em que a sua vida havia se transformado. Ela ainda esperava por um milagre, um milagre que não aconteceria tão cedo.

            Perdida naqueles pensamentos, quase não percebeu o celular tocando. Praguejou baixo, não gostava quando o seu treinamento era interrompido. O número no visor, porém, a fez gelar. Entre todas as pessoas... logo ele? Era o único de quem quase nunca tinha notícias, alguém que poderia destruir a sua vida se entrasse em contato com ela.

            Mas ainda assim... uma sensação estranha de alegria e alívio tomou conta dela, e foi numa voz trêmula que atendeu o telefone, dizendo:

- L-ludwig? Por que... agora?


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