Signal Fire escrita por Fernanda Redfield


Capítulo 34
O perdão e a música I


Notas iniciais do capítulo

Boa noite, como estão?

Espero que estejam bem e que não existam tantas ameaças de morte a minha pessoa em vigor pela demora do capítulo... Bem, não existem desculpas que justifiquem, mas, ainda assim, peço perdão.

Como mencionei nas notas anteriores, estamos na reta final. As pontas soltas estão conectando-se e eu espero que vocês se sintam bem em relação aos finais... Como podem ver pelo título, esse é um capítulo dividido em dois que fala, sobretudo, de perdão.

Bem, indico "Young Love" do Kip Moore e "Better Man" da Little Big Town para vocês escutarem com esse capítulo.

Espero que gostem, nos vemos lá embaixo! Boa leitura!



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E, como se a confusão em uma fizesse reflexo na outra, Quinn dirigia a esmo por Lima. As suas mãos tremiam agarradas ao volante e a loira surpreendeu-se quando percebeu que estava em frente ao prédio de Santana. O tremor não cessou nem mesmo quando ela abandonou o volante e apanhou o celular para ligar para a latina.

Enquanto a linha chamava, Quinn continuava presa na melodia em que encontrara Rachel. A sua concentração tentava se prender ao som freqüente do toque do telefone a chamar, contudo, ela se perdia constantemente nos sons da voz e do piano de Rachel que ecoavam em seus ouvidos. Esses sons, por sua vez, formavam sintonias repletas de arrependimento, cujos tons altos pediam perdão e os baixos suplicavam por uma segunda chance. Os agudos distorciam-se em choro e os graves em soluços... E todos esses componentes formavam uma sinfonia melancólica, orquestrada habilmente pelo coração machucado de Quinn.

Na platéia vazia, Quinn não aplaudia e as lágrimas que derramava não eram feitas de emoções ou do nirvana auditivo, essa orquestra tocava no fundo de si, no seu coração e esse toque ardia em brasa. Ao menos tempo que queimava, mostrava que estava viva e, na mesma proporção, mostrava que uma parte dela ainda ardia indomável. Um fogo que pertencia somente a Rachel.

Quinn não chegou a deixar esse fogo consumi-la, ela fechou e apertou as pálpebras como se, ao fechar os olhos, pudesse ignorar tudo que sentia e tudo que acontecera. Assim como o fogo se alastrava, o sentimento percorreu todo o corpo de Quinn e, debilitada, ela se viu perguntar se estava sendo destruída ou se renascia daquele fogo.

O toque na linha continuava distante e foi um bater de nós de dedos no vidro da janela do carro que despertou Quinn de todo a avalanche emocional que já fizera casa em seu peito. Os olhos verdes viram o homem sorridente parado ao lado de seu carro, mas, não pareciam enxergá-lo - estavam cansados, afoitos e distraídos - no automático, Quinn abaixou o vidro e sorriu desconfortável ao senhor. Ele retribuiu e disse gentilmente:

— Boa noite! A Srta. Lopez autorizou a sua entrada, ela a viu chegar da sacada da cobertura.

— Ah sim, obrigada. Eu só vou trancar o carro e já subo. - Quinn respondeu educada ao senhor e ele rapidamente voltou a sua guarita na portaria do prédio. A loira chacoalhou a cabeça enquanto apanhava a sua bolsa e desligava o carro, as suas mãos não mais tremiam, mas, os seus olhos estavam brilhantes o bastante para ela saber o que viria a seguir se não tivesse sido interrompida.

As lágrimas eram as suas mais fiéis companhias nos últimos dias e não era agora que elas a abandonariam... Nem mesmo se quisesse.

Quinn saiu do carro e o trancou, todo o trajeto até o elevador foi feito sem que ela visse muito do que a cercava - estava devidamente presa em seus pensamentos e torturada pelos seus sentimentos, tudo palpável parecia distante do limbo emocional em que se encontrava - porém, assim que entrou no elevador, optou por, ao menos, mascarar a intensidade de seu estrago.

Nos espelhos do elevador, Quinn se via refletida e o reflexo era a maior evidência do que estava acontecendo em sua vida. O seu interior já se vazia visível em seu exterior, a sua aparência cansada não era conseqüência das aulas dadas naquele dia e a palidez do seu rosto não evidenciava um mal estar físico. Tudo nela ecoava e, ironicamente, pedia por Rachel.

Um pouco da morena em seus dias e já estava daquela forma, totalmente entregue a algo que deveria abandonar.

Os andares passavam, os números mudavam e Quinn respirava profundamente em cada um deles. Silenciosa, ela tentava acalmar o seu coração e respirar normalmente para que pudesse pensar calmamente. As suas tentativas só produziram efeito quando ela estava próxima, três andares, da cobertura. E esses três andares passaram em segundos, um apito e as portas se abriram. Quinn deu mais uma olhada insegura nos espelhos e saiu do elevador, as portas se fecharam atrás de si e as suas pernas bambearam em direção à porta.

Da última vez que estivera ali, ela quase baniu Santana da sua vida e, também, ela resolveu dar adeus a Rachel, ou, pelo menos, tentar.

Nenhuma das duas coisas aconteceu. A primeira porque Santana ficou independente do que queria e a segunda por algo que ela não sabia, sobrava vontade dentro de si para esquecer Rachel, contudo, quando deveria fazer algo, o seu corpo se recusava e preferia esperar.

Quinn sentia-se à deriva, sem nada em que flutuar, lutando contra correntezas cada vez mais intensas e decididas a arrastá-la para o fundo. E o medo maior era o desconhecido, ela não sabia o que encontraria no fundo, ela não saberia se seria salva ou se afogaria.

Mais uma vez, a realidade teve que se fazer mais alta do que o volume dos pensamentos conturbados de Quinn. Foi o barulho da pesada porta de madeira a se abrir que trouxa a professora de volta para o tempo presente, em frente a ela, Santana Lopez estava de cabelos molhados e confortáveis trajes caseiros.

Quinn não pode deixar de sorrir para a sua melhor amiga, nunca a vira tão relaxada e tão sorridente. Na verdade, vira alguns lampejos disso quando ela estava com Brittany, mas, agora... Parecia que estava redescobrindo Santana Lopez. A latina até franziu a testa para o que viu - Quinn debilitada e cambaleante - mas, o sorriso não saiu dos seus lábios quando ela cumprimentou:

— Achei que não fosse mais sair daquele carro, cara pálida.

— Não foi tanto tempo assim. - Quinn resmungou incomodada, estava constrangida e envergonhada, sobretudo, fragilizada. E cada emoção que sentia estava refletida em seus olhos e mesmo se não estivessem, Santana era boa demais em decifrá-la. Era exatamente disso que a latina fazia, ela olhava por cima do ombro de Quinn, para o corredor, à procura de alguém e, quando não a encontrou, sibilou insatisfeita:

— Foram dez minutos contados no meu relógio, sabe-se lá quanto tempo fazia que você estava lá antes de eu chegar à sacada.

— Eu mal cheguei e já está me fazendo escutar bobagens, eu sequer entrei no seu apartamento, Lopez. - Quinn resmungou irritada, os olhos verdes assumiram um brilhante aspecto defensivo e Santana suspirou levemente aliviada, por ver que a sua amiga não voltara para o torpor do qual lembrava tê-la tirado. Por isso, Santana abriu os braços, oferecendo um abraço que negara na última vez que se viram.

Mais do que machucada e confusa, Quinn sentia-se solitária e foi justamente a solidão que a fez ir em direção à melhor amiga. Um primeiro passo inseguro, seguido por um segundo ansioso e um terceiro desesperado. Três passos e, ela foi envolta pelos braços fortes de Santana, a latina a apertou, inconscientemente, Santana queria passar, no abraço, toda a felicidade que fizera casa em sua própria vida.

Quinn não deveria estar sozinha, ela não vivera para não ter alguém. Santana conhecia a amiga como ninguém para saber que ela não levava jeito para a solidão, ainda mais, depois de ser abandonada pelos pais e por toda a família. Naquele abraço, Santana não conseguiu passar a felicidade, mas, a melancolia e a tristeza eram tão agressivas dentro de Quinn que foi como se elas pudessem atravessar a pele da professora. A latina as sentiu em sua própria pele.

E não foi o fogo e sim, o gelo, que preocupou Santana.

Se Quinn queimava com as lembranças de Rachel e o sentimento que dividia com aquela morena, ela congelava quando não os tinha.

A latina se afastou devagar, finos filetes de lágrimas escorreram pelas bochechas de Quinn, mas, Santana não disse nada. Fez-se forte pela amiga, deu-lhe um beijo na testa e, ainda abraçada a ela, entrou no apartamento. Dentro do amplo espaço, decorado de forma elegante, Quinn se deixou levar até se sentar em uma poltrona.

A professora olhou ao seu redor, estar novamente no apartamento de Santana trouxe lembranças de uma virada de ano que prometeu o novo. Um ano que falhou miseravelmente e trouxe amarguras passadas, defeitos inesquecíveis e um coração quebrado. Naquela noite, Quinn bebeu vinho e hoje, sentia a garganta seca e arranhada. Na mesma noite, só teve olhos para uma estrela e hoje, enxergava um céu que, por mais limpo que estivesse, não possuía estrelas para os seus olhos.

Quinn respirou fundo e, pelo canto dos olhos, viu Santana sentar-se a sua frente e dedicar-se a observar, preocupada e calada. Quinn sorriu de forma triste para as suas mãos e estava prestes a pedir desculpas quando Santana a interrompeu com uma risadinha, ela tinha a sobrancelha arqueada e sussurrou carinhosa:

— Sem desculpas, lembra?

— Sim, assim como eu me lembro de várias outras coisas que foram ditas e pensadas naquela noite. - Existia certa nostalgia na voz de Quinn e, também, nervosismo. Ela ansiava por contrar a Santana o que não saía de seu peito, mas, não sabia como seria interpretada, entretanto, calar-se não parecia uma boa opção naquele momento. Quinn ergueu os olhos e piscou, eles arderam e ela os ignorou. - Vamos falar primeiro de você. Soube que detonou no julgamento.

— Como se isso fosse alguma novidade. - Santana afirmou de forma soberba, o sorriso arrogante nos lábios provocou uma verdadeira risada em Quinn, alegre e desimpedida, fruto de um sentimento real e vivenciado. Os olhos negros da latina se perderam atrás de Quinn no mesmo instante que passos se faziam audíveis na imensa sala. A risada da professora se transformou em um sorriso contido e saudoso, afinal, os olhos de Santana se perderam em uma pessoa, da mesma forma que os seus se perderam, no passado.

Quinn não ousou interromper aquele momento, decidiu observar. Kathryn chegou a elas, os cabelos rubros escurecidos pela umidade, ela tinha um sorriso inseguro e cumprimentou Quinn com um aceno na cabeça, visivelmente temerosa por mais uma reação contrária da professora. Quinn se encolheu, envergonhada e repetiu o cumprimento.

Santana observou as duas e pareceu satisfeita com o que vira, sua mão alcançou uma das mãos de Kathryn e os dedos se entrelaçaram. A ruiva sorriu e deixou ser guiada para um local ao lado de Santana no sofá, a latina beijou-lhe a face antes de voltar sua atenção para Quinn e confessar:

— Admito que sou boa, mas, eu esperava algo mais complicado nesse caso... A Promotoria nos ajudou e o júri foi compreensivo.

— O júri teria me condenado se o meu representante fosse outro. Foi você que possibilitou a minha segunda chance, Santana. - Kathryn foi bastante incisiva em suas palavras e a forma dura como ela olhou para Santana deixou evidente que as duas tinham discutido aquilo várias vezes. Mais uma vez, a risada ocupou os lábios de Quinn, quem diria que Santana Lopez seria humilde em relação a algum feito? Santana deu de ombros, derrotada, e Kathryn trocou um olhar com Quinn, a loira resistiu a colocar um apelido na amiga, ela parecia muito encoleirada. - Bem, eu vou pegar algo para bebermos antes que comecemos a discutir, preciso estar com a fala em dia para agüentar todos os seus argumentos.

A latina arqueou a sobrancelha para o comportamento autoritário da sua companheira, Quinn continuava a rir e teria continuado se Santana, após Kathryn ir à cozinha, não a tivesse olhado de forma tão séria. A advogada suspirou e juntou as mãos, um gesto que denunciava a sua insegurança em relação àquela conversa, e até tentou perguntar, mas, gaguejou. Quinn inclinou o corpo e segurou as mãos da amiga, depois, disse suave:

— Pode perguntar.

— Eu não vi a Berry e, ao menos que ela esteja escondida dentro da sua bolsa, só posso concluir que ela não está contigo... O que houve entre vocês? - Santana tentou mascarar a sua curiosidade com a sua preocupação, mas, foi em vão. Ela não conseguira ler Quinn tão bem desde que mencionara Rachel, a sua amiga parecia mudada e, principalmente, inquieta. Quinn suspirou e brincou com os dedos da amiga, mas, Santana apertou a sua mão de forma firme e sorriu, encorajando-a. A professora suspirou e respondeu frágil:

— É uma longa história, nos encontramos em New York, ela foi até mim e pediu para voltar. Eu disse coisas que achava serem verdades e que, agora, só me confundem. Eu não a deixei dizer que me amava... Eu não consigo. E ainda assim, ela voltou a Lima e cantou para mim. Eu não sou forte como você foi com Brittany, dizer adeus é muito mais difícil do que, simplesmente, pedir para ela ficar, mais uma vez.

Quinn tinha as mãos na cabeça ao terminar de falar, seus dedos apertavam o seu couro cabeludo como se pudesse enfiar aquelas palavras em sua cabeça. A sua razão era a única coisa que lhe restava porque o seu coração era teimoso demais, ele se deixava queimar, ele aplaudia a sinfonia de sua dor e, principalmente, ele escutava Rachel em qualquer linguagem, na música ou nas palavras.

O silêncio entre elas era palpável, contudo, Santana tinha os olhos fixos na amiga. Ela tomou as mãos de Quinn entre as suas e a loira a olhou nos olhos, o verde estava choroso e inseguro e o escuro estava firme. Santana respirou fundo e sorriu, um sorriso gentil, generosa, ela disse:

— Eu não fui corajosa ao dizer adeus a Brittany, eu apenas aceitei uma verdade que estava além das minhas mãos. E, em nenhum momento, eu disse que você deveria dar adeus a Rachel.

— Mas, v-você...?! - Quinn estava ainda mais confusa e as palavras lhe faltaram porque ela se surpreendera, tinha quase certeza de que Santana não aprovava o que tinha com Rachel. Talvez, Kathryn tivesse amolecido as suas verdades.

Contudo, Santana Lopez sempre pensara da mesma forma quando olhava para Quinn Fabray e Rachel Berry. Não existiam despedidas, nem adeus e, muito menos, separação para as duas. O que elas tinham era mais forte do que muita coisa que existia e caminhava naquela Terra. O que as duas possuíam era justamente o que faltara a ela e Brittany. Rachel e Quinn traziam, em si, a certeza irracional de que se amavam, independente de tudo. Era algo semelhante à teimosia, próximo da dependência, mas, certo e lúcido. Diante de tantos desencontros, de tanta mágoa e de tantos erros, ainda existia algo ali que merecia ser protegido. Algo, nelas, ainda as inflamava o bastante para fazer Rachel abandonar os seus sonhos e Quinn questionar as suas decisões.

Algo, dentro delas, queimava o bastante para mudar as notas da melodia que ecoava em Quinn. Em vez da melancolia, quando Quinn era tocada pelo calor dos tons de Rachel, tudo se convergia em uma sinfonia de vivência infinita, de sentimentos inquestionáveis e de um amor incompreensível.

Doía estar magoada, mas, doía ainda mais estar distante. O fogo, afinal, deixara sinais em suas almas, não como cicatrizes e sim, como marcas. E eram essas marcas que ardiam e lembravam, tanto uma quanto a outra, do que eram quando estavam juntas. As lembranças ecoavam a saudade e a saudade dava a certeza de que elas não tinham sido feitas para estarem separadas. Não daquela forma, não daquele jeito, não naquele frio e nem naquela escuridão.

— Eu queria que você voltasse a ser quem era, a acreditar no que era... Você era algo antes de Rachel, alguém por quem ela se apaixonou e precisava voltar a ser tudo isso. - Santana estava de pé, andava de um lado para o outro e tinha as mãos na cintura. A sua voz era firme como um grito de guerra, o último pronunciamento antes da última batalha que lutariam juntas para enfrentarem os seus passados e os seus presentes, rumo aos seus futuros vitoriosos. A latina parou e olhou cheia de adrenalina para Quinn. As lágrimas haviam secado e dentro daqueles olhos verdes havia algo que, há tempos, Santana não via. - Se você não tivesse se erguido contra os erros dela, você não seria a Quinn que eu conheci. Se você não tivesse a afastado para se reerguer, você não teria sido a cheerio que eu admirei. E, principalmente, se você não questionasse as suas decisões e os seus sentimentos, você não teria sido a Quinn pela qual Rachel Berry se apaixonou. Você voltou a ser, justamente, aquela que a amava e que lutaria e não esperaria por ela.

A esperança desabrochou em Quinn, tão verde quanto os seus olhos e tão obstinada quanto o brilho dentro deles. Dessa vez, a queima não ardeu e sim, afagou. As marcas dentro de si chamaram por Rachel e Quinn respirou fundo ao atendê-las, as lembranças voltaram, mas, a sinfonia não era melancólica quando orquestrada pelo seu coração.

A sinfonia era, sobretudo, bela.

***** 

O céu, acima de Rachel, estava dividido quando ela chegou ao estacionamento. A porção oeste, que se estendia pelas vagas e chegava ao portão de saída do colégio, tinha indícios da noite que se aproximava - a cor do céu era uma mescla de azul em diversos tons escuros, algumas corajosas estrelas também já se faziam evidentes - enquanto a porção leste ainda apresentava sinais do dia, o tom alaranjado rajado de tons avermelhados.

Era uma bonita comunhão de opostos. Entre o leste e o oeste, o dia se mesclava à noite e a luz fazia casa nos braços de escuridão. O céu, naquele dia, abrigava um pouco do sol e um pouco das estrelas. Ambos brilhavam, o sol estava esgotado enquanto as estrelas estavam prontas para iluminarem a noite. Um ia embora enquanto as outras ficavam.

Os postes de luz no estacionamento acendiam-se aos poucos, discretos pontos de luz na escuridão que somente ameaçava, já que esta não era capaz de impedi-los de enxergar. A noite tomava o que restava do dia, lenta e preguiçosa.

Naquele ambiente de nuances, Rachel enxergava sua sombra deformar-se no chão aos seus pés, da mesma forma que as suas certezas tinham se deformado na última hora. Assim como as estrelas que ocupavam o local do sol na noite, ela se doaria para Quinn. Ela seria a luz enquanto Quinn estivesse cansada e não cobraria nada em troca. Assim como as estrelas, ela viveria em função de seu sol, à distância e brilharia por ele.

Estava decidida como estivera em todos os passos que atravessaram o McKinley High. As palavras de Leroy não mais doíam agora que as compreendera e aceitara, na verdade, elas soavam as mais sinceras verdades que escutara nos últimos dias. A felicidade de Quinn, àquela altura, era muito mais importante que a realização dos seus sonhos. Rachel só não conseguia afirmar que a felicidade de Quinn - provavelmente sem a sua presença na vida dela - era mais importante do que o amor que, um dia, dividiram a acreditaram.

Rachel não sabia se arrancara o amor, mas, a felicidade se perdera no instante em que Quinn a pedira para ficar e ela se fora. O que elas possuíam foi seriamente danificado e, provavelmente, destruído no instante em que quebrara o coração de Quinn.

Se a morena pudesse voltar atrás, bem sabia que faria diferente. Ela ficaria exatamente da forma como Quinn pedira. Aquele ditado, de que as coisas só se tornavam valorizadas quando eram perdidas, fazia muito sentido. Rachel só compreendeu o que sentia por Quinn quando a perdeu e o pior, não era a primeira vez que a perdia e sim, a segunda.

Deveria ter aprendido na primeira vez, não deveria ter deixado a sua teimosia incurável e a sua ânsia irracional tê-las levado, novamente, para longe dos braços de Quinn. E se a dor, na primeira vez, fora intensa... Dessa vez, ela parecia incessante e insuportável.

Rachel queria voltar ao passado ou, pelo menos, àquele momento. Tudo o que queria era uma segunda chance, mesmo sabendo que não a merecia.

O silêncio no estacionamento era tranqüilizador diante da gritaria dentro de seu peito, contudo, essa ausência de sons se perdeu quando uma melodia chegou aos ouvidos de Rachel. A essa melodia, risinhos baixos e cúmplices foram somados. A morena parou no meio do estacionamento, a sua frente, um casal rodopiava e dançava iluminado pelo pôr-do-sol e embalado por uma música romântica.

Your daddy thought I was wrong for you,

Thinking back your mom did too

But two wrongs never felt so right

It was written in the stars,

For two young and wild at hearts

To sneak out late into the night 

Os raios remanescentes do sol tocaram o casal e delinearam as suas silhuetas. Rachel sorriu quando reconheceu Claire sendo recepcionada pelos braços de Christine, as duas se encontraram e sorrisos - o aberto de Claire e o contido de Christine - desenharam-se em seus lábios. Essa loira e essa morena pareciam envoltas em luz, ainda que, ao redor delas, a escuridão já se fizesse presente. Christine segurava Claire pela cintura e olhava nos olhos dela enquanto as balançava no ritmo da música e cantarolava baixinho.

You’d climb in and take my hand

Andy you slide on over, on over and we’re ride 

Claire se aconchegou no abraço de Christine, procurando escutar-lhe o coração, a loira beijou-lhe a testa e fechou os olhos. As duas continuavam a se balançar com a música, mas, era como se o som não mais existisse. Os olhos de Claire também se fecharam e Rachel sorriu de forma triste para as duas. Também se sentira daquela forma, como se tudo ao seu redor se calasse e o mundo parasse por alguns segundos, segundos que significavam o infinito porque estava nos braços de quem amava.

Como Claire, Rachel se sentiu ser segura e, principalmente, sentiu que algo a conectava àquele mundo. E esse algo era, justamente, uma pessoa. A pessoa que amava e a única capaz de transformar as leis do tempo, transformando um mero segundo no representante do infinito.

‘Cause young love don’t know nothin’

When the radio plays you sing along

When she’s holdin’ on

You just can’t get close enough,

You swear it’s sent from above

It’s real, it’s good and it’s young love 

A música continuava assim como aquele momento, tão pueril e tão intenso, fruto de um amor tão jovem e inconseqüente, também continuava.

Rachel gostaria de observá-las por mais tempo, gostaria de também ter aquilo de volta... Mas, o seu tempo, infelizmente, passara. Ele se fora quando deixou Lima após o colégio e voltara, mas, tornou a partir quando, mais uma vez, deixou Lima. Segundas chances existiam, mas, uma terceira era praticamente impossível. Por isso, mesmo que aquela cena continuasse quando não mais as observasse, que Christine e Claire continuassem depois de se formarem... Ela, Rachel Berry, deveria partir. Sozinha.

Os ombros de Rachel voltaram a se encolher, dolorosos pelo peso da culpa e do arrependimento. A morena avançou a passos vacilantes pelo estacionamento, gostaria que seus passos fossem silenciosos o bastante para passarem despercebidos. E eles, de fato, eram. Contudo, os seus sentimentos não e Christine, de alguma forma, estava conectada a eles. A aluna abriu os olhos quando a professora estava há alguns passos de distância, Rachel já passara por elas quando escutou a sua aluna chamar:

— Miss Berry!

Rachel realmente gostaria de continuar, mas, algo prendeu os seus pés no concreto do estacionamento. Talvez, fosse a necessidade de falar com alguém ou, talvez, fosse a vontade de ter aquilo que as duas possuíam, ainda que fosse pouco e indiretamente. Rachel não sabia por que parara e porque se virara, entretanto, ali estava ela, olhando para as suas duas alunas que tanto a lembravam do que ela mesma e Quinn eram no passado.

Mais do que isso, as duas também significavam o que poderiam ter sido caso o tempo, a mágoa, as decepções e os erros não tivessem tirado tudo delas.

— Olá meninas, eu não esperava vê-las aqui nessa hora... Estão à espera de alguém? - Rachel procurou colocar um sorriso convincente nos lábios, assim como tentou dar um tom despreocupado a sua voz. Pela forma como Christine a olhara e pelo revirar dos olhos de Claire, falhara miseravelmente. Rachel desviou os olhos das duas e olhou para a escuridão do oeste. Christine pigarreou e o otimismo na voz dela era real ao dizer:

— Na verdade, estamos comemorando.

— Sério? O que mais pode ter acontecido a vocês além da formatura e das Nationals? - A técnica do coral, mais uma vez, invejou a juventude repleta de otimismo de suas alunas. Naquele momento, sentiu-se ainda mais velha. O seu corpo estava cansado, assim como a sua mente e o seu coração estava machucado, praticamente inapto. A idade a amargura estavam evidentes nas discretas marcas em sua pele e na opacidade de seus olhos. Claire sorriu, um sorriso direcionado a Christine e não à professora, e respondeu orgulhosa:

— Coach Sylvester chamou Christine para uma reunião e avisou que ela formará como capitã das Cheerios. Ela parecia bem arrependida de tê-la expulsado do esquadrão por causa de todo aquele episódio.

Rachel viu quando a expressão de Christine se fechou, contudo, Claire não permitiu que ela se entregasse àquela parte de si. A baixinha se esticou na ponta dos pés e aplicou um beijo na face da mais alta, Christine sorriu aliviada e Rachel suspirou, estava sendo mais difícil do que imaginara. A técnica do coral apertou a alça da bolsa, procurando libertar o nervosismo que provocava o suor em suas mãos, e disse genuinamente feliz:

— Estou muito contente por você, Chris. A Coach Sylvester mais erra do que acerta, contudo, ela tem os seus bons momentos, que são raros, e devemos valorizá-los.

Christine riu das palavras de Rachel e essa morena também se permitiu sorrir de lado. Porém, Claire observava as duas sérias. Essa baixinha cruzou os braços na altura dos seios e, incisiva, comentou:

— A senhora também erra bastante e, ultimamente, pouco têm sido os seus acertos, Miss Berry.

Rachel não saberia explicar o que nasceu e percorreu o seu corpo diante das palavras de sua aluna. Foi algo que começou como raiva, contudo, minguou na apatia e chegou ao seu peito em forma de dor. Tudo relacionado a Quinn remetia a dor, por mais que viesse nas palavras cruéis de sua aluna. A professora crispou os lábios carnudos e os manteve fechados, respirando forte pelo nariz e ignorando a ardência em seus olhos.

Claire permanecia impaciente, esperando não somente por essa resposta e sim, por todas as outras dúvidas que compartilhara com Quinn Fabray quando a sua ídola se fora e Christine se recolhera à covardia. Por falar em Christine, ela olhava de Rachel para Claire, ansiosa pela reação de cada uma - Claire estava ansiosa e Rachel, apática - sem saber se deveria interceder.

Rachel desviou os olhos de Claire e os piscou, uma tímida lágrima escorreu por sua bochecha e ela bufou. Um sorriso amargo brotou em seus lábios carnudos e ela balançou a cabeça em negativa, não devia satisfações àquela aluna, mas, não podia ignorar os próprios erros que passavam e repassavam em sua memória, lembrando-a do que fizera e de quem machucara. A técnica do coral firmou o aperto na bolsa e, reunindo o pouco de dignidade que ainda possuía, retomou o seu caminho. Christine suspirou compreensiva, já estivera naquele local, mas, Claire não estava satisfeita e esbravejou:

— Eu costumava admirá-la, sabia?! Mas, eu não consigo admirar uma pessoa que dá às costas a quem mais a ama em busca de algo incerto como um sonho! Você tinha tudo em mãos, por que a abandonou aqui, Miss Berry?!

Os ombros de Rachel tensionaram-se, o peso de sua culpa e de seu arrependimento estava sendo arduamente suportado e aquela era a primeira vez que ela sentia que, a qualquer momento, poderia desabar. O aperto na alça de sua bolsa relaxou, a bolsa foi ao chão e ela se virou. Os seus olhos castanhos brilharam e ela lutava contra a sua fragilidade quando respondeu:

— Eu faço essa pergunta, várias vezes, durante todos os meus dias, desde que eu saí de Lima! Eu não cheguei à resposta alguma porque eu não sei o que o que me fez abandoná-la! E é justamente essa falta de motivação que deixa tudo ainda pior... Eu perdi o meu presente e o meu futuro por causa de uma fantasia do passado! Meus sonhos se quebraram e tudo o que me importa é a quebra do coração dela!

As palavras foram ditas de forma mais alta do que Rachel gostaria, entretanto, elas desafogaram muitos diálogos que ela travava consigo mesma. Nos olhos de Claire e Christine, Rachel enxergou algo que não gostaria de ver, mas que merecia. A pena era humilhante e reconfortadora, oposta como aquele céu naquele fim de dia. Contudo, diferentemente do anoitecer, a pena não teria fim e tudo que lhe cercava era a pena...

E tudo que Rachel queria era o perdão.

Christine saiu de seu torpor e deu um passo em direção à técnica do coral, mas, Rachel a parou com um movimento da mão. Ela apanhou a sua bolsa, no chão e respirou fundo enquanto se colocava em pé. Os seus olhos, novamente, foram para as suas alunas. Claire balbuciava um pedido de desculpas, visivelmente desconfortável e Rachel a poupou dessa situação quando deu às costas a elas.

A música que elas dançavam já acabara há muito tempo, outra coisa tocava e Rachel realmente desejava que elas pudessem esquecer o que havia acontecido, elas não mereciam escutar o que escutaram e, tampouco, deveriam tê-la visto daquela forma. Sobretudo, Rachel não gostaria de receber mais um olhar de pena.

Ela sabia que não era digna de tanto.

*****

Sam Evans sentia-se culpado por estar tão feliz enquanto a sua melhor amiga praticamente se arrastava pela rotina dos dias. Quinn passava pelos dias de forma silenciosa, sobretudo, pensativa. Ela também tinha, sempre, uma expressão fechada e cheia de tensões, pensando constantemente no seu passado, presente e futuro. Enquanto ele - alguém que já esteve naquele limbo emocional e já vivera daquela amargura - encontrava-se em um local que jamais imaginara estar.

Ele estava feliz, redescobrindo sentimentos que achara ter deixado de acreditar ao mesmo em que desvendava certas porções de si que não conhecia. Por exemplo, Sam redescobrira o seu jeito com crianças na filha de Marley, Eliza, que era a sua companhia inseparável, assim como a mãe.

Se alguém dissesse a Sam Evans que ele finalmente se veria liberto de Mercedes justamente com a chegada de outra pessoa em sua vida, ele não acreditaria. Por muito tempo, Mercedes fora o centro de sua vida e ele gravitava em torno dela. E, com o passar dos anos e a covardia de Mercedes em querer somente ele, Sam perdeu-se de si mesmo.

Por isso, ele abraçava a sua essência reencontrada com o mesmo carinho com o qual abraçava Marley. Assim como se entregava, novamente, a si mesmo da mesma forma como se entregava à enfermeira. Sam estava tão imerso em toda aquela leveza alegre que o sorriso não saía dos seus lábios cheios, assim como o brilho esperançoso não deixava os seus olhos azuis. Ele estava flutuando e o que o trazia ao chão, de forma brusca e violenta, era Quinn.

A sua amiga era a antítese de todos os seus sentimentos, logo ela que, desde o começo daquela amizade, sempre fora a dona do otimismo e da esperança. Ainda assim, ele não conseguia culpar Rachel, nem mesmo queria, sentira o peso da pequena mão morena assim como a entendia. Rachel era, de certa forma, a Mercedes na vida de Quinn e somente o tempo diria, assim como foi no caso dele, o que viria a seguir entre elas.

Sim, Rachel abandonou Quinn no momento em que a sua melhor amiga precisara dela... Mas, Sam não conseguia ver algum tipo de maldade nisso quando vira os olhos e, principalmente, a alma de Rachel, praticamente defender aquele amor de forma tão violenta e inconseqüente. Ele acreditava que aquilo que as atrapalhava não era o amor e nem mesmo a natureza intensa desse sentimento para as duas. O que as afastava era justamente o que elas tinham demais... A bagagem emocional, o peso do tempo e a ausência do perdão.

Mais do que tudo, nem Quinn e nem Rachel haviam perdoado quem tinham sido no passado. Quinn não se perdoava por ter deixado Rachel ir a New York na primeira vez e a morena não se perdoava por ter voltado à cidade que tanto lhe trouxera tristeza. Sam chegara a essas conclusões depois de ele mesmo se perdoar.

Talvez, em nossas vidas, não devemos procurar inimigos e sim, olhar para os nossos demônios. Essencialmente, Sam aprendera que deveria santificá-los para, depois, perdoá-los. Afinal, ele não conseguiria se dar uma segunda chance se considerasse culpando Mercedes por sua insistência.

O administrador ajeitou a gola da camisa social escura, colocou um cinto na calça jeans e apanhou as chaves e a carteira. Sam olhou-se no espelho pela última vez e passou a mão pela barba que estava crescendo lentamente, Marley dera uma dica a respeito do quão charmoso ele ficava dessa forma e ele resolveu deixar crescer, por ela. Ele não pode deixar de sorrir para o seu reflexo corado e ansioso, exatamente como um jovem apaixonado. Sam chegara à sala quando escutou batidas em sua porta, ele franziu a testa para o som, mas, apressou o passo.

Talvez, Quinn quisesse, finalmente, se abrir com ele.

Contudo, o universo andava muito generoso com ele. Sam encontrou, em sua soleira, Marley Rose estava vestida em jeans, com um lenço azul em torno do pescoço, uma camisa folgada com a estampa dos dizeres “Eu sou a mãe mais orgulhosa do mundo” e tênis All Star nos pés, segurando a mão de uma miniatura sua de 3 anos de idade. Eliza tinha os olhos azuis da mãe, assim como o cabelo castanho escuro e a pele era oliva - um dos poucos traços de Jacob Puckerman que ela herdara além dos cachos indefinidos no cabelo - a pequena usava uma camisa estampada com “E eu sou a filhinha mais feliz do mundo”, também de jeans e de tênis All Star. E ambas as camisetas eram decorada pelas impressões das pequenas mãozinhas de Eliza em tinta colorida.

Sam olhou da mulher para a filha e não pode deixar de sorrir, ultimamente, o sorriso era algo tão natural quanto respirar para ele. Marley encolheu os ombros e também sorriu, ela apertou a mão da filha e desculpou-se:

— Ela quis vir combinando, não pude fazer nada.

— Eu não faço objeção a isso, as duas estão lindas! - Sam disse gentil, aproximando de Marley e aplicando um beijo nos lábios róseos. Eliza deixou-se espremer entre os dois e riu deliciada para aquela cena, depois, Sam se abaixou e a envolveu em um abraço de urso. As risadas dele, de Eliza e da Marley ecoaram em sintonia no pequeno corredor e Sam fechou a porta atrás de si enquanto colocava a pequena no chão. - Mas, eu disse que as buscaria em casa. Não precisavam ter vindo.

— Eu acho que você não entendeu como Eliza pode ser insistente, ela também quis ver você o quanto antes! - Marley respondeu acanhada e as bochechas avermelharam enquanto ela afagava os cabelos da filha. Eliza abateu palminhas e Sam suspirou. Jamais imaginara que pudesse caber tanto amor dentro do seu peito, mas, Marley e Eliza estavam mostrando que era o seu coração que parecia pequeno diante do muito que poderia guardar.

Sam olhou de uma para a outra antes de, novamente, pegar Eliza no colo com o seu braço esquerdo enquanto entrelaçava a sua mão direita à mão de Marley. Nos primeiros degraus, eles encontraram Quinn que praticamente corria para chegar ao seu apartamento. A professora ergueu a cabeça e, com um sorriso que não lhe chegava aos olhos, cumprimentou:

— Olá pessoal, como estão?

— Melhores do que você, aparentemente. - Sam bronqueou assim que percebeu os olhos distraídos de Quinn, considerando da onde ela vinha, ele não se surpreenderia se ela estivesse ébria. Santana era péssima influência ainda mais quando se aliava ao álcool e ao desabafo. Marley apertou a mão de Sam, como se o censurasse e Eliza se enterteu ao brincar com os cabelos loiros de quem a carregava. Sam agitou a cabeça, tentando não julgar aquele comportamento autodestrutivo que já experimentara mais de uma vez, e sorriu nervoso. - Estamos indo ao cinema, a sessão de estréia da animação de Wicked, não gostaria de ir conosco?

— Ah não, sem musicais para mim, por favor! Tudo que eu quero é dormir, o final do ano letivo sempre é complicado e eu preciso descansar. - Quinn dissimulou com um sorriso leve, em seguida, ela continuou o seu caminho, acenando para Marley e Eliza. A enfermeira observou a postura cansada de Quinn e, preocupada, perguntou:

— Ela vai ficar bem?

— Eu espero que sim. - Sam respondeu melancólico, o amor dentro de seu peito começou a deixá-lo até que Eliza, como se percebesse, beijou-lhe na bochecha e gritou de felicidade em seus braços. Sam olhou para aqueles olhinhos azuis e, depois, para os mesmos olhos azuis de Marley.

 Novamente, o seu peito encheu-se de amor e, novamente, ele se culpou porque sabia que o que tinha sobrando em si era justamente o que faltava em sua melhor amiga.

 

Quinn não admitiria, se perguntassem, mas, sabia que estava levemente alterada pelo vinho que tomara na casa de Santana. Mais que isso, estava transtornada pelas conclusões que chegara diante de mais uma conversa avassaladora com a sua melhor amiga.

Santana entregara palavras que Quinn não mais sabia se acreditava. Entretanto, vindas da boca de uma pessoa de fora da sua espiral de desilusões e decepções, elas faziam muito sentido e eram dignas do pensar. Contudo, agora, Quinn pesava se elas eram dignas, também, do sentir. Será que a latina estava certa? Será que, no meio de todas aquelas feridas e cicatrizes, ainda existisse alguma forma de se reconstruir e de se curar? Quinn não se dava muito bem com novas chances e recomeços. Os seus pais jamais tentaram recomeçar consigo, ela falhara em suas primeiras tentativas de se redimir com Rachel e agora, aquela segunda chance que a vida deixara aos seus pés se revelara uma decepção de proporções gigantescas.

A professora não gostava de pensar no conceito de recomeços porque eles não faziam sentido para alguém como ela que, necessariamente, falhara em quase tudo que fizera. Os seus erros eram muito mais escandalosos do que os seus acertos, a sua tristeza também falava mais alto do que a sua alegria e, no momento, sentia-se mais perdida do que esteve anteriormente.

Assim como a maturidade trazia a parcimônia, ela também trazia o medo e o excesso de cuidado. Quinn não era mais jovem para se arriscar, assim como não mais se recuperava facilmente diante de tudo que a ferira. Ela precisava de tempo e, assim como não tinha mais paciência, coragem ou obstinação, o tempo também não fazia mais parte de suas disponibilidades. Tudo que ela tinha agora era a esperança, as sábias palavras de sua melhor amiga e aquele sentimento que, mesmo na maturidade, permanecia incontrolável e destemido como esteve em sua juventude, quando ela sequer sabia que se tratava de amor.

Naquela época sim, em seus anos no colegial, ela possuía o tempo. Mas, ainda naquela época, a coragem lhe faltava. Se fosse mais madura, saberia ainda nos primeiros anos que sempre fora apaixonada por Rachel Berry. Quem sabe, se ela tivesse pensado e, principalmente, sentido, teria conseguido dar um final feliz e clichê ao romance de colegial... Quem sabe, se não tivesse deixado Rachel sair de Lima sem um adeus, tivesse compreendido que aquela partida era somente um recomeço para elas...

Quem sabe, se Quinn tivesse o coração de hoje em um corpo mais novo e em uma mente mais agitada, ela tivesse conseguido amar Rachel Berry. Sem ressalvas, sem mágoa, sem melancolia, sem dor e sem feridas... Somente o amor.

Ela deveria pensar no presente, contudo, ela somente conseguia remoer o passado e tudo que se acumulara entre elas. E o passado, literalmente, bateu a sua porta. Quinn mal entrara em seu apartamento e tivera que o abrir novamente, na soleira de sua porta, Noah Puckerman a olhava ansioso e nervoso. Quinn não soube o que dizer a ele, as palavras falhavam com ela nos últimos dias, contudo, Noah foi mais rápido e se adiantou inseguro:

— Por favor, não precisa dizer nada. Eu só vim aqui lhe dizer que eu e Shelby estamos dividindo a guarda de Beth. E, nos períodos em que ela estiver comigo, você está mais do que convidada a passar um tempo conosco. Eu não quero nada em troca e você não precisa me agradecer... Isso é o mínimo que eu posso fazer por você depois de todo esse tempo.

— Noah, eu...! - Mais uma vez, a ausência de palavras tirou os sentimentos de Quinn de cena. Porém, os seus olhos verdes brilhavam de uma forma que fizeram Noah sorrir de lado, um sorriso generoso e satisfeito. Quinn viu o policial embaçar-se em sua visão e levou a mão ao rosto, limpando as lágrimas. Noah, corajoso, adiantou-se e afagou o seu pulso, ele suspirou e disse compreensivo:

— Eu sei o que quis dizer. Você pode vir vê-la quando quiser, não existirão mais acordos e nem barreiras que possam impedi-la de vê-la. E caso Shelby queira dificultar, eu peço a guarda total de Beth. Você merece isso e eu quero que você a tenha, nem que por algumas horas, Quinnie.

As palavras de Noah somadas ao apelido carinhoso despertaram uma das nostalgias que estavam aprisionadas dentro do peito de Quinn. Ela se adiantou e vacilante, jogou-se nos braços fortes que, em uma noite bêbada, deram-na amor e Beth. Noah a recebeu e, principalmente, se fortificou por ela. As lágrimas também molhavam o rosto másculo marcado pelo tempo e pelo trabalho, mas, ele sorria. Um dos sorrisos mais genuínos que dera nos últimos anos. Quinn tremeu nos braços dele e, agarrando-se a ele, sussurrou sôfrega:

— Muito obrigada.

— Como eu disse, era o mínimo que eu podia fazer por você. - A voz de Noah estava rouca e frágil pelas lágrimas que ele derramara, ele as limpou ainda sorrindo e afastou-se de Quinn, dedicando-se a limpar, também, o rosto dela. Quinn sorriu para o desajeitado toque gentil e deixou que ele segurasse o seu rosto. - Eu amei você e destruí a sua vida na mesma noite. E deixei que continuassem a lhe derrubar durante os anos... Você foi uma das poucas pessoas que acreditou em mim e eu não poderia deixá-la tão vulnerável agora que você tanto precisa de alguém. Eu é que agradeço por essa segunda chance para fazer as coisas darem certo.

— Segunda chance? Eu jamais lhe culpei, pelo menos, não de verdade, Puck. - Quinn justificou-se inquieta, levando as suas mãos para junto às dele e sentindo o calor dele, sempre tão avassalador e teimoso, esquentar as suas mãos frias. Noah abaixou a cabeça e respirou fundo, ele não acreditava em suas palavras. O policial deu um passo para trás e, sem graça, respondeu:

— Eu sei, você é boa demais para culpar alguém, sempre foi assim... Boa demais para mim. Mas, eu me culpei e eu precisei fazer isso. Se lhe incomoda tanto, encare como eu mesmo me perdoando... Pela forma como eu magoei você, mais de uma vez, assim como pela forma como eu magoei a nossa filha. Vocês vão se encontrar e eu... Eu vou me perdoar por todos esses anos, Q.

Noah ainda tinha lágrimas nos olhos ao deixá-la sozinha e paralisada no meio do corredor. As palavras dele ainda ecoavam nos ouvidos de Quinn, assim como a culpa dele pesava no ar que respirava.

E, entre a culpa dele e as lágrimas que manchavam o seu rosto, Quinn encontrou o que não sabia que procurava e que, ainda assim, era necessário. Ela não tinha o tempo, mas, nunca tivera a coragem. Contudo, agora, ela também era muito mais inteligente e compreensiva do que antes. Portanto, ela precisava ser corajosa assim como precisava compreender.

Tudo isso para, enfim, poder perdoar. Não somente Rachel e sim, a si mesma. Existia um passado que enuviara o presente, fazendo chover sobre um futuro. E Quinn queria voltar a trazer o sol... Ela precisava que o sol voltasse a brilhar sobre ela e sobre a sua estrela.

*****

Rachel precisou caminhar sozinha por Lima, assim como precisou de um bom banho quente para, enfim, relaxar. Não queria falar naquele momento porque sabia que o pior de si viria à tona, sempre era assim que sentia quando estava acuada. E, dessa vez, o que a acuara era o medo, a solidão e as diversas incertezas que pareciam estabelecer o curso de seu caminho obscuro. Rachel não queria mais falar sobre o que sentia porque cada discussão arrancava um pedaço de si que ela não mais via como recuperar.

Portanto, a morena estava sentada em seu quarto escuro. Os seus olhos estavam em seu aparelho celular e ela lutava, bravamente, contra a ânsia de revirar as suas fotos em busca de um aplacamento momentâneo para o buraco frio que se agigantava em seu peito. Ela não podia viver de momentos que jamais teria de volta, a realidade diante de si era dolorosa, mas, ainda assim, era uma realidade.

E Quinn ainda vivia nela e, principalmente, precisava voltar a ser feliz.

A morena estava distraída, Barbra Streisand tocava em seus ouvidos, mas, ela não sabia qual música era. Em sua janela, a noite já estava estendida sobre Lima. Rachel assustou-se com a notificação e surpreendeu-se ao ver, na tela, o ícone de um novo e-mail recebido. Ela suspirou, nos últimos dias, os e-mails apenas tornaram a sua vida mais complicada. Ainda assim, ela foi corajosa o bastante para teclar no ícone.

O e-mail abriu diante de seus olhos, o remetente era de New York - ainda que ela não o conhecesse - e o assunto era assustador.

  "Nova montagem de Funny Girl em 2021”

 Rachel engoliu em seco e seu coração acelerou. Aquilo não podia estar acontecendo. Seus lábios se secaram e ela piscou várias vezes, contudo, o conteúdo do e-mail não modificara. Uma nova agência, sem relação alguma com Tony Levone ou Finn Hudson, soubera de sua curta estadia em New York e queria saber se estava disponível para um teste nos próximos dias.

 Nem mesmo Rachel sabia o que queria e nem o que deveria sentir naquele momento. Ela só tinha uma certeza e essa era Quinn. Os seus dedos vagaram pelo teclado, sem saber o que responder... Uma perfeita alegoria para o seu próprio interior que não sabia o que deveria sentir.

 Rachel fechou os olhos e tirou os fones de ouvido, deixou que a noite e o silêncio lhe respondessem. Na escuridão, tudo se tornou mais claro e, no silêncio, a orquestra tocou os mais belos acordes desafinados pelo bater desgovernado de seu coração, a sinfonia melancólica e dolorida guiou os seus dedos... A música não a abandonou, muito menos, Quinn e ela, enfim, respondeu ao e-mail.

*****


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam?

Ainda continuam incertos quanto ao final da fanfic? Aliás, só temos mais dois capítulos e espero que vocês me aguentem mais um pouquinho Hahahaha

Bem, deixe seu comentário ou faça a sua recomendação, estou ansiosa pelo feedback de vocês... Nos vemos no próximo e penúltimo capítulo, beijos! :)



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