Guardadora escrita por Liliaceae


Capítulo 1
Único


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem... =P



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Guardadora

 

Mais um dia. E não era um dia qualquer. Era véspera de Natal. Todos atrás do presente perfeito. Tanto entra e sai na loja... Mal podia se conter... Seria hoje?

Bem... Todo o ano era a mesma coisa... Desde que havia chegado, sempre mantivera as esperanças de ser útil naquela época. Mas ninguém olhava para ela. Com tanta coisa interessante, com tantas novidades nas prateleiras, o máximo que recebia de atenção era a doce senhora da limpeza que vinha ter com ela diariamente. As poucas palavras que ouvia... Reconfortantes.

Será que era tão insignificante assim? Insignificante ao ponto de nenhuma criança, jovem, adulto ou mesmo um idoso perceber a beleza singela dos seus traços?

Num mundo dominado pelos eletrônicos, pra que serviria um simples enfeite, um mero globo de neve?

“Os humanos são mesmo estranhos...”, não podia evitar esse pensamento. Por que havia sido criada? Por que criar algo tão inútil quanto ela? Realmente, eram muito estranhos.

Sentada dentro do seu mundinho, em meio a flocos feitos de plástico, como ela própria, tendo como companhia apenas uma ovelhinha, branca com focinho rosado. “A Guardadora de Ovelhas”. Era o que dizia a placa de metal prateado na base de madeira sob a qual a redoma cheia de água estava fixada. “Nunca entendi o porquê do ‘ovelhas’... Só tem uma aqui e ela nem é de verdade... Nem eu sou de verdade...”, suspirava acariciando a cabeça da miniatura, que se aconchegava as suas saias vermelhas, pintadas num tom apenas um pouco mais escuro que seus longos cabelos; esses sim eram vermelhos intensos. Sorriu para a pequena companheira, achando engraçado como os homens nunca notaram como os brinquedos tinham sempre algo de diferente a cada dia. Um braço erguido de maneira diferente... Olhos que, misteriosamente se voltavam para o lado oposto do dia anterior...

Num dos casos mais engraçados que presenciara nos anos em que se encontrava no alto daquela prateleira, próxima a seção de bonecas – seres muito chamativos e, por vezes, irritantes, sempre atormentando seus dias com piadinhas do tipo: “Por que não vem brincar conosco Guardadora? Será que não é capaz nem de encontrar um modo de deixar essa sua ovelha boba sozinha, sem que ela fuja dessa bolinha em que vive?”; definitivamente, não gostava delas –, o pobre maquinista do trem elétrico da mesa em frente havia saído para a festa organizada pelos soldados do batalhão que figurava abaixo da prateleira em frente à sua. O pobre havia adormecido depois de tanto pular e cantar ao lado dos amigos, que não notou quando o velho senhor, dono da loja, chegou na manhã seguinte para iniciar mais um dia de trabalho, e deu de cara com o trem ligado... O coitado correu até a mesa e, ao desligar o brinquedo, notou a falta do maquinista. Como aquilo era possível? Ele não era uma peça removível, era? Em todo o caso, o velhote tratou de fuçar por toda a loja, temendo que seu precioso brinquedo não pudesse ser vendido devido à falta do componente que se destacava nos anúncios da caixa. Àquela altura, os soldados, que haviam voltado à sua formação rotineira, estavam alarmados tentando, em vão, acordar o personagem de boina e macacão azul marinho. Depois de uma boa “chacoalhada”, ele levantou assustado, gritando para que parassem o trem antes que este se chocar-se contra uma parede de pedras. Um pesadelo, obviamente.

Após outro bom peteleco, os soldados trataram de levá-lo até o trem e colocá-lo pra dentro da cabine. Quando o pobre velho voltou para procurar novamente perto do seu amado trem, deu de cara com o maquinista sorridente, posicionado no mesmo lugar de sempre. Os olhos de espanto e a típica coceira que lhe acometeu a careca, renderam risos e imitações por parte de todos os brinquedos durante semanas.

A pequena guardadora, por sua vez, limitou-se a sorrir toda vez que via o velho olhar para o trem desconfiado. Coitado. Gostava tanto de brinquedos e nem ao menos sabia o que estes aprontavam durante as noites. E estas ficavam mais animadas a cada dia em que a grande festa, que todos conheciam por Natal, se aproximava.

Agora, faltavam apenas algumas horas. E ela continuava postada ao lado de sua ovelha, olhando esperançosa para o mundo exterior, esperando. “Aquela criança parece ter gostado de nós”, sussurrou para a inquieta companheira, nunca se saíra muito bem em controlá-la, sua sorte era que a água do globo dava a impressão de que os movimentos, sutis, porém existentes, do animalzinho fossem uma mera ilusão de ótica.

Realmente, a menina de longos cabelos loiros e olhos cor de mel, parara diante da prateleira onde estava nossa guardadora e tentava a todo custo alcançar o cintilante globo com as mãos gorduchas.

“Eu quero esse mamãe! Esse da menina do vestido vermelho!”, berrava a pequena, numa voz estridente que feriu os ouvidos de todos os presentes na loja, humanos ou não.

“Querida... Você não vai poder brincar com esse... Vai acabar quebrando-o antes de chegarmos em casa...”, a mãe argumentava com o choro descontrolado da menina, ao passo que a guardadora agradecia aos céus pela sensatez da mulher.

“Claro que queremos sair daqui... Mas eu gostaria de permanecer inteira”, sorriu amargamente ao se lembrar do destino que teve outro globo, um boneco de neve que ficava ao seu lado, compartilhando de sua angústia até dias antes. Um garoto adentrara a loja pulando ao se dar conta do paraíso em que se encontrava, saiu batendo em tudo o que achou pela frente. A pancada na prateleira 6b foi mais forte. O globo do boneco voou rumo ao chão. A triste lei da gravidade. E a guardadora teve que lidar com a solidão e tristeza ao ver seu amigo, ou o que restara dele, ir para o lixo.

O alívio que se seguiu ao notar a mãe arrastar a afoita menina rumo à prateleira das bonecas, que naquele exato instante estavam apavoradas com a possibilidade de serem escolhidas pela pequena perfuradora de tímpanos, impediu a guardadora de notar os brilhantes olhos azuis, mais violetas, de um rapaz de cabelos negros, que adentrara a loja depois da confusão, pousados em sua reluzente moradia.

“É lindo... Um presente perfeito...”, sorriu o moço, dirigindo-se ao balcão e, depois de perguntar o preço do objeto em questão, pediu que o gentil senhor o embrulhasse com cuidado.

“Pelo que vejo, minha cara guardadora vai guardar coisas mais valiosas de hoje em diante...”, o velho sorriu amigavelmente para o jovem. Este corou e respondeu calmamente.

“Se ela realmente guardar esse sentimento, ficarei feliz. Mas espero apenas que mostre um pouco...”, afirmou observando o homem se dirigir à prateleira e segurar o globo delicadamente.

“Algo tão belo certamente atenderá as expectativas”.

“Céus! Estamos sendo compradas! Para onde iremos minha pequena? Não poderia ser aquele rapaz, poderia? Será que somos um presente para uma parenta sua? Talvez sua filha? Não... Ele é muito novo. Mas certamente iremos para as mãos de uma criança... Tomara que ela seja cuidadosa. Deve ser... Ou ele não nos compraria...”, assustada, afagou a companheira, esta parecia mais assustada que ela.

Passara seus dias numa loja de brinquedos apenas imaginando quem a compraria, com que objetivo. E agora que estava acontecendo, estava realmente apavorada. Não conseguia parar de imaginar a caixa escura em que se encontrava sendo aberta por uma garotinha – na sua mente distorcida pelo medo, uma menina loira de mãos gorduchas –; esta logo se poria a correr com o presente e, certamente, o fim da guardadora e sua ovelha seria uma lixeira fedorenta.

“Pelo menos na prateleira, eu podia ver o pôr-do-sol... O brilho da lua à noite... A neve verdadeira cair pelas ruas... Sempre imaginei o dia que sairia para ver as ruas, sem ser por aquelas janelas... Mas... Ahh... Por que eu tinha que ser uma simples guardadora de plástico num globo de vidro?”, no fim das contas, não poderia haver ser mais insignificante, poderia?

Algumas horas se passaram e nada acontecia. Há muito estavam postadas no escuro, imóveis.

“Quanto tempo mais?”, se perguntava já conformada com sua desgraça. “Se é esse nosso destino, que ao menos não demore tanto”.

Na angústia da espera, os devaneios foram muitos. Tantos que, quando a caixa foi finalmente aberta, a delicada guardadora apenas fechou os olhos e esperou pelo fim. Que não veio.

“Que lindo! Nunca ganhei algo tão bonito! Ela é muito fofa... Onde a encontrou, amor?”, as palavras ditas por uma voz extremamente amigável e gentil, fizeram a figura dentro do globo abrir os olhos, curiosa.

A cena com a qual se deparou era bem diferente da qual esperava. Ao invés de uma menina chorona e mimada, seus pequenos olhos pintados deram de cara com uma moça de longos cabelos ruivos e olhos chocolate. Um pouco parecida com ela própria.

“Estava passando por uma loja de brinquedos... Tinha uma menina muito irritada por que a mãe não queria lhe dar esse globo de presente. Bem... Nas mãos daquela garota não duraria mais que cinco minutos!”, o rapaz de olhos violeta sorria, “Achei que ela ficaria mais segura nas suas mãos... estava tão solitária naquela prateleira... E é tão parecida com você... Pensei que talvez vocês pudessem fazer companhia uma à outra...”

A moça sorriu ainda mais, colocando a guardadora em cima da mesinha que se encontrava no centro da sala. Enfeitada com vários penduricalhos natalinos, uma árvore com pacotes bem feitos à seus pés, uma lareira acesa e janelas grandes por onde se podia ver a neve cair generosa sob as luzes da rua. Um ambiente aconchegante e que transbordava carinho. Visão que fez os pensamentos de ambas, guardadora e ovelha, se tornarem calmos e felizes. Não acabariam quebradas afinal.

“A Guardadora de Ovelhas... Gostei do nome... É uma pena que ela guarde apenas uma ovelha...”, o comentário fez o jovem soltar uma gostosa gargalhada, que logo deu lugar a uma expressão mais séria.

“Pois saiba que ela não guarda só isso”, respondeu perdendo-se nos orbes chocolate.

“E o que seria?”, a pergunta se formou nos lábios da humana, mas apareceu também nos pensamentos da pequena.

“Bem... Sei que é bobo... Mas... Talvez... Ela possa guardar um pouco do nosso amor... Afinal... Seu nome diz... Guardadora...”, corado, ele completou, “V-Você quer se casar comigo?”

Os olhos chocolate perderam-se em violetas reluzentes por longos instantes. Instantes nos quais, a pequena guardadora, dentro da sua redoma, apenas observou.

“Sim... Nada me faria mais feliz!”, a moça jogou-se nos braços do futuro marido, selando o compromisso recém assumido com um beijo carinhoso.

“Guardar amor? Como posso fazer isso? Sou apenas um pedaço de plástico... Nada além disso...”, perguntou-se durante os minutos que se seguiram. Foi quando finalmente entendeu. “Não fui criada para, como as bonecas ou carrinhos da loja, agradar uma criança... Acho que agora faz sentido... Não sou, no fim das contas um mero brinquedo, sou sim um enfeite, um adorno... Mas um adorno que acaba de ganhar um significado... Guardadora... É isso que devo ser de hoje em diante... Devo continuar a existir em meu globo de vidro, sorrir para quem me observar... E, para que aqueles que um dia perguntarem para esses dois o porquê do meu sorriso, eles também possam sorrir ao responder: ‘Ela sorri assim, porque viu um dos melhores momentos da nossa vida e porque, na imagem dela, está guardada a lembrança do sentimento que nos une’... Devo sorrir agora, pois fui agraciada com o melhor destino que qualquer presente de Natal pode ter... Ser uma doce lembrança... Uma doce lembrança do amor de duas pessoas”.

 

22 de Dezembro de 2008

 

 


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Notas finais do capítulo

Certo... Sei que não é lá essas coisas... Mas... Pelo menos eu tentei... xD
Oks, vou explicar...
Essa One é dedicada, principalmente, à HellLady_Choice, ou se preferirem, Danny/Dasty, uma pessoinha que conheci aqui no Nyah!, que me emocionou muito com seu jeito de escrever em "Ich Liebe Dich - One Song For You" - e, quando perguntada se gostaria de ler algo diferente nesse Natal, respondeu que seria legal ver a história de uma menina num globo de neve... Bem Dasty... Fiz o possível com sua idéia e espero sinceramente que você curta amiga!!! XD
Mas, assim como as outras ones, que pretendo colocar aqui antes do Natal, essa vai com o mesmo carinho para Sabrina, ou S- BK - Outra amiga que vem me dando muitos motivos para sorrir -, TenTen_san ou, como eu a chamo, Rê-sama - a real responsável por eu ter vindo parar aqui no Nyah!... Pessoa que eu admiro pacas...xD - e Rô-Kage-Sama - conheci esse amor de pessoa numa das minhas confusões básicas... Espero que possa me desculpar com essa pequena histórinha... xD [Tá, eu admito... Tô morrendo de medo do Esquadrão ANBU vir me pegar... *--------*]... Tirando isso, agradeço por cada palavra que ela posta por aqui e, assim como a Dasty, a Sá e a Rê-sama, me fazem muito feliz!!!!
=P
E, por último, mas não menos importantes:
Ao meu querido Onii-san, Pedro, que me agüentou durante todo esse ano e, mesmo distante, fez a diferença... Amo-te Pedrinho-baka-nii-san!!!!
À Dani, minha cunhadinha que eu amo - e, cá entre nós, escreve KakaSaku pra matar de rir e emocionar quem ler!!! XD.
À Chelle-chan, uma amiga que, sem dúvidas, merece não só meus comentários em suas histórias, mas também toda energia positiva que eu posso produzir!!!
Ao Octavio-kun, o primo mais cômico da história!!! Agradeço pelos momentos de riso e animação!!!

Enfim... Falei d+ como sempre... Sei que omiti muitos... Mas quero que todos aqueles que me conhecem e leram algo escrito por mim - sejam meus reviews chatos ou minhas ones massantes - sintam-se tão alegres quanto eu ao lerem mais essa historinha...

Arigatô pessoas do meu core!!!!
Kisses!!!
;)



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