Sorri ao finalmente encontrar a casa esperada.

Meus pés doíam da caminhada e tudo que queria era um banho e minha cama, alem de sua companhia. A luz da sala acesa a minha espera provavelmente.

Pisquei cansada antes de abrir a porta. A sala quieta me assustou no começo até encontrar uma pessoa conhecida sentada no sofá, os cotovelos nos joelhos enquanto apoiavam a cabeça de onde pendiam os cabelos negros; ocultando-lhe a face um pouco mais sombria que o esperado.

- Demi? – chamei franzindo o cenho. – Tudo bem?

A risada falsa e irônica ecoou pela sala perigosamente silencio, o medo e insegurança tomaram meu corpo sem um motivo concreto.

- Estou ótima. – a cabeça continuava para baixo, mas sua voz risonha me deixou curiosa.

- Demi, o que aconteceu? – perguntei esperando uma resposta que não veio. – Olhe para mim, por favor.

- Olhar para você? – cuspiu forçando os dedos entre o cabelo. – O que vai adiantar? Isso não fará você falar a verdade.

- Verdade? – continuei preocupada. – Do que esta falan...

- Negação. – as unhas rasparam paranoicamente no couro cabeludo negro. – Exatamente como ela falou...

Agora a voz já não era irônica, mas nervosa. Uma raiva que levava os dentes rangerem e os olhos a lagrimarem, fazendo a voz ser digna de se temer.

- Ela quem? – perguntei.

- Com quem estava? – cortou-me.

O fato de não me encarar fazia meu coração ficar desconfortavelmente apertado.

- Com Miley. – respondi lembrando a conversa que tive a pouco com minha melhor amiga, sabia que ela me entenderia então fui a sua casa. 

- Não viu Taylor hoje, não é? – continuou num jogo que temia o final.

- Eu... eu... – gaguejei e assisti a transformação perante minha insegurança.

O corpo, antes jogado e de aparência fraca, pulou em pé. Os olhos de fera davam a impressão de ser comida viva uma opção muito provável agora. Eles eram vermelhos, ela havia chorado.

- Dem, o que aconteceu? – tentei me aproximar, mas de um passo que dei afastou-se dois. – Porque...

- Eu pergunto por que Selena. – as carreiras de dentes eram forçadas uma contra outra, fazendo a mandíbula ficar rígida em demonstração física a raiva da voz. – Porque você se aproximou de mim se não queria? Alguém te obrigou? Quis saber como seria tocar numa aberração?

- Demi, você esta me assustando. – repreendi. – Nunca falaria isso.

- Aaaah, claro. – sorriu, a ironia novamente na face. – Ninguém nunca falaria isso na hora que é descoberta.

- Descoberta? – tentei a tocar, mas esquivou-se novamente quase violentamente. – Então acha que entrei na sua vida para ver como seria partir um coração ou coisa parecida?

- Sim e obrigada por me poupar o trabalho de explicar. – falou. – As maiorias das pessoas se fazem de desentendidas até a ultima prova.

- Prova do que? – implorei. – Do que esta falando?

- Talvez isso faça sua memória voltar. – os dedos longos se dirigiram os bolso traseiro da calça jeans, tirando um pequeno aparelho onde um play for acionado.

Congelei ao ouvir a voz bater em mim. O gravador reproduziu uma cena que só não contaria eu mesmo para Demi por medo de revive-la, mas foi impossível não fazer agora.

“Selena, desculpa, mas não consigo te ver com uma pessoa tão... doente.” Disse a voz eletrônica de Taylor. “Ela não é a pessoa certa para você e...”

“Quer que admita não ver Demi como a pessoa perfeita para mim, ok eu faço. Quer que admito não ignorar os problemas mentais dela, ok tudo bem. Quer que admito o medo do pensamento bipolar, ok faço sem problemas porque é verdade. Ou pensa que me sinto totalmente bem com uma pessoa que se cortava? Ela tem problemas e não nego isso. Se gostaria que nunca tivesse a conhecido? Sim, porque talvez com a ausência dela conseguiria gostar de uma pessoa mais próxima a mim.” Esperei a fala ser completa, mas não aconteceu.

E o resto?

E a parte onde admitia tudo o que sentia e minha necessidade de senti-la?

- Ainda não se lembra? – o ato de Demi guardar o gravador seria a cena que mais se repetiria em minha mente, a ação que confirmara o troque em que cai.

- Demi tem mais! – as lagrimas se declararam presentes quando forcei minha voz chorosa a sair. – A conversa não terminou, juro.

- Quer que escute mais sobre seus arrependimentos? – tinha as duas mãos fechadas em punho, o que me assustou por dois segundos. – Desculpe lhe causar tantas falsas aparências a chegar esse ponto.

Um passo foi dado em minha direção, um movimento de ameaça. Mas não me movi.

Nós estávamos mais juntas que o esperado, a respiração quente da boca vermelha cada vez mais raivosa por meu silencio confirmador batia em minha lagrimas correntes. Fechei os olhos com força ao sentir sua fala.

- Desculpe se pensei ser real demais. – o sussurro foi baixo o bastante para ouvir. – Desculpe por fazer seu tempo ser perdido, por confiar em suas palavras. E desculpe fazer todas suas tentativas de ajudar sua irmã falharem.

Minhas mãos foram para as suas, sentindo a força estrema que eram apertadas nos socos praticamente prontos. Mas sabia que nunca faria mal a mim.

Foi surpresa não ser empurrada longe e logo minhas mãos passaram das suas para os braços.

- Porque fez isso comigo? – o lábio inferior foi mordido quando a voz amoleceu num quase choro. – Sempre soube que não era boa o bastante, mas teria entendido se...

- Desculpe. – chorei. – Cai em uma armadilha. Caímos numa armadinha.

- Me diga que numa falou isso e juro que acredito em você. – limpou as lagrimas que escorriam desesperadamente por minha bochecha. – É o que mais quero: acreditar.

Senti a caricia já sabendo que era a ultima.

- Demi, eu... – fechou os olhos com força ao entender minha linha. – Demi, espere... por favor, desculpe...

Mas era tarde de mais. Ela saiu para a noite e a única coisa que ouvia era o eco continuo do estrondo raivoso da porta.

- Por favor... – continuei implorando aos sussurros quando cai no sofá, imaginando que ela ouviria e voltasse a me embalar nos braços protetores. – Preciso tanto de você, por favor, volte... volte para mim... por favor...