Diário de um Semideus 3 - A Última Filha escrita por H Lounie


Capítulo 4
O herói do carro vermelho




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Uma garota

Andei por entre o corredor de prédios, ainda sentia frio e a chuva batia forte em mim, marcando minha pele alva. Meus olhos vez por outra teimavam em fechar e mesmo que isso ocorresse em menos de um segundo, eu cambaleava, quase indo ao chão. Parecia que o sono queria me engolir novamente, algo ou alguém queria que eu voltasse a dormir.

Imagens vinham a minha mente a todo instante. Rostos de pessoas que acreditava não conhecer, mas que minha cabeça fazia parecer o contrário. Tinha o garoto loiro, o que tinha uma cicatriz no rosto e a garota que ele beijou, Thanea. Tinha um menino moreno de olhos verdes e uma menina loura com olhos assustadores, a voz me disse que eles eram o inimigo e que eles iam mentir para mim.

Meus pés estavam descalços e eu via meus dedos avermelhados com alguns arranhões, sangrando um pouco. As pontas dos dedos de minhas mãos estavam roxas, tamanho frio eu sentia. Eu vestia apenas algo que parecia um vestido, não, não era isso, era uma toga. Dois braceletes de ouro envolviam meus pulsos e eu tentada me livrar deles.

“Não”. Disse a voz fria em minha mente. “Considere isso um presente meu”.  Um presente? Que raios poderia ser um presente? Minha mente buscou por significados, porém não cheguei a resultado algum, apenas assimilei presente como sendo algo bom.

Continuei a andar até chegar a uma rua maior, onde havia pessoas andando. Algumas passavam por mim e me encaravam com olhares de censura, como se eu houvesse acabado de cometer um crime. Alguns corriam como se houvesse uma placa escrita “perigosa” pregada em mim.

As luzes me distraiam, eu não prestava mais atenção nas pessoas, apenas nas construções com fachada de vidro feita ali. Algo em mim não estava bem. Meu estômago revirava, parecendo prestes a se lançar para fora de mim. Virei- me para o lado e o cheiro que senti foi como um soco em meu estômago.

- Fome? – Disse baixinho. Minha voz soou fraca, mas ao mesmo tempo poderosa e bonita, completamente diferente das vozes alvoroçadas que eu tinha ouvido em todo caminho que percorri. Era a primeira vez que eu falava, a primeira vez que ouvi minha voz fora de minha mente.

- Olá. – Alguém tocou meus ombros. Meus reflexos gritaram para que me preparasse para o combate. – Você está bem?

Ao me virar me deparei com um homem moreno, bem mais alto do que eu, com uma voz rouca e alta. Ele vestia um sobretudo preto e estava debaixo de um guarda chuva. Por um momento eu apenas o encarei. Ele me estudava cauteloso, como se fosse sair correndo caso fosse necessário.

- Estou... estou bem. – Disse por fim, falando mais alto agora.

O homem pareceu surpreso. Ele ainda me encarava, seus olhos presos aos meus. Eu podia ver meu reflexo nos olhos verdes dele, eu parecia... bem, eu parecia molhada e assustada.

Então tudo começou a se mover lentamente. O vento, os carros nas ruas, as vozes das pessoas se tornaram um murmúrio indistinto. Meu choque foi grande quando percebi que quem estava fazendo aquilo era eu. A voz gargalhou em mim mente, rindo de meu desespero.

- Onde, onde estou? – Disse agarrando a camisa do homem e fazendo as coisas voltarem a se mover normalmente.

- Calma, você está em Manhattan, Nova York. Está com algum problema? O que você tem? – Ele arregalou os olhos assustado, querendo fugir de meu súbito ataque.

- Fome.

- O que?

- Você perguntou o que eu tenho, eu disse que tenho fome.

O homem sorriu, visivelmente relaxado agora. Pela sua expressão deduzi que ele interpretou que fome fosse meu único problema.

- Qual é seu nome? – Perguntou ele. – Vamos entrar aqui neste café, posso pagar algo para você. Deve ter tido um dia difícil. Está vindo de alguma festa à fantasia com o tema grego? – Ele riu.

- Festa? Eu não sei... – Me perdi nas palavras, eu nem mesmo sabia o que ele queria dizer. – Bom, meu nome é...

Ótimo, eu não sabia qual era meu nome.

- O que foi querida, esqueceu seu nome? – O homem riu mais uma vez.

“Daphne Adrastea”. Disse a voz em minha mente.  “O primeiro nome despertará o interesse do amaldiçoado, o segundo mostrará quem você realmente é. Sim, Adrastea, aquela de quem não se pode fugir”.

- Meu nome é Daphne. – Disse por fim, ocultando o Adrastea.

- Bonito nome. Agora vamos Daphne, você pode usar o banheiro para se secar e depois pode comer alguma coisa.

Segui o homem até estarmos dentro do café. Olhando de trás ele era o que se pode chamar de bonito, seus cabelos negros faziam um belo par com seus olhos verdes. Ele me indicou a porta do banheiro e foi sentar-se em uma das mesas.

Segui para o espaço com portas duplas que ele indicou, sentindo olhares nas minhas costas. Ao adentrar o locar, deparei- me com um enorme espelho. Confesso que fiquei satisfeita com minha aparência. Meus longos cabelos negros estavam molhados, mas nem isso parecia fazê-los ficar menos bonitos. Minha pele alva contrastava com eles. E meus olhos... Bem, eu não consegui descrever a cor deles, eram bonitos e brilhantes, mas ao mesmo tempo perturbadores. Havia toalhas de papel em um dos cantos de uma pia, porém não achei que seria bom secar meus cabelos com papel. Bati neles com as mãos até conseguir deixá-los arrumados, não estavam completamente secos, porém não pingavam mais.

- Senhorita. – Disse uma moça, entrando no banheiro. – O cavalheiro que está lhe acompanhando mandou que eu trouxesse isso a você.

Ela me entregou um sobretudo preto. O mesmo que o cara que havia me convidado para comer estava usando.

- Ah, isso é... obrigada?

A moça estranhou minha pergunta, o que me fez pensar se cometi algum erro. Ela sorriu e saiu pela porta. Usando algumas toalhas de papel, sequei meu corpo e tentei fazer com que a toga que eu usava parasse de pingar. Decidindo que era o suficiente, arrumei meus cabelos negros e saí do banheiro, procurando pela mesa onde o cara que havia me ajudado sentou.

- Ei, aí está você. – Disse ele.

- Obrigada pelo casaco. – Respondi meio sem jeito.

- Disponha. – Ele sorriu, um sorriso caloroso e calmo. – Tomei a liberdade de pedir um sanduíche para você e um suco.

- Está ótimo, obrigada.

Eu não sabia o que era um sanduíche, mas estava com tanta fome que acho que comeria qualquer coisa. Assim que nossos lanches chegaram, tratei logo de comer a parte que cabia a mim.

- Uau, você estava mesmo com fome. Quer pedir mais alguma coisa? – Disse ele.

- Não, não. Estou bem agora.

- Então, vai me contar o que fazia na chuva descalça e com uma toga grega? – Ele sorria de canto, como se estivesse querendo me provocar.

- Eu não sei, não lembro. Eu estava dormindo e aí acordei na chuva.

- Caramba, que história. Você deve ter bebido ou sei lá, batido com a cabeça. Quem sabe.

- É, quem sabe.

A maneira como o homem me olhava estava me dando medo. Algo me dizia para sair de perto dele o mais rápido que pudesse.

- Bem, eu agradeço pela comida e pelo casaco, mas já vou indo.

- Mas já? Não quer ficar mais? A chuva parou, podemos andar por aí. – Insistiu ele.

- Não, não. Eu tenho mesmo que ir. – Disse me levantando, já andando para a porta.

Como eu esperava, ele me seguiu para fora.

- Tem mesmo que ir? – Disse ele, me segurando pelo braço. – Acho que podemos nos divertir um pouco.

A maneira como ele falou aquilo me deixou enojada. Puxei meu braço e comecei a andar.

- Ei! Espere aí, você me deve uma!

Meu caminhar se tornou uma leve corrida, mas eu sabia que o homem logo me alcançaria. Juntando toda minha força, tentei fazer o tempo andar mais lento como antes, mas dessa vez pareceu não funcionar.

- Você não vai fugir de mim. - gritou o homem

Na mesma hora, um carro vermelho estacionou e um homem desceu. Não pude ver quem era porque já estava noite, mas o homem fez alguma coisa que fez o outro correr.

- Olá! – disse o recém chegado em uma voz melodiosa.

“Fuja Daphne. Fuja deste homem, ainda não é hora de conhecê-lo!” Disse a voz em minha mente. “Você sabe para onde ir. Long Island, a Colina. Conquiste-os, faça-os acreditar em você”

Na mesma hora corri, não sabia quem havia me salvado, mas também não queria descobrir.


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