O pequeno garoto, de cabelos negro e rosto desprovido de emoções, observava fascinado a vitrine da loja de brinquedos, a mais famosa da cidade. Entredia-se olhando as bolas quicando enquanto crianças de sua idade puxavam seus pais para pedir-lhes uma boneca ou um carrinho, via as cores brilhantes e os enfeites delicados da árvore de natal, grande e reluzente, com suas luzes piscando repetidamente.

-Vamos, otôuto!

O garotinho apenas virou a cabeça e assentiu, encarando o irmão mais velho, os pequenos olhos azul-marinho bem abertos, embora sua face continuasse inexpressiva e sua boca muda.

Os dois irmãos caminharam lado a lado, em um silêncio agradável e característico de sua família, vista pela maioria das pessoas como uma família imponente e fria, de poucas palavras e incisiva.

Atravessaram o parque, escutam as risadas e brincadeiras das crianças, ainda sem dizer nada, apesar de serem próximos.

-Não quer brincar com as outras crianças otôuto?

-Não.

Quieto e inexpressivo, o garoto era conhecido por nunca sorrir ou chorar, sequer demostrando uma simples reação, mesmo junto de sua família e poucos amigos, o garoto continuava com seu jeito fechado e impenetrável, sendo impossível descobrir se estava alegre ou triste, independente da situação.

O mais velho olhou tristemente para o pequeno, logo fechando os olhos negros ao sentir o vento bater em seu rosto, mexendo levemente seu cabelo de mesma cor, atados por uma fita vermelha em um longo rabo.

-Chegaram bem a tempo! O jantar vai será servido daqui a pouco, seu pai terá uma reunião hoje, então não poderá ficar muito em casa.- A mãe dos dois cumprimentou-os logo que entraram em casa, o mais velho dirigindo-se a cozinha para ajudar a mãe com o jantar.

-Okâ-san, Nii-san, vou para o meu quarto. -O pequeno garoto pronunciou-se, avisando onde iria estar.

-Hai.

O garotinho sentou-se no chão junto ao seus brinquedos, montando um grande castelo de legos enquanto esperava pelo jantar, silencioso e discreto.

Algumas horas após o jantar, o garoto dormia calmamente em sua cama. Na semana que se seguiria, seria natal, mas aquilo de nada lhe importava, não via sentido em tais comemorações e festas, assim como não entendia os sentimentos e sorrisos que todos apresentavam nessa época, sendo algo que para ele não tinha sentido ou motivo, afinal, era apenas um dia. Ou isso ele pensava.

***

Os pais e o irmão mais velho discutiam na sala a respeito do menor, tentando em vão achar uma resposta para o garoto não demonstrar emoções ou falar, apesar de que todos naquela família eram sempre quietos e misteriosos, aquele garotinho de olhos azuis marinho superava a todos. Perguntavam-se como uma criança poderia isolar-se daquela forma, ou ficar sem sorrir ou chorrar apesar dos mais alegres momentos e dos machucados mais sérios. A voz sempre inexpressiva e calma, como se nada pudesse alcançar sua alma e sempre envolto em uma redoma de vidro, inquebrável e segura, a qual nem ele mesmo conseguia transpassar.

A mãe, preocupava-se com o menino, achando que o mesmo estava perdendo sua infância, o pai, incerto sobre tudo, achava que era apenas a personalidade do garoto, e o irmão, o único que realmente entendia o pequeno, pensava em como fazer-lhe entender o que eram sentimentos.

Envoltos em seus pensamentos, nem perceberam o suave andar do garoto, que percorria calmamente o corredor, abrindo as portas com delicadeza, dirigindo-se a cozinha, pegar um copo d'água, sonolento, e , ainda assim, inexpressivo e envolto por sua redoma de vidro, como algo valioso que precisava ser protegido do mundo e bem guardado, embora tentassem liberta-lo de uma prisão imaginária, em que o nada e tudo coexistiam.