Com tantos pensamentos acabei pegando no sono, mas isso já era quase no amanhecer. Eu dormi vendo o sol nascer, seria hoje que se tudo desse errado eu iria virar comida de índio.

Acordei pelo que me pareceu alguns minutos depois com alguém me saculejando, era Taluca, ela me avisou que estava indo atrás do Justin. Me sentei na mesa onde estava e o descrevi, mas a todo momento eu ficava olhando Taluca e seus trajes.

Ela usava a mesma mini saia de ontem, um top mais decente desta vez, seus olhos estavam pintados de vermelho, seu rosto cheio de atitude. Atrás em suas costas havia um arco e flecha, ela estava descalça no chão e tinha uma tornozeleira de pedrinhas, ela usava vários cordões de tiras finas e uma gargantilha com uma concha furada, ela estava bonita demais pra procurar o Justin, mas nada comentei. E do jeito que eu conhecia o Justin, ele ficaria todo excitado só por ver uma indiazinha sexy vestida nos devidos trajes.

O cabelo de Taluca estava preso na mesma trança de ontem, um pouco bagunçado mais parecia perfeito pro formato do seu rosto. Havia duas tiras de tinta preta ao redor de seus braços, como todo índio tem e parecia determinada a me ajudar e eu só tinha que agradecer a ela e não ficar pensando no que Justin ia achar dela.

Depois que ela foi em sua missão, eu voltei a me deitar. Mas logo índios me acordaram e me levaram para um banho de água morna. Até que eu gostei do meu tratamento, depois recebi massagens de velhas com pele caídas e me deixaram dormir por um longo tempo, eu estava me sentindo ótima.

No almoço eles me convidaram pra comer carne de jabutí que no início achei bastante estranho, mas depois que provei até que gostei.

Eu estava assustada com a tribo, era a primeira vez que eu tinha contato com eles ao lado de fora. Havia caveras para todos os lados, caveiras humanas. Até os homens estavam nus, só os adolescentes - meninas e meninos - andavam de trajes iguais aos de Taluca.

Comi a carne do jabutí e depois as índias me guiaram pra dentro e me deixaram sozinha na toca pensando. Até agora Taluca não tinha voltado, pra Justin não ter me achado ainda talvez a tribo fosse bem afastada da ilha, afastada tanto que quando eu e ele exploramos a ilha nem tínhamos achado aquela união de índios apavorantes.

Fiquei pensando e pensando, meus pensamentos iam de mal a pior, será que eles não chegariam a tempo?! Será que ela já tinha encontrado ele?! Será que eles tinham tirado um tempinho pra...

– Ah, cale-se Sophia.. - eu me torturei baixo.

Lá de fora eu já via os preparativos, eles estavam colocando esqueletos por todas as partes, já montavam a fogueira e eu sabia que seria presa ali até cozinhar e encontrar a morte. Comecei a andar de um lado pro outro angustiada, a noite estava descendo. Cadê a Taluca e o Justin?! Meu Deus, eu iria morrer da pior forma possível.

Quando o sol se pôs, duas índias vieram me buscar, eu dei passos pra trás.. tinha medo do que elas poderiam fazer mas elas me seguraram com força e me levaram pra tenda ao lado. Lá eles me colocaram uma espécie de vestido branco até os pés, como uma deusa grega.

Era um branco liso e muito bonito, pentearam meu cabelo pra trás e prenderam com uma espécie de pregadeira que possuía uma flor de verdade, passaram em meu rosto uma tinta leve como se fosse maquiagem e mostraram meu rosto em um pequeno espelho redondo de bolsa. Eu estava linda, parecia que ia me casar.

Não me sentia tão bem quando estava arrumada, desde quando me entendo por gente, mas eu nunca estive tão bonita daquele jeito. Meu cabelo parecia mais tratado e bem bonito, minha pele estava mais jovem e minha expressão triste era o que estragava tudo. Eles estavão me arrumando pra minha morte.

A noite finalmente chegou e eu sentia meu coração se torturar, eu não queria andar para onde as índias estavam me levando, mas eu não tinha muita opção. Elas me empurraram para o meio dos índios que já estavam todos juntos e reunidos ao redor da fogueira, era em torno de uns trinta, todos sorridentes olhando as labaredas de fogo queimarem sem pena.

Dois dos índios se aproximaram, me pegaram pelo braço e me levaram a um tronco. Lá eles me amarraram com tanta força que eu cheguei a gritar, eu estava com raiva dentro de mim. Lutei contra piratas, tubarão e tudo mais, pra ser morta agora por índios?!

Meu grito ecoou por toda a floresta, desta vez os pássaros voaram assustados de medo, mas com certeza não com mais medo do que eu. Eles tomaram o tronco nos ombros e eu fiquei deitada sobre o tronco como um churrasco no espetinho, eles colocaram o tronco em que eu estava amarrada deitado sobre dois grandes suportes e embaixo de mim havia muita palha onde eles acenderiam o fogo.

Eu fechei meus olhos e levei meus pensamentos a Deus, prometi por tudo o que era sagrado, prometi até em nome da minha cadela que morreu a anos em um atropelamento, eu tinha que me livrar daquela, eu não poderia morrer.

Foi aí que ouvi palmas de todos os índios, senti o calor subir. Eles já tinham acendido a lenha, o fogo estava subindo, as labaredas ainda eram pequenas, mas logo alcançariam a calda do meu vestido que era longa. Aqueles filhos de uma égua tinham me vestido com aquele pano longo pra eu queimar mais rápido.

Uma lágrima rolou dos meus olhos, não haveria mais jeito. Eu sentia minha testa soar, minhas costas arderem, eu sabia que o fogo já estava me alcançando. O que você pensa em uma hora dessas? Sabendo que em minutos você vai morrer e ninguém vai chorar sobre seu corpo, somente índios que vão te saborear como se você fosse um peixe capturado?!

Meu último pensamento poderia ter sido em meus pais, em minha cachorra, nas poucas amigas que eu fiz e que hoje deixei pra trás, nos estudos. Poderia ter pensado na infeliz da diretora que me expulsou da escola, poderia ter pensado até mesmo no presidente do meu país que nada estava fazendo pra alimentar os pobres, poderia pensar nos meus planos pro futuro e que agora seriam interrompidos... mas o meu pensamento foi no Justin.

Foi em tudo que passamos até alí. Foi quando eu salvei ele do tubarão, quando nos escondemos juntos do pirata Oscaliz, quando fomos seqüestrados por piratas, quando lutamos contra eles, quando nadamos juntos, quando nos beijamos, quando ouvi ele dizer que não se interessava por mim.

Lembrei das nossas ''brincadeiras'', das risadas, do desespero dele quando eu passei mal e por fim, quando senti já o fogo queimando minhas costas eu lembrei do seu sorriso, o sorriso de Justin me deu forças e esqueci até que embaixo de mim as labaredas lambiam minhas costas.

O sorriso dele foi a maior recompensa desde que eu tinha chegado ali, era tão difícil fazê-lo sorrir e eu consegui fazê-lo feliz, tinha valido a pena cada minuto com ele, eu não tinha dúvidas disso.

Meu rosto estava úmido de lágrimas, na verdade eu nem tinha reparado que tinha chorado tanto assim, eu olhei pros lados e vi os índios pulando, estavam felizes.

Eu praguejei baixinho para cada um deles, a calda do meu vestido já pegava fogo e eu não me importava, eu queria fechar os olhos e ficar com o sorriso do Justin na cabeça, mas a dor que o fogo fazia em minhas costas me tirava qualquer pensamento.