Ela saia todo dia as 7h da manhã, tirava a moto da garagem ainda com sua calça xadrez rosa do seu pijama, e uma blusa baby look branca, com o cabelo preso por uma caneta que tinha o formato do Mickey na ponta que fazia com que as ondas de seu cabelo ficassem caídas e sua nuca a amostra,  empurrava a moto de ré até o outro lado da rua para que sua mãe pudesse tirar o carro para ir trabalhar.  Assim que o Fiat Punto vermelho saia da garagem, ela ligava e moto, voltava para a garagem, fechava o portão e meus devaneios acabavam. Eu observava tudo pela janela do meu quarto que dava para rua.

      Eu conhecia ela, desde de pequena, morávamos na mesma rua sempre na mesma casa, só não éramos o que podemos chamar de amigas, pelo menos não mais. Shannon, era o nome dela, mas todo mundo chamava ela de Shay, inclusive eu, claro! Assim que ela entrava, eu saia e ia para a escola. Não eu não estudo mais, mas minha mãe é dona de uma, e eu trabalho lá pra ela. A propósito eu me chamo Sasha.

     Isso acontecia todo dia, eu sempre via ela, mas de uns tempos pra cá ela tem saído mais tarde, na primeira vez que ela saiu um pouco mais tarde, achei que eu estivesse atrasada e ela já tivesse voltado para dentro de casa. Me arrumei muito rápido nesse dia, quando cheguei na cozinha olhei para o relógio, ainda eram 7:05 da manhã, imaginei vários motivos pra ela ter saído mais cedo mas não imaginei que ela ainda não tivesse saído até escutar o ronco do motor da moto dela, corri para a porta e dei de cara com a nuca dela. Shay olhou para traz para me ver, deve ter se assustado com o barulho do portão da minha casa, ele sempre faz muito barulho e eu abri rápido demais, o carro da mãe dela já havia sumido e ela ainda estava ali.  Ela sorriu, de um jeito torto que eu adorava.

     - Bom dia! – Me derreti toda.

     - Bom dia! – retribui o sorriso. E comecei a descer a rua. Escutei ela acelerar a moto,olhei para traz e a vi entrar de volta na garagem. Gente sério,era uma cena linda ela montada naquela moto enorme .

  Depois que eu via ela pela manhã eu só a via de tarde um pouco depois da hora do almoço ou entre 16:30 e 17:30. Se eu tivesse sorte eu via nos dois horários. Ela era fera em matemática, e quando fazíamos o ginásio, ela me ajudava muito com essa matéria infeliz, e as vezes,dependendo do problema ela concerta meu computador, não só o meu mas o de outras pessoas também, uma vez eu soltei uns fios de propósito só para ela vir aqui em casa.

     - Não deve ter sido nada de mais, você tem uma chave de fenda pra eu abrira CPU aqui?

     - Espera um pouco. – Tratei logo de arranjar uma na caixa de ferramentas que minha mãe mantinha por precaução. – Tá aqui ó. –A mão dela tocou a minha quando ela pegou a ferramenta, eu fiquei vermelha.

     - Ah são só alguns fios soltos, mas não sei como eles se soltaram. – Acho que ela sabe que eu fiz de propósito.

     - Hum...

     - Talvez você devesse limpar aqui dentro, ta com bastante poeira e isso pode te causar problemas. Se quiser, eu levo ele lá pra casa e trago quando ele tiver brilhando de limpo.

     - Isso demora? – Shay, sempre foi assim, tão prestativa, o que você precisasse era só falar com ela, ela dava um jeito de arrumar.

     - Amanhã no fim da tarde acho que já posso te devolver Sasha.

     - Então tudo bem.  – No outro dia antes do fim da tarde ela devolveu a CPU, o que eu tinha feito tinha rendido duas visitas de Shay ao meu quarto.

     Eram poucas as vezes que agente se via,  sem contar com as vezes de manhã quando eu saia e ela ainda estava do lado de fora. Uma vez teve uma festa na casa de uma garota que morava na rua de baixo, eu e ela ficamos rindo das pessoas, sentadas no sofá, ela tinha uma risada engraçada que me fazia rir.

     Todo mundo sabia que ela era gay, e ninguém a tratava diferente por isso, mas eu já vi ela pegar briga com um garoto que tinha chamado ela de “Sapatão” na faculdade, ah esqueci de mencionar, nos estudamos na mesma faculdade mas são cursos diferentes então não nos vemos muito por lá. Continuando, o menino chamou ela desse pseudônimo  horroroso, ela se irritou e partiu pra cima dele, não era a primeira vez que ele fazia isso, o garoto saio todo arranhando e chegou no outro dia com uns hematomas no braço e os arranhões na cara. Se eu não tivesse tirado ela de cima dele, pode ter certeza que ela teria pelo menos quebrado um braço dele,  eu só tirei porque sabia que o coordenador do curso deles nãos estava longe e logo apareceria por ali.

     Foi a primeira vez que tivemos uma conversa de verdade. Depois da briga a levei, na verdade eu arrastei para o outro lado do campus onde praticamente ninguém ia. Ela ficou calada por um bom tempo, poucas lágrimas escorreram pelo seu rosto.

     - Eu sei, que escutar aquilo deve ter sido difícil,mas você não podia ter partido pra cima dele daquele jeito Shay. Apesar de que achar que ele merecia .-ela soltou um riso leve.

    - Não você não sabe Sasha. Pouquíssimas pessoas me tratam assim, quando alguém trata, é alguém que provavelmente já mais verei.

     - Mas ele você vê todo dia.

    - É. E ele precisa se tocar que ele não é de uma raça melhor, não existem raças. – ela bufou de raiva.

     - Está tudo bem agora, acho que ele aprendeu. Apanhar de uma mulher deve ser tão constrangedor para um homem. – riu alto, eu a abracei, ela retribuiu o abraço e me beijou na bochecha eu não me contei claro, quando ela ameaçou sair eu a puxei pelo braço e beijei sua boca. Ela pareceu assustada.

     - Não é ma boa hora.  – ela beijou minha testa e saiu.

     Não assisti o restante da aulas, fiquei lá parada estática, feliz por finalmente tê-la beijado, e triste muito triste por ela ter me rejeitado.  Voltei pra casa e fiquei sentada na soleira fingindo ler algum livro, já estava tarde e eu deveria estar dentro de casa provavelmente dormindo, mas nossa rua era segura, e enfim, não estava a fim. Ela chegou e parou a moto na frente da sua casa, desceu e me viu na soleira, veio até mim.

     - Temos que conversar? – ela sentou no batente.

     - Não precisa se não quiser – ela me chamou para sentar ao seu lado com o olhar e um aceno de cabeça, eu fui.

    - Você tá bem? – ela pareceu preocupada.

    - Eu pareço bem? – falei ríspida. Ela ficou calada. – Shay,  eu gosto de você, eu realmente gosto de você.

     - Eu sei.

     - Você sabe? – Ok eu me assustei nessa hora, achei que eu fosse bem discreta.

     - Você acha que, eu não percebi? Eu te vejo na janela todo dia, eu sei que você tirou os fios de propósito, o jeito que você fica vermelha quando eu sorriu pra você, acho que você gosta do meu sorriso torto, ele faz você ficar vermelha mais rápido, e o jeito como você ficou hoje depois que você me beijou, acha que eu não perceberia, serio? – eu ri na verdade era bem óbvio sim. – Olha, eu gosto de você, você é como uma irmã pra mim, um pouco distante mas é. Nos conhecemos desde pequena e....Sasha, eu e você, nunca vai acontecer.

     - Por que? – eu perguntei com as lagrimas saindo de meu olhos mesmo sem eu querer.

    - eu posso fazer uma lista se você quiser. – fiquei calada esperando a lista de motivos. – Sabe a Ashley, Ashley Benson?

     - Da faculdade?

     - Ela é minha namorada – fiquei chocada – E você, você não é gay Sasha, você precisa entender o que sente. – Agora eu fiquei confusa, e ela percebeu. – O jeito que você me olha, não é o jeito que uma menina interessada em outra olha, você me olha com admiração, com afeição, com amor, amor de irmã de amiga, não com o olhar de “te desejo” sabe?

     - Na verdade não.

     - Olha, eu sou gay, eu sei que sou gay, porque desde que me entendo por gente, eu me sinto muito mais atraída por mulheres. Sasha quantos namorados você já teve?

     - Uns 3.

     - E namoradas? – fiquei calada estava começando a achar que ela tinha razão. – Viu, você só me acha bonita e quer se aproximar mais de mim, coisa que eu também quero, eu lembro dos tempos em que eu e você corríamos por ai de bicicleta, e eu sinto saudade.

     - Desculpe, talvez você tenha razão e devo estar confundindo mas e se não estiver?

     - Ai você vem e conversa comigo, sair beijando as pessoas desse jeito não é muito educado Sasha. – eu ri, ela tinha razão.

     - desculpa.

     - Amigas de novo?

     - É. – Abaixei a cabeça envergonhada.- Obrigada, você pode ter quebrado meu coração sabia?

     - Skitles? – ela falou rindo.

     Ela tinha razão. Ela não havia quebrado meu coração, eu apenas sentia falta da minha Shay, aquela que sempre tinha Skitles para me dar quando eu estava triste. Eu agarrei o braço e encostei minha cabeça em seu ombro, pegando alguns skitles do saquinho.

     - Eu não faço seu tipo? Você tem um tipo?

     - Ah, qual é!! – ela se levantou e voltou para sua casa do outro lado da rua.

    - O que? Você tem que me dizer, você é minha amiga ou não? – eu também havia me levantado.

     - Cala a boca Sasha! – ela montou em sua moto e sumiu na escuridão de sua garagem.

     Nos estávamos de volta.