Sobre A Pele escrita por Selena West


Capítulo 2
Reflexos


Notas iniciais do capítulo

hm... dois capitulos em um único dia, agora só semana que vem e com reviwes.



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Alice estreitou os olhos para o espelho do mesmo modo que Viola, a garota mais popular da escola, fazia para os garotos. Eles pareciam gostar quando Viola fazia isso, Alice parecia fazer uma careta de dor quando tentava o mesmo. Ela queria ser como Viola. Todos na escola queriam ser amigos de Viola, ela era descolada e legal.

Observou a garota de bochechas grandes e cara de dor refletida no grande espelho. Não importava o quanto Alice emagrecesse, suas bochechas ainda estavam lá. Eram redondas como de uma criança. Ali as odiava. Amarrou os cabelos loiros com um elástico. Virou a cabeça em ângulo engraçado e o soltou novamente.

Nem mesmo assim, pensou Alice sobre sua aparência com o cabelo amarrado.

Alice apoiou as mãos na beirada da pia e aproximou o rosto do espelho. Encarou a loira de grandes olhos azuis do outro lado. Admirou o perfil direito que em sua opinião era o melhor. Aproximou-se e deu um beijo rápido no próprio reflexo. Ela não tinha realmente beijado um garoto ainda. Na quarta série alguns meninos da sua classe apostaram que Alice não beijava Davide. Ela aceitou o desafio, afinal ele não era tão mal assim. Foi um beijo estranho. O suficiente para declarar ela como vencedora da aposta. Aquele foi seu único beijo, fora um selinho em um primo no aniversário da tia avó no ano retrasado.

Alice deu uma baforada no espelho que ficou embaçado e escreveu “idiota” com o dedo, era como ela se sentia ali olhando pra si mesma durante horas.

Seu cabelo estava quase na altura da cintura. Alice puxou algumas mechas para frente do rosto, daquele modo parecia uma garota de filme de terror. Com um movimento automático colocou os cabelos atrás das orelhas. Uma voz conhecida a chamou do lado de fora do banheiro.

“ Alice, o jantar está na mesa” seu pai chamou.

Ela continuou parada olhando para o nada enquanto seu pai batia na porta do banheiro.

“Está me escutando?” ele perguntou.

“Já ouvi.” Alice suspirou. “To indo.”

Prendeu novamente o cabelo e saiu do banheiro. Seu pai já estava na metade do corredor. Alice não gostava muito dele, sempre se perguntava por que sua mãe casou com seu pai. Para ela era possível imaginar alguém amando um ser tão detestável.

Soledad servia os pratos com a sopa do jantar. A mesa estava silenciosa ninguém sentia vontade de falar. A mãe de Alice olhava para o marido e a filha como se esperasse que algum deles disesse algo. Alice mexia no prato sem comer nada. Ela levantou os olhos e suspirou, iria quebrar o silencio.

“ Vou fazer uma tatuagem.” Disse como se fosse à esquina.

“Não vai. Não deixarei você fazer uma tatuagem.” O pai de Alice continuou jantando.

“Ninguém vai me impedir!”

Hector olhou a filha como se ela fosse uma criança mimada e sorriu sarcasticamente.

“ Não vai fazer tatuagem alguma. Enquanto você não tiver dezoito anos ainda precisará de uma autorização para uma coisa dessas. E eu garanto que não a darei.”

“O que você quer tatuar minha querida?” Perguntou Fernanda à filha.

“Uma borboleta azul” Hector bufou e se afundou na cadeira.

“Não dê bola para as loucuras de sua filha Fernanda!”

Alice bateu com o garfo na mesa.

“ Por favor, respeitem o jantar.” Fernanda pediu para o marido e a filha.

“ Você já não está feliz pelas marcas que deixou em mim pelo resto da vida? Quer estragá-la mais um pouco?” 

O advogado abaixou a cabeça e cobriu os olhos com a mão. Respirou fundo e decidiu terminar a discussão se levantando da mesa.

“Oh Alice.” Disse a mãe da garota sem saber como agir.

Alice sabia que o acidente era um tema difícil para o seu pai. Ela queria atingir o seu ponto fraco. Hector se trancou em seu escritório, seu território sagrado. Fernanda repreendeu a filha que apenas a ignorou e continuou fingindo que estava comendo.

Depois do jantar Alice foi para o seu quarto. Ficou pensando enquanto ligava e desligava a luz do abajur. As cenas do acidente de carro não eram muito nítidas. Alice tinha nove anos, estava sentada no banco de trás do carro. Era natal, o seu pai havia bebido além da conta. O carro fazia um zigue-zague irregular na pista. A únicas coisas que Alice se lembra são os faróis do caminhão se aproximando e a dor horrível nas costas. A garota tinha sido arremessada para fora do carro que capotou até  o acostamento. Até hoje as costas de Alice guardam as marcas daquela noite.

No fundo a garota sabia que a culpa era do caminhão que bateu no carro, porém o ódio que Alice sentia por seu pai era nutrido desde sempre. Não importava o que dissessem a culpa seria dele. Hector era muito controlador coma filha, nunca a deixava decidir sozinha o que ela queria. Isso irritava profundamente Alice, que não via a hora de sair daquela casa.

Fernanda não se intrometia na briga de pai e filha, para ela era mais fácil ignorar o fato de que eles não se davam bem. A mulher passou na frente do quarto da filha, a luz piscava. Olhou pela fresta da porta Alice ligando e desligando o abajur, não se atreveu a entrar. Fechou a porta e partiu para seu quarto. Sentia vontade de beijar o topo da cabeça da filha e lhe dizer que tudo ficaria bem.


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