O Vento E A Chama escrita por Jewel


Capítulo 10
VISITAS (IN)ESPERADAS




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Acordei sonolenta, com a sensação de ter tido um sonho bom, embora tenha me parecido que só fechara os olhos e já era dia.

Olhei para o relógio. Pouco mais de 8 horas. Comecei a me espreguiçar, parando no meio do ato. “O que o MinSuk disse mesmo? Que viria cedo?”. Saltei da cama e corri para o banheiro.

Tentei me arrumar depressa, mas, pela primeira vez em muito tempo, estava indecisa sobre o que vestir. Parti da premissa de que ele já tinha me visto de tudo quanto é jeito, assim, não haveria muito o que melhorar. O dia estava ensolarado, então decidi usar um vestido leve, este ainda inédito em Chicago.

Desci e vi que as meninas ainda dormiam. Comecei a preparar o café da manhã, sentindo-me muito bem disposta para cozinhar. No meio de meus afazeres olhei par ao relógio. 9 da manhã. “Bem, talvez não tão cedo assim...”, suspirei. Foi aí que a ficha começou a cair. Lá estava eu, toda arrumadinha, suspirando por um garoto que tinha a idade do meu irmão caçula! Senti-me envergonhada. Olhei ao redor, tentando achar sentido naquilo tudo. “Caminho errado a tomar, Ju.” – meu grilinho falante do bom senso resolveu se pronunciar.

– Como eu sou ridícula... – constatei.

Tirei o avental e comecei a me dirigir para meu quarto, a fim trocar de roupas. Mal coloquei o pé no primeiro degrau, a campainha tocou. Hesitei por um instante, com a mão no corrimão. Depois dei de ombros e fui atender.

Abri a porta e o tempo parou. Por um instante, foi como se eu perdesse os sentidos, sem desmaiar. Meus olhos se arregalaram e eu arfei. Lentamente tudo foi voltando, e comecei a sentir a pressão de meus dedos na porta.

– Bom dia, Ju! – a voz de MinSuk soava zombeteira.

Claro que ele estava se divertindo. Todos eles me olhavam num misto de divertimento e curiosidade.

– Oh my...! – foi tudo o que consegui dizer e comecei a rir, incrédula.

Eles sorriram de volta e eu ri ainda mais.

– E aí? A gente pode entrar? – disse MinSuk.

– Claro! Por favor!

Saí um pouco do caminho enquanto KinKyu, Bae, YoungTae e JungHo entravam em minha casa seguidos por MinSuk. Fechei a porta e encostei-me nela, observando-os.

YoungTae parou pouco depois de entrar, Jung também. Bae e JinKyu eram os mais curiosos e olhavam ao redor. MinSuk parou em minha frente e começou a rir. Apertei meus lábios, tentando tirar o sorriso bobo que com certeza estava ali, mas era difícil.

– Você devia ter me avisado... – disse-lhe, sorrindo.

– Achei que você ia gostar da surpresa! – disse ele, piscando.

Nesse momento reparei que todos estavam olhando para nós e me senti sem jeito. O que se deve fazer quando rapazes lindos e que você admira batem à sua porta?

– Não precisa ficar tímida... – incentivou ele.

Eu não estava tímida, só não sabia o que fazer, e normalmente quando isso acontecia, sempre acabava fazendo coisas estúpidas. Resolvi ser cautelosa.

– Annyŏnghaseyo! – disse-lhes.

– Annyŏnghaseyo! – responderam eles, quase juntos.

– Ok, quem fala inglês? – perguntei, observando as mãos de todos levantarem, embora a de YoungTae mais timidamente. – Ótimo! Porque aquilo é todo o coreano que eu sei!

Eles riram.

– Então... vocês vieram conhecer Chicago?

– Sim. – respondeu-me JinKyu. – Aproveitamos que tivemos uma folga e viemos conhecer a cidade.

– Fazer algumas compras... – acrescentou Bae.

– E ver o que o MinSuk anda aprontando! – disse JungHo, fazendo todos rirem.

MinSuk ria balançando a cabeça. A felicidade de ter seus hyungs por perto estava estampada em seu rosto.

– É.. então vocês vão ter muita coisa para ver! – brinquei. – Eu não quero dar uma de fã.. mas eu estou muito feliz por tê-los aqui.

– Nós também estamos felizes por conhecê-la. – sorriu-me JungHo.

Sorri em retorno, passando meus olhos em cada um deles, só então começando a acreditar que aquilo estava realmente acontecendo.

– Quando vocês chegaram?

– Ontem a noite fui pegá-los no aeroporto. Eram eles que estavam me ligando. – MinSuk riu ao comentar.

Eu, pelo contrário, fiquei muito sem graça.

– E de pé tão cedo? Nem devem ter tomado café da manhã... Venham, eu preparo algo para vocês.

– Nós não queremos incomodar... – disse JinKyu, sua voz suave.

– Imagina! Eu estava mesmo preparada... MinSuk disse que viria cedo, então preparei um caminhão de comida, porque, vocês sabem, né?

– Sim. Ele come muito... principalmente de manhã. – confirmou YoungTae, rindo.

Seguimos para cozinha e eles se sentaram enquanto MinSuk e eu terminávamos de preparar as coisas.

– Então.. o que vocês pretendem fazer em Chicago?

– Bom, a gente não se planejou... viemos de surpresa... – disse JungHo.

– E que surpresa! – riu MinSuk, batendo os ovos.

– A gente nem procurou o que tem para ver aqui... – Bae dizia,virando os olhos.

– A verdade é que nós não estamos acostumados com esse negócio de ‘tirar férias’. – resumiu JinKyu.

– Eu imagino... – sorri, de costas para eles, fritando os mexidos.

– Nós nem temos tanto tempo assim... – continuou JinKyu. – Acho que vamos ficar só uma semana.

– Só? – me virei, a tristeza e desapontamento em meu semblante. MinSuk me olhou de um jeito estranho e me recompus rapidamente. – É impossível conhecer Chicago em tão pouco tempo... há tanto a ver! Não é, MinSuk?

– É... – confirmou ele, baixando a cabeça e concentrando-se novamente na tigela de ovos.

– Mesmo que seja por pouco tempo, está ótimo! – sorriu Bae.

– O MinSuk falou tanto, que a gente precisava vir... – riu JungHo, de um jeito que me intrigou.

– Coitado do MinSuk...! Só estuda! – estranhei, colocando a tigela na mesa para começarmos a comer.

– Só estuda? – a voz de Bae estava repleta de incredulidade. – Tem certeza?

– Eu estou me esforçando aqui! – se defendeu MinSuk.

– Porque você precisa ver... – continuou Bae, sem ouvi-lo. – Em casa, é uma lástima! E na época da escola então...!

– Sério? – franzi o cenho, e olhei para MinSuk. Ele segurava o riso. – E aqui você é um nerd!

– Eu estou me esforçando para aproveitar ao máximo o curso. Só isso.

– E você tem aulas de manhã? – Bae continuou molestando-o.

– Todo dia. – MinSuk riu e confirmou com a cabeça.

– E está conseguindo acordar cedo? – JinKyu arregalou os olhos ao perguntar.

– Ah! Agora é um complô, então? – foi a vez de MinSuk arregalar os olhos.

– Nós precisamos dizer a ela a verdade sobre você! – brincou Bae.

YoungTae só ria.

– Não. – JungHo fingiu ficar sério. – Verdade seja dita: tudo que MinSuk se dispõe a fazer, faz bem, então se ele tem que acordar cedo, ele o faz.

– Você defendendo o MinSuk? Algo com certeza está errado aqui. – zombou Bae.

Eu ria com cuidado para não me engasgar, quando vi Jane e Mayreen na porta da cozinha. Jane sorria animada enquanto Mayreen mantinha os olhos arregalados, sem saber se deveria entrar ou não.

– Bom dia meninas! Temos companhia para o café!

Todos os Gothee, com exceção de MinSuk, se levantaram.

– Bom dia! – disse Jane ao entrar, seguida de Mayreen que apenas sorriu acanhada e cumprimentou-os curvando um pouco a cabeça.

– Deixe-me apresentá-los: essas são Jane e Mayreen. Meninas esses são: JungHo, JinKyu, Bae e YoungTae. – “Mas acho que isso vocês já sabiam...”, pensei, sem graça.

– Muito prazer. – sorriu Jane.

– O prazer é nosso em conhecê-las. – curvou-se ligeiramente JungHo.

– Ok. Mais ovos... MinSuk? – disse, me levantando.

– Tudo eu! – brincou ele.

Jane e Mayreen sentaram-se entre Jung e YoungTae. Após um momento inicial de timidez, que era tudo o que Jane conseguia se aguentar, logo estavam conversando.

Quando todos terminaram, comecei a colocar os pratos na pia. Fui para me virar e MinSuk estava atrás de mim. Arrepiei-me com sua proximidade.

– Vou levá-los para conhecer a cidade... – disse-me, colocando alguns pratos na pia. – Você quer vir com a gente?

– Posso? – sorri, animada.

– Sim, por favor, venha! – era a voz de Bae, se aproximando. – MinSuk não é um guia turístico muito bom... – piscou ele.

MinSuk arfou, fingindo se ofender e voltou para a mesa, para pegar mais alguns pratos.

– Ok. Vou só trocar de roupas.

Bae sorriu, feliz por eu ter aceitado. O sorriso dele era tão franco e amistoso...

– Bae, posso fazer uma coisa? – perguntei, sem pensar.

Ele apertou os olhos e franziu a testa, com uma expressão curiosa.

– Ok... – disse.

Mordi o lábio, sem jeito. Então estendi minha mão, tocando seu rosto. Eu sempre achara o rosto de Bae belo, tão belo que eu sempre quis tocá-lo para ver que era de verdade. Deslizei meus dedos, tocando toda sua face, com muito carinho. Ele sorriu de lado e corou um pouco.

– Sempre quis fazer isso, Bae... – sorri-lhe, recolhendo minha mão. – Obrigada.

– Eu que agradeço... – disse ele, sem jeito, colocando a mão onde eu tinha acariciado.

Deixei-os e segui para meu quarto. Shorts, blusinha e tênis. “Pronta para um dia de turista!”, constatei ao me ver no espelho. Enquanto arrumava minha bolsa Jane entrou, desolada.

– Eu não posso ir... – disse-me. – Eu tenho uma dissertação para acabar...! – sua voz chorosa.

– Ah... mas quanto falta?

– Falta... começar. – confessou.

Fiz uma careta.

– Mayreen?

– Ela não quer ir. Inventou uma desculpa, mas eu sei que ela está sem graça.

– Bom... Lucia está na casa da amiga, então fazer o que? Gothee só para mim! – sorri.

– Egoísta!

– Egoísta, eu? Quem manda deixar tudo para última hora?! – puxei-lhe a orelha.

– Desculpa, mamãe! – zombou ela, mas pude ver que realmente estava chateada por não ir.


Seguimos para downtown de metrô.

– O que vamos fazer primeiro? – perguntou Bae.

– Não sei... – respondeu de atravessado MinSuk. – Pergunta para sua guia!

Todos rimos, inclusive ele. Em seguida, estanquei, pois eles realmente olharam para mim, esperando por uma resposta.

– Que tal um primeiro dia de turista? – sugeri.

Eles assentiram e sorriram.

Chegando ao centro, nos encaminhamos para uma estação de turistas e pegamos um ônibus double decker que estava prestes a sair. Como entramos por último, ficamos meio dispersados, de modo que sentei-me com JungHo na frente, enquanto os outros foram mais para trás. Eu já tinha feito aquele passeio com Jane, então sabia tudo o que o guia estava dizendo, mas tentei não conversar muito com JungHo para que ele pudesse prestar atenção. Pelo menos eu achei que era isso que ele queria. Mal saímos ele já começou a me encher de perguntas. De onde eu era, o que fazia, quanto tempo eu ainda ficaria em Chicago... claro que o fazia tão educadamente quanto MinSuk, porém de uma maneira mais direta – aquilo me assustou no começo, mas depois percebi que aquele era o jeito de JungHo, mesmo com os outros e até com desconhecidos.

Depois de um tempo ele finalmente se deu por satisfeito e começou a prestar atenção ao guia, que neste momento explicava que ‘Chicago’ era uma palavra indígena que significa ‘cebolas fedorentas’.

– Cebolas fedorentas? Quem nomeia uma cidade assim? – perguntou JungHo, incrédulo.

– ... mesmo assim, caçadores Franceses se aventuraram a colonizar a área... – continuava o guia.

– Franceses! – dissemos juntos, caindo na risada.

– Para quem come aqueles queijos fedorentos... cebola não é nada! – comentei.

Daí por diante, quase tudo o que o guia dizia virava piada. Só paramos quando uma senhora e seu marido nos olharam com censura.

Quando acabou, seguimos para o Millenium Park. O dia estava ensolarado, com uma temperatura amena e agradável, mas mesmo assim reparei que JinKyu estava derretendo:

– Tudo bem? – perguntei, me aproximando.

– Sim. Eu suo bastante, mesmo.

– Ok. Se precisar a gente pára um pouco... – disse-lhe.

– Vamos seguir para o parque e depois a gente almoça. – sugeriu MinSuk.

– Já com fome? – perguntou YoungTae.

– Eu tive que dividir meu café-da-manhã com vocês, esqueceram? – riu ele.

Millenium Park estava lotado – como tudo em Chicago sempre é, mas principalmente por ser um domingo de sol. As formas modernas chamaram a atenção de todos e começamos a tirar algumas fotos.

Quando chegamos ao ‘Bean’, ficamos nos divertindo fazendo caretas e tirando fotos de nossos reflexos. Eu e YoungTae ficávamos competindo quem fazia a careta mais estranha e ríamos muito – neste momento saíram as fotos mais engraçadas do dia.

Paramos para almoçar no Portillo’s, afinal, não haveria um almoço mais tradicionalmente americano do que hot dogs. Eu mal conseguia comer de tanto rir com as histórias que eles se revezavam contando.

Andamos um pouco no centro, à sombra de todos os arranha-céus, que dividiam a atenção dos rapazes.

– Que demais! – YoungTae disse, olhando para cima.

– Um mais alto que o outro! – completou JungHo. – Para que tudo isso?

– Então... se você tivesse prestado atenção no guia... – cutucou Bae. - ... você teria ouvido que depois do Grande Incêndio, os melhores arquitetos do mundo viram em Chicago a oportunidade de criarem o que quisessem e por isso um prédio é mais inovador que o outro.

– Eu tenho uma teoria de que a cidade é uma tentativa de alcançar o céu... – disse. – Vocês querem subir em alguns deles?

– Talvez outro dia. – respondeu logo JinKyu.

– Vocês tem o estomago fraco? – perguntei quando voltamos a andar.

– Por que? – quis saber JungHo.

– Está esquentando... nós podíamos fazer um passeio de barco pelo rio Chicago.

– Boa idéia. – disse MinSuk. – Não, eles não tem estômago fraco.. pelo menos não costumam ter.

O passeio foi muito agradável. Por volta das duas o sol estava mais forte, de modo que a brisa do rio e o movimento do barco eram bastante bem-vindos. Bae não se contentava em usar somente sua máquina fotográfica, se apoderando da minha durante boa parte do passeio. Com o tempo a máquina foi parando em diferentes mãos, de modo que cada um de nós teve chance de registrar suas impressões. Do barco pudemos ver melhor os prédios históricos, sempre acompanhados de uma explicação de nosso guia.

Estava perto do fim da tarde quando levei-os para o píer Navy.

– Você guardou o melhor para o final... – me cutucou MinSuk, sorrindo.

– Sou ou não sou uma boa guia? – piquei para ele.

– A melhor! – disse Bae, batendo palmas.

Eu amava píeres. Fosse onde fosse. Adorava a sensação de estar ‘em terra e na água’ ao mesmo tempo. Mas em Chicago, ficar sentada, no silêncio, vendo o mar, não era exatamente a atração principal.

Todos eles estavam empolgados, sem saber primeiro em qual brinquedo ir. A animação deles foi me contagiando, de modo que me senti como uma adolescente, ainda que não fosse minha primeira vez ali.

Fomos no Wave Swinger – que eu conhecia como Chapéu Mexicano.

– Vamos no carrossel? – sugeriu Bae, quando descemos.

– Não! Vamos no Splash! – pediu JungHo.

– Vamos no carrossel primeiro! – apoiou YoungTae.

– Carrossel não tem graça nenhuma! – rebateu MinSuk.

– Eu topo... – disse timidamente.

– Então vamos! – disse Bae, enganchando em meu braço.

YoungTae fez o mesmo enganchando em outro, e ambos me puxaram para o carrossel enquanto os outros ficaram para trás. Quando descemos, JinKyu e JungHo vieram até nós:

– Nós vamos comprar algo para comer. Vocês querem algo? – perguntou JinKyu.

– Eu vou com vocês. – disse YoungTae.

– Eu também. – acrescentou Bae.

– Cadê o MinSuk? – perguntei.

– Ele está ali no tiro ao alvo. – informou-me JungHo.

Fui até lá devagar, observando MinSuk, segurando a espingarda, com um olho aberto e outro fechado, mirando o alvo do centro. Acertou duas vezes a área próxima ao centro, de menor valor, e uma a de maior.

– O que vai querer rapaz? Qualquer coisa dessa fileira. – perguntou o homem responsável pela barraca.

– Aquele boneco do Chicago Bulls ali. – apontou ele, meio desanimado ao receber seu premio.

– Não gostou? – perguntei ao me aproximar.

– Gostei... – sorriu ele. – Mas não serve para nada.

– Mas essa que é a graça! O que você queria ganhar? Um carro? – brinquei.

– Seria uma boa! – riu ele.

– Quer tentar moça? – ofereceu o homem.

MinSuk me olhou, encorajando-me.

– Não... eu, ... não, eu não sei atirar. – fiquei sem graça, de repente.

– Eu te ensino. – ofereceu MinSuk.

– Ok. – aceitei, ainda receosa.

Ele se posicionou atrás de mim e pegou em minha mão, me mostrando como posicionar a arma. O simples toque de sua pele me fez estremecer... Olhei para ele, para ver se o mesmo o ocorria, mas ele estava normal, sem o menor sinal de qualquer reação a nossa proximidade. Aquilo me decepcionou um pouco. Quase não ouvia o que ele explicava, tentando entender a diferença entre aquele MinSuk e o da noite anterior. “Isso que dá ser tão ridícula...! Provavelmente ontem ele estava normal e você que ficou imaginando coisas...”, repreendi-me.

– Entendeu? – perguntou ele.

– Entendi. - menti.

– Então atira.

Atirei três vezes seguidas. Nenhuma sequer acertou o alvo.

– Uau! Nunca vi ninguém tão boa em acertar o fundo da barraca! – zombou o homem.

Deixei a arma no balcão, sem graça, em parte pelo acontecido e mais ainda por meus pensamentos.

– Olha, vou te dar mais três chances... – disse-me o homem. – Mas não fura mais a minha barraca!

MinSuk riu. Eu também.

– Você não tem que olhar o alvo inteiro. Mire em um ponto e coloque a ponta do cano nele... – repetia MinSuk. – Assim... – ajudou-me.

Foquei, conforme ele dizia. Atirei, quase pausadamente, acertando as três vezes dentro da área de maior valor.

– Uau! – dessa vez não havia ironia na voz do homem.

– Uau mesmo... – disse MinSuk incrédulo.

– Isso!! – comemorei, boquiaberta.

– Moça, quase me arrependo de ter te dado outra chance, mas vá lá: que prêmio você quer?

– Aquele! Aquele ali!! – apontei, sentindo-me uma criança.

– Este? – estranharam MinSuk e o homem.

– É! – confirmei.

– Ok. – sorriu o homem.

Abracei meu prêmio que soltou um som característico, me fazendo rir.

– Com esse valor, você podia ter pegado uma raquete de tênis! – disse MinSuk, mantendo sua expressão de incredulidade.

– O que eu ia fazer com uma raquete de tênis, MinSuk?! – franzi a testa, achando aquela idéia absurda.

– E o que você vai fazer com um frango de borracha? Que cacareja, ainda por cima!

– É pro JinKyu!! – sorri, entusiasmada, apertando o frango que cacarejou novamente.

MinSuk arfou e virou os olhos, e eu comecei a me dirigir para onde os outros estavam.

Eles estavam numa grande fila para comprar fichas. Quando eu me aproximei com o frango de borracha, JinKyu já abriu seu sorriso característico.

– É para você! – disse, entregando-lhe.

Ele pegou e apertou, fazendo todos rirem com o som.

– Puxa! Muito obrigado! – disse-me.

– De nada! Mas, olha, esse daí você não pode comer! – avisei de brincadeira.

Ele fingiu ficar decepcionado. Depois riu ainda mais e apertou o brinquedo mais algumas vezes.

Enquanto comíamos, o frango foi passando pela mão de todos eles. MinSuk, embora risse e brincasse, ainda me olhava de canto, com a mesma expressão de pouco antes.

Andamos em mais alguns brinquedos e seguimos para a roda gigante. Por questões de segurança, naquele dia estavam permitindo apenas 5 pessoas por cabine. MinSuk rapidamente resolveu a questão, dividindo-nos em dois grupos de três. Mas ao contrário do que eu esperava, ele se meteu com JungHo e Bae na primeira cabine que apareceu. Dei de ombros e entrei com YoungTae e JinKyu na próxima.

– Estão gostando? – perguntei-lhes quando entramos.

– Sim. Muito! – sorriu YoungTae.

– Está muito divertido! – acrescentou JinKyu.

– Sim, Chicago é demais... e vocês ainda nem viram tudo...!

Enquanto a roda subia, YoungTae ficou em pé observando a vista do cair da noite no lago. Como não me sentia muito bem em roda gigante fechada, comecei a puxar papo com JinKyu para passar o tempo.

– Como é ser o líder?

– Não é bem assim... – riu ele. – As pessoas confundem: eu sou o líder vocal. Tudo bem, porque também sou o mais velho... mas daí a eles me obedecerem... Tem uma grande diferença!

– Eles não te obedecem?

– Eles não tem muito o que obedecer. Eu não mando em nada!

– Ahã... – ironizou YoungTae.

– O que? Eu só indico o que vocês tem que fazer, mas vocês fazem? – ele arregalou os olhos.

– A gente faz sim.

– Sim, mas não porque EU mandei. Fazem porque tem que fazer...

– É, isso é verdade! – riu YoungTae.

– E é tranqüilo? Tipo, a vida a cinco? – ri de pensar.

– Nós somos muito tranqüilos. Quando éramos mais novos sempre tinha umas discussões tolas... mas agora a gente já se acostumou.

– Já sabemos o que cada um gosta e não gosta, que brincadeiras podemos fazer e o que não podemos... – completou YoungTae.

– Já sabemos como conciliar cada personalidade. – resumiu JinKyu.

Continuamos conversando e tirando algumas fotos.

Como já tínhamos experimentado todas as atrações do parque, seguimos para minha casa. Ao contrário de manhã, desta vez eles já estavam mais a vontade. Se esparramaram, cansados, nos sofás da sala. Eu os acompanhei, só então sentindo o mesmo.

Pouco depois as meninas apareceram para animar a conversa e Lucia chegou. Bae pareceu animado ao ver o piano. Começou a tocar algumas notas e, quando percebi, estava ouvindo ‘Life’ ao vivo e a cores, nas vozes lindas e suaves que acompanhavam as notas doces do piano. Meu coração batia tão forte que temi que parasse em algum momento. Quando acabaram, Mayreen pediu que tocassem outras e eles ficaram felizes em satisfazê-la. Neste momento Lucia sugeriu fazermos uma noite do karaokê em nossa casa. Todas adoramos a idéia e os rapazes toparam também.

Me senti muito feliz ao ver a interação harmônica em minha sala. Todos pareciam se conhecer há tempos...

Uma noite perfeita para um dia perfeito – ou quase.


–--

Após a escola fui direto para casa. MinSuk não fora à aula, provavelmente fazendo sala e mostrando mais de Chicago para os meninos.

Chegando em casa, havia um bilhete de Jane, informando-me que tinha ido para aula e que o almoço estava no forno. Isso me fez refletir o quanto eu sentiria saudade dela quando fosse embora.

Fiquei refletindo com o bilhete de Jane em minhas mãos, sem enxergá-lo. Metade do mês já tinha passado. Eu conseguia me lembrar todos os detalhes de minha chegada, de meus dias. Ainda sim, não me pareciam dias... pareciam meses, anos. Em diversos aspectos, parecia uma vida inteira.

Eu ainda tinha metade do mês. “Preciso aproveitar ao máximo.”, ponderei.

Almocei e resolvi fazer um bolo. Enquanto estava assando, peguei a lista de músicas que Robert me entregara, avaliando. Decidi começar com as que eu sabia.

Assim, comecei a tocar ‘My Love’ da Corine Bailey Rae. Sabendo que não ia incomodar ninguém, uma vez que estava sozinha em casa, comecei a cantar. Minha voz não chegava nem perto da original, mas eu gostava de minha versão.

Terminei, me preparando para iniciar outra canção quando a campainha tocou. Qual não foi minha surpresa ao ver JinKyu lá, segurando um lindo buquê de tulipas amarelas. Ele abriu seu imenso sorriso ao me ver.

– Olá Juliana! – ele pareceu ansioso.

– JinKyu! Que bom vê-lo! Entra! – o sorriso dele me contagiou.

Ele entrou e olhou ao redor. Pareceu-me que relaxou ao ver a casa vazia.

– Atrapalho?

– Absolutamente. – neguei com a cabeça.

– São para você. – ele respirou fundo e me entregou o buquê, reverenciando um pouco com a cabeça.

Minha boca abriu, surpresa, e sem saber o que dizer. Sorri e peguei as flores. Adorava tulipas. A mim, representavam a união de beleza e força. Fiquei admirando-as por um instante então sorri ainda mais.

– Muito obrigada JinKyu! Elas são muito lindas...! – eu as acariciei delicadamente. – Mas, me desculpe, eu posso perguntar por que você está me dando estas flores?

– Uma maneira singela de agradecer por você ter sido tão hospitaleira e agradável conosco ontem.

– Ah, JinKyu! Não precisava se incomodar. Para mim, foi um prazer poder passar o dia com vocês.

Eu nunca vi ninguém sorrir como ele. Pude entender perfeitamente porque aquilo conquistara Mayreen. Era impossível não sorrir em retorno.

– Fique a vontade. Vou colocá-las num vaso.

Quando voltei à sala, JinKyu estava olhando as fotos no mural.

– Tenho que confessar que eu fiquei um tempo na porta te ouvindo cantar. – disse ele quando entrei.

Coloquei o vaso de tulipas, sobre o aparador, em frente ao espelho e me virei para JinKyu.

– Coitado de você! – brinquei.

– Não. Devo dizer, que você tem uma voz muito bonita. – disse ele e eu comecei a balançar a cabeça, sem graça. – É sério. – ele riu.

– Você quer tocar? – perguntei, a fim de mudar de assunto.

– Posso? – perguntou ele, apontando para o piano.

– Por favor.

Ele se sentou e começou a tocar uma melodia suave. Eu não conhecia a música, mas a suavidade era arrebatadora. Tocava com sagacidade, quase me tirando o fôlego, aumentando o tom da melodia, e voltando à suavidade anterior. Quando acabou eu bati palmas.

– Você toca lindamente, JinKyu! – eu estava quase emocionada, como ficava sempre que via alguém dominar o piano daquela maneira.

Ele sorriu e pareceu que ia dizer uma coisa, mas então parou no meio e em vez disso, disse:

– Tem alguma coisa no forno?

– O bolo! – disse, arregalando os olhos e correndo até a cozinha.

Ele entrou na cozinha enquanto eu tirava o bolo do forno. Ficamos conversando enquanto eu desenformava e cobria com calda de chocolate.

– Você gostaria de um pedaço de bolo JinKyu?

– Sim, se não for incomodar. – ele sorriu. – O cheiro está muito bom!

Comemos em silêncio. Ao terminar, ele me perguntou do que era o bolo.

– De cenoura. – informei-lhe.

– Cenoura? Cenoura, cenoura?

A estranheza de JinKyu me fez lembrar de MinSuk – e isso me fez sentir falta dele.

Ofereci mais um pedaço e ele aceitou, sempre sorrindo. Quando acabou voltamos para sala e para o piano. Ele tocou mais uma canção que me fez perder o fôlego.

– Você cantaria uma música comigo? – perguntou-me, um pouco depois.

Eu fiquei sem jeito, mas aceitei.

– Não sendo em coreano... – brinquei.

– Não, não é. – ele começou a tocar e eu reconheci a música imediatamente.

– ‘One last cry’. – minha voz saiu um sussurro. Aquela música me fazia lembrar de muita coisa... algumas que sequer tinham acontecido comigo.

– Você gosta? – ele continuava tocando.

– Sim. – suspirei.

Então JinKyu começou a cantar e eu fiquei ali, sem fazer nada, apenas ouvindo a voz dele e pensando. Voltei à realidade quando ele parou de cantar e tocar, antes do fim da primeira estrofe.

– Você disse que cantaria comigo.

– É verdade. É que a sua voz é tão... perfeita. Não acho uma boa ideia...

– Por favor. – e ele recomeçou a tocar. – Agora você começa, para não me enganar mais.

Sorri.

– “My shattered dreams and broken heart…” – comecei. Pouco depois, ele começou a cantar comigo.

Continuamos cantando mais algumas canções, as vezes eu parava para ouvir, mas ele me olhava feio de brincadeira e eu voltava a cantar. Estava muito divertido.

Ao final de mais uma canção, JinKyu abriu seu sorriso e pareceu sem jeito.

– Eu tenho mais uma coisa para confessar, Ju.

– Sou toda ouvidos. – sorri-lhe.

– Eu não trouxe as flores só para te agradecer. A verdade é que eu estava passando e as vi. Naquele momento a beleza delas me lembrou você.

Abaixei a cabeça, desviando o olhar. Aquilo não ia acabar bem.

– Eu sei que a gente nem se conhece, mas... eu senti meu coração bater forte ontem. – continuou.

Não, JinKyu. Por favor...”, eu estava desesperada em minha mente.

– Será que... – ele abaixou a cabeça um pouco, procurando meus olhos. Tentei demonstrar meu olhar atordoado, tentei impedir que JinKyu continuasse aquilo. Mas ele não reparou em meu olhar, e continuou. - ... será que há alguma chance de você estar sentindo o mesmo?

E dizendo isso ele aproximou o rosto de mim. Não para me beijar, mas para olhar bem fundo nos meus olhos.

– Por favor JinKyu... – foi tudo o que consegui dizer e desviei os olhos.

Ele suspirou e sorriu de uma maneira triste.

– Há alguém no seu coração, Ju?

Fechei os olhos. E sem perceber confirmei com a cabeça.

Ele pareceu se confortar e até se animar um pouco com isso.

– Essa pessoa gosta de você também? – a voz dele era muito, muito doce.

– Não sei... – minha voz foi um sussurro e eu não consegui evitar que uma lágrima caísse.

Ele tocou de uma maneira muito delicada meu rosto, enxugando-a.

– Como assim não sabe? – perguntou-me.

Mais uma lágrima rolou e eu não consegui mais falar.

Enxugando essa segunda lágrima, JinKyu olhou fundo nos meus olhos e sorriu:

– Esse cara deve ser muito burro...

Eu concordei com a cabeça, rindo um pouco. Ficamos em silêncio algum tempo.

– Vou tocar algo para te alegrar. – disse ele.

Então começou a tocar uma melodia bem animada que também não reconheci. Aquilo me animou, principalmente pelas caras e bocas que ele fazia tocando. Quando percebi, já estava rindo de novo.

– Isso. Assim está melhor! – ele disse, passando para algumas músicas infantis.

Comecei a tocar junto com ele as que eu conhecia. Estávamos nos divertindo quando a campainha tocou.

– MinSuk! – eu estava tão feliz em vê-lo que demorei para ver a carranca que ele ostentava.

– Oi Ju. O JinKyu está aí?

– Sim. – saí da frente para ele entrar. – Nós estamos tocando...

Ele já falava em coreano. Parecia um pouco seco, diferente do MinSuk que estava acostumada a ver. Em retribuição, JinKyu sorria e parecia não entender.

– Bom, eu vou pegar um pedaço de bolo para você MinSuk! – e saí para a cozinha.

De lá eu não conseguia ouvir muita coisa e tampouco importava uma vez que eles continuavam falando em coreano. MinSuk parecia bravo e JinKyu parecia argumentar. MinSuk parou de falar e abaixou a cabeça. JinKyu continuou se explicando mais um tempo e depois parou, dando de ombros.

Então MinSuk levantou a cabeça e olhou em minha direção. Pega, abaixei os olhos e fingi pegar uma xícara.

Quando voltei à sala com o bolo, JinKyu se levantou.

– Vocês já vão? – perguntei.

MinSuk estava tentando ficar sério. JinKyu me cumprimentou, curvando-se:

– A tarde foi muito agradável, Ju. Espero que possamos nos rever antes que eu volte para a Coréia. – ele me lançou mais um de seus sorrisos.

Eu sorri, retribuindo, e ele saiu.

– Ju... por favor, me diga uma coisa. – disse MinSuk, se demorando um pouco, enquanto JinKyu descia as escadas e chegava à rua.

– Claro. – eu estava triste por ter presenciado um desentendimento entre eles.

– Neste momento, há alguém em seu coração? Você está apaixonada por alguém?

De novo aquela pergunta. Só que vindo da parte de MinSuk, aquilo me pegou de surpresa. Em apenas um segundo, me perguntei o que eles deveriam ter dito pouco antes, me perguntei qual era a resposta que ele queria ouvir, qual seria sua reação se eu a desse. Só no segundo seguinte foi que eu me perguntei qual era a resposta àquela pergunta. “Sim, MinSuk. Neste momento, há alguém no meu coração: você. E não só lá! Ultimamente você está no coração, nos pensamentos, no fundo dos meus olhos, na minha respiração...”, essa era a resposta. Tão logo a soube, constatei que não conseguiria dizê-la.

Apertei os lábios e abaixei a cabeça para fitar o chão. Daria tudo para ter visto o rosto de MinSuk nesse momento. Apenas o ouvi respirar e descer as escadas, decidido. Voltei a olhar enquanto ele e JinKyu desciam a rua.

Fiquei ali, por algum tempo, sem notar sequer que estava ali. Meu coração diminuiu e endureceu. A tristeza das palavras não ditas pareceu tão profunda...!

Não parei para avaliar muito os motivos de MinSuk. Provavelmente ele queria saber se JinKyu tinha alguma chance comigo. Ele nunca tomou nenhuma iniciativa real sobre nós como JinKyu fizera. No domingo, apenas um dia depois do ‘quase’ clima do cinema, ele me tratara exatamente igual a todas as outras pessoas. Seja o que fosse que tivesse motivado os ‘quase’ acontecimentos no dia do cinema, já havia passado.

Mas o meu sentimento... Ele estava forte e intacto. “E eu vou guardar para mim...”, resignei-me.

Entrei e voltei ao piano. Toquei todas as músicas da lista, entorpecida, sem sentir as alegres e não sofrendo nas tristes.


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