Destinos Partilhados escrita por shamps_e_washu


Capítulo 16
Jantares


Notas iniciais do capítulo

DISCLAIMER: DN e seus personagens não nos pertencem, isso é apenas um fanfic despretenciosa com intuito de divertimento (e correção de certas 'injustiças' que todos conhecemos muito bem...)

Contém spoilers do anime e do mangá, ao menos até o episódio 25.

IMPORTANTE: os capítulos que contém cenas lemon/hentai estarão devidamente sinalizados, para que os leitores que não curtem esse tipo de cena possam pula-lás.

MUITO OBRIGADA a todos que leram, comentaram e voltaram!Chegamos ao capítulo 16, e esperamos que se divirtam!Boa leitura!

E obrigada pelos comentários e por mostrarem que não se esquecem da gente, hehe. Acreditem, ficamos muito emocionadas! Amamos vocês! CADA VEZ MAIS!!!!



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Jantares

Para L, o fato de precisar ficar dias preso a uma cama de hospital só não foi pior porque tinha a companhia de Raito o tempo todo. O garoto lhe trazia livros, guloseimas, notícias e, mais que tudo, alegria. Conforme ambos se recuperavam, as boas conversas também puderam voltar, de forma que nem se sentia o tempo passar naquele quarto.

Só à noite, quando o amigo era convidado a se retirar e voltar para casa, a vida ganhava um ritmo monótono. E para alguém naturalmente insone essa situação se tornava quase insuportável, fazendo-o contar os segundos para que o dia amanhecesse e a movimentação retornasse. Ficar parado dessa forma era angustiante.

- Odeio hospitais.

Pedir que ficasse deitado chegava a ser piada, por isso passava as madrugadas sentado, os livros e os doces espalhados pela cama trazendo uma pequena sensação de familiaridade para o espaço restrito em que se encontrava. Ao menos o quarto era só seu e não precisava suportar a companhia de estranhos doentes, mas ainda assim aquele ambiente lhe trazia más lembranças. Aliás, nem poderiam ser chamadas como tal, pois nada mais eram do que sensações desagradáveis na boca do estômago que remetiam a um passado incerto e merecidamente esquecido.

Entretanto, mais do que tudo isso, a situação presente era o principal alvo de sua atenção e preocupação. Sabia que todo o tempo longe de Raito seria a chance para que ele agisse como Kira. Não podia evitar franzir o cenho ao pensar nisso, e no teste de controle diário pelo qual passava toda vez que via a lista de mortes no jornal da manhã.

- Quanto mais se aproximar do caderno, mais distante ficará de mim. De nós. Não posso permitir que nosso elo se desgaste.

Portanto, respirou aliviado ao finalmente receber a notícia da alta, e o sorriso largo de Raito afastou os pesares que de alguns dias pudessem ter sido suficientes para envenenar o que haviam conquistado à custa de muito desespero.

Entretanto, os votos de saúde vindos do Sr. Yagami o lembraram de um outro detalhe não menos importante. Sabia que o chefe de polícia não o saudaria tão amigavelmente quando soubesse da... intensidade da amizade entre seu filho e o detetive que o perseguira tão obsessivamente nos últimos meses.

- O que há, Ryuuzaki? O sorvete não está do seu agrado?

L piscou, voltando sua atenção novamente à realidade. A primeira coisa que Raito insistiu em fazer foi levá-lo à sorveteria mais próxima, para que, segundo ele, 'curasse de vez a birra', já que fora obrigado a ouvir diariamente reclamações de que não havia sorvete de pistache com trufas no hospital.

- Não vai dizer que, depois de ter feito tanto drama, passou a vontade! - levantou as sobrancelhas, encarando L como a uma criança imperiosa, por vê-lo brincar com a comida desde que haviam chegado.

- A vontade vai passar depois da sexta ou sétima taça, não se preocupe, Raito-kun. Eu só estava fazendo uma pausa para ponderar - tomou de uma vez todo o resto do sorvete derretido - quando irei à sua casa. Confesso que estou cada dia mais ansioso para isso.

Por mais que o tom de voz não demonstrasse pressa alguma, Raito sabia que a obstinação era verdadeira.

- Não falamos mais a respeito disso desde o primeiro dia de internação, mas na cabeça dele isso quer dizer que já está decidido e não é necessário comentar. Então, Ryuuzaki... o que pretende fazer?Um pedido formal?Isso é bem tradicionalista, o que causa um contraste interessante com a nossa... relação.

- Eu só quero conversar com seu pai. Pode pedir outro igual a este? - balançou o copo vazio. Raito fez sinal para que o garçom trouxesse a segunda rodada, e voltou rapidamente ao assunto principal.

- Você sabe, ele é bem rigoroso.

- Eu também posso ser, caso precise. Hoje à noite?

- Ryuuzaki... – suspirou - você não vai desistir dessa idéia, não é mesmo?

A pergunta ficou suspensa no ar até que o pedido chegasse à mesa. Mas a resposta não veio imediatamente em forma de palavras, pois, em vez disso, L levantou-se e alcançou em dois passos o ouvido do garoto que ainda não havia tocado no sorvete.

- Eu não disse que não o deixaria cair? – sussurrou, deslizando de leve os dedos nos cabelos castanhos – Confie em mim.

Voltou à posição inicial em silêncio, apenas observando Raito ajeitar a franja e lamber os lábios, controlando com sucesso os sentimentos tão repentinamente aflorados pelo toque. Apesar da compostura, seus olhos brilhavam quase febrilmente.

- Hoje à noite, então. Jante conosco. – e refugiou-se no doce gelado.

L sorriu para si mesmo. Lembraria a Raito de sua paixão, quantas vezes fosse necessário.

- Até o dia em que nossos corações estejam a salvo.


O convite para que Ryuuzaki jantasse em companhia da família Yagami foi bem recebido por todos da casa. Raito não tinha o costume de chamar amigos para compartilhar do convívio mais íntimo, mas, dadas as turbulências dos últimos tempos, Sachiko apoiou completamente a iniciativa. Era um alívio ver o filho voltando à vida normal. Para Souchiro, isso se mostrava ainda mais natural.

- É bom ver que os momentos difíceis fortaleceram a amizade de vocês. É o tipo de coisa rara de se encontrar, portanto não se esqueça de valorizar isso.

Raito apenas sorriu, tamborilando os dedos na mesa próxima.

- Obrigado por compreender, pai. Espero que Ryuuzaki chegue logo. Quem sabe não será tão difícil quanto pensei...

Dentro de cinco minutos, ou seja, às 19h em ponto, a campainha tocou e Raito levantou-se rápido da poltrona para atender a porta. Não foi surpresa ver que L trajava-se e portava-se despojadamente como sempre, entretanto, ele parecia mais belo do que nunca aos olhos do mais jovem.

- Boa noite, Raito-kun.

- Boa noite, Ryuuzaki.

Entraram em silêncio, encarando-se com cautela, como se qualquer troca de olhares fosse denunciar a aceleração do coração de ambos. Raito imaginou que tudo se resolveria após o jantar, mas L abordou o Sr. Yagami logo que o avistou.

- Obrigado por me receber em sua casa. Podemos conversar? É algo muito importante.

- Sobre trabalho, Ryuuzaki? - abaixou a voz - Não creio que seja o ambiente apropriado, com minha esposa e filha aqui.

- Não é trabalho. Diz respeito a toda família, na verdade.

Olhou rapidamente para o jovem Yagami a seu lado, e não encontrou sinais de reprovação para sua atitude. Pelo contrário, Raito acenou positivamente com a cabeça e postou-se completamente ao lado dele.

- Sim, pai. É principalmente sobre eu e Ryuuzaki. Por favor, o escute.

- Estou ouvindo.

Vendo que a expressão do patriarca tornara-se um pouco mais dura, L olhou-o nos olhos e abrandou o tom de voz, escolhendo bem as palavras antes de se pronunciar.

- Sr. Yagami. Entende que eu e seu filho nos tornamos bons amigos nesse período... aliás, como eu já declarei, ele é meu primeiro e único amigo.

- Sim, mesmo que tudo isso tenha começado com uma suspeita infundada de sua parte, Ryuuzaki.

- Para a qual já pedi desculpas formais, e mesmo Raito já superou isso. Mas, principalmente após os últimos incidentes, posso dizer que nos tornamos... mais do que amigos.

Ryuuzaki esperou que apenas a entonação da frase fosse o bastante para ser entendida, entretanto, tudo o que Souchiro fez foi cruzar os braços.

- Fico feliz que meu filho o tenha como a um irmão e vice-versa. - disse, como se tivesse a intenção de colocar ponto final nas estranhas declarações.

- Receio que não seja esse o caso, Sr. Yagami. Na verdade, estou aqui para comunicar que eu e Raito-kun estamos... namorando.

O pai não esperou nem um segundo para dar a resposta definitiva.

- Essa piada não tem a menor graça.

- Não é piada, pai. - Raito adiantou-se - Procure entender. Eu e Ryuuzaki... estamos apaixonados de verdade.

O tempo parou completamente para os dois garotos enquanto testemunhavam o olhar de Soichiro se tornar incandescente conforme se lembrava em um instante de todos os absurdos que seu filho sofrera em nome da 'tentativa de capturar Kira'. Repentinamente, a obsessão sem sentido do detetive excêntrico ganhava uma motivação óbvia.

E só havia uma opção para o fim dessa história que nem havia começado.

- Saia já da minha casa, seu maníaco pervertido.

L prendeu a respiração, vendo suas piores perspectivas se concretizando. Ouviu Raito se pronunciar pedindo que o pai mantivesse a calma, e a repetição enfática deste para que se retirasse.

- Não posso fazer isso. Eu e Raito já decidimos. – declarou com veemência.

- Se eu tiver de repetir novamente, usarei minhas mãos... FORA!!!!– cuspia as palavras, o olhar de fúria misturando-se a um nojo profundo, de forma que L sentiu-se como um mendigo leproso. Apenas conseguiu balançar a cabeça negativamente, procurando suplicar uma chance de provar que Raito lhe era mais caro do que a própria vida.

- Se ao menos ele soubesse...

- PAI! – colocou-se entre os dois, temendo o pior – Pai. Por favor. Eu sei que pode ser chocante, mas não é repentino. Eu quero, também. Não olhe para Ryuuzaki como se ele fosse o único culpado.

Ao invés de acalmar-se, o pai pareceu ainda mais inflamado e sua expressão mais ameaçadora, o suor vertendo da testa e as veias saltando das têmporas. Dirigia-se a Ryuuzaki como se o adolescente a sua frente fosse invisível.

- Você seduziu meu filho, desgraçado. E eu deixei que se aproximasse... por dias o ESPIONANDO, sabe-se lá o que não FEZ ENQUANTO ASSISTIA ÀQUELES VÍDEOS! E por MESES... tendo a chance de... até mesmo...abusar dele diariamente... FORA! NÃO QUERO MAIS VER SUA CARA NOJENTA!!!

- Não fiz nada que Raito-kun não quisesse.

A declaração clara e direta foi a gota d’água.

- PEDERASTA DOS INFERNOS!

L teve a chance de comprovar que o soco do Yagami mais velho era muito mais efetivo que o do mais novo, quando este foi jogado de lado e o punho do chefe de polícia o atingiu em cheio no queixo.

- RYUUZAKI! – Raito tentou correr para acudir a vítima que voara pela sala, mas foi impedido com rudeza pelo mesmo agressor.

- Não quero você perto desse... desse ANORMAL PERVERTIDO! O que ele fez... não tem nome.

- O que ele fez... – Raito estreitou os olhos, sentindo a respiração começar a falhar pela raiva contida – o senhor não sabe NADA do que ele fez! E nem QUER saber, pelo visto! Isso é... isso é.... INJUSTO DEMAIS!!!!

- E NÃO LEVANTE O TOM DE VOZ PARA MIM! NÃO VÊ O QUE TE FIZERAM, RAITO?

Enquanto L se levantava com dificuldade e Souchiro discutia ferozmente com Raito, uma atarantada Sachiko vinha da cozinha, assustada com os gritos e chocada com a cena que encontrara na sala.

- O que está acontecendo aqui? Raito? Querido?

- Só estou tirando o lixo, Sachiko. Apenas tirando o lixo. – e dirigiu-se a passos duros até L, que permanecia em pé, com a face roxa marcando a expressão pálida e serena. Não esboçou nenhum movimento defensivo, nem mesmo quando foi puxado abruptamente pela camiseta e arrastado aos tropeções até a porta.

Raito não podia acreditar nessa passividade, mas ao ver tanta violência sem sentido contra aquele que salvara sua vida, fato que todos pareciam ter se esquecido completamente, seus sentimentos transbordaram e de súbito viu-se agarrado aos braços do pai, tentando com afinco afastá-lo de Ryuuzaki.

- LARGUE ELE! EU JÁ DECIDI!NÃO TEM O DIREITO...

-ISSO É PRO SEU BEM, RAITO!

- Se Ryuuzaki sair por essa porta, EU SAIO TAMBÉM! – e encarou o pai com obstinação tão grande que todo o barulho silenciou.

- Se acalme, Raito-kun. – L manifestou-se enfim, já na soleira da entrada – Se é assim, eu irei. Não há razão para desentender-se com sua família por minha causa.

- Que está dizendo, Ryuuzaki...? Entre já. Eu quero ficar com você.

Libertar tais palavras foi como extrair um fardo das costas para Raito, assumindo de vez sua decisão. Já em Ryuuzaki, o efeito foi sentir-se ainda mais encorajado a insistir nessa escolha.

- Ficaremos juntos, Raito-kun. Isso ninguém poderá impedir. Mas, por hora, não é minha intenção começar uma guerra. – meneou a cabeça serenamente, conseguindo sorrir apesar da dor latejante – Boa noite. Eu sei que logo esclareceremos tudo isso pacificamente.

L se lembraria para sempre que uma das atitudes mais difíceis e dolorosas de sua vida seria ter dado as costas naquele momento. Mas fizera sua parte, e não se pode conseguir tudo em uma só noite. Não havia sido tão diferente do que havia imaginado, apesar de toda a confiança que passara a Raito nas conversas que tiveram a respeito.

- Terei errado?

Logo teria a resposta para tal dúvida, pois a discussão na família Yagami continuava após a porta ter sido fechada com estardalhaço.

- Nunca mais chegue perto daquilo. Com licença, vou tomar um banho. – com essas palavras imperativas, Soichiro deixou a sala.

Raito sentia dentro de si todos os tipos de revolta que jamais o haviam preocupado até então. Afinal, sempre fora o filho perfeito, o mais educado, o mais elegante, inteligente e com um futuro brilhante. Até ter apresentado seu namorado à família, era uma pessoa exemplar. Agora, o tratavam pior do que a um delinqüente drogado – e ao outro também, reduzido a um fornicador criminoso como se todas as suas qualidades fossem descartáveis.

Esses pensamentos se traduziam nos punhos fechados e na respiração cada vez mais descompassada durante os instantes seguintes à expulsão de Ryuuzaki.

- Não aceitarei isso.

Na ânsia de entender porque seu filho estava tão abalado e seu marido tão enraivecido, Sachiko tocou de leve o ombro de Raito.

- Raito, meu filho! O que está havendo? Por que o rapaz... foi mandado embora?

- O rapaz... – suspirou – Ryuuzaki. É meu namorado, mãe.

Imediatamente Raito sentiu a pressão dos dedos dela desaparecer de sua pele.

- Que bobagem é essa, Raito? – vendo o queixo trêmulo e as mãos nervosas, Raito preparou-se para uma reação materna tão terrível ou pior do que a do pai.

- Não esconderei mais. Eu amo Ryuuzaki.

- Não.

Ele esperou que ela chorasse de desgosto.

- Sim, mãe...

Que ela gritasse algo como “Você sempre foi um bom menino”.

- PARE!!!

Que virasse as costas e se refugiasse em sua cozinha perfeitamente limpa.

- Eu o amo.

Mas jamais esperaria ter a face alvejada pelas mãos dela.

- Cale-se, Raito. Cale-se.

Foi um tapa, apenas, e as palavras que vieram depois não fizeram sentido algum perante as lágrimas de humilhação que borravam o castanho das pupilas. Segurou-se para que elas não caíssem de seus olhos.

Sem dizer mais nenhuma palavra, o primogênito retirou-se da presença dos pais, tendo a certeza de que não se arrependeria de ter deixado uma casa tão injusta. Não levou mala, roupas e nem dinheiro, como se nada daquilo lhe pertencesse mais. E se o olhavam como a um infectado, os trataria da mesma forma.

Mais tarde, se surpreenderia de nem ter se preocupado em deixar para trás o item da gaveta direita da escrivaninha do quarto, enquanto corria pela rua seguindo a quase desaparecida silhueta de Ryuuzaki. Este, ao ouvir passos atrás de si, virou-se rapidamente e sua esperança confirmou-se. Parou, e conforme a figura de Raito se aproximava, sentia o coração bater mais forte. Abriu os braços tão naturalmente que nem se deu conta, assim como instintivamente o outro se jogou neles.

Não contaram por quanto tempo permaneceram abraçados dessa forma.

- Seu rosto. – Raito lembrou-se, acariciando a face arroxeada – Precisa cuidar disso.

- Não é nada. Vai passar. Mas Raito, você tem certeza de que deveria ter vindo? Seus pais...

- Vão ter que aceitar, em algum momento. De qualquer forma, eu não poderia passar essa noite sob daquele teto... não depois dessa baixaria.

L deu de ombros, sentindo-se dividido. Por um lado, não gostava de provocar uma fissão familiar, tendo plena consciência das conseqüências que uma relação fora dos padrões traria para alguém tão bem colocado socialmente como Raito. Mas também estava imensamente feliz e realizado pelo garoto ter escolhido ficar ao seu lado.

- Vamos para o hotel, então. Lá poderemos comer e dormir sossegados, até que os ânimos esfriem.

- Sim. Farei o jantar para você hoje, para compensar a vergonha gratuita que passou em minha casa.

- E você sabe cozinhar, Raito-kun?

- Existem muitas coisas sobre mim que você desconhece, apesar da sua vigília permanente. – sussurrou, em um tom leve de provocação, a qual L reagiu sorrindo.

- Então preciso me esforçar mais para descobrir tais detalhes.


Nos armários da cozinha, infindáveis pacotes de inúmeros tipos de bolachas. O frigobar transbordando de sorvetes sortidos. Sobre a mesa, um vistoso bolo de morango comido pela metade e restos de um pudim de leite, junto a uma garrafa quase vazia de café preto.

- Não se pode ter um jantar decente com essas coisas. – Raito suspirou – Ryuuzaki, isso é tudo que tem?

- Considero que tenha comida o suficiente para nós dois aqui, Raito-kun. Mas gostaria de algo especial?

- Bem, seria o bastante para uma festa de sobremesas, mas... eu não posso preparar algo apresentável sem nem ao menos um tipo de verdura.

A menção da palavra “verdura” fez os lábios de Ryuuzaki se contraírem levemente.

- Bem, não se sinta obrigado a fazer nada, Raito-kun... o dia foi tão atribulado, e...

- Ora, eu disse que o faria, e isso é fácil de resolver! – com um grande sorriso, foi puxando L pela mão – Tem um mercado 24h por aqui, não tem? Não preciso de muita coisa.

- Eu não sou o maior fã de 'verduras' da face da Terra, Raito-kun... temo que isso seja um desperdício de ingredientes e do seu talento.

- Falando isso você só me deixa mais ansioso pelo desafio. Ou tem dúvidas de que farei uma refeição digna da suas exigências?

- Você sabe, eu só acredito nas coisas quando tenho provas inquestionáveis.

Raito apenas olhou com o canto dos olhos, sorrindo como uma criança disposta a provar suas habilidades e receber rios de elogios. Essa visão veio de tal forma inocente e natural que L sentiu-se encantado, segurando com mais força a mão dele para que a ternura não lhe escapasse entre os dedos.

- Meu menino. Valeu a pena apostar em uma probabilidade tão próxima de zero.

- A propósito... – Raito estacou, um tanto formal - isso pode soar um tanto abusado, mas eu saí de casa sem levar nada, e...

- Não se preocupe. Tenho um cartão para emergências. Mesmo que seja para comprar... legumes! – revirou os olhos, como se não acreditasse no que fazia.

- Vai ser um dinheiro bem gasto. Confie em mim.

L sorriu.

- É o que eu mais quero.

- Chegamos. Pode empurrar o carrinho enquanto eu pego as coisas?

- Tudo bem.

Para L, que pilotava helicópteros apenas lendo o manual de instruções, um simples carrinho de mercado não deveria representar problemas. Entretanto, após dois minutos, ainda não conseguira desencaixar um deles da fila e começou a perder a paciência.

- Tem algo errado aqui.

- Vá com calma, as rodinhas estão presas. - Raito puxou o carrinho de forma que ele se soltou em dois segundos, para frustração do outro - Prontinho! Vamos?

- Vamos... - amuou-se por um tempo, mas logo descobriu que aquele objeto poderia ser mais divertido do que parecia à primeira vista.

Qual não foi a surpresa de Raito, enquanto escolhia com capricho cada ingrediente, ouvir o som típico de uma criança utilizando o carrinho de compras para deslizar pelos corredores e, ao se virar, encontrar ninguém menos que Ryuuzaki passeando descontraído.

- Está se divertindo?

- Sim, fazer compras é realmente interessante...

Continuou seu passeio pendurado no carrinho sem dar atenção aos olhares de estranhamento, catando nas prateleiras um e outro quitute que lhe agradasse.

- Ei! Não pegue o carrinho só pra você! - riu, correndo atrás do fujão e depositando no carrinho as compras que carregava - Muito engraçado. Até parece que nunca foi às compras antes.

- Não. É a primeira vez. Como acha que estou me saindo? - empoleirou-se no carrinho, deixando que Raito o empurrasse pela lateral.

- Está me saindo uma criança reinante. E, ainda, daquelas que enche o carrinho de coisas extras! - sob os protestos de Ryuuzaki, Raito foi retirando todas as guloseimas da lista de compras.

- Mas e a sobremesa, Raito?

- E o que é tudo aquilo que já está no hotel?

- Tem que pensar no amanhã, Raito.

- Você chega a ser assustador nessas horas. Por hora, vamos ficar só com esses aqui.

L olhou com desgosto para a parte trazida por Raito, cheia de vegetais, carne, peixe e temperos suaves, o que significava 100% de certeza de uma refeição completamente sem graça.

- Vou cuidar direitinho de você, então sossegue. - Raito segurou-lhe carinhosamente o queixo com dois dedos, vendo sua descrença - Aposto os cinco dedos da mão que vai comer tudinho.

- Olha lá, eu vou cobrar. Mas já terminamos?

- Deixe-me ver... - conferiu o conteúdo do carrinho - Ainda tem algumas coisas de que precisamos. Pra esse lado.

Foi arrastando o carrinho com Ryuuzaki dependurado nele, desistindo de pedir que ele não agisse como um garotinho. Sorriu, conformado.

- Na verdade, é tão óbvio que eu devia ter previsto isso... e devo admitir que tem sua graciosidade.

A brincadeira só perdeu a graça quando, ao virarem o corredor, Raito sentiu o carrinho talvez pesado demais e se deu conta de que vários doces haviam aparecido ali como num passe de mágica. Ryuuzaki apenas esboçou um sorriso inocente quando o olhar do outro o inquiriu.

- Que tal se você pegar o resto? Eu empurro.

- Tem certeza, Raito-kun?

- Ah sim senhor, tenho sim. - esticou a lista de compras para ele - Está tudo aqui.O que tem um 'v' já está comprado.

- Tudo bem, então. - riu-se, lamentando que Raito não notasse o efeito inverso de sua indignação: tornar tudo ainda mais divertido.

Pulando do carrinho, foi às prateleiras e, entre um e outro item da lista, arranjava algo a mais para adicionar ao montante. Era quase uma habilidade sobrenatural descobrir bobagens até entre os molhos de tomate. Entretanto, conforme os colocava, Raito os devolvia na mesma ordem, tornando a cena quase cômica para quem porventura olhasse. Por fim, chegaram ao caixa com os ingredientes originais intactos, ainda que Raito quase tenha deixado escapar duas latas de leite condensado.

- Ao menos a cobertura para sorvete, que já não tem mais. - L insistiu, com olhos pidões irresistíveis.

- Fazer compras com você dá trabalho, sabia? Mas vá lá. Não vou te deixar sem isso, claro!

Em resposta, L beijou rapidamente o rosto do rapaz, o que foi suficiente para deixá-lo imensamente corado e constrangido. Talvez ainda não estivesse pronto para demonstrações públicas de afeto, e manteve-se em silêncio até saírem do mercado.

Como estivessem cheios de sacolas, nem mesmo puderam andar de mãos dadas até o hotel.

- É irônico que a visão de pessoas desconhecidas o envergonhe tanto, já que nem o próprio pai foi motivo pra se encolher assim. Mas tudo bem. Um passo de cada vez.

Esquecendo esse pequeno incidente e disposto a dissipar o clima desagradável, L abraçou-se às costas de Raito assim que suas mãos viram-se livres.

- Mas até agora você não disse exatamente o que vai preparar para mim...

- Surpresa. Mas você vai gostar.

- Lembre-se de que você me prometeu os dedos se eu não gostasse... - entrelaçou as mãos na de Raito, levando-a até os lábios.

- Está mantida a promessa. E deixe-me cozinhar, ou não jantaremos hoje! - tentou de leve soltar-se, mas Ryuuzaki o puxou para um beijo longo e cheio de desejo, compensando todo o tempo que passaram sem se tocar. Tanto tempo que pareciam estar sentindo o gosto um do outro pela primeira vez.

Lembravam-se das sensações primordiais, do desejo transbordante, das primeiras descobertas em uma noite solitária. Mas o sabor, o toque e a textura pareceram queimar depressa demais nessa chama inicial, sem deixar marcas mais profundas. Agora, em um único beijo, tudo o que outrora imaginaram ter perdido retornava com a força de um furacão.

Quando seus lábios se separaram, apenas a força com que puxavam o ar dos pulmões denunciava a duração do beijo. Fitaram-se sorridentes, tomados por um sentimento inexplicável e estranhamente confortável de se encontrarem pela primeira vez ao mesmo tempo em que tinham a certeza de se conhecer a séculos.

- Eu estava ansioso por isso. - L confidenciou ao pé do ouvido, causando um arrepio agradável na nuca de Raito. Este respirou fundo e deslizou os dedos pelos cabelos negros que, apesar de revoltos, não deixavam de ser macios.

- O mesmo pra mim. Mas vai me soltar e deixar que faça nosso jantar?

- Mas é você quem não me solta! - ainda o apertou mais junto ao peito antes de abrir os braços - Pronto, está livre, embora eu ainda não devesse.

- Aguarde só mais um pouco, e serei só seu de novo. Mas, agora, ao trabalho!

Com maestria, iniciou o trabalho de separar os ingredientes, os temperos e os utensílios de que precisaria. Ao se dar conta de que Ryuuzaki o continuava observando da porta, foi enfático ao arrastá-lo para fora.

- Não posso nem ver Raito-kun cozinhar?

- Só vai ver depois que estiver pronto, ou vai acabar comendo tudo pelo meio do caminho! Ora, vamos, eu disse que seria uma surpresa...!

- Tudo bem, então. Esperarei na sala. Raito-kun fica tão gracioso quando começa a teimar, que a minha tentação é continuar a provocá-lo. Mas darei um descanso a ele.

Foi até a poltrona e sentou-se, coçando os dedos dos pés enquanto as cenas dos fatos do dia iam e vinham na cabeça. Tudo ainda parecia novo e confuso demais, mas o curso dos acontecimentos estava ao menos 10% a mais a seu favor.

- Talvez 20% depois do beijo, o que significa 30% ou 40% amanhã pela manhã... no que depender de mim.

Sorriu com o dedão sobre a boca, lembrando-se de que o pouco que viu foi suficiente para comprovar como Raito era absolutamente adorável enquanto exercia seus dotes culinários.

E ele fez o melhor que pôde, motivado pelo desafio de ver Ryuuzaki admitir que comida salgada e saudável podia ser muito bom, sim. De uma forma ou de outra, L conseguia incentivá-lo a ter prazer nas coisas simples que normalmente ignorava, como jogar uma partida de tênis ou cozinhar o jantar dando o melhor de si.

Agora satisfeito, contemplava sua mais nova obra gastronômica. Apesar do tempo sem praticar, o aroma e a textura comprovavam que o prato estava nada menos do que perfeito, e mesmo um teimoso aficionado por doces como Ryuuzaki ficaria com água na boca. Mal podia esperar pela reação dele.

Dando os últimos retoques decorativos, sorriu. Seria uma noite memorável.


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Notas finais do capítulo

Notas Finais: Finalmente um pouco de alegria após tantas dificuldades seguidas! Não se podia esperar outra reação do sr. Yagami, mas com o tempo eles consertam isso... torcemos por eles, não é? Bem, agora só resta esperar para ver o que a noite reserva a esse casal recém-reconciliado... ah, para aqueles que estão ansiosos por cenas mais, hm, picantes... pedimos que esperem só mais um pouquinho mesmo! Agora é sério!!!Mas esse capítulo foi concentrado em fluffys, esperamos que tenham gostado. n.n

No próximo capítulo: será que o Raito realmente vai fazer Ryuuzaki comer algo diferente? E o que será esse algo? Depois do jantar, a madrugada reserva momentos de rara felicidade.