Minha Vida Antes... (annabeth) escrita por Marina Leal


Capítulo 3
Capítulo 3 OS PROBLEMAS COMEÇAM


Notas iniciais do capítulo

desculpem a demora, mas enfim consegui postar, leiam, espero que gostem.



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Dois meses depois de meu pai ter se casado com Margaret tenho a notícia de que minha madrasta está grávida, eu fiquei feliz, de verdade, mas era complicado por que meu pai continuava a me ignorar e quando ele falava comigo era sempre rapidamente e minha madrasta seguia seu exemplo, talvez ela fosse até pior, mas eu não me importava muito, eu não havia passado a maior parte da minha vida com ela, e por isso a indiferença dela comigo não era tão estranha para mim.

Meu pai ainda não havia contado a ela o que eu era, e isso me deixava tensa, como ela ia reagir quando soubesse? Eu sabia que ela não ia acreditar no começo, mas, e quando ela acreditasse?

“Annabeth” era a voz de meu pai, eu estava no meu quarto brincando com uns pequenos blocos de madeira que ele havia comprado para mim. Suspirei e me levantei rapidamente.

“Sim papai?” Perguntei do topo da escada.

“Vou precisar conversar com Margaret agora, só quero pedir que você não venha para cá por enquanto está bem?” Eu assenti com a cabeça, meus cachos deslizaram para frente e eu os coloquei de volta no lugar. Eu sabia sobre o quê meu pai ia conversar com ela, meu estômago parecia mais pesado do que antes, não sei explicar muito bem essa sensação. “Vá para o seu quarto.” Ele disse e olhou uma última vez para mim e voltou para a sala onde Margaret devia estar esperando por ele, eu sabia que devia ir para o quarto, mas não consegui me obrigar a ir, por isso fiquei sentada no tapete e esperei meu pai começar a falar eu sabia que era errado, mas poxa, era sobre mim que ele ia falar.

Pude ouvir meu pai conversando com ela, não ouvi as palavras exatas, mas eu sabia que era sobre mim e minha mãe, durante toda a explicação de meu pai ela não falou nada, e eu ficava mais nervosa a cada minuto que passava.

“Você quer que eu acredite que ela é filha de uma deusa?” Foi a primeira coisa que eu pude ouvir de minha madrasta, e pelo que pude perceber ela não estava acreditando nenhum pouco na história que meu pai contava.

Meu pai não falou nada, parecia estar se concentrando em responder a essa pergunta, mas como ele não respondeu, eu imaginei ele concordando com a cabeça.

“Você, mais do que qualquer outra pessoa, sabe que isso é um absurdo, não sabe Frederick?” Margaret disse em um tom controlado, mas ainda assim, cético. “Os deuses gregos não existem” houve um trovão do lado de fora, mesmo que o tempo estivesse claro, mas minha madrasta não pareceu perceber.

“Não é.” Disse meu pai discordando calmamente. “Eu também achei isso um dia, mas não acho mais, e é tudo por causa dela: Atena.”

Houve um silêncio estranho no andar debaixo e eu tentei imaginar o rosto da minha madrasta, não consegui.

“Atena?” A voz dela parecia nervosa, e tinha alguma coisa a mais, mas não consegui identificar o que era. “A mãe dela é Atena?”

“Sim.” Foi a resposta de meu pai. Margaret não disse nada, talvez estivesse esperando algo mais, assim como eu. “Foi a própria Atena quem deixou ela aqui para que eu pudesse criá-la, mas eu quero que você saiba que eu não queria uma criança daquela forma, naquela época, tentei insistir para que ela levasse a menina e a criasse no Olimpo, mas ela não me ouviu e disse que crianças como Annabeth deviam ser criadas por seus parentes mortais...” Meu pai parou por um momento, e minha madrasta não disse nada, talvez estivesse tão surpresa quanto eu ao ver meu pai falando daquela maneira.

Eu fiquei paralisada no canto em que estava, nunca havia ouvido meu pai falar aquilo de mim, e naquele momento eu soube que ele não me amava e que provavelmente nunca ia me amar.

“Ela me disse que Annabeth era um presente, uma benção dela para mim. Mas eu não podia me responsabilizar por uma criança Margaret, eu tinha meu trabalho, não podia tirar do meu tempo para cuidar de um bebê.” Ele continuou e eu tive que reprimir as lágrimas que ameaçavam sair dos meus olhos e denunciar o quanto aquelas palavras me machucavam.

“Eu entendo querido.” Minha madrasta disse assim que meu pai parou de falar, mas era claro que ela iria ficar do lado dele. “Mas e agora, o que nós vamos fazer com ela?”

Houve um suspiro, de meu pai eu achei. Sim, o que eles iam fazer comigo?

“Acho que devemos esperar que ela tenha idade suficiente para que a mãe dela venha buscá-la, você concorda?” Meu pai disse.

Minha madrasta não respondeu por algum tempo, até que:

“Tudo bem.” Foi a resposta dela, mas algo em sua voz me disse que haveria um porém. “Mas eu não vou deixar que a presença dela traga perigo para o nosso filho, eu respeitarei a sua decisão até que ela tenha idade suficiente. É só o que posso prometer.” Meu pai ficou em silêncio.

Houve um som abafado de pés se movendo na pequena sala, alguns segundos depois pude ouvir os passos de um deles vindo em direção à escada e eu tratei de correr para o meu quarto, mas meu pé se enrolou no tapete e eu caí, para o meu azar foi ela quem apareceu, seu olhar me disse tudo o que ela não disse: Você sabia que é feio ouvir a conversa das pessoas?

“Desculpe.” Eu murmurei e me levantei, pude sentir o rosto vermelho, mas mesmo assim fui na direção de meu quarto sem me virar para olhá-la, com meu peito se contraindo em dor e tristeza.

POV: Frederick

Foi duro dizer aquelas palavras, mesmo que elas fossem verdadeiras há algum tempo atrás, agora era diferente, aquelas palavras não eram mais verdade absoluta para mim, agora eu amava Annabeth, eu a criei, ela era minha filha, eu não a desejava antes, quando Atena a trouxe até mim, mas ela cresceu e mesmo em atos pequenos ela demonstrava que também me amava, mesmo que eu, por muitas vezes, tenha agido de forma rude perto dela, e isso havia mudado a forma que eu via muitas coisas.

Minha Annabeth, meu presente, a benção que Atena havia me dado. A benção que eu teria recusado se ela não fosse tão teimosa e poderosa, Annabeth havia herdado tanto da mãe, além dos olhos, e nem sabia.

“Eu entendo querido.” A voz de Margaret me tirou do estado de dor e auto piedade que eu estava tendo, ela não poderia entender, nem mesmo minha filha poderia entender o motivo de eu agir assim, ela não entenderia que era para o bem dela. “Mas e agora, o que nós vamos fazer com ela?” Pude ouvir pelo tom de voz de Margaret que ela havia mudado sua opinião sobre minha filha e eu queria poder dizer que amava Annabeth, queria defendê-la da nova ideia concebida por Margaret, mas meu ego não deixava, a parte da minha mente que se perguntava como teria sido se Annabeth nunca tivesse existido ainda estava lá, e era mais forte do que qualquer outra coisa.

Eu suspirei, tentando encontrar as palavras certas e que também fossem verdadeiras.

“Acho que devemos esperar que ela tenha idade suficiente para que a mãe dela venha buscá-la, você concorda?” Eu disse tentando convencer a mim mesmo, mas não queria que ela fosse, queria que ela nunca tivesse idade suficiente para ir embora, mesmo sabendo que era inevitável.

“Tudo bem.” Foi a resposta de Margaret e eu virei o rosto, não esperava que ela cedesse tão depressa. “Mas eu não vou deixar que a presença dela traga perigo para o nosso filho, eu respeitarei a sua decisão até que ela tenha idade suficiente. É só o que posso prometer.”

Olhei em seus olhos castanhos e pude ver que não era apenas Annabeth que estava sofrendo, Margaret temia a presença da minha filha e eu não podia fazer nada, me senti impotente, eu não conseguia nem mesmo fazer com que minha esposa se entendesse com minha filha. Mas você terá outro filho em breve. Minha mente me lembrou e eu não fiz nada, eu me sentia vazio, apenas me virei de costas para ela para evitar que ela visse a dor que estava ameaçando se apossar de mim.

Pude ouvir seus passos vindo na minha direção, seus braços ao meu redor alguns mínimos segundos depois.

“Calma” ela disse no meu ouvido. “Tudo vai ficar bem, acredite.” Eu assenti e a beijei levemente, ela se afastou de mim e por um momento ela me lembrou Atena, seu jeito forte e decidido, mas foi apenas por um momento, logo ela voltou a ser a mulher simples e carinhosa que sempre foi. “Tenho que terminar o almoço.”

Concordei e ela saiu da sala, tive o impulso estranho de segui-la, e assim que ela havia saído da sala fui atrás. Ela parou ao pé da escada e olhava firmemente para algo, ou melhor, alguém que estava caída no chão. Eu devia ter imaginado que Annabeth não me ouviria e ficaria na escada para ouvir a conversa.

Ela não me viu escondido na porta, mas eu pude vê-la claramente e perceber que seus olhos cinzentos estavam vermelhos, o que significava que ela havia ouvido minha conversa com Margaret, voltei para minha poltrona, minha maquete sobre a guerra civil esquecida sobre a mesa.

Ela não devia ter ouvido aquilo. Foi o pensamento que dominou minha mente.

POV: Annabeth

Joguei-me em cima da cama e chorei, meu pai não gostava de mim, ele havia deixado isso bem claro ainda pouco.

“Pára Annabeth” falei para mim mesma, olhando para o teto. “Respira e pensa.”

Me obriguei a ficar calma e pensar em alguma coisa, nada veio à minha mente, mas eu já não sentia mais a vontade louca de chorar, bom sinal.

“Annabeth.” Era a voz de meu pai. Respirei fundo uma vez, sua voz era um golpe para mim.

“Sim?” Perguntei.

“Venha, vamos almoçar.” Ele disse.

“Já estou indo, só preciso lavar as mãos.” Respondi.

“Tudo bem.” E foi isso, nada de “ande logo” ou “rápido”, era como se ele realmente não me quisesse por perto.

Fui para meu banheiro para lavar meu rosto e minhas mãos e vi meu reflexo no espelho. A menina que olhava para mim era muito bonita, era loira com os cabelos em cachos e a pele não era nem branca nem muito morena, seus olhos eram de um tom cinza tempestuoso, muito bonitos, a característica que herdei de minha mãe. Atena. Mas pelo tom avermelhado em sua pele, eu percebi que não estava fazendo um bom trabalho para reprimir o choro. Respirei fundo uma vez e molhei o rosto até que ele não estivesse mais tão vermelho.

Desci a escada como uma prisioneira que vai para a forca e não consegue impedir seu destino, dei um suspiro de tristeza e apareci na cozinha. Minha madrasta havia feito frango frito com salada.

Eu não disse uma palavra durante toda a refeição, e muito menos meu pai ou ela, eu podia sentir o olhar de reprovação de meu pai e o de preocupação de minha madrasta a cada gesto que eu fazia. Terminei de almoçar e fui para o quintal, o Black ia me entender, ele sempre me entendia e não tinha medo de mim.

Peguei uns biscoitos que estavam em cima do balcão de mármore negro e passei pela porta dos fundos como uma fugitiva que não fez nada de errado.

“Au, au.” Eu nem apareci direito no quintal e Black surgiu na minha frente, pulando e melando a minha roupa de baba, mas eu não liguei, era bom alguém parecer feliz em me ver.

“Oi garoto.” Eu disse fazendo carinho na orelha dele. “Tudo bem?”

Ele ganiu baixinho, parecia uma reclamação.

“É eu sei que não tenho vindo ao quintal por muito tempo, mas hoje eu tô aqui.” Eu disse tentando me distrair.

Ele me olhou como se dissesse: O que houve? Você não está muito bem.

Eu suspirei e fui para debaixo da árvore que meu pai plantou quando eu era bebê, era de certo modo a minha árvore.

“Vem garoto!” Eu chamei baixinho e ele veio correndo na minha direção.

Ele deitou a cabeça no meu colo e olhou para mim, eu sabia que ele estava esperando que eu começasse a falar o que estava me deixando triste, abaixei minha cabeça e comecei a falar, contei tudo para ele, e a medida que falava eu ia me sentindo, não melhor, mas aliviada por contar para alguém como eu me sentia e ele ouviu tudo quieto, ás vezes lambia a minha mão para que eu desse mais um biscoito, mas logo voltava a prestar atenção em mim.

Eu me deitei na grama macia e verdinha do quintal e ele se deitou ao meu lado.

Passei a maior parte da tarde brincando no jardim de casa, até que um homem apareceu no portão, eu ia avisar meu pai, mas minha curiosidade foi maior, mesmo com meus instintos gritando para que eu fosse para dentro de casa, não dei ouvidos nem aos latidos do meu cachorro.

Cheguei mais perto do portão e o que eu vi me fez dar um grito agudo, eu não sei direito o que eu falei, mas eu acho que foi algo do tipo:

“Paaaaaaaaaaaaaaaaaai.” Eu estava tão assustada que não pensei no que meu pai ia falar para mim, eu só queria que alguém me ajudasse.

Depois que eu gritei o homem foi embora, eu poderia até estar ficando maluca, mas pelo que eu tinha visto ele só tinha um olho, e ficava bem no meio da testa. Eu tremia tanto que meu pai teve que me carregar para dentro de casa, minha madrasta me deu um copo com água e meu pai me sentou na cadeira da cozinha, ela não parecia gostar de estar perto de mim, mas parecia preocupada.

“Annabeth, o que houve?” Meu pai afastava meu cabelo para trás enquanto eu soluçava.

“Um, um homem no portão.” Eu disse entre soluços. “Ele só tinha um olho, que ficava bem no meio da testa.” Eu parei, não estava com vontade de lembrar aquilo de novo.

Meu pai e Margaret se entreolharam, algo em seu olhar me fez ficar preocupada e com medo.

“Ele disse alguma coisa Annabeth?” Meu pai perguntou, o tom de voz calmo, mesmo eu sabendo que era fachada.

“Não.” Eu respondi com um tremor. “Ele apenas ficou me olhando.”

“A partir de hoje você não vai mais ficar fora de casa sozinha, está bem?” Meu pai disse me olhando nos olhos, por um momento eu pensei que ele estava preocupado comigo, mas ele desviou o olhar e eu não tive como saber se era verdade.

Eu concordei com a cabeça e me levantei para ir para o meu quarto, mas antes que eu saísse da cozinha notei o olhar que minha madrasta me dava, parecia que ela estava vendo um alienígena ao invés de mim, mas tentei não me importar com isso, mesmo que fosse um pouco difícil.

Enquanto subia a escada eu desejei que nenhum monstro tentasse me atacar na casa de meu pai, mas naquele mesmo momento eu soube que minha vida nunca mais seria a mesma, e que dali pra frente só iria piorar.

Como eu queria estar errada.

2 anos depois...

Eu estava no meu quarto, brincando com meus ursos e meus legos de montar, quando ouvi os risos e os passos de meus meio-irmãos ecoarem do corredor, e mais uma vez o sentimento de estar sozinha me tomou. Eu suspirei e voltei a brincar.

“Pai.” Alguns minutos depois um deles se queixou com voz de choro. “O Bobby me bateu.”

Eu revirei os olhos, algo que eu não faria se meu pai estivesse vendo.

“Bobby, não bata no seu irmão.” Foi só o que meu pai disse, sua voz estava baixa, então pensei que ele estava no escritório.

“Tá pai.” Foi a resposta que eu ouvi.

Eu pensei em sair do meu quarto e ir brincar com eles, mas me lembrei que provavelmente não seria uma boa ideia, pois eu já estava bastante encrencada desde a minha última tentativa de aproximação com meus irmãos. Eu não queria atrair monstros, simplesmente acontecia, e da última vez as coisas não foram muito bem aqui em casa.

Enquanto eu pensava nisso as acusações de minha madrasta tornaram a soar em meus ouvidos e eu me encolhi, já fazia uma semana desde meu último incidente com... com seres sobrenaturais, mas ainda assim eu tremia com a lembrança, havia sido bem ruim dessa vez.

Balancei a cabeça para espantar as imagens que vieram na minha cabeça e tentei me concentrar no hoje, era meu aniversário de sete anos, será que meu pai havia lembrado disso? Eu não sabia bem o motivo, mas eu queria que meu pai se lembrasse de algo a meu respeito, e não apenas que a minha mãe era uma deusa, ou talvez eu só quisesse um pouco da atenção dele.

Houve uma batida na porta, precisei de um segundo para me recuperar do choque (eles geralmente me deixavam sozinha até a hora das refeições e nunca batiam na porta, foi estranho para mim ouvir alguém na porta) e me levantar do carpete marrom.

“Annabeth.” Era a voz de meu pai, parecia calma, mas pude ouvir a tensão por baixo da fachada.

“Sim pai?” Eu disse indo até a porta bem devagar para abri-la.

Assim que me viu tão próxima ele deu um passo para trás, mas me estendeu um objeto embrulhado com papel de presente como se nada tivesse acontecido.

“Feliz aniversário.” Ele disse e eu estendi a mão para pegar a forma retangular e familiar para mim. “Espero que goste.”

“Obrigada.” Eu murmurei ao ver a capa. Folheei algumas páginas, meu pai sabia que eu era disléxica e por isso comprava livros escritos em grego antigo, uma coisa que eu sempre me perguntei era como ele conseguia aqueles livros.

Era um livro de mitologia grega (parecia meio engraçado estudar sobre mitologia grega com um livro escrito em grego), mas aquele livro tratava especialmente de uma deusa. Minha mãe. Atena.

Olhei para cima e os olhos castanhos de meu pai estudavam minha reação ao seu presente. Eu havia adorado, poderia ler sobre minha mãe quando eu quisesse, mas com aquele livro eu sentia que teria uma chance de conhecê-la melhor, os outros livros contavam apenas mitos isolados, mas parecia que aquele contava muito mais coisas sobre ela.

Eu ri para ele, demonstrando que eu havia gostado. Ele assentiu para mim sem sorrir.

“Você vai ter bastante tempo para ler depois, agora vamos descer para almoçar.” Ele disse olhando para a escada.

“Tudo bem.” Eu disse. “Só vou colocar ali na estante já venho.”

Ele balançou a cabeça, concordando. Quando voltei ao corredor ele já havia descido, suspirei de tristeza e fui almoçar.

A refeição foi um evento silencioso, nada de “parabéns” ou “feliz aniversário”, meus irmãos me olhavam com evidente interesse, como se me quisessem por perto, mas minha madrasta os manteve afastados de mim, fingi não notar que ela contraía o rosto a cada vez que eu me mexia na cadeira.

Assim que terminei de comer eu me virei para olhar para o meu pai, mas se ele percebeu fingiu que não, eu queria pedir algo a ele, e tinha que ser com ele, minha madrasta nunca permitiria, mas se meu pai falasse com ela, quem sabe.

Ele me ignorou durante todo o tempo que comia, ou talvez estivesse preocupado com alguma outra coisa, mas eu tinha que pedir dele.

“Hum, pai?” Chamei quando ele se levantou para colocar o prato dele na pia, minha madrasta me olhou, preocupada.

“Sim Annabeth?” Ele se virou para me olhar e eu perdi parte da coragem.

“Eu queria pedir uma coisa.” Eu disse baixinho.

“O quê?” Ele perguntou olhando para mim, parecia considerar as opções do que eu poderia pedir.

“Eu posso...” Eu parei para olhar para minha madrasta.

Meu pai esperou eu completar minha pergunta.

“Eu posso brincar com o Bobby e o Matthew?” Eu me concentrei em olhar apenas para o meu pai, e não prestar atenção na reação de Margaret. Eu sabia que ainda era cedo para pedir isso, mas eu queria tanto não me sentir sozinha, bom, não exatamente sozinha, o Black sempre ficava comigo, mas eu sentia vontade de brincar com meus irmãos sem que alguma coisa ruim acontecesse.

Meu pai olhou para Margaret, pedindo sua permissão. Eles tiveram uma breve discussão com olhares até que um de meus irmãos falou.

“Mãe, dexa ela bincá com a gente! Po favô.” Eu não sabia distinguir meus irmãos pela voz, mas eu não ia me virar para tentar descobrir qual dos dois havia dito aquilo embora sentisse uma imensa gratidão por ele.

Não pude aguentar mais o silêncio, me virei para ver qual seria a resposta da minha madrasta, tive que reprimir o riso assim que vi seu rosto, pois parecia que ela tinha acabado de chupar um limão bem azedo. Minha sorte era que ela não olhava para mim, e sim para os dois, que a olhavam com um pedido mudo para que ela deixasse. Ela voltou seu olhar para mim, parecia procurar algo. Depois de alguns instantes analisando meus olhos ela pareceu chegar a uma decisão.

Margaret virou os olhos para meu pai e respondeu.

“Eles podem brincar com ela sim.” Sua voz não parecia muito feliz, mas eu e meus irmãos sorrimos. “Desde que nós dois possamos ficar no quintal com eles.”

Eu não me senti magoada com as palavras dela, muito pelo contrário, eu me sentia ganhando alguma coisa importante.

Eu queria ter percebido que minha sorte não duraria tanto assim.

*******

Nós cinco estávamos no quintal, brincando de pega-pega (eu havia sugerido pique - esconde, mas minha madrasta não permitiu), parecia tão normal que, por alguns momentos eu havia me esquecido de quem eu era, e que eu não pertencia àquele lugar, meu pai estava rindo, mesmo com a minha presença, minha madrasta parecia menos preocupada ao nos observar brincando sentada em uma toalha em cima da grama, tudo parecia estar indo bem, mas quem eu era nunca me deixaria viver uma tarde em paz com a minha família.

“Annabeth, é a sua vez de pegar.” Meu pai disse indo se sentar ofegante ao lado de Margaret. “Daqui a pouco eu volto está bem?”

Ele estava vermelho e coberto de suor, por isso decidi dar alguns minutos para que ele melhorasse um pouco e comecei a correr atrás de meus irmãos, não era bem uma corrida, era mais como se nós estivéssemos apenas fingindo correr.

Assim que paramos de correr eu não sabia dizer quem estava mais vermelho, se era o papai, o Bobby, o Matthew, ou eu. Meus cabelos só não estavam emaranhados no meu rosto porque estavam presos em um rabo de cavalo frouxo na nuca, mas os de papai e meus irmãos pareciam três ninhos de rato de tanto correrem e todos nós rimos ao ver como estávamos totalmente horríveis.

Em um segundo tudo parecia bem, minha família estava rindo relaxada e eu estava sendo aceita por eles, no outro tudo parecia ter mudado completamente e eu não havia entendido o motivo até me virar de costas para eles e perceber alguma coisa rastejando em nossa direção, reprimi um grito quando notei que eram duas cobras com escamas azuis, do mesmo tipo que Héracles havia matado no berço quando ainda era bebê.

Elas ainda estavam um pouco distantes de mim, mas pelos seus olhos eu pude perceber que o alvo delas era eu. Minhas mãos tremeram de medo, e de raiva, era incrível o quanto eu mesma conseguia estragar um dia tão bom quanto estava sendo meu aniversário.

Eu pensei em olhara para trás, mas elas estavam se aproximando cada vez mais e poderiam me atacar a qualquer momento se eu me distraísse.

“Frederick.” Disse a minha madrasta com o pânico tingindo a sua voz. “Precisamos tirar eles daqui.”

Eu sabia que meu pai estava tão paralisado quanto eu, ele conhecia os mitos, sabia que aquelas serpentes eram muito perigosas, ouvi um barulho de alguém tentando se levantar, mas em seguida um baque no chão, parecia que meu pai a havia empurrado de volta no lugar.

“Precisamos sair daqui.” Minha madrasta disse baixinho, como se as cobras pudessem entender o que ela estava dizendo se ela falasse alto demais.

“Não podemos.” Meu pai respondeu. “Se nós tentarmos elas vão atacar.”

“Se nós não tentarmos elas vão atacar de qualquer maneira.” Ela retrucou nervosamente.

“Pai.” Eu falei tentando não demonstrar meu medo. “Ela tem razão, vocês precisam tentar sair daqui.”

“Mas filha...” meu pai começou a dizer, mas eu balancei a cabeça para ele parar.

“A culpa é minha.” Falei. “Eu tenho que resolver isso sozinha, vocês devem ir para dentro de casa.” Ou pelo menos devem tentar. Pensei. “Agora.”

Eles se levantaram devagar, pelo canto do olho percebi que papai havia se encarregado de levar meus irmãos para dentro de casa, eu vi que tinha razão em ter mandado eles entrarem, as cobras não fizeram nada para impedi-los de ir para casa, mas assim que dei um passo elas sibilaram e mostraram as presas para mim, me impedindo de passar.

Meu coração estava pulsando a uma velocidade incrível, a adrenalina corria pura em minhas veias, então, mesmo sem saber como, eu percebi que a cobra que estava do meu lado direito seria a primeira a atacar visando meu pescoço, instintivamente ergui minha mão naquela direção e para minha surpresa eu a peguei pelo pescoço com tanta força que eu percebi que ia matá-la sufocada, mas não tive muito tempo para pensar nisso porque a outra decidiu que era a hora dela de atacar, repeti o gesto que havia feito com a mão direita e peguei a outra cobra, também, pelo pescoço. Elas se contorceram e se enrolaram nos meus braços, mas eu não afrouxei o aperto, elas não eram muito grandes e isso me ajudou bastante.

Quando as duas estavam flácidas em minhas mãos eu as larguei, eu sabia que elas estavam mortas e que naquele momento eu tinha problemas mais urgentes para resolver.

Suspirei e comecei a andar na direção da casa, meu pai, meus irmãos e minha madrasta estavam olhando para o quintal pela janela, e Margaret não parecia muito feliz com o que havia acontecido no jardim, ela me olhava com uma expressão que me disse que eu estava completamente enrascada. Voltei os olhos para a expressão de meu pai e percebi que era uma mistura entre o choque e a raiva com alguma coisa a mais.

Entrei na casa e fui onde eles estavam, esperei por gritos, por acusações, mas nada disso veio, apenas o silêncio, nada mais. Abaixei a cabeça, não querendo ver o olhar de decepção de meu pai.

“Annabeth, acho melhor você ir para o seu quarto.” Meu pai falou com a voz um tom acima de um sussurro, achei que ele estava muito tenso para falar mais alto.

Balancei a cabeça, concordando. Eu soube que esse ataque havia mudado alguma coisa na minha vida, eu só não sabia o que era. Percebi que não podia ser uma coisa boa pelos olhares de acusação que eu recebi, tanto de meu pai quanto de minha madrasta.

Assim que cheguei ao meu quarto fui diretamente para o banheiro, me tranquei lá e chorei enquanto tomava banho.

Aquele havia sido o meu pior aniversário.


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Notas finais do capítulo

*Nota da autora: Pessoal me desculpe por passar o tempo muito depressa, é que eu preciso seguir a ordem cronológica, e no livro diz que a Annabeth foge de casa aos sete anos, por isso passei o tempo um pouco rápido. E aí, o que acharam????