Eternal Flame escrita por bandolinz


Capítulo 32
3x05 - "Vou Fazer Desse Lugar Sua Casa"


Notas iniciais do capítulo

Ho Ho! Feliz Natal pessoal! .õ/



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Desliguei o telefone pensando no que eu faria quando reencontrasse Jacob. Eu esperei por esse momento por tanto, tanto tempo.

Um motivo era tudo o que eu precisava.

– Não. Não faça isso Nessie. – pediu Edward aparecendo na sala.

– O que foi? – minha mãe perguntou.

– Billy está doente. – eu disse.

– Charlie me contou.

– Eu vou até Forks. Ver como ele está.

– Nessie, duvido que haja algo que você possa fazer por Billy... – Bella começou.

– Não Billy. Jacob. Ele está precisando de mim, agora mais do que nunca, eu preciso ir vê-lo.

Bella me observou confusa.

– Por que isso agora, Renesmee? – ela perguntou por fim.

– Vovô acha que seria uma boa ideia nós irmos vê-lo e eu concordo. Nós deveríamos ir juntas. – eu disse. – Já faz tanto tempo, mãe. Tenho certeza de que Jacob está passando por um momento difícil e eu... Eu quero vê-lo.

Edward balançou a cabeça com pesar.

– E depois? Simplesmente irá embora? – ele perguntou – Você vai fazê-lo retroceder anos no processo de cura a troco de nada.

– Edward tem razão, querida. Jacob não iria querer que você fosse vê-lo por pena. E você vai sofrer ainda mais por ter que deixá-lo para trás mais uma vez. Não é uma boa ideia. – Bella franziu os lábios avaliando minha reação.

Desabei no sofá, derrotada. Tudo o que eles disseram era verdade. No que eu estava pensando? Ir ver Jacob quando eu sabia que não poderíamos ficar juntos só traria mais mágoas para ambos. Ele tentaria me fazer ficar e me odiaria o dobro quando eu fosse embora. Isso na melhor das hipóteses. Eu nem sabia se Jacob ao menos aceitaria me ver novamente.

A verdade é que eu não queria que Jacob se curasse de mim. Não enquanto eu tinha a plena certeza de que passaria o resto dos meus dias sofrendo pela falta dele. Eu queria me sentir completa outra vez, por um momento que fosse, e só Jacob me trazia isso. Estar ao lado dele me faz esquecer qualquer problema e acreditar na possibilidade de um final feliz, faz com que eu me sinta em casa. Pelo menos eu lembro que fazia.

– Por que não liga para ele? – Edward sugeriu me entregando o telefone, a expressão solidária.

– E o que eu vou dizer? – perguntei subitamente nervosa com a possibilidade de ouvir a voz de Jake.

– O que você iria dizer se fosse vê-lo? – meu pai ergueu uma sobrancelha.

Engoli em seco pegando o telefone.

– Não sei.

Passei alguns minutos daquele jeito: sentada encarando o telefone, caçando em minha mente as palavras certas para dizer. Mas as palavras certas apenas não existiam.

Observei meus dedos lentamente discarem os números da casa dos Black.

Chamou uma, duas, três vezes até que alguém atendeu.

– Alô? – atendeu uma voz feminina.

– Oi, Jacob está? – falei insegura.

– Jake, é para você. – agora que ela falou uma frase completa, reconheci a voz de Rachel.

– Quem é? – ouvi Jacob perguntar num tom de desinteresse.

Meu coração disparou ao ouvir a voz dele. Ainda que não estivesse alta e clara, era a voz dele.

– Hum, desculpe, quem fala? – Rachel perguntou.

– Renesmee.

Houve um longo instante de silêncio, longo o suficiente para me fazer tremer de ansiedade.

– Er, Jacob não pode falar agora, Renesmee. Quer deixar algum recado?

Foi como se eu levasse uma tapa na cara.

– Não, está tudo bem. Eu ligo depois. – a frase saiu engasgada. – Tchau Rachel.

Desliguei sentindo a rejeição cair sobre mim como uma avalanche de gelo.

Como a frieza de Jacob ainda conseguia me afetar tanto? Quero dizer, eu já deveria estar acostumada a ser ignorada, após nove anos de silêncio, mas ainda assim doeu.

Ok, eu entendi, ele não iria dar-se ao trabalho de me escrever, mas se recusar a atender um telefonema? A que ponto nós chegamos, se ele nem sequer quer falar comigo? Será que Jacob realmente me odeia tanto assim?

– Renesmee? – minha mãe chamou num tom cauteloso, como se falasse com algum animal ferido.

– Eu... Eu vou para o meu quarto. Não estou me sentindo bem. – falei me levantando.

Bella segurou minha mão, parando na minha frente.

– Querida o que houve? – ela perguntou, os olhos dourados nublados pela preocupação.

Desviei meu olhar do dela, procurando me acalmar, mas era inútil. Quando ergui a vista para encarar Bella, meus olhos já estavam turvos pelas lágrimas.

– Ele nem quis falar comigo, mãe. – contei.

– Ah, meu amor. Não fique assim. – disse Bella me puxando para um abraço frio, contudo aconchegante. – Não posso acreditar que Jacob fez isso, deve ter alguma razão.

– Ele me odeia, mãe. – gemi.

– Shiii, claro que não odeia, Renesmee.

Bella me puxou de volta para o sofá e eu deitei com a cabeça em seu colo. Meu pai ficou parado de pé à nossa frente, a expressão torturada.

– Ele estava lá... Eu o ouvi... E por um momento eu pensei... – eu não conseguia terminar uma frase, dividida entre a raiva e a tristeza. – É isso. Jacob já me superou e eu aqui que nem uma idiota, chorando por ele, escrevendo cartas estúpidas, pensando em visitá-lo. Argh! Como eu o odeio!

– Não odeia não. – Bella sussurrou, afagando meus cabelos.

– Mas eu queria odiar. Ou pelo menos esquecê-lo, como ele me esqueceu...

Edward se agachou em frente a mim e me deu um quase sorriso.

– Nessie, você não vê que essa é a estratégia de Jacob? – disse.

– Como? – perguntei enxugando as lágrimas.

– Jacob está levantando todas as barreiras possíveis para que você sinta mais falta dele. Não percebe que ele nunca responde suas cartas por isso? Se ele te der a resposta que você tanto quer, seria como te libertar e você não teria razões para procurá-lo. Ele está tentando levá-la ao limite para ver se você desiste de ficar longe dele.

Pisquei algumas vezes, abismada ao perceber que as palavras de Edward até chegavam a fazer sentido. Se esse é o plano de Jacob, devo confessar, está funcionando. Mas quão determinado Jake poderia ser? Ficar incomunicável todo esse tempo, mesmo sabendo o quanto o silêncio dele me magoava, era inesperadamente cruel.

– Sempre machucamos aqueles a quem mais amamos, porque no fim das contas eles serão os únicos realmente capazes de nos perdoar. – Edward disse, afagando meu rosto, depois lançou um olhar de conivência para Bella, como se ele mesmo estivesse se desculpando por alguma mágoa causada no passado – Por isso, mesmo sendo difícil, Jacob sabe que você não irá se ressentir com ele por isso. Assim como eu sei que você já o perdoou, desde o momento em que você largou aquele telefone.

– Eu só queria que as coisas voltassem a ser como eram antes de toda essa bagunça começar. – desabafei – Jacob é meu melhor amigo, talvez o único amigo de verdade que eu já tive. É injusto que eu tenha de sacrificar isso também.

– Você fez a proposta de continuarem amigos e ele não aceitou. Foi escolha dele e tenho certeza de que Jacob sabe lidar com as consequências. Agora é hora permitir-se ter uma vida, sem se culpar pelo sofrimento de Jacob. – falou Edward.

Bella acenou concordando.

– Você não pode depender de uma resposta dele para sempre, Renesmee. Precisa começar a se perdoar. – ela disse.

– Vocês têm razão. – falei baixo, abraçando os dois – Obrigada.

Em seguida subi para o meu quarto e escrevi para Jacob, falando como eu me sentia mal a respeito do silêncio dele, mas que mesmo assim eu entendia e perdoava. Na mesma carta, desejei melhoras para Billy.

Ainda que eu não fosse enviar essa carta até o próximo dia 11, eu precisava colocar para fora tudo o que estava preso na minha garganta agora. Guardei a carta na minha gaveta, busquei MJ no guarda roupa e me atirei na cama, deixando o sono me envolver.


~


Quando chegou a segunda-feira, eu não poderia dizer que estava animada para ir à escola, entretanto não parecia uma ideia tão horripilante dessa vez. Quem sabe isso tenha algo a ver com o fato de eu estar curiosa a respeito do pai do Lefroy, o que era bobagem. Não é como isso fosse da minha conta ou como se eu de fato me importasse.

– Sério, Edward, vocês deveriam deixar a Nessie de castigo. Nunca um Cullen pegou detenção. – Emmett sugeriu, com um sorriso petulante no rosto, enquanto entrávamos no colégio.

Fiz uma careta para ele, o que apenas fez com que seu sorriso ficasse ainda mais largo.

– Isso só mostra como a Renesmee está conseguindo se misturar com os demais. – Alice pontuou.

– Detenção na segunda semana de aula? Isso não é se misturar! Provavelmente é algum tipo de recorde até para o padrão humano. – Emmett gargalhou.

– Deixe Renesmee em paz, Emmett. – Bella apelou em minha defesa. – Tem certeza de que não quer que eu entre com você? – ela me perguntou, parando no corredor.

– Não, mãe, está tudo bem. – respondi em voz baixa.

Ela acenou concordando, o semblante ainda preocupado.

– Está tudo bem. – eu repeti, com mais ênfase, dessa vez, ostentando meu sorriso mais otimista – Não é como se eu estivesse prestes a ser interrogada pelos Volturi. – brinquei.

– Eu sei. – ela respondeu.

– Essa foi uma metáfora de péssimo gosto. – Edward comentou, parando atrás de Bella.

Revirei os olhos e dei um beijo no rosto de cada um.

– Vejo vocês no intervalo. – falei, e então entrei sala da conselheira estudantil.

Uma mulher magra, de meia idade e com aparência oriental me esperava, sentada atrás de uma escrivaninha.

– Com licença, queria me ver?

– Renesmee Carlie Cullen?

Fiz que sim.

Ela ajeitou os óculos me observando e gesticulou para que eu me sentasse na cadeira em frente a ela. Não pude deixar de notar as armações coloridas e extravagantes dos seus óculos, assim como os adereços multicoloridos que preenchiam sua mesa.

– Bom dia Renesmee. Sou Elisabeth Craig, sua conselheira estudantil. – ela me sorriu educadamente – Eu lhe chamei para conversarmos sobre o seu comportamento durante a aula do senhor Jackson sexta-feira.

Balancei a cabeça uma vez para indicar que estava ciente. Ela rapidamente buscou uns papéis na gaveta e após uma breve olhada neles, continuou.

– Aqui diz que você alegou estar se sentindo mal para sair mais cedo da aula, entretanto não compareceu à enfermaria.

– Oh, sim. Eu estava tão mal que acabei indo direto para casa. – menti.

– Veja bem, Renesmee, entendo que por ser nova aqui ainda pode levar algum tempo para você se acostumar com o sistema do Kayhi, entretanto preciso que você esteja ciente de que não posso fazer outra coisa a não ser deixá-la uma semana na detenção, como o Senhor Jackson indicou.

– Eu entendo senhora Craig.

– Senhorita. – ela corrigiu.

Três batidas na porta.

– Bom dia Lisa. – um sorridente Gabriel Lefroy entrou na sala.

– Olá, Gabriel. Como tem passado? – Senhorita Craig o cumprimentou com a expressão iluminada.

Não pude deixar de me surpreender com a informalidade dos dois, tratando-se pelo primeiro nome. Com apelidos até.

Lefroy não esperou pelo convite da senhorita Craig para sentar na poltrona ao meu lado.

– Oi bailarina. – ele piscou para mim.

– Oi. – respondi sem maiores floreios.

– Ora, ora, vejamos por que você está aqui, Gabriel. – a conselheira dizia enquanto corria os olhos pelos outros papéis em sua mesa. – Oh, parece que você também deixou a aula do senhor Jackson sem autorização.

– Exato. Precisei ir buscar minha irmã no hospital. – disse ele sem rodeios.

– Oh! – ela suspirou em choque – Algum problema com a jovem Catherine? – perguntou parecendo genuinamente preocupada.

– Agora já está tudo bem. – Gabriel respondeu acalmando-a.

– Que bom, fico aliviada em saber. Infelizmente não tenho outra escolha a não ser deixá-lo uma semana de detenção, assim como a senhorita Cullen. Sabe como o professor Jackson é. – ela franziu o cenho.

– Sem problemas. – ele deu de ombros.

– Então é isso. Comportem-se, vejo os dois após o horário de aula. – ela sorriu, nos dispensando. – Mande lembranças à Catherine. – senhorita Craig acrescentou, esticando-se na cadeira enquanto nós dois saíamos.

– Lisa, uh? – murmurei irônica, estranhamente chateada pelo tratamento preferencial que o Lefroy acabara de receber.

– Sim, eu e a senhorita Craig temos um bom relacionamento. – Gabriel respondeu casualmente e por um momento achei que ele tinha deixado passar minha ironia. – Algum problema nisso?

– Não. Claro que não. – retruquei. – Só indica que você passa bastante tempo no conselho estudantil.

– A Lisa sempre me ajuda quando preciso faltar o colégio para ir ao dentista com a Catherine ou me atraso por levá-la ao colégio. Esse tipo de coisa. Confesso que tudo começou graças ao aconselhamento semanal que fui obrigado a ter com ela, três anos atrás. – disse ele abertamente.

– O que? Levou um fora da rainha do baile e não conseguiu lidar com isso? – eu não tinha razões para ser tão hostil com Gabriel, mas não conseguia evitar, as palavras apenas saltavam da minha boca.

– Não, quando meu pai morreu. – ele disse sério.

Engoli em seco, reconhecendo quão idiota eu fui.

– Eu sinto muito. – falei sincera.

– Ok, já faz tempo. – ele disse olhando reto por cima de mim.

– Não, é sério. Eu fui grossa com você, sem motivo nenhum. Ainda que tivesse motivo, eu não deveria. Sinto muito mesmo.

Mordi os lábios, preocupada, esperando que ele perdoasse meu comentário infeliz.

Gabriel me avaliou, sustentando meu olhar com seus olhos incrivelmente azuis por tempo suficiente para me deixar desconfortável. Depois voltou a caminhar em passos lentos e eu o acompanhei.

– Tudo bem. Acho que já estou ficando acostumado com isso. – ele disse por fim.

– Isso o quê? – ecoei confusa.

– Essa coisa de você só me tratar decentemente quando minha irmã está por perto.

Meu queixo caiu.

– Não é nada disso.

– É sim. – ele insistiu.

Talvez eu seja um pouco mais legal com você quando ela está por perto. É que não quero magoá-la. Eu gosto da Cat, ok?

– E de mim você não gosta. – ele parou na minha frente, se inclinando para o rosto dele ficar na altura do meu.

Senti minhas bochechas formigarem devido ao tom provocativo que ele usou e, óbvio, pela súbita proximidade.

– Não tenho nenhuma razão especial para gostar... – aleguei no tom mais neutro que consegui, lutando contra o impulso de me afastar dele. Eu não quero passar a falsa impressão de que ficar perto dele me afeta de alguma forma.

– Mas aposto que você tem uma ótima razão para não gostar. – Lefroy argumentou, erguendo as sobrancelhas sugestivamente. – Você é legal com todo mundo, menos comigo.

Talvez tenha algo a ver com o fato de você ser um cafajeste que se esconde atrás dessa fachada de bom moço, que é muito convincente, por sinal.

– Não tenho nenhuma razão para não gostar de você. Deveria ter? – perguntei com o ar mais inocente.

– Não. Aliás, quando nos conhecermos melhor você vai acabar me amando. Verdade.

Eu ri alto.

Se nos conhecermos melhor. – corrigi.

Quando. – repetiu ele, um sorriso travesso brincando nos lábios.

– O que faz você ter tanta certeza de que, eventualmente, vamos nos conhecer melhor? – questionei entrando no jogo dele.

– Porque algo me diz que por trás dessa superfície deslumbrante, irônica e irritante, você é uma boa pessoa.

Ele acabou de me elogiar em meio a dois insultos?

– E parece estar realmente precisando de um amigo inteligente e divertido como eu.

Eu ri. Uma risada longa e verdadeira da qual eu nem lembrava ser capaz de produzir.

– Inteligente, eu não sei, mas sou obrigada a concordar na parte do divertido.

Gabriel sorriu satisfeito e por um instante seus olhos azuis brilharam como os de Cat faziam quando ela falava sobre suas aulas de balé.

De tudo que o Lefroy falara, sobre uma coisa ele estava absolutamente certo. Eu não poderia me dar ao luxo de afastar pessoas, ainda mais alguém que me fizesse sorrir, como ele estava fazendo agora.

Eu precisava desesperadamente de um amigo.

Antes que eu pudesse formular algo audacioso e divertido para dizer, Jennifer Collins apareceu do nada se jogando nos braços do Lefroy.

– Gabe, meu amor, senti sua falta! – ela disse, emendando um beijo apaixonado logo em seguida.

Enquanto os dois se beijavam, eu desviei a atenção para os cartazes no mural ao lado, me sentindo como se estivesse invadindo o espaço dos dois. Bem, eu e o Lefroy estávamos meio que no meio de uma conversa, não estávamos? Pareceria imaturo sair de repente sem nem dizer tchau. Ou talvez fosse exatamente o que eu deveria fazer.

Gabriel a afastou por fim, parecendo ligeiramente atordoado.

– Jen, você conhece a Renesmee? – ele gesticulou na minha direção.

– Claro. Temos duas ou três aulas juntas não é? – ela falou com um sorriso moderado.

Concordei, sorrindo educadamente em resposta, e logo ela voltou sua atenção para Gabriel.

– Você vai me acompanhar até minha sala? – ela perguntou, fazendo charme.

– Er, hoje não, Jen. Eu e a Renesmee temos aula de Literatura agora, você sabe como o professor Campbell é pontual.

– Tudo bem. – Jennifer respondeu sem hesitar um instante. – Te vejo no almoço.

Gabriel a beijou rapidamente e logo ela saiu, sem parecer remotamente ofendida pela recusa dele ou incomodada pela minha presença.

Ela deve confiar muito no namorado. Ou já está tão acostumada a ser traída que nem se dá mais ao trabalho de demonstrar ciúmes. Não que haja motivos para ela ter ciúmes de mim.

– Vamos? – ele chamou e fomos juntos até a sala.

Apesar da ligeira aproximação com o Lefroy, me sentei perto de Karen e Emma, como na semana anterior. O professor Teodoro chegou logo em seguida.

A manhã passou rápido, provavelmente porque eu gostava dessa aula. Almocei com minha família e não voltei a conversar com Lefroy até o fim do período da tarde.

Quando o sinal tocou, para todos irem embora, Emma veio falar comigo.

– Detenção, huh? – disse ela parada como uma estátua ao lado da minha carteira.

– É. – respondi, guardando minhas coisas sem pressa. Preferia sempre ser a última a sair da sala ao invés de correr para fora assim que o sino tocava como os outros faziam.

– Bem, como ninguém nunca faz nada nessas duas horas de “castigo”, talvez você queira dar uma lida nisso. – ela disse, deslizando um papel sobre minha mesa.

Era o jornal da escola, uma edição de junho - fim do ano letivo anterior. O tema principal era o baile de formatura e entre várias notícias, a que se destacava era uma intitulada de “A traição do ano – Gabriel Lefroy é visto no baile acompanhado de uma garota misteriosa que com certeza não é a loiríssima Miss Collins que todos nós conhecemos e amamos”.

– Pode ficar com esse exemplar. Só não conte para a Karen, ela guarda todos os jornais onde o Lefroy é notícia e sempre me implora por um reserva, assim ela pode recortar a foto dele. Mas acho que você precisava ler isso para saber onde está se metendo.

Antes que eu respondesse, Emma me acenou um tchau e saiu.

Ok, eu pensei. Não era da minha conta os casos amorosos do Lefroy. Ainda assim a curiosidade, como sempre, falou mais alto e gastei alguns segundos lendo as especulações a respeito da garota desconhecida e algumas divagações sobre o rumo do namoro de Collins e Lefroy após essa traição pública.

O texto não passava de suposições, claramente sem fundamento algum. A única ‘evidência’ verdadeira era a foto que ocupava um quarto da página, onde Gabriel sorria largamente, entregando uma flor para uma garota, cujos cabelos escuros caiam em cachos escondendo seu rosto.

Coloquei o jornal dentro do meu caderno e caminhei perdida em pensamentos até a sala da detenção. Havia quatro pessoas lá e Gabriel era o único rosto conhecido, além da senhorita Craig. Ele sorriu ao me ver e eu dei um sorriso fraco em resposta, mesmo assim sentei na primeira cadeira livre, perto da porta, local oposto ao dele.

A senhorita Elisabeth pediu para iniciarmos as atividades de casa, pois ela precisava sair por meia hora para aconselhar um garoto do segundo ano cujos pais acabaram de se divorciar.

Pode-se dizer que o perfil dos alunos reunidos aqui era do tipo dos que não poderiam se importar menos com o que a conselheira Craig falava.

– É isso. Comportem-se, pois logo, logo voltarei para dar uma checada em vocês. – ela disse, deixando a sala.

Não demorou, Lefroy puxou uma cadeira para perto de mim, sentando ao meu lado.

– Hey, bailarina. – disse levemente.

– Oi Lefroy. – respondi em voz baixa, mantendo os olhos no meu caderno, enquanto escolhia uma página qualquer para fazer a atividade.

– Sabe que não precisa de fato fazer a tarefa não é? – ele perguntou com divertimento na voz.

– Vou ter que fazer de qualquer jeito. – falei girando o caderno e o jornal caiu dentre as folhas.

– O jornal da escola. – ele murmurou, apanhando o papel do chão e colocando sobre a minha mesa – Eu deveria ter adivinhado.

– O que? – me fiz de desentendida.

Por que raios eu não joguei esse papel no lixo, mesmo?

– Você não confia de mim por causa do jornal da escola. – explicou. – O que por sinal, é um equívoco. Essa coisa é sensacionalista.

Analisei a expressão dele e não pude deixar de notar que Gabriel parecia um tanto decepcionado.

– Sensacionalista por que inventou que você trouxe outra garota ao baile enquanto sua namorada estava de cama? – sugeri em um tom educadamente dissimulado.

– Não. Foi exatamente isso o que eu fiz. – ele confirmou, para meu completo espanto. – Mas eu não traí a Jennifer. Ela sabia que eu acompanharia a Sarah no baile – ele me informou.

– Eu não entendo.

– Sarah Golding. – ele disse apontando para a garota na foto – Ela se graduou no semestre passado. Não era do tipo que tinha muitos amigos, então não foi surpresa quando o baile chegou e ela não tinha um par. – Gabriel explicou – Foi bem quando a Jen ficou doente, daí Sarah me perguntou se eu poderia acompanhá-la no baile. Nós não éramos amigos, nem conversávamos na verdade, ela era bem tímida, o que me fez presumir que foi um tremendo sacrifício para ela tomar a iniciativa de me convidar. Eu iria passar o sábado em casa mesmo e decidi que não faria mal aceitar o convite dela. Até a Jennifer concordou que seria muita crueldade deixar a garota vir sozinha para o próprio baile de formatura. Não tem nada de romântico nisso. – ele gesticulou para a foto, contrariado.

– Então porque você não desmentiu essa história toda? – contestei, me sentindo mal por mais uma vez ter presumido o pior dele.

– Não faz diferença. – ele deu de ombros. – Em duas semanas ninguém lembra mais disso.

Houve uma longa pausa silenciosa.

– Que tal começarmos a perguntar as coisas diretamente um para o outro ao invés de ficar criando hipóteses? – Gabriel sugeriu.

Procurei algum sinal de ressentimento em sua voz, mas quando olhei para ele e vi que seus olhos eram gentis.

– Seria bom. – tentei sorrir.

– Eu, por exemplo, estou morrendo para saber se você é tão boa bailarina como diz. – ele falou num tom divertido.

Eu ri baixinho.

– Melhor do que você imagina. – provoquei.

– E convencida. – ele riu. – Cor preferida?

– Lilás, eu acho.

– Lendo algo atualmente?

– De fato, relendo, Jane Austen, Orgulho e Preconceito.

– Por que eu não estou surpreso? – ele fez uma careta perfeita.

Ele continuava fazendo perguntas, algumas corriqueiras, outras nem tanto. Eu não havia perguntado nada até agora, até porque apenas uma pergunta sobre ele ecoava na minha mente e era algo um pouco mais complexo do que ‘Qual seu prato preferido’.

– Bem, já que eu estou fazendo todo o trabalho difícil, aqui... – Lefroy uniu as sobrancelhas, se endireitando na cadeira – Se você estiver curiosa, tenho dezessete anos, minha cor preferida é azul e eu gosto de cantar no chuveiro. Sou até bom nisso.

Eu ri incapaz de acreditar que ele estava mesmo dizendo isso.

– É verdade. – ele frisou me acompanhando nos risos. – Se quiser, eu canto pra você.

Eu afastei uma mecha de cabelo para olhar para ele e encontrei Gabriel repentinamente sério, me olhando fixo. Nossos olhares se sustentaram por um longo momento.

– Eu tenho uma pergunta. – comecei, ainda olhando profundamente nos olhos dele.

– Não tenho nada a esconder. – seu tom espelhava o meu.

– O que aconteceu com o seu pai? – perguntei por fim.

Gabriel piscou, sendo pego de surpresa pela intensidade da minha pergunta. Ele passou a mão nos cabelos, baixando a vista.

– Ele morreu em um acidente de carro, três anos atrás.

– Eu sinto muito.

– Eu também. – ele disse em um suspiro. – Mas não vamos falar disso. Temos uma lição de literatura para fazer.

Gabriel abriu o caderno e nós fizemos a atividade em dupla. Pouco tempo depois a senhorita Craig voltou, mas se limitou a ler um livro de romance durante os oitenta minutos seguintes e nos deixou fazendo o que bem entendêssemos até o horário da detenção acabar.

Bem que a Karen alertou que não tinha nada para fazer. Se não fosse pelo Lefroy, eu estaria no completo tédio.

A senhorita Craig por fim nos dispensou e Gabriel me acompanhou até meu armário.

– Como a Cat está? – perguntei.

– Está ótima. Ela já vai poder tirar o gesso em uma semana, o que significa que não vai ter de perder o festival de outono.

– Que bom. – sorri aliviada por ela.

Abri meu armário, colocando minhas coisas dentro.

– Um tanto impessoal, não? – Gabriel indagou.

– Uh, o quê?

– Seu armário. Todos os armários por aqui tem bastante informação saltando, você sabe, fotos de amigos, banda preferida, viagem dos sonhos. O seu... Nada. Estranho. Principalmente vindo de uma garota.

– Anda vendo armários de muitas garotas, senhor Lefroy? – falei com o intuito de desviar o assunto de mim.

Ele não caiu nessa.

– Por que você se esforça tanto para agir como se não fizesse parte disso? – ele perguntou a expressão séria.

– Não é isso. É que eu acabei de me mudar, ok? – falei fechando a porta de metal com um estrondo excessivo.

– Conheço garotas que teriam cuidado disso antes mesmo de pegar o horário das aulas.

– Exagerado. – suspirei revirando os olhos.

– Você está sempre na defensiva, não deixa ninguém se aproximar demais. E nas poucas vezes que você baixou a guarda, deu pra perceber que você não é assim. Está bem claro pra mim que alguém te magoou pra valer e agora você tem medo de se expor de novo.

A única pessoa que me veio à mente foi Jacob. Eu não só estava falhando miseravelmente em superá-lo, como tinha me fechado completamente para todo o resto. Tudo o que eu mais amava já foi tirado de mim uma vez, como esperar que eu seguisse me apegando às pessoas? Ou até mesmo a lugares, se daqui a três anos estarei indo embora de novo e Ketchikan não passará de mais uma cidade onde os Cullen estiveram?

– Eu vivi toda minha vida aqui no Alasca. Mal posso imaginar como deve ser difícil se acostumar em uma cidade nova, longe de todos os seus amigos. – Gabriel disse, se encostando aos armários.

– É meio solitário às vezes. Eles realmente fazem falta. – murmurei.

Jacob realmente faz falta, pensei.

– Eu só quero que você saiba que não está sozinha. – Lefroy sorriu, uma determinação crescendo no seu tom. – Porque eu vou fazer desse lugar sua nova casa.

Dei um sorriso triste, imaginando que por maiores que fossem seus esforços, isso seria impossível.

– Quer apostar?

Sacudi a cabeça em negativa, ajeitando minha bolsa nos ombros e caminhando em direção à saída.

– Boa noite Lefroy.

– Então é uma promessa! – ouvi a voz dele ecoando pelo corredor vazio enquanto eu alcançava a saída.

Enquanto eu caminhava pelo estacionamento frio até meu carro, um sorriso melancólico atravessou meu rosto, imaginando o quanto meus dias seriam melhores se, por um milagre, ele conseguisse.


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