A Brave New World escrita por Maria Salles


Capítulo 12
Capítulo 12


Notas iniciais do capítulo

"- São desculpas demais, isso sim. meus olhos estavam ardendo novamente, mas decidi que não iria chorar - Desculpas de alguém que está com medo. Você, Dimitri Belikov, é um temendo medroso! Tem medo de se comprometer com alguém, isso sim!"



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Um sentimento ruim permaneceu comigo nos próximos três dias após o ataque na festa. Um frio na barriga, um presságio ruim. Um strigoi havia atacado na festa. Em um lugar cheio de gente. E havia deixado o corpo de uma forma que... nem gostava de lembrar. Destruído, estripado, ensanguentado... Não desejaria uma morte nem para meu pior inimigo. Nem mesmo Roland.

Vik ficou em choque por um dia inteiro. Fora ela quem achou o corpo. Segundo ela, estava indo para o carro quando ouviu uma voz a chamar e foi atrás. Ela gritou e dois casais que namoravam lá perto a encontrou chorando ao lado do corpo de Roland. Mais uma prova que tudo fora premeditado. E que o strigoi, ou strigois, sabiam o que estavam fazendo.

Ela foi pra Academia mais cedo. No final da tarde do dia seguinte à festa. Ela e a maioria dos estudantes. Era mais seguro lá, com as wards e os guardiões. Ela ficou no quarto o tempo todo, falando apenas com Dimitri e Yeva. Comia por que era obrigada e a maior parte do tempo tinha aquela expressão vazia e distante.

- É tudo culpa minha...

Na tarde que Vik foi embora, apenas Olena e Yeva a acompanhou. Sonya ainda estava no trabalho, e Karolina havia saído para distrair Paul, que estava com instintos assassinos. Ele andava com um brinquedo fingindo ser uma estaca e dizia que ia matar todos os strigois. Karolina não achava saudável para ele, e resolveu que iria leva-lo para a Academia no dia marcado, e passar os últimos dois dias conversando com ele e o acalmando. Ficamos apenas Dimtiri e eu em casa, e meus acabei expressando meu pensamento em voz alta sem perceber quando estávamos na sala.

- O que? – ele ergueu os olhos do livro que estava lendo para mim.

- Tudo isso. Eu senti que havia um strigoi ali muito antes de ele atacar. Eu o senti duas vezes e ignorei! Por isso Roland está morto e Vik...

Suspirei pesado, sentindo alívio por tirar um peso da minha consciência. Eu era acostumada a guardar tudo para mim. A maioria das minhas angustias e preocupações, apenas para não acabar afetando Lissa. Era uma merda. Com Dimitri eu podia falar, desabafar, afogar minhas mágoas. Ele se manteria sincero comigo, dizendo o que acha, mas ainda sim encontraria uma forma de me confortar. Ter conhecido ele foi uma das melhores coisas que me aconteceu. Eu aprendi muito, não apenas como guardiã, mas como pessoa e, posso dizer que sim, como mulher.

- Claro que não! – Dimitri fechou o livro espantado – Rose, nada disso é sua culpa! E como poderia? Eles pensaram em tudo. Estavam atentos, vigiando. Mesmo você sabendo da presença deles, não teria feito diferença.

- Eu poderia ter feito alguma coisa. Dado um alerta, ou eu sei lá!

- Não teria feito diferença.

- Teria! Roland estaria vivo.

- Não estaria. Rose, era uma festa de despedida, cheia de jovens e bebidas. Acha que alguém acreditaria em você?

- Havia adultos e guardiões... – ele me olhou cético, e uma outra pergunta se fez em minha mente. – E você, Dimitri? Você acreditaria? Você acredita em mim?

Desde o incidente, Dimitri e eu não havíamos ficados a sós para conversar. Era um corre-corre, guardião pra lá pra cá, perguntas e preocupações. Na noite do ataque Dimitri me seguiu por que confiava em mim, mas não deixou claro se acreditava. E pela sua expressão a minha frente, ele também não sabia a resposta.

- Eu nunca vi isso antes, Rose. Eu não vou dizer que você está mentindo, mas não sei... Como isso seria possível? Por que você? E por quê?

Eu sabia a resposta pra isso. Eram poucas pessoas que sabiam do laço com Lissa e da minha... ‘condição especial’. Muito menos pessoas ainda sabiam da minha capacidade de sentir strigois ou de ver fantasmas. Yeva era a única aqui na Rússia que sabia. Ela e Oskana e Mark. E agora estava mais que na hora de Dimitri saber de mais do que apenas o meu relatório escolar dizia.

- Por que eu já morri uma vez, e tenho esse tipo de laço espiritual com o outro lado. – Dimitri franziu a testa e saiu da poltrona reclinável para ir sentar-se ao meu lado no sofá – Você sabe do acidente com a Lissa, três anos atrás. Ela foi a única que sobreviveu.

- E o fato de você estar aqui do meu lado vem do fato de...?

- Lissa me trouxe de volta. Ela estava assustada, em choque, não sabia o que estava fazendo. Ele me trouxe de volta a vida e ao mesmo tempo forjou um laço mental comigo. Ela pode...fazer coisas. Trazer alguém de volta a vida gasta muito seu psicológico e físico. Mas ela pode curar, e tem uma super compulsão. Mil vezes mais forte que os de um Moroi normal. Ele também pode entrar em sonhos, embora não saiba ainda como.

Dimitri me encarou, como se decidisse minha sanidade mental. Sua expressão se suavizou e vi que ele acreditava em mim.

- Então, quando ela te trouxe de volta, você meio que ficou conectada ao mundo dos mortos?

- É, bem isso.

- E isso te deu dons especiais. Que muita pouca gente, um número quase nulo, possuem?

- Bem por ai. – além de mim, havia Mark, mas não sabia se Dimitri sabia disso. E tinha também o irmão e guardião da Avery. Isto é, se eles não tivessem morrido.

- Então você sente strigois.

- E... vejo fantasmas. – acrescentei com hesitação. – Eu sei, sou uma aberração! Uma aberração da natureza!

Dimitri suspirou e esfregou a mão no rosto.

- Rose... você sabe que tudo isso é... quase impossível, não é?

- Você não acredita em mim?

- Eu não sei no que acredito ou não. Preciso apenas de um tempo para digerir tudo isso. – ele me olhou nos olhos e apoiou a mão em meu ombro – Rose eu confio em você. Eu sei que você não mentiria para mim. Não pense mal de mim por isso.

- Eu não penso. – respondi com sinceridade – Mesmo Dimitri. Eu até agradeço por você tentar, sabe? Por me ouvir. Realmente, são coisas demais. E ainda nem te contei tudo!

Suas sobrancelhas arquearam em espanto.

- E ainda tem mais?

- Sim. – eu ri de leve – mas outra hora de conto tudo. São três anos de informações, camarada. Não posso te contar tudo numa tarde.

- Vai me contar tudo neste final de semana. – era uma afirmação e não uma pergunta – três dias parecem ser mais do que o suficiente. Mas este final de semana.

- Tudo bem, então. – eu ri novamente, mais leve e divertida – Você vai acabar com os ouvidos doendo e cansado de ouvir minha voz.

- Eu duvido muito...

Eu estremeci. Pelo som de sua voz e a forma séria e o olhar profundo que ele me dava, eu sabia que ele se referia a enjoar de minha voz, e não sobre seus ouvidos. Ele pareceu perceber isso também, mas não tentou se retratar ou se afastar como ele fazia sempre que falava demais ou quando estávamos muito próximos. Ao invés disso sorriu e se precipitou para tocar de leve minha testa em um beijo gentil.

- Eu vou tomar banho – avisou-me ele se levantando – Logo todo mundo chega e vamos jantar. Depois que eu sair você poderia fazer o mesmo e ir se deitar um pouco, Rose. Você não dorme há muito tempo.

- Não estou com sono.

- Claro que não está. Seus olhos estão pesados assim por nada. – ele riu e foi para as escadas – estou falando sério, Rose. Descanse.

Eu revirei os olhos e cai deitada no sofá enquanto Dimitri ria ao subir as escadas. Finalmente algo bom aconteceu nessas 12 horas.

***

Eu nem percebi quando dormi. Deveria estar realmente cansada, e com a conversa com Dimitri, acabei relaxando e dormindo. Indo diretamente aos braços do sonho criado pelo Espirito.

O campo era o mesmo de antes, e Adrian estava sentando sob a árvore no mesmo morro que subimos da ultima vez. Estava todo de branco e parecia um  tipo de anjo caído, com os olhos verdes jade brilhante.

- Olá pequena damphir. - Adrian sorriu e bateu de leve na grama ao seu lado para que eu me sentasse – Você parece cansada...e apesar de ter alguns tons lindamente dourados em sua áurea, o negro está esta mais forte que da ultima vez que te vi.

- Que faz apenas dois dias. – eu ri apoiando a cabeça em seu ombro – Sabia que você não aguentaria de saudades e viria me visitar.

Ele riu e afagou minha cabeça. Ficamos em silencio por alguns segundos até ele quebra-lo.

- Você vai me fazer perguntar o que aconteceu?

- Houve um ataque de strigoi numa festa onde estávamos. Era um conhecido da Vik. Ela ficou mal e eu estou sentida por ela.

- Isso é barra. Mas ela vai ficar bem, Rose.

- Não sei não...- encolhi os ombros contra o corpo dele. –Vik gostava do idiota morto. Não era amor, mas gostava e foi ela quem o encontrou, então.

Adrian soltou o ar num sibilar e não disse nada. Não há nada para se dizer nestes momentos. Perder alguém que se ama... nunca experimentei algo assim e nunca quero experimentar. Se ficar longe de Lissa já era ruim o bastante... a ideia de nunca mais a ver era terrível demais.

- Rose, o que mais está passando na sua cabeça?

- O que? Nada, por que?

- Tem algo que te incomoda.

- Não é nada...- seu olhar me desarmou – é que me sinto culpada. Eu senti os strigois e não fiz nada.

- Por que não tinha nada pra se fazer.

- Yeah, foi isso que o Dimitri me disse... Que não mudaria muita coisa, e blá-blá-blá.

- Ele tem razão.

- E quando ele não tem? – respondi mal humorada. Adrian me olhou analiticamente, e de repente me senti igual um ratinho de laboratório – O que foi?

- Nada... é que você está... diferente. Sua áurea e... mais. Não sei. Esse Dimitri sei-lá-o-que parece estar te fazendo bem.

Notei um fundo de ciúmes e incomodo em sua voz. Era triste. O segundo homem em minha vida que me amava e eu não podia corresponder. Qual era meu problema afinal? Tinha uma espécie de imunidade a sentimentos do amor? Tudo que poderia sentir seria amor de irmão? Amor de amigo? Era isso? Acabaria uma guardiã ressentida e fria como minha mãe?

- Hm. – foi tudo o que disse, e era melhor mudar de assunto. – E como está Lissa?

- Ah... – A expressão de Adrian se turvou, um misto de tristeza, preocupação, raiva. – Está numa festa agora. Outra. Por isso vim me distrair e arriscar te encontrar. Ela começou a sair quase toda a noite. Christian vai quando pode, para tentar controla-la. Mas é quase impossível. Ela não quer ser controlada.

- Arght! Lissa age feito uma criança às vezes viu!

- Ela só quer chamar a atenção.

- Agindo feito uma idiota! – exclamei. Suspirei apertei a ponte do nariz. – Eu sei que isso é o Espirito. Eu sinto. Eu pego uma parte, e não se de onde estou conseguindo tirar forças para não acabar surtando como da última vez. Mas isso está refletindo o que ela é. Lissa é mimada, Adrian. Não negue isso.

Ele deu nos ombros, não negando nem concordando.

Lissa era minha melhor amiga, minha irmã. Mas não podia fechar os olhos para seus defeitos. Lissa era mimada sim. Mas não a culpo. Seus pais e seu irmão sempre a trataram como um bem precioso e raro – considerando o Espirito, ela é – mas fizeram isso de uma forma errada. Deram tudo a ela e nunca lhe disseram não. E a culpa também era a minha, pois também nunca tive coragem de negar o que me pedia.

- Rose, está na hora de ir. – Adrian me avisou e ergui a cabeça – Estão te chamando no mundo real.

Eu olhei em volta, e vi que o cenário começava a transparecer, transformando-se em nada.

- Tudo bem. Eu vou ver se consigo falar com Abe, pra poder ligar pra Lissa.

Nos levantamos e ele me abraçou com força, inspirando fundo, sentindo meu cheiro.

- Cuide-se pequena damphir. Logo venho te ver de novo. Semana que vem, talvez.

- Okay, Adrian.

Dei um beijo estalado em sua bochecha antes que ele desaparecesse como tudo a minha volta. A escuridão tomou conta de tudo, mas apenas por alguns instantes antes de abrir os olhos para a pouca claridade do mundo real, deparando-me com um par de olhos profundo e negros que sempre disparam meu coração ao encará-los.

- Minha ideia era que você tomasse banho primeiro, mas fico feliz que descansou mesmo assim.

Dimtri sorria pra mim, as pontas dos cabelos escuros umidas, grudando no rosto. Sua mão estava em meu braço, e imaginei há quanto tempo ele estava me chamando.

- Dormi demais? – indaguei me sentando no sofá e coçando o olho distraidamente.

- O tempo deu tomar banho e preparar algo para nós comermos. Minha mãe e avó vão passar a noite na Academia, é mais seguro. Karolina e Sonya vão chegar mais tarde, então seria bom se já jantássemos agora.

– Eu nem reparei que estava tão cansada... Foi só eu deitar e pronto, acabei dormindo..

Dimitri riu comigo e me levantei do sofá sentindo já o cheiro de comida. Meu estomago roncou alto e me senti envergonhada. Tinha até mesmo esquecido de comer durante o dia! Apenas o suficiente para me manter em pé, e isso, para mim, era pouco comparado com o que eu como normalmente.

- Okay, vou tomar um banho rápido e já desço pra comer.

Ele assentiu com um sorriso e voltou para a cozinha. Eu o olhei de costas, impressionada com o quanto ele podia ficar lindo e sexy estando tão simples e a vontade. Usava um conjunto simples de moletom azul escuro e ao invés das botas costumeiras, tênis preto. Os cabelos geralmente presos, estavam soltos e charmosamente despenteados. Dimitri, em toda concepção, era lindo. Usando a roupa que fosse, sendo qualquer hora do dia ou da noite. Estava sempre impecável, e isso era incrível.

Me dei um tapa mental para voltar a realidade e ir tomar logo um banho quente para acordar. Banho este que foi realmente rápido. Meu estomago começava a gritar por comida, e Dimitri se mostrara um cozinheiro tão bom quanto a mãe.

- Ainda tem aquele pão preto que você gostou, Rose. – avisou-me Dimitri quando cheguei à cozinha limpa, cheirosa e trocada. – Pode comer.

- A gente divide. – respondi com um sorrisinho – sei que você gosta dele tanto quanto eu.

Dimitri sorriu culpado e se sentou a mesa comigo. Comemos em um silencio confortável, mas ainda havia muitas coisas em rodando em minha cabeça. E eu precisava falar.

- Dimitri...

Eu me interrompi, procurando colocar em palavras tudo o que sentia de maneira que ele entendesse. Dimitri esperou pacientemente, como sempre era comigo.

- Tudo o que aconteceu... o ataque premeditado e tal. Isso está me fazendo pensar... – eu o olhei e ele me incentivou com um aceno de cabeça – Talvez... talvez tenham razão. Talvez eu seja muito nova e... eu tenho medo de não estar preparada. De acabar não suportando. Já experimentei a perda uma vez, e ver seu melhor amigo morrer não é algo no qual você supera fácil. E acho que nunca vou superar sabe... Não se supera a dor e a saudades. Você apenas se acostuma com elas e aprende a lidar com elas todos os dias.

Foi a coisa mais sensata e filosófica que eu havia dito em toda a minha vida. E era completamente verdade. Eu ainda me sentia culpada pela morte de Mason, e sentia sua falta todos os dias desde que ele se fora. Tentava compensar a falta que tivera com ele treinando mais arduamente, mas parece que não era suficiente.

- E se houver próxima vez? E se eu não estiver preparada? Se mais alguém... – eu me 

interrompi porque senti que meus olhos ardiam com vontade de chorar – Dimitri eu não quero ser fraca. Não posso ser. Quero estar preparada para o que der e vier, e não apenas agir por instinto, por que parece que só isso não funciona comigo. Eu falhei. Duas vezes. E duas pessoas morreram.

- Pensei que já tivéssemos concordado que você não teve culpa com o que aconteceu com Roland.

- Talvez... eu não sei. Mas eu teria, pelo menos, feito alguma coisa. Eu teria avisado e foda-se aqueles que não acreditaram. Mas não. Eu ignorei o aviso, eu deixei passar e olha o que houve.

Dimitri me encarou por um tempo e então esfregou as mãos no rosto em um gesto cansado com um suspiro. Ele odiava quando o ignorava, quando me culpava ou quando batia na mesma tecla de um assunto. As três juntas então era terrível demais para ele.

- Okay, Rose. – disse ele por fim, voltando a me olhar – entendi seu ponto. Você quer mais treinos, é isso?

- Não quero somente mais treinos. Quero treinos específicos. Todos os dias corremos, nos exercitamos e as vezes lutamos. Mas não é o suficiente e você sabe. Aqui fora é totalmente diferente da Academia. Não há como nos preparar para o desconhecido. Não temos como saber quando seremos atacados. Pessoas são previsíveis. Strigois não. Ainda mais em batalha.

Dimitri me encarou e pensou. Fico minutos em silencio, e não tive coragem de desviar o olhara dos seus. Eram determinados e misteriosos, guardados por uma máscara séria que dificultava minha leitura sobre ele. Em geral, eu o entendia muito bem. Pequenos gestos que passam despercebidos, para mim eram grandes mostras de sua personalidade e de quem ele era.

- Tudo bem. Mas você terá que prometer se esforçar ainda mais do que está se esforçando. Que não pode reclamar que estou pegando pesado ou qualquer coisa assim. Entendido?

- Sim! Estou disposta a fazer qualquer coisa que você mandar! Qualquer coisa.

- Começamos na segunda. Vamos deixar a poeira baixar e seu pé melhorar. Já que foi teimosa e insistiu no salto, agora será obrigada a ficar de molho com o pé pra cima o final de semana inteiro.

- Sim senhor, senhor! – eu bati continência e Dimitri balançou a cabeça, mas sabia que ele ria por dentro. – significa então que tenho que subir para o quarto agora? Já que tenho que ficar de molho, não posso ficar em pé e lavar a louça... sabe como é, pode piorar.

- Eu me pergunto de onde você tira seus argumentos.

- Passo a noite toda pensando, camarada. – eu ri e me levantei com ele – Isso foi um sim? Estou livre?

- Hoje  está. Mas só por que estou bonzinho com você, Rose. Você tem que descansar, por que a partir de segunda, eu prometo que não vou pegar leve com você.

- Estou contando com isso, camarada.

- Hey, Rose. – ele me chamou antes que eu saísse da cozinha – Você realmente vai insistir no camarada?

Eu não respondi. Ao invés disso eu ri e pisquei divertida para ele antes de dar as costas e subir para meu quarto.

***

Final de semana passou rápido. Talvez eu estivesse com essa sensação por ter o passado folgadamente de pé pra cima. Dimitri teve razão, não deveria ter usado salto. Meu tornozelo inchou de um tanto que parecia que tinha uma bola no lugar dele. Graças às ervas de Olena e às mãos milagrosas de Dimitri, eles estavam perfeitos no domingo à noite.

Mais uma lista para as qualidades de Dimitri: um exímio massagista. Suas mãos eram leves e precisas, exercendo pressão de maneira que não machucava, mas proporcionava certo alívio e até prazer. Não pude controlar minha mente quando ele massageava meu tornozelo. Imaginando como seria se ele subisse suas mãos e tocasse meu corpo em lugares que ante eu socava o safadinho que tentasse. Imaginava como seriam seus beijos e, bem, como ele seria na cama. Eu vinha pensando demais em Dimitri nas ultimas semanas e estava um pouco assustada com o poder que ele tinha sobre mim. O próprio Adrian disse que estava diferente, e que Dimitri me fazia bem. Isso me deixava extremamente confusa.

O que eu sentia por Dimitri nunca havia sentindo por mais ninguém. Era tão forte e profundo que chegava a me assustar. Eu estava completamente apaixonada por ele. E aconteceu tão de repente e ao mesmo tempo tão diferido que me atordoava o tamanho do sentimento que nutria por ele.

- Rose, está acordada ainda?

Eu havia ido para a cama mais cedo no Domingo. Dimitri tomou o lugar da irmã no quarto, mas eu havia cedido a cama para ele. Quero dizer, devolvido-a, já que pertencia a ele. Como Dimitri convencera Olena a deixar que durmamos no mesmo quarto, não sei. Mas não deveria ter sido muito difícil. Ela confiava nele, confiava em mim, e éramos todos adultos ali. Não era como se eu fosse ataca-lo no meio da noite ou vice-versa.

- Yeah. – respondi levantando a cabeça e me sentando na cama.

Dimitri estava encostado no batente da porta, seu rosto parcialmente iluminado pela luz do lado de fora do quarto. Vi que já usava seu pijama, moletom e regata, e devia estar se preparando para ir dormir também.

- Amanhã quando você acordar provavelmente já terei saído. – avisou-me – mas assim que tomar café e se aprontar, vá para o galpão. Não demore nem acorde tarde.

Seu tom de voz era de aviso, mas não era rude. Voltei a me deitar de lado na cama, sem tirar os olhos do contorno de seu corpo contra a luz.

- Pode deixar. Boa noite.

- Boa noite, Roza.

Dormi quase imediatamente. Não tive nenhum sonho. Nem com Adrian, nem com Lissa, nem nada. E foi bom pois acordei disposta e descansada no dia seguinte. Dimitri tinha razão quando disse que já teria saído quando eu acordasse. Ao descer para a cozinha, isso era antes das oito, com minha roupa de treino e pronta para ser esfolada viva, ele já havia acordado, se arrumado, tomado café e saído.

Olena, sabendo que meu treino seria ainda mais puxado, havia preparado um café da manhã reforçado e saudável para que eu não passe mal e aguentasse até a hora do almoço. Comi tudo que me foi oferecido, mas não arrisquei a comer mais de olho gordo. Não queria acabar vomitando no meio do treino. Então comi apenas o suficiente e sai para o galpão, ansiosa.

No caminho não encontrei ninguém. E quase não se ouvia os pássaros cantando. Era uma manhã fria, e todos deveriam estar em suas camas quentinhas e confortáveis protegidas do vento cortante e da neve que começava a cair e formava uma fina e perigosa camada de gelo na rua.

Cheguei ao galpão e, logicamente, não havia ninguém do lado de fora. Dimitri sempre me esperava do lado de dentro, geralmente sentado numa cadeira preguiçosamente lendo seu livro de cowboy.

Empurrei a pesada porta do lugar apenas o suficiente para me deixar passar, não queria arriscar a esfriar ainda mais o local. Metade das luzes lá dentro estavam apagadas, e as poucas acesas e a luz que entrava do vão da porta aberta dava ao lugar um aspecto sombrio. Não havia sinal da presença de Dimitri. O que era estranho. Ele nunca se atrasava.

- Dimitri?

Eu chamei e minha voz ecoou pelo galpão vazio. Dei mais uns passos para frente, sem ir muito longe da porta por precaução.

- Hey, camarada? – chamei novamente e comecei a ter um mal pressentimento sobre esse silencio. – Mas que merd...

Minha frase foi interrompida por um grito assustado que dei com a rapidez dos acontecimentos seguintes.

Surgindo de não sei onde, um par de braços fortes me agarrou por trás em um abraço apertado, pressionando meu corpo desconfortavelmente contra o seu. Não conseguia me livrar, havia me pego pela cintura e fechado sobre meus braços me imobilizando. A proximidade de seu corpo era muita e não conseguia desferir golpe algum com as pernas. Nenhum eficaz pelo menos. Logo em seguida, senti sua respiração quente em meu pescoço, e sua boca pressionou minha pele em uma mordida que não machucou, mas deixaria uma marca.

Meu corpo reagiu antes que meu cérebro. Senti o perfume que exalava dele, e era terrivelmente familiar. Era o mesmo perfume que embalava minhas noites faz quatro dias. Em seguida foi a forma como meu corpo reagiu automaticamente ao seu toque. Esquentando por completo em uma onda de calor e formigando no lugar onde ele mordera. Ele não me soltou do aperto de aço nem afastou a cabeça da minha. Seus lábios estavam próximos ao meu ouvido e senti sua respiração pesada.

- Se eu fosse um strigoi, - começou ele com a voz rouca e baixa me fazendo arrepiar – você estaria morta.

Sua voz era o que faltava para completar e confirmar o que eu já sabia. Dimitri afrouxou o aperto, mas não me soltou. Ele havia me pregado uma peça de proposito, e apostava que estava se divertindo a beça por dentro ao me dar esta lição.

Meu coração palpitava e a minha respiração estava acelerada, por causa tanto do susto quanto por causa da proximidade e força que Dimitri me segurava. Agora que conseguia me mexer, dei uma acotovelada em seu estomago forte o suficiente para afastá-lo de mim e não machuca-lo. Levei a mão automaticamente ao pescoço, encobrindo o lugar onde ele mordera.

- Seu idiota! – exclamei me virando para ele, que sorria de leve – Nunca mais faça isso, Dimitri! Nunca! Quase me matou do coração! Seu doente!

- Isso, Rose, foi uma demonstração. Você mesma disse noite passada que não podemos saber, adivinhar quando os strigois atacarão. Eles são mais fortes, mais rápidos e mais letais que nós. Temos que saber compensar isso com inteligência, ou acabamos mortos. Você confiou, literalmente, em seu estomago. Confiou no alerta físico e esqueceu do instinto e do que aprendeu na Acadamia.

- Está de dia. E tínhamos um treino marcado, obviamente minha guarda estava baixa. Você queria que eu tivesse usado minha estaca e te empalado, é isso?

- Esteja sempre atenta, Rose. De dia ou de noite. Nunca se sabe de onde ou quando o perigo pode vir.

Eu não respondi. Afinal, ele tinha razão. Ao invés de dizer algo eu o segui para o tatame logo após ter fechado a porta por completo. Dimitri retirou seu casaco de cowboy e eu tirei minha jaqueta de frio. Preparei-me psicologicamente. Esta manhã seria longa e dolorida. E eu estava preparada para ela. Que começassem os jogos!

- Tudo bem. – iniciou ele – vamos aquecer um pouco e então vemos o que você pode melhorar ou aperfeiçoar. Posso também de ensinar alguns golpes e truques com o tempo.

- Sim senhor, capitão. – disse-lhe me sentando e esticando uma perna para o lado para alongar.

- Rose, não estamos em um navio. – Dimitri permanecera em pé, segurando o joelho na altura da barriga – Não precisa me chamar de capitão.

- Prefere que te chame de que, então? De camarada?

- Dimitri tá de bom tamanho pra mim.

Eu simplesmente sorri sem respondê-lo e voltei a me concentrar no meu aquecimento.

Vinte minutos depois, Dimitri e eu estávamos aquecidos e prontos para treinar. Começamos com exercícios simples de bloqueio. Dimitri me atacava e eu bloqueava. Então ele apontava meus erros ou me dava dicas de como fazer de uma forma mais vantajosa para mim. Eu tinha uma grande vantagem e ao mesmo tempo desvantagem a meu favor: era mulher e mais baixa que a maioria dos strigois. Mas compensava isso com técnica e força, algo que sempre os pegava desprevenidos por me subestimarem. Dimitri me ajudou a reforçar esta vantagem com rapidez nos ataques. O segredo era não parar para pensar, algo que já fazia sem ninguém precisar me falar.

- Okay, vamos parar um pouco. – pediu após algumas horas de treino. Ambos suados e arfantes – Rose, me enganei quando disse que você era boa. Você é muito boa. Mesmo. Ótima! Tem técnica, instinto e estilo de luta.

- Obrigada. – agradeci pulando de alegria por dentro com o elogio – Mas Alberta fez um ótimo trabalho treinando comigo. Sem ela não seria metade do que sou.

- Não, Rose.  Alberta não te fez guardiã. Isso foi você. Ela apenas te lapidou. Colocou para fora o que você já era. Você é incrível.

Ele disse com tanta seriedade que fiquei sem falas. Não consegui nem pensar numa resposta engraçadinha para fazer. Puxei o ar com dificuldade e me obriguei a sorrir.

- Obrigada.

Dimitri pigarreou desconfortável, mas sorriu de leve para mim e voltamos a treinar. Ficamos repetindo movimentos, ele me corrigindo e indicando movimentos a manhã toda. Mas a tarde prometia ainda mais. Teríamos uma luta pra valer.

Almoçamos como se fossemos sobreviventes de uma guerra. Estava morrendo de fome e o cansaço ainda não havia me abatido, sendo obrigada por Dimitri a esperar ansiosa até que tenhamos feito toda a digestão antes de voltar para o galpão para a parte mais esperada por mim.

E então, a hora finalmente chegou.

Nós nos rodeamos antes de Dimitri vir pra cima de mim. Passei por baixo de seus braços, evitando que eles me agarrassem novamente. Em um embate de verdade significaria morte. Eu tentei pega-lo por trás, mas ele foi mais rápido e me virou antes que pudesse sequer pensar em estaca-lo. Meu chute era melhor e mais forte que meus socos, e me foquei nisso aproveitando que Dimitri era mais alto, portando mais difícil de bloqueá-los. Mas ele fez um ótimo trabalho se esquivando e segurando meu pulso com força tentando prede-lo contra as minhas costas. Eu dei um giro para me soltar, e sabia que mais tarde estaria vermelho e dolorido.

Adoraria dizer que estávamos em uma luta equilibrada e que bloqueava a maior parte das investidas de Dimitri, mas seria uma tremenda mentira. Eu conseguia me mantar em pé apenas por que não sentia dor por causa da adrenalina no circulando, mas Dimitri estava realmente acabando comigo. E deu seu golpe de misericórdia quando eu voltei s chuta-lo, mas ele segurou meu pé e não soltou. Sua intenção era me puxar e agarrar para ‘matar’, mas acabei me desequilibrando e ambos caímos no chão, Dimitri em cima de mim.

O tempo parou.

De repente ele estava próximo de mais. Os nossos corpos quentes grudados, ele me prensando contra o chão uma pressão suave. Eu podia sentir seu coração batendo forte, tão forte quanto o meu. Parecia que havia uma fogueira entre nós, por que o calor ficou subitamente insuportável.

- Eu acho que você ganhou.

Disse num murmúrio, sentindo a necessidade de quebrar a tensão. Mas parece que ela penas intensificou. Dimitri não se afastou nem respondeu, como se estivesse maravilhado demais para fazer qualquer uma das coisas. Honestamente? Eu também estava.

Dimitri me disse que era errado ficarmos juntos. Ele era meu tutor, afinal de contas. E uma vez, sem querer, em um treino, ele deixou escapar que tinha o lance da idade – ele era sete anos mais velho que eu – e o fato de estarmos morando na mesma casa. Dividindo o mesmo quarto, agora. Ele era muito apegado a condutas morais e regras. Eu estava pouco me fodendo pra elas. Éramos, ao mesmo tempo, iguais mais diferentes. E por mais que eu odiasse admitir, eu estava me apaixonando por Dimtiri. Rose Hathaway, afinal de contas, não era um coração de pedra! Agora eu rio ou choro?

Eu deveria ter me afastado. Dimitri deveria ter se afastado. Mas estávamos cansados demais para ignorar a forte tensão sexual que parecia se intensificar cada dia mais entre nós. Eu estava louca para saber como era a sensação de seus lábios, como seria o gosto de sua língua. Não poderia ser errado beijar uma pessoa, poderia? Mesmo quando a ama?

Sem pensar no que fazia, eu avancei para ele. Devagar, como se fosse um gato reconhecendo o dono. Envolvi sua nuca com uma das mãos e o puxei gentilmente para mim, sem encontrar resistência. Meus olhos esquadrinharam seu rosto. Seu nariz reto, a mandíbula desenhada, as sobrancelhas perfeitas, os lábios que pediam para serem beijados. Ergui meu olhar novamente para me afundar na escuridão de seus olhos. Cheios de carinho e plenitude. Foi esse olhar que me instigou a continuar. Quando encontrei o que procurava: Dimitri queria o beijo tanto quanto, ou mais, que eu. E com surpresa constatei que ele também me amava.

Eu o beijei.

O tocar suave dos lábios quentes desencadeou uma reação em cadeia. Começou calmo e suave, e então evoluiu para algo quente e urgente. Beijar Dimitri era ainda melhor do que havia imaginado. Ele era carinhoso e gentil comigo, seus lábios eram macios e deliciosos. Sua língua traçou o contorno do meu lábio antes de se insinuar para dentro de minha boca, começando um ritmo mais rápido e perigoso.

Ele segurou minha cintura e a puxou contra si, pressionando ainda mais nossos corpos. A outra mão percorreu minha barriga e segurou a barra da minha blusa, rocando em minha pele, provocando um formigamento na área. Envolvi meus braços em seu pescoço e joguei meu corpo sobre o dele para nos viramos e eu ficar sob ele. Minhas mãos desceram, então, pelo seu dorso e infiltraram por baixo da blusa dele, sentindo sua pele e seus músculos, que pareciam pulsar de tão quentes.

Eu teria continuado, e se Dimitri não tivesse impedido, o que começou como um simples beijo, teria virado algo mais. Algo que eu percebi que queria fazer [i]com ele.[/i]

- Rose, não! – sua voz estava rouca, em um murmúrio gentil. – Não. Por favor.

Ele tirou meus braços de seu pescoço e me tirou de cima de seu corpo com suavidade, procurando não ser bruto e acabar me magoando sem querer. Eu ainda estava impressionada com o quão rápido as coisas esquentaram e esfriaram entre nós para me dar conta da extrema gentileza que Dimitri estava agindo.

- O-o que? – indaguei temendo ter feito alguma coisa errada. – O que aconteceu, Dimitri?

- Aconteceu que é errado.

Ele se levantou e foi para a cadeira, pegar o casaco e vesti-lo.

- Errado? – perguntei cética – Errado, Dimitri? Como que pode ser errado?

- Eu sou sete anos mais velho que você. Eu estou monitorando você e estamos dividindo o quarto! Quer mesmo que eu diga o que está errado?

- Eu sou maior de idade Dimtri, idade realmente não é um empecilho.

- Não deixa de ser errado. – eu abri a boca para protestar, mas ele me interrompeu – Rose... eu já te disse o que achava sobre nós dois. São motivos demais para ignorar.

- São desculpas demais, isso sim. – meus olhos estavam ardendo novamente, mas decidi que não iria chorar - Desculpas de alguém que está com medo. Você, Dimitri Belikov, é um temendo medroso! Tem medo de se comprometer com alguém, isso sim!

- Rose... – ele deu um passo em minha direção, mas me afastei para o outro lado, indo pegar minha jaqueta – Você sabe que estou certo. Ainda mais, você tem o Adrian e..

- Deixe o Adrian fora disso. – eu me virei para ele com raiva e lágrimas embaçando minha visão – ele não dei nada a ver com isso. Nem sei como poderia! A culpa é sua, Dimitri. Toda sua. Você e essa mania de ser certinho, de seguir as regras o tempo todo. Foda-se tudo isso! Eu sei que bem que você quer chutar tudo por ai e sair quebrando a cara de idiotas que passam pelo seu caminho. Você, Dimitri, finge ser calmo e controlado por fora, mas por dentro você luta pra conseguir se manter na sua! Quer um conselho? Isso é um porre!

Eu saí do galpão sem deixar que ele falasse, e Dimitir tão pouco foi atrás de mim, uma atitude sábia. Estava com a cabeça quente, e a ultima coisa que precisava era de mais confusão naquela hora, pois eu amara beija-lo e queria mais. Mas neste exato momento, meu interesse era dar uns bons tapas na cara dele.


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Notas finais do capítulo

OKAY! Tudo postado agora!! Infelizmente, não terão mais um ou dois capitulos por dia, postarei assim que terminá-los. O 13 está em andamento, mas tenho uma coisa pra dizer: ROMITRI.
Espero que gostem e estejam gostando! Deixem Reviews, indiquem, acompanhem!

Enqunato isso, um spoiller do 13:

"- Não estamos brigados – respondi quase que imediatamente – Para que acha uma briga, é necessário que hajam conflitos de interesses ou opiniões. E o caso de Dimitri, claramente, não é nem um nem outro."