Pesadelo do Real escrita por Metal_Will


Capítulo 58
Capítulo 58 - Eleonora




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"Liberdade e felicidade não são a mesma coisa"

Capítulo 58 - Eleonora

 A pessoa diante de Monalisa e Ariadne era ninguém menos que a própria mãe de Mona. Ou pelo menos era esse o papel que ela fazia no Labirinto. No entanto, o que ela era agora? O que ela poderia fazer? Monalisa nunca mais conversou com a verdadeira face de sua mãe desde que saiu para a festa de Gabriel, dias atrás, época em que Eleonora ainda se passava pela guia para enganá-la. Agora ela estava ali, com uma presença obscura, embora sorridente. Quais seriam seus planos?

- N-Nos deixe passar - pede Monalisa, não passando nem um pouco de confiança na sua fala - Não temos nada a tratar com você!

- Como pode dizer isso? Eu sou sua mãe! - responde Eleonora.

- Como você é capaz de dizer isso! Mentiu para mim o tempo todo! Disse que seria a minha guia...e na verdade só queria me manter aqui dentro

- Isso não foi uma mentira. Eu sou sim a sua guia - ela volta o olhar para Ariadne, que apenas mantém um olhar firme - Muito melhor do que essa garota!

- E ainda tem coragem de dizer uma coisa dessas? Por sua culpa eu quase fico presa nesse lugar por todo o sempre.

- Presa você diz? - Eleonora volta a olhar para Monalisa, agora com uma cara mais séria - Ficar aqui é sua maior segurança. Esse mundo foi feito unicamente para você. Se quero que fique aqui é porque eu te amo. Eu só quero o melhor para você!

- Conta outra...

- Lembro da primeira conversa que tivemos a respeito do Labirinto. Você disse que odiava esse lugar, mas não a mim. Já mudou de ideia tão rápido?

- Infelizmente, eu odeio tudo que esteja me impedindo de chegar na verdade.

- A verdade...é...parece que a verdade é mesmo mais importante que a felicidade, não é?

- Não posso ser feliz em uma mentira! Já falei isso milhares de vezes! - Monalisa responde rudemente -É por isso que quero chegar aquela Torre...não quero apenas sair. Quero saber o porque de estar aqui.

- Oh, a Torre de Esmeralda...é onde o Arquiteto vive.

- Pelo que entendi é a única pessoa que pode me dar as respostas.

- Isso mesmo. O Arquiteto é a pessoa que projetou esse mundo para você. Se alguém pode mudar as regras do Labirinto, esse alguém é ele.

- Então nem mesmo você nega isso?

- Mas não posso afirmar com certeza. O que impede dele se recusar a te contar qualquer coisa? Todo esse trabalho terá sido em vão.

- Mas como...

- Não a escute! - intervém Ariadne - Se conseguir encontrar o Arquiteto, ele vai te mostrar a verdade. Eu não estaria te acompanhando se essa não fosse a trilha certa. Lembre-se de que eu sou sua guia.

- É...é verdade.

- Você prefere mesmo escutar essa pirralha estranha do que eu? Sou sua própria mãe!

- Não...você não é a minha mãe - retruca Monalisa - Minha mãe é alguma pessoa fora do Labirinto. No máximo, você representou minha mãe aqui.

- Mas isso não muda o fato de que dentre todos no Labirinto eu seja a pessoa que mais te ama! - Eleonora fazia uma voz terna e chorosa, estendendo sua mão para ela - Me dê a mão, Monalisa. Podemos sair daqui agora e voltarmos para a mesma vida segura e tranquila de antes. Não precisa passar por tudo isso.

- Você sabe que nunca vou fazer isso...

- É uma oportunidade única que estou te dando, Monalisa. Essa pode ser sua última oportunidade de esquecer tudo e voltar a ter uma vida tranquila. Vai mesmo recusar isso?

- Vida tranquila? - repete a loirinha, com os punhos fechados e trêmulos  - Que sentido vai ter a minha vida sabendo que nunca poderei saber a verdade? Nunca terei paz tendo certeza que vivo em uma realidade projetada! Terei casa, comida e conforto, mas...mas...de que adianta tudo isso sem ser livre? Liberdade e felicidade não são a mesma coisa!

- A verdade... - balbucia Eleonora - ...e o que te garante que vai ficar com a verdade por muito tempo? O que te garante que suas memórias não serão apagadas fora do Labirinto? Como aquela vez...que você foi parar naquela cidadezinha ridícula.

 Monalisa se arrepiou. Principalmente porque ela sabia que aquela mulher estava falando a verdade. Eleonora estava consciente da passagem de Mona pela segunda camada, onde suas memórias foram deletadas e ela assumiu o papel de uma menina chamada Aurora. Aquilo ainda era um Labirinto, mas ela não tinha consciência de onde estava. Quando saísse, possivelmente ela também perderia as memórias de tudo, inclusive do próprio motivo de ter sido lançada em um Labirinto. Claro que Monalisa já havia pensado nisso e claro que ela já tinha uma resposta para isso.

- Eu sei...eu sei que corro esse risco, mas mesmo assim....mesmo assim o que importa é o agora. Agora eu tenho consciência de que estou sendo enganada e agora eu preciso saber porque estou aqui. É por isso que não quero sair pelo menos antes de me encontrar com o Arquiteto.

- Entendo. Então a sua escolha já está feita - fala Eleonora, jogando para trás seus lisos cabelos - Sendo assim...vou ter que te impedir de continuar.

- Impedir?

- Cuidado - fala Ariadne, segurando na mão de Monalisa - Eu sou sua guia, mas não sou necessariamente sua guarda-costas. Não garanto que vou conseguir te proteger.

- O que ela vai fazer?

 Antes que Monalisa conseguisse pronunciar um "a", o cenário muda radicalmente. De uma paisagem desértica noturna para um quarto também escuro, porém amplo e com cheiro de coisas antigas. Monalisa ainda segurava a mão de sua guia, mas não via sua "mãe" em lugar nenhum.

- E agora? Mudamos de lugar? - pergunta a loirinha - Nosso caminho atrasou?

- A questão não é que nós mudamos de lugar, mas sim o lugar que mudou - falou Ariadne - É diferente.

- Hã?

- Fique atenta...precisamos escapar daqui para chegar à Torre, mas a sua mãe pode estar escondida preparando alguma coisa.

- Ela não é a minha mãe!

- Que seja...mas não saia de perto de mim.

 Ariadne tenta andar da maneira o mais cuidadosa possível, mas até Monalisa repara que ela estava nervosa. Estranho para alguém que faça parte do Labirinto e seja ciente de tudo que está acontecendo.

- Parece nervosa, Ariadne...

- E estou. Admito.

- Mas você..

- Esse é um espaço restrito da Eleonora. Parece que nem mesmo eu consigo saber exatamente o que acontece aqui dentro. É verdade que se sairmos daqui vamos direto para a Torre, mas nem mesmo eu sei o que pode acontecer.

- Então...você não sabe como sair daqui?

- Saber como sair eu sei...o que eu não sei é o que aquela mulher está planejando.

- E como a gente sai?

 Ariadne aponta para uma porta no fim de uma escada em espiral, um pouco distante do local onde as duas estavam naquele quarto. Bastava ir até lá e abri-la.

- É naquela porta?

- Mas não é tão fácil. Aquela porta está trancada.

- Trancada? Oh, não, então...

- Isso mesmo - a voz de Eleonora ecoa pelo quarto e ela aparece bem atrás das meninas, sentada em um tipo de trono (embora mais parecesse um sofá) púrpura, rodeada de bonecas, sim, centenas de bonecas de vestido preto e babado.

- O que é esse quarto? - pergunta Monalisa.

- É exatamente o que a sua amiguinha falou, filha - provocou Eleonora - Vocês só poderão sair daqui se tiverem uma chave...e essa chave está dentro de uma dessas bonecas.

 O problema é que eram várias bonecas, todas muito parecidas, jogadas no chão. O quarto já era escuro e mesmo que houvesse algum meio de diferenciar cada uma delas, seria impossível de perceber devido a pouca luminosidade.

- Dentro delas? Então...tudo que precisamos fazer é...

 Ela escuta Ariadne quebrar uma das bonecas.

- Aqui não tem nada - fala a guia - Acho que vamos ter que abrir uma por uma.

- Uma por uma? Impossível! São muitas! - e parece que o número subia a cada vez que Monalisa olhava.

- Se não quer vir comigo, então fique aqui para sempre quebrando bonecas. Você já teve uma, não é, Monalisa?

 A garota lembra que uma vez ganhou uma boneca de seu pai, mas não se lembrava muito bem da ocasião. Foi há muito tempo e talvez tenha sido sua única boneca. Nunca gostou muito de brincar com ela. Quando criança preferia mais ler ou desenhar.

- Acho que tive...

- Claro que teve. Se quiser lembrar como ela era, basta olhar para o rostinho de cada uma dessas bonecas.

 Ao fazer isso, Monalisa se arrepia. De fato, todas as bonecas tinham o mesmo rosto da boneca que o seu pai havia lhe dado. Para conseguir a chave da saída ela teria que...quebrar bonecas idênticas a única que teve.

- Sim, eu me lembro daquele dia - fala Eleonora - Era seu aniversário de 5 anos...seu pai havia lhe dado uma boneca de presente. Você nunca a pediu, mas ele achou que fosse a sua cara. Foi um dos únicos momentos que você sorriu...tão linda.

- Monalisa...ignore-a.

- Mas... - ela continua a olhar para a boneca que tinha em mãos - É tão parecida com a que meu pai me deu...

- Não é? - concorda Eleonora - Vai ter coragem de destruir algo que te lembra um momento tão valioso? É uma pena que você não tenha aceitado vir comigo quando teve chance...agora não posso mais voltar atrás...

  A lembrança do momento fica mais intensa quando Monalisa olha de novo para o rostinho da boneca que tinha em mãos. Apesar de seu pai ter sido tão distante quanto sua mãe, aquele momento em especial marcou sua infância. Ela tinha uma lembrança positiva daquilo. Destruir aquela imagem mexia intensamente com a mocinha. Um estado mental conflitante tomou conta dela.

- Eu...eu não consigo - choraminga a Monalisa - Eu quero..mas eu não estou conseguindo..

- Escute, Monalisa, eu realmente não sei em qual boneca está a chave. Mas ou a gente quebra todas ou achamos um jeito de descobrir em qual delas está a certa...o problema é que quebrar todas pode levar muito tempo.

- Mais do que você imagina...mas não tem problema. Esse é um outro espaço restrito em que a morte e as doenças não entram.

- Como? - Mona volta o olhar para sua falsa mãe.

- Infelizmente...vocês ficarão aqui para sempre a menos que encontrem a chave.

- Uma hora vamos encontrá-la - falou Ariadne.

- Mesmo? Parece que fica cada vez mais difícil de achar - falou Eleonora, apontando para o número de bonecas que se multiplicava a cada segundo. Se o espaço não fosse infinito, o quarto já teria coberto com um mar de bonecas de vestido preto.

 "Por que eu não consigo?", pensa Monalisa, "Não é um desafio difícil...eu só preciso quebrar as bonecas...mas...mas por que eu me sinto tão apegada à imagem dela?"

- Mona - fala Ariadne - A cada segundo que passa...as bonecas vão aumentando e a boneca certa vai se perder no infinito. Vamos ficar aqui para sempre se você não reagir rápido!

 "O que está...havendo comigo? Por que...por que eu não consigo?", ela continua a pensar. E o ambiente fica sendo cada vez mais tomado por bonecas, como em um pesadelo sem fim. Já Eleonora assistia tudo de seu assento, sorrindo sadicamente. Como escapar dessa situação bizarra?


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Notas finais do capítulo

Mais explicações serão dadas no próximo capítulo (espero postar amanhã).
Até lá! ;)