Pesadelo do Real escrita por Metal_Will


Capítulo 35
Capítulo 35 - Confiança




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/138863/chapter/35

"Um ato de confiança dá paz e serenidade"

~ Fiodor Dostoievski

Capítulo 35 - Confiança

 A garota ainda estava meio confusa com a situação. Ela realmente ouviu aquelas palavras dos lábios de Ariadne? A guia havia finalmente despertado ou ela estava ouvindo o que não deveria ouvir em meio à tensão do momento? Mas ao que parecia, a ruivinha estava falando sério.

- Parece admirada, Mona - repara Ariadne, sorrindo tranquilamente - Mas é isso mesmo que ouviu. Muito prazer. Serei sua guia nesse Labirinto.

- Mas...quando? Como? Você...é você mesmo? - Monalisa ainda parecia cética.

- Sim. Sou eu mesma. Você sabe que sou - Ariadne responde, com uma aura pacífica e tranquilizante. Muito diferente do que ocorrera na outra linha do tempo - Deve estar se perguntando o que fez para isso acontecer, não é?

- B-Bem...eu só contei à verdade, embora estivesse achando que não ia adiantar muito.

- Na verdade, foi bem antes disso.

- Antes? Mas eu não nem tinha falado antes com você e..

- Ora, Monalisa, o que você acha que ativa o evento da guia?

- Não sei bem ao certo...imaginei que fosse contar a verdade para você e...

- Não. Não é isso. É algo bem mais simples - interrompe Ariadne. A forma com que falava exalava tranquilidade e paz.

- Mesmo? O quê?

- Você só precisava fazer uma coisa: confiar em mim.

 Confiar nela? Apenas isso? Olhando agora fazia sentido. Monalisa só passou a confiar em Ariadne na outra linha do tempo depois que descobriu ter sido enganada. Depois que o tempo voltou, Monalisa estava consciente de tudo que iria ocorrer e já confiava em Ariadne desde então. Mas se isso era verdade, então Ariadne já estava desperta desde o começo.

- Nesse caso...você já sabia que era guia...

- Antes de você falar comigo? Sim. Sabia.

 A notícia a deixa intrigada. No fim, tudo aquilo foi em vão? Por que passou por tanta tensão se desde que voltou no tempo já havia ativado o principal: confiar nela? Que explicações Ariadne daria quanto a isso?

- Não fique brava comigo - responde a ruivinha, como se adivinhasse os pensamentos da garota - Mas pelas regras do Labirinto era você que precisava vir até mim e não eu até você. Enquanto houvesse possibilidade de você dar o primeiro passo, eu não poderia agir.

- Então...agora que ouviu da minha boca que confio em você

- Posso agir livremente como guia. Desculpe por fingir até agora.

 Monalisa se deixa levar pelas lágrimas. Lágrimas de alívio. Agora tinha um norte na bússola para se orientar em sua jornada e o melhor: agora sabia que era um norte confiável. Finalmente havia conseguido liberar sua guia. O sentimento de paz que ela sente era inexplicável. Ariadne deixa que a loirinha a abrace e continue a chorar de alegria.

- Calma, calma. Tá tudo bem agora - diz Ariadne, dando alguns tapinhas nas costas dela.

- Finalmente eu te achei! - exclama a loirinha em meio a lágrimas - Não importa como você apareceu, o importante é que você está aqui! Por favor, me ajude!

- Claro. Eu existo para te ajudar - diz Ariadne, sem tirar a calma e o sorriso do rosto. Após mais alguns instantes, ela olha para o quarto e pega o caderno de sonhos de Monalisa  - Primeiro, quero me desculpar por isso.

 Monalisa enxuga os olhos e olha para o caderno com mais atenção.

- O que houve?

- Assim que entrei no quarto usei um evento para alterar as datas do caderno. Fiz isso para te deixar ainda mais paranoica. Desculpe.

- Me deixar paranoica? - pergunta Mona - Por quê?

- Bem, você devia estar planejando me contar a verdade desde o começo, por isso me deixou ver seu caderno de sonhos. Mas esses sonhos dizem muitas coisas misteriosas, ainda mais que eu apareço em um deles. As datas também estariam no futuro e isso pareceria estranho. Claro que eu sabia de tudo isso. Mas queria me passar por inocente a tudo isso eme divertir um pouco...desculpe se te maltratei.

- Sabia que as datas estavam corretas. Tsc. Vocês no Labirinto adoram me maltratar. Até você! - reclama Monalisa - Mas isso não importa mais...agora que você está do meu lado, não preciso mais me preocupar. É só seguir suas instruções e posso enfim descobrir a verdade.

- Bom, quanto a isso.. - agora a voz de Ariadne parecia mais séria - Não há garantias que tudo saia perfeitamente.

- Hã? Como assim?

- É verdade que minha função aqui é te ajudar, mas não estou com você 24 horas por dia. Os vírus podem agir enquanto isso..

- Esses vírus...como...

- Mona - Ariadne se levanta de repente - Vamos sair?

- Agora? De repente? Mas...por quê?

- Apenas vamos para outro lugar - diz ela - Acredite...vai ser melhor.

 Apesar de não ter entendido, Monalisa obedece. Ela calças os tênis, pega as chaves e vai até a porta. A loirinha não chega a levar seu caderno, mas Ariadne parecia querer discutir outra coisa.

- Desculpe agir assim, mas a sua casa não é um lugar onde eu me sinta bem...

- Acho que sei o porquê disso - murmura a loirinha, lembrando de quem realmente é a sua mãe.

- Isso mesmo. Sua mãe é um vírus - explica Ariadne, enquanto as duas caminhavam para um playground em uma pracinha próxima. Havia algumas crianças brincando, mas não muitas - Claro que ela sabe sobre nós duas, mas também sabe que você tem consciência da verdadeira identidade dela. Talvez ela não haja diretamente, mas pode dar sugestões sobre suas escolhas.

- Não vou seguir os conselhos dela agora que sei da verdade - retruca Monalisa - Não irei cometer o mesmo erro duas vezes.

- Espero que não - Ariadne se dirige para um balanço desocupado. Monalisa a acompanha, embora não se sentisse muito confortável em um brinquedo de criança. Ariadne começa a se balançar.

- Bem... - Monalisa iria começar algum assunto, mas faz uma pausa. Ariadne ouvia tudo enquanto se balançava.

- Sim? Pode falar. Estou ouvindo.

- Iria perguntar sobre o que devo fazer, mas imagino que mesmo você não possa me contar tudo.

- Não posso - responde a ruivinha - Eu sou uma guia, mas não tenho permissão para te mostrar todas as respostas de uma vez. Você terá que chegar à saída por suas próprias escolhas. Apenas apontarei as decisões que são corretas.

- Se você me disser todas as decisões certas, é o mesmo que me levar à saída, não?

- Não necessariamente. Você não tem a obrigação de acatar todos os palpites que eu der.

- Mas a sua função é me ajudar! Eu quero sair, então é claro que vou aceitar tudo que você me sugerir.

- Sim. Minha função é guiá-la, dando os conselhos corretos até à saída definitiva, mas...você pode escolher não querer sair.

- Não! - Monalisa balança a cabeça - É claro que quero sair! É meu direito saber a verdade!

- Sim, é verdade, é seu direito - Ariadne continuava se balançando devagar - Mas nada impede que você abdique desse direito.

- O Mestre dos Relógios já me falou isso uma vez - lembrou Monalisa - De que talvez valesse mais a pena aceitar o Labirinto e continuar a vida como sempre. Mas eu já estou envolvida demais nisso. Viver em um mundo onde todos escondem a verdade de você é cruel demais!

- Verdade...então...o que você acha que é a verdade?

- Acho que devo ter uma outra vida fora daqui. Sei lá. Como se acordasse de um sonho e iniciasse uma vida totalmente diferente.

- Sim. Provavelmente você se sentirá assim - responde Ariadne - Mas...o que garante que o lado de lá seja melhor que aqui?

- Nada - concorda Monalisa - Mas...também nada garante que seja pior. Vocês não me falam nada! Como posso saber?

- Tem razão. Não tem como saber. Nada impede que você ache o outro lado melhor.

- O único jeito de saber é saindo...ou acordando...ou seja lá o que for.

- Bem, tem razão. Mas se você parar e pensar, as coisas são bem relativas, né?

- Relativas?

- Se você sair do Labirinto e descobrir que lá fora é ruim, então aqueles que te levaram para fora seriam os vilões e os vírus, na verdade, seriam os bonzinhos.

- Não faz sentido...se vírus fossem bons teriam outro nome, não?

- Vírus são seres que precisam se hospedar em algo para continuar existindo. Não é interessante para eles que você saia, pois se alimentam da sua consciência nesse mundo.

- Se alimentam?

- "Alimentam" entre aspas - continua a ruiva, sem parar de se balançar - São programados para sentir prazer na sua alienação. Impedir a sua saída desse mundo é a única razão da existência deles assim como a minha razão é mostrar os caminhos que levem à saída desse mundo.

- Entendi...você existe para que eu saia, eles existem para que eu fique. Muito confuso.

- Errado. Não existo para que você saia. 

- Hã?

- Continuarei existindo enquanto houver possibilidade de saídas para você. Caso você decida continuar no Labirinto, minha vida continua normalmente, desde que as saídas continuem ativas.

- Mas...

- Mas caso as saídas fechem, eu não tenho mais razão de existir. Por isso, só me resta mostrar uma última saída.

- Que seria...morrer? - Monalisa fala esse último verbo com uma voz fraca. A impressão forte da outra linha de tempo ainda atormentava sua mente.

- Sim. O Labirinto tem infinitas saídas, mas mesmo que todas as outras fechem, uma sempre existirá. A saída da morte. Se essa for a única saída que eu puder te mostrar, terei que mostrá-la. São as regras - fala a ruivinha de forma fria e sem rodeios.

- Não! - Mona balança a cabeça negativamente, tentando espantar aquela cena ruim da cabeça - Não posso permitir que isso aconteça...quero sair, mas não desse jeito.

- Mesmo que você saia do Labirinto, o que garante sua vida eterna do outro lado? - pergunta Ariadne - Se o outro lado também for mortal, você terá que morrer algum dia.

- Eu sei, mas...não quero morrer sem saber a verdade.

- Hihi - Ariadne ri.

- Qual é a graça?

- Nada, nada. Ou melhor, não tenho permissão para falar muito mais do que isso...

- Tá vendo? É isso que me irrita! Por que eu não posso saber da verdade? Por que me escondem tanto o que está lá fora? Por quê?

- Não seria um Labirinto se a saída estivesse bem aí na sua cara, né? - responde Ariadne.

- Mas quero saber o por que de estar nesse Labirinto. Só isso!

- Se quiser saber a resposta, basta sair, não?

- É isso que eu quero desde o começo! Mas, claro, sem que precise morrer! A outra saída é mais difícil, mas pelo menos continuo viva!

- Sendo assim.. - Ariadne salta agilmente do balanço - Vamos começar a agir logo

- Tá legal. Qual é o próximo passo?

- Isso vai depender do que o Labirinto nos propor.

- Nem você sabe? Ah, já sei...vai depender do meu próximo sonho, não é?

- É...você aprendeu bem rápido como as coisas funcionam por aqui - sorri Ariadne - Talvez a saída esteja perto ou longe...tudo vai depender do seu sonho.

- Certo. Conto com a sua colaboração.

- Estou sempre colaborando...com a sua saída. Agora...se isso é bom ou ruim...

- Já disse que não vou mudar de ideia - afirma Monalisa, também se levantando do balanço - Já que decidi sair, vou levar isso até o fim.

- Que seja, então...vamos pelo caminho mais difícil. Conversamos amanhã - diz Ariadne, acenando.

- Hã? Já vai embora? Mas a sua mochila - Monalisa ia terminar a frase, mas assim que volta os olhos para a colega ela a vê carregando em suas costas a mesma mochila que havia deixado na casa - Como você...

- Desde que ninguém esteja olhando, posso fazer coisas assim...o Labirinto, lembra?

- Claro. O Labirinto - concorda Monalisa.

- Então...bons sonhos e até amanhã! Lembre de anotar tudo no seu caderninho! Até!

- Até e...Ariadne

- Sim? - a ruivinha se vira, sem tirar o sorriso do rosto.

- Obrigada desde já.

- Não precisa me agradecer. Estou aqui para isso. Tchau!

 Dessa vez ela vai mesmo. Enquanto vê a colega sumindo no horizonte, Monalisa senta-se novamente no balanço e sorri levemente. Parece que agora as coisas estavam começando a se acertar. Sentia em seu coração que teria mesmo chances de sair do Labirinto, mas, ao mesmo tempo, fica imaginando que tipo de vida teria do outro lado. 

"Acho que agora falta pouco", pensa ela, "Só preciso aguentar essa sensação de estar sendo enganada um pouco mais...só um pouco mais..."

  Após alguns minutos balançando e refletindo sobre tudo o que aconteceu, Monalisa se levanta e volta para casa. Agora aliviada, bem mais aliviada.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Pesadelo do Real" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.