Abstinência escrita por intothevoid


Capítulo 1
The Perfect Drug


Notas iniciais do capítulo

A síndrome de abstinência provocada pela falta de droga ocorre a partir de 3 a 10 dias do último uso. Causa mente confusa, problema de memória, reação emocional exagerada ou apatia, distúrbio do sono ou alteração, problemas de coordenação motora, sensibilidade ao stress, variando os sintomas de acordo com o tempo que passa.
Essa informação foi tirada de sites diferentes relacionados ao assunto.

~

A música usada é a The Perfect Drug, do Nine Inch Nails.
Combina com a situação. E particularmente acho que escutar NIN é como se drogar. rs (?)

Enfim.



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Abstinência

O peso que sentia sobre o peito o impedia de respirar.

Aquela dor já tão comum, que espreitava pelos cantos e invadia o próprio ser com violência o fazia sorrir de forma vazia. O fazia rir em desespero.

O silêncio tinha um tom agudo e irritante que lhe dava vontade de vomitar.

Indo e voltando, tudo parecia girar sem sair do lugar.

I've got my head but my head is unraveling

Can't keep control can't keep track of where it's traveling

I got my heart but my heart is no good

When you're the only one that's understood

Tudo o matava.

Tudo o fazia se sentir vivo.

Tudo no momento era nada.

Rolou sobre a cama, sem força, distraindo-se por um instante perdido com o movimento que o vento forte causava nas cortinas. Havia deixado as janelas novamente abertas.

Quem se importava afinal?

Fechou os olhos, ouvindo um trovão anunciar o inicio de uma tempestade.

Um alívio para a alma que não possuía.

Nada mais de silêncio.

Os cabelos escuros se esparramavam pela cama, tão absurdamente sem brilho quanto o próprio olhar.

Os lençóis jaziam amassados e ainda úmidos com o sangue da última vítima, deixando um cheiro forte no ar. Cheiro de morte.

O corpo ainda mais pálido e magro que o normal se mantinha imóvel, jogado sobre o colchão, frágil, tal como uma boneca quebrada.

Por quê?

I come along but i don't know where you're taking me

I shouldn't go but you're reaching, dragging, shaking me

Turn off the sun pull the stars from the sky

The more I give to you the more I die

Rolou novamente, pouco se importando quando o corpo atingiu o chão num baque surdo. Respirou fundo e levantou-se devagar, direcionando o olhar para o outro corpo jogado na cama. Inerte, vazio, frio.

Nada mais que um jogo. Nada mais que uma distração.

Tirar a vida de humanos lhe trazia um alivio momentâneo. Mas nunca era o bastante. Nunca. Nunca.

Precisava de outra coisa. Precisava de um jeito urgente e doloroso.

Estremeceu de repente, sentindo o corpo seminu arrepiar. Assim, fechou os olhos, impedindo-se de pensar.

Ficou daquele jeito por um longo tempo, sentindo-se anestesiado no próprio vazio.

E após todos aqueles minutos que lhe pareceram uma eternidade, finalmente abriu os olhos, direcionando-os imediatamente á janela por onde agora entravam pingos grandes e violentos.

And I want you

And I want you

And I want you

And-I-want-YOU!

Ofegou por um instante, sentindo-se ainda pior do que anteriormente.

Ignorando a si mesmo aproximou-se da janela, sentindo os pingos fortes e gelados lhe atingirem a pele pálida. Pensou em como gostaria de aproveitar aquilo. Mas era inútil.

Assim ficou um tempo ali, vendo de forma apática a chuva cair e o céu brilhar vez ou outra com um forte estrondo.

Porém seus olhos se focaram numa figura distante do outro lado da rua. E naquele instante tudo parou. Aquela pessoa parada ao longe não podia ser real. Gemeu baixo, sentindo-se tonto ao notar o sorrisinho de canto e os olhos negros tão intensos lhe encarando daquele jeito quase obsceno.

Após aquela constatação apoiou-se abruptamente contra a batente da janela, determinado a ir até ele, esquecendo até mesmo a quantos metros estava do chão.

Mas antes que fizesse qualquer coisa, um ônibus passou em alta velocidade pela rua, tampando por uma fração de segundo a imagem do homem ali na calçada. E quando deu por si ele já não estava mais ali.

Sentiu-se idiota. Frustrado. Irado. Perdido.

You are the perfect drug... The perfect drug... The perfect drug

You are the perfect drug... The perfect drug... The perfect drug

Saindo de onde estava, num ato violento e até irracional virou o criado mudo ao lado da cama, derrubando tudo no chão.

Não iria chorar. Não mais. Por mais que os olhos marejassem. Por mais que os soluços escapassem. Não iria se humilhar ainda mais.

O jeito que encontrava era deixar a raiva tomar conta do próprio corpo, descontando no que via pela frente.

Mas já não sentia alivio em destruir objetos.

Matar humanos não afastava aquele sentimento.

Aos poucos se corroia por dentro. Cada vez mais.

You make me hard when i'm all soft inside

I see the truth when i'm all stupid eyed

Your arrow goes straight through my heart

Without you everything just falls apart

Rangeu os dentes, sentindo uma necessidade enorme de sair dali.

Aquele lugar já não podia ser chamado de lar. Doía fisicamente ficar ali dentro. Sentia-se sufocado por lembranças. Lembranças boas. Lembranças ruins. Lembranças indesejadas.

Vestindo-se rapidamente, saiu dali. Podendo enfim respirar fundo enquanto se colocava sobre a própria moto.

Não se importava com a bagunça em casa. Não se importava com o cadáver sobre a cama. Não se importava com nada sem a presença dele ali.

Àquela hora as ruas estavam vazias, o zumbido do motor da moto junto com a água que caída do céu e também os trovões. Tudo trazia uma sensação de liberdade.

Acelerava e se sentia livre. Livre de tudo. Algo de excitante naquilo o fazia querer gritar. Não via o caminho, mas também não precisava. Não queria.

My blood wants to say hello to you

My fear is born again inside of you

My soul is so afraid to realize

How very little there is left of me

Após correr por um bom tempo, a chuva já diminuíra. Não sabia que horas eram. Não sabia para onde ir. Não podia voltar agora. Não podia ficar sozinho. Não podia voltar a si. Se fizesse, tudo desabaria.

Uma variedade de nomes lhe passaram pela cabeça então.

Nomes de pessoas dispostas a acabar com aquilo. Acabar de diversas maneiras.

Dor ou prazer. Qual o melhor para fazer esquecer o tormento em que se encontrava?

Passou a língua pelos lábios, acelerando ainda mais. Tudo ao redor girando de forma insana.

Não queria, mas precisava. Do que exatamente? Já não sabia mais.

And I want you

And I want you

And I want you

And-I-want-YOU!

Logo parou em frente a uma boate.

Aquele lugar.. Já estivera ali outras vezes com ele.

Mordeu o lábio inferior resolvendo entrar. Já estava ali de qualquer forma. Faria a noite valer a pena nem que fosse para beber até desmaiar.

O lugar estava cheio e barulhento como de costume. Mas quase não notou a agitação, indo direto para o bar e mantendo naturalmente uma expressão vazia no rosto.

Pediu uma bebida, mal reconhecendo a própria voz, tão baixa e rouca.

Um suspiro pesado lhe escapou pelos lábios. Já nem os notava.

Distraído, olhou ao redor, fixando o olhar no homem ao lado, que também pedia algo para beber.

Por um segundo pensou ser aquele que tanto queria ver. Pensou que talvez fosse outra ilusão. Outra peça pregada pela própria mente.

Mas parado ali ao lado estava apenas um humano. Um humano terrivelmente parecido com ele. Até mesmo no modo quase sensual que levava o cigarro aos lábios e tragava, sorrindo confiante, sorrindo predador.

E não bastou mais que um olhar correspondido para que minutos depois já se encontrassem num beco vazio trocando saliva de modo bruto.

Mas... Não era a mesma coisa.

Não se parecia nem um pouco com o que queria. E perceber aquilo em vez de se deixar levar fez com que ficasse irritado. Fez com que sentisse nojo. Nojo do humano. Nojo de si mesmo.

You are the perfect drug... The perfect drug... The perfect drug

You are the perfect drug... The perfect drug... The perfect drug

Assim, levou as mãos ao cabelo fino do estranho, entrelaçando os dedos ali com força e afastando a boca dele da própria.

Sorriu de um jeito perigoso, mordendo o lábio inferior dele com força e prensando seu corpo contra a parede, ouvindo um gemido baixo dele ao ter o membro friccionado.

A raiva aumentada cada vez mais e borbulhava por dentro.

Então deslizou a boca até o pescoço alvo, deixando as presas a mostra e mordendo ali com violência, sentindo-se melhor enquanto rasgava a pele dele, quase sorrindo ao ouvi-lo gritar.

Uma vingança indireta, talvez. Uma distração sem sentido.

Permitiu-se sugar o sangue que escorria abundante sem pressa, apreciando o desespero do humano enquanto sentia as próprias forças voltarem aos poucos.

Havia tempo que não se alimentava e fazer isso em vez de apenas vê-los sangrarem até a morte o deixava um pouco melhor.

Logo o outro foi se aquietando e em poucos minutos se silenciou.

Assim, se afastou, deixando o corpo vazio ir direto ao chão. Encarou aquele rosto que parecia tão familiar, sem vida, de modo indiferente. Sem qualquer remorso. Sem qualquer divertimento.

Dando as costas para ele, resolveu voltar para casa.

Take me with you

Take me with you

Take me with you

Take me with you

Enquanto atravessava a porta da sala e se dirigia ao quarto para limpar tudo, sentiu-se subitamente cansado.

Sentiu-se mal.

O odiava. Odiava ficar longe dele. Odiava não ver aquele sorriso convencido. Odiava tanto não ouvir suas provocações quanto não poder provocá-lo.

Odiava não sentir seu calor por perto. Odiava não escutar sua voz. Odiava não poder ficar simplesmente abraçado a ele, aproveitando sua presença. Odiava também ultimamente vir pensando em afastar essa carência com outras pessoas.

Mas acima de tudo odiava precisar tanto dele. Odiava se sentir sozinho no vazio daquela casa, esperando.

Without you...without you everything falls apart

Without you...it's not as much fun to pick up the pieces

Odiava ficar longe da droga que estava viciado, que o matava por dentro, mas que não conseguia ficar sem.

Without you...without you everything falls apart

Without you...it's not as much fun to pick up the pieces

Odiava a si mesmo por ainda amar aquele idiota, insensível e cretino.

It's not as much fun to pick up the pieces

It's not as much fun to pick up the pieces

Without you...without you everything falls apart

Without you...it's not as much fun to pick up the pieces

 -x-


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