Alterego escrita por Gavrilo, Drablaze


Capítulo 14
Capítulo 14




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— Yo.

O cumprimento informal podia parecer perturbador diante da atmosfera densa, porém o mais desconcertante era a figura familiar que realizou a saudação. Masaru, ou Evige, simplesmente agia como se estivessem nos velhos tempos. Não, talvez o tempo nunca tenha passado para ele. Um ano, cem anos, duzentos anos. Independente disso, o estilo de vida que defendeu por tanto tempo permanece inalterado.

Daisuke e Natt seguiram Evige em silêncio a caminho de seu escritório, escoltados por um esquadrão de militares femininas. Por coincidência eram muito... digamos, saudáveis e simpáticas. Evige provavelmente tinha incluído boas companhias femininas em sua lista de coisas legais a se ter, e disso dispunha em abundância com sua reputação e poder.

Evige era o único que parecia inteiramente confortável, tentando quebrar o clima impessoal com galanteios a Natt. Depois de um tempo, a garota finalmente desistiu de ignorá-lo e respondeu à altura:

— Não senhor, nós não nos conhecemos antes, eu nunca vim à esta cidade, eu não quero um guia turístico para me ajudar e se quisesse não seria o senhor. Também vou ter que dispensar o convite ao jantar particular, porque no momento prefiro comer meus próprios órgãos — respondeu com um sorriso forçado —. Mais alguma proposta?

Evige riu satisfeito e dirigiu-se a Daisuke:

— Ouch, fui rejeitado. É uma bela tsundere que você tem aí, meu amigo!

Logo chegaram ao seu destino, uma grande e colorida sala com os mais diversos equipamentos e enfeites. Evige queria comentar sobre tudo o que havia ali, mas Daisuke o impediu:

— Evige, antes de...

— Espere — interrompeu o político —. Por favor, pode me chamar de Masaru. Não é como se a esta altura fosse segredo ou algo do tipo, foi só uma medida que tive que tomar no desespero quando o mundo ainda estava uma loucura. Eu sei o que você pensou quando ouviu o nome "Evige", mas não me associe a esse maluco que usou você como cobaia há 100 anos. Tudo será explicado.

— Sim, é sobre isso que quero falar. O que aconteceu com você desde a catástrofe e por que parece tão jovem?

— Ah, digamos que eu cuido muito bem de mim mesmo, hehe. Bem, francamente não é uma história muito interessante, mas vou contar de qualquer forma. O presente é bem mais complexo e importante do que o passado.

Como caracterizou Evige, o mundo estava de fato uma loucura mesmo antes da catástrofe em si. Daisuke na época tratava as notícias com desprezo, mas o jovem Masaru tinha muito fascínio pelas teorias e especulações sobre fenômenos estranhos que ocorriam ao redor do globo. Um misterioso meteorito tinha sido avistado caindo na Terra, mas ninguém sabia ao certo onde.

Simultaneamente, começavam a surgir mutações inéditas em alguns seres vivos, incluindo humanos recém-nascidos. Pouco tempo depois, pessoas desapareciam sem deixar quaisquer vestígios para trás, incluindo Daisuke e sua família. Masaru não teve muito tempo para se preocupar com os outros, entretanto, pois havia uma ameaça de radiação na área.

Olhando para trás, parece que tudo aconteceu em um instante para Masaru: a grande explosão, mortes em massa, o advento de um grupo humanitário que se propôs a ajudar os governos, a descoberta do alterego, a destruição da vida como conhecia. Masaru inicialmente usou seus conhecimentos de engenharia e tecnologia para auxiliar na reconstrução de vários locais, mas sua carreira terminou tão rapidamente quanto começou.

A Aliança promovia a tecnologia AE, ou TAE, como ferramenta muito mais eficaz para resolver todos os problemas. Assim, técnicos com boa formação foram substituídos por experts em alterego. Isso porque não basta apenas conhecimento para dominar TAE; ela é uma extensão do alterego, e portanto precisa ser sentida pelo usuário. Como Masaru não tinha a afinidade necessária, seus conhecimentos logo foram reduzidos a nada.
Ou pelo menos nada legal, isto é. O mundo estava mais interligado do que nunca, à medida em que todos buscavam auxílio da Aliança, então Masaru trabalhava prioritariamente invadindo as redes de comunicação e vendendo informações aos interessados. Era um negócio arriscado, mas a única coisa que alguém como ele podia fazer.

Das 1000 armas TAE que tentou usar ao longo dos anos, conseguiu utilizar apenas 1, que se quebrou depois de uns 2 segundos. Incríveis 0,001%: essa era a parcela de armas que poderia utilizar em toda sua vida. Por isso foi logo detido por agentes secretos e teve seus olhos arrancados durante uma tentativa frustrada de resistir. E então seus olhos enfim se abriram. 

Quantos anos se passaram desde então? 5, 6, 7? Não importava. Masaru encantou-se com sua recém adquirida visão, a manifestação de seu alterego. Podia ver coisas que ninguém viam, compreender a estrutura de qualquer coisa. De início ficou mais confuso do que um cego comum, pois não sabia fazer sentido dos diversos números e linhas que via, mas passou os dias estudando como utilizar os dados ao seu favor.

Quando conseguiu escapar da prisão, na qual havia sido posto sem nem perceber, Masaru tentou retomar sua vida, mas sabia que as coisas nunca mais seriam as mesmas. Tinha conhecimento, podia enxergar diversas possibilidades, desenvolveu o gosto por uma boa briga... mas para quê? Vivia como fugitivo, arriscando sua vida a cada segundo, sem poder ser admirado ou compartilhar o que sabia com alguém.

Em um belo dia ele surgiu, o sujeito que se identificou como Maxell Gumendi. O homem lhe ofereceu uma vaga para fazer parte do plano que levaria a humanidade à evolução. Claro que Masaru ficou muito mais interessado nos benefícios da parceria, como a possibilidade de conhecer as mentes mais brilhantes e os lugares mais divertidos do globo. Também foi Gumendi quem propôs o nome "Evige" para disfarçar a identidade de Masaru por enquanto.

— Mas não me pergunte por que "Evige". Só fui saber o que aconteceu com você muito tempo depois e descobri que Evige era o codinome do principal responsável pelos experimentos. 

— Mas há muitas inconsistências nessa história toda — interveio Daisuke —, principalmente com as ações da Aliança.

— Acredite, ainda nos dias de hoje estou quase tão confuso quanto você. A Aliança Internacional é um grande movimento mundial que busca a integração entre os povos e o desenvolvimento da humanidade. Vários partidos e organizações estão adotando suas ideologias. Em particular, meu líder está utilizando uma milícia secreta para assegurar seu poder e dominar Dakar.

Dakar era como o centro político do mundo. Desde a catástrofe, a Aliança vem mantendo ligações muito fortes com essa região, fortalecendo o poder e influência desta. Não era tão estranho que a primeira a ser dominada seja ela. O que não faz sentido é...

— Então por que a Aliança só está agindo agora? Ela poderia ter aproveitado o caos para dominar o mundo quando quisesse, do jeito que os governos estavam desestabilizados como você descreve.

— Aí está, caro amigo. Ninguém garante que a Aliança que salvou o mundo seja a mesma Aliança de agora, nem a Aliança que conduziu experimentos com cobaias humanas antes da catástrofe.

Era com certeza um fato desconcertante, mas Daisuke ainda se perguntava uma questão primordial: por que ninguém fez nada até agora? O mundo presenciava passivamente o surgimento de um ser estranho que progressivamente caminhava para dominar tudo em seu caminho, incluindo a mente das pessoas.

— É claro que alguém de 100 anos atrás acharia estranho, mas é assim que as coisas são, Daisuke. Aposto que essa garota aí nem realmente se importa com os seus ideais, certo? O cidadão comum está muito bem como está, com um ditador global ou não. Ninguém dá a mínima enquanto puder manter seu padrão de vida. Nesse sentido não somos tão diferentes assim do resto, somos?

Era verdade. Daisuke lutava porque não queria se perder; desejava manter seus ideais até o fim e se orgulhar disso. Sabia disso e não era hipócrita a ponto de impôr seu ponto de vista ao mundo. Mesmo assim, não podia fingir que as coisas estavam OK quando havia tanta coisa errada.

— Masaru, eu sei que a Aliança não quer simplesmente auxiliar no desenvolvimento da humanidade como diz. Desde que "acordei", notei um fluxo descomunal de radiação no ar. Não é natural, alguém está por trás disso.

— Bingo! — congratulou Evige, batendo palmas — Sim, é uma de nossas grandes apostas. É melhor se as pessoas se convencerem de que o alterego é o caminho natural para o progresso, então estamos mantendo a radiação até ela ser completamente absorvida.

— Vou tentar adivinhar: daqui a um ano?

— De acordo com meus cálculos, sim.

— Bem, era tudo o que eu queria saber — disse Daisuke, levantando-se —. Não sei se vai me ajudar ou se opôr a mim, mas não gosto de ficar devendo algo a você, então digo o que pretendo fazer. Vou ao centro da radiação e destruirei a fonte de poder da Aliança. Não devem ser capazes de fazer muita coisa sem o tão querido alterego.

— À vontade, mas saiba que desse jeito provavelmente vai ser morto logo logo, e não vai ser por seus inimigos.

— O que quer dizer?

— Como já disse, não existe apenas uma Aliança, Daisuke. Há muitos interesses envolvidos na questão. Interesses que levam a, por exemplo, a criação de soldados perfeitos. E claro, os meus próprios. Não quer saber como anda o projeto Daisuke?

À menção do nome, Daisuke mudou de ideia e decidiu ficar mais um pouco. Evige sugeriu que Natt ficasse no escritório enquanto guiou Daisuke a uma sala oculta no interior do local. 

— Chegamos.

Daisuke sentiu-se minúsculo à vista daquele laboratório, com o que pareciam ser restos de seres humanos flutuando em grandes tubos e um grande aposento branco protegido por uma tela de vidro ao fundo.

— Masaru... o que é isto?

— Isto, meu amigo, é o local de trabalho de nosso caro cientista Evige.

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