Sono Shitsuji: In Love? escrita por Poney


Capítulo 2
Sono Shitsuji: Still Lovin'


Notas iniciais do capítulo

Segundo capítulo, gente, pra vocês que tanto me pediram! Hoho!! E, bem... parece que desta vez eu caprichei demais, então tive que dividir a fanfic em três x_x' Mas, por favor, se forem ler, leiam primeiro o primeiro capítulo, senão não entenderão. E, como o primeiro, continua no mesmo esquema: as partes em itálico são da narração do Sebastian!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/127828/chapter/2




Sono Shitsuji: still
lovin’.

Estava tudo em enorme agitação. Era preciso proteger bocchan, nada mais além disso. Tiros pesados e balas perdidas ecoavam por toda a Mansão Phantomhive, voando quase certeiras para todos os lados; teríamos que eliminar de qualquer forma todos aqueles bandidos, matando-os de forma mais rápida possível, afinal, eles vieram mandados para matar nosso jovem mestre. Estávamos todos o protegendo: Bard, Finny, Sebastian-san principalmente, e eu. Todos atacavam de forma correta, nenhum de nós precisava de conselhos ou ordens de Sebastian-san para matar alguém. Eu, particularmente, atirava nos homens sempre que podia, escondendo-me apenas para trocar a carga da arma, ou, na pressa, a própria arma. Mas, em meio a um intervalo assim, cometi um enorme erro: não havia notado que um dos capangas havia me visto. Apenas dei por mim quando ouvi um som mais próximo de tiro, assustando-me ao repentinamente ser empurrada para a parede por um movimento rápido de Sebastian-san. Ele havia me protegido com seu próprio corpo...!

– S-Sebast...!

– Shh.

Permanecemos um longo instante daquela forma. Tudo à minha volta havia parado, congelado, nada mais importava. Aquilo tudo acontecera tão rapidamente, Sebastian-san empurrando-me na parede, apoiando suas mãos com força de cada lado de meu rosto; todo seu corpo me protegia valente, de cada tiro que vinha em nossa direção. Seus ombros largos tapavam-me de uma forma calorosa, juntamente com sua grande estatura. Então seus olhos se encontraram com os meus, foi quando os batimentos do meu coração aumentaram ainda mais. Fui capaz de sentir os batimentos de Sebastian-san também aumentar, formando uma gostosa sincronia juntamente com o meu. Naquele instante, arregalei os olhos, ainda fitando os dele, sentindo uma sensação de que já havia vivido aquilo anteriormente...

– S-Sebastian-san, eu...!


... ... ...

Havia tudo voltado ao normal, eu já não fazia brincadeiras para ver o rosto tímido de Maylene, e não podia beijá-la a qualquer momento que me atraísse, mesmo se possuísse um enorme desejo de tê-la em meus braços. Eu deveria me conter, eu deveria manter minha postura como um mordomo. Ela havia se esquecido de tudo, e assim continuaria até o fim de sua vida, sendo assim feliz. Quanto a mim, me recordarei pelo restante de minha existência de toda e qualquer aproximação maior entre nós.

A rotina também era a mesma: já chegara o horário de preparar tudo com extremo esmero para bocchan, deixar tudo pronto, chamar os empregados e no horário exato despertar o jovem mestre de seu sono. Vesti-me conforme o trabalho exigia: primeiramente a camisa, fechando os botões, em seguida colocando a gravata e dando um nó perfeito nela; logo vesti o colete e subi as calças, abotoando-as logo após. Antes de vestir o terno, fitei-me no espelho e ajeitei os cabelos, deixando-os em perfeito estado. Só então vesti o fraque, prendendo o broche do brasão dos Phantomhive no lado esquerdo do peito. Logo me dirigi ao quarto dos empregados, chamando-os; Maylene acordaria sozinha, o necessário era apenas dar três toques na porta de seu quarto. Dirigi-me até lá, e meu peito saltava debaixo das vestes. Já haviam passado meses, e por mais estranho que pareça ainda me sentia abalado ao me aproximar dela. Dei os três toques em sua porta, chamando-a logo em seguida pelo nome.

– Maylene?

– H-Hai!! E-eu já estou pronta, Sebastian-san!!

Aquela voz “desesperada” de sempre, fazia meu coração acelerar ainda mais. Segui em direção ao Hall de entrada, esperando por todos lá, para que os desse as ordens necessárias e seguisse com o trabalho. Com a postura ereta como nos conformes, esperava com as mãos atrás das costas, fitando o pequeno corredor de onde todos viriam. Logo avistei todos sorridentes, se aproximando aos poucos; Maylene parecia mais agitada do que o comum, falando alto, sendo que ainda estava cedo. Conforme se aproximavam, mantive minha pequena curiosidade sobre qual seria o motivo de tamanha agitação. Esperei calmamente, e logo que se aproximaram mais, tomei a palavra.

– Bem, hoje não possuo ordens muito precisas, são até simples para o trabalho de cada um de vocês. Bard, hoje decidi servir um Poulet mariné et grillé au citron vert ao bocchan, você deverá apenas matar o frango e depená-lo sem causar alarde algum, já que o jovem mestre prefere o frango fresco – dirigindo-me a Finnian, fitei-o firmemente, prosseguindo – Hoje o trabalho mais difícil ficará com você, Finnian. Terá que dar um belo banho em Pluto, já que houve tantas chuvas esta semana, e Pluto fez questão em rolar nas poças de lama em sua forma canina... – logo me virei em direção à Maylene, que, distraída, permanecia com um sorriso bobo nos lábios – Quanto à senhorita, Maylene, evite distrações como a deste instante e os escândalos, sim? Precisará de um pouco de paciência para lavar as janelas de toda a Mansão.

Após ouvir um “Hai” em coro, dei as costas a todos, e segui com meu trabalho: ainda tinha muito a fazer. Apanhei o relógio de bolso e averigüei o horário, notando que ainda faltava tempo para despertar o sono de jovem mestre.


– Finny, Finny!! Agora que o senhor Sebastian não está mais aqui, posso contar o meu sonho finalmente!

– Conte, conte, estou até curioso demais!

Cochichando próxima ao seu ouvido, contei-lhe todos os sonhos que tive durante a noite toda, de fato maravilhosos. Várias situações em que envolviam Sebastian-san e eu, com carícias e beijos tão calorosos, de uma forma tão íntima, como se realmente tivéssemos uma relação amorosa; deste, apenas cenas rápidas. Já em outra cena era mais lento, notava-se Sebastian-san recostando suavemente seus lábios aos meus enquanto eu dormia, adoecida. Em seguida sonhava com uma longa tempestade, enquanto eu chorava sentada no gramado do jardim, completamente encharcada, e repentinamente aparecia ele, abraçando-me por trás num movimento repentino, e após isto, beijando-me de uma forma tão carinhosa. Acabei por contar a Finny tudo isto, e até mais, detalhando tudo com enorme empolgação, encantada. Aquele sonho maravilhoso parecia tão real, eu podia sentir até mesmo as sensações...

– Waaah, Maylene, que kawaii! Até parece uma continuação daquele dia de tempestade, que você até tinha esquecido o tapete limpo lá fora, e havia ficado na chuva...! Sebastian-san te buscou lá, e chegaram os dois encharcados no Hall de entrada!

– Eh...? Mesmo? E-eu não estou me lembrando disso...!

– Como não? Depois disso você ficou bem doente, e foi o próprio Sebastian-san quem cuidou da sua febre! A parte do seu sonho de quando ele te... beijava... enquanto você dormia, parece-se também uma das situações quando ele te visitava para ver se estava melhor, e sempre tardava a voltar! Hi... – dizia Finny, em meio a um riso tímido, porém, de certa forma, provocador

– Woaaaaaaaahh!! C-como eu não me lembraria de uma coisa dessas, Finny...???? N-não é possível! V-você deve ter sonhado também, F-Finny...

– Não, eu não sonhei. Tenho certeza que Bard também sabe disso, sem mesmo eu ter contado! – deixando agora de cochichar, Finny virava-se para Bard, que já caminhava em direção à cozinha – Ne, Bard! Você se lembra de quando Sebastian-san tirou a Maylene-san da chuva e depois cuidou do resfriado dela?

– Claro que me lembro! – com um sorriso largo no rosto, ele voltava-se para mim com um tom provocativo na voz – Eu nunca vou me esquecer... Os pombinhos tão encharcados, e Sebastian fez questão de te levar até o banheiro no colo... Heheh!

– Aaaa-AAAAHH!!! I-impossível!! E-eu sou tão idiota!! Como não consigo me lembrar de uma coisa assim?

Completamente esquecida do horário, eu gritava feito louca, como se estivessem me forçando a entrar em um hospício. Sebastian-san realmente havia me pego no colo e me tirado da tempestade, como no sonho! Mas quanto ao beijo, impossível ter de fato acontecido. Já era demais ele se preocupar comigo daquela forma, tirando-me da chuva naquele estado, e ainda cuidando de minha saúde! Eu precisava mesmo era parar de sonhar, não apenas dormindo, mas acordada também com esse tipo de coisa. Porém... era impossível deixar de lembrar daquelas cenas, juntamente com as sensações, que ajudavam a parecer ainda mais reais. Mesmo que me animasse demais, aquilo, por mais real que me pareça, era apenas um sonho. “Sebastian-san não se atreveria a fazer algo assim, principalmente com uma empregada como eu... Principalmente comigo, na verdade...”, pensava, já tirando toda e qualquer esperança que havia em meu peito.

Enquanto limpava a parte mais alta da vidraça da janela de um dos cômodos da Mansão, distraída, apoiava-me numa escada de madeira, no penúltimo degrau, desequilibrando-me ora ou outra. Mantinha um sorriso bobo no rosto, não conseguia me concentrar um instante sequer no trabalho. Esfregava o vidro lentamente, sem mesmo olhar para ele, mas sim para um ponto qualquer do céu que se abria aos poucos, do lado de fora da Mansão. Apenas voltei a mim ao ouvir uma voz masculina chamando-me pelo nome algumas vezes seguidas; era a voz de Sebastian-san...!

– Ah-AAAAAAH!!

Antes mesmo de gritar, deu tempo apenas de olhar para baixo e notar Sebastian-san olhando-me lá de baixo. A escada tombou para o lado contrário dele, e eu não consegui segurar-me em lugar algum; a escada tombava rapidamente, e por pouco não me esborrachei no chão. Por pouco? Sebastian-san me segurara ainda no ar, e com uma de suas pernas apoiara a escada e o esfregão, em perfeita postura, evitando minha catástrofe.

– Está tudo bem, Maylene?

– Aaah... a-aah...

Era sempre daquela forma, ele me salvava de um incrível tombo, com aquela postura perfeita, aquela feição séria, sem prejudicar absolutamente nada, e sempre me perguntava se estava bem. Porém, aquela vez havia sido diferente. Meu coração batia forte, mas de uma forma maravilhosa de se sentir. Ele, lentamente, colocava-me de pé de volta ao chão, mas permanecia meio abraçado a mim. Meu tronco todo se recostava nas costelas e no abdômen de Sebastian-san e, como estava no seu lado esquerdo, pude sentir um breve aceleramento do coração dele, batendo num ritmo até sutilmente maior que o meu. Logo que senti sua forte palpitação, meu coração passou a se acelerar ainda mais; era uma sensação extremamente prazerosa. O profundo desejo que eu possuía era tomar o rosto calmo e sedutor que me fitava e beijá-lo até cansar. Mas eu fiquei estática, e Sebastian-san logo me soltou, deixando-me livre; arrumou a escada no mesmo local onde estava antes de eu ter caído, ajeitando o pé que causara o tombo.

– Tome mais cuidado da próxima vez, Maylene. Deveria ter notado o pé da escada, havia um parafuso torto. Poderia ter se machucado na queda se eu não estivesse aqui. – e continuou, fitando firmemente meus olhos - Preste atenção no trabalho, não se desconcentre novamente, pode ser perigoso para você.

Vi-o se distanciar após dar as costas, e permaneci da mesma forma, com o rosto completamente corado. Ele agiu tão carinhosamente comigo e não me deu bronca de forma alguma! Mesmo que aquilo tenha ocorrido em um instante tão rápido, fora uma sensação muito boa; mesmo eu me intimidando tanto naquele instante, senti que possuía toda a liberdade de roubar um beijo, e com uma estranha certeza de que ele me retribuiria. Mas era impossível! Nunca poderia fazer algo assim, deixaria Sebastian-san irritado, no mínimo; ou então não compreenderia minha ação e me mandaria voltar a trabalhar, sem sentimento algum... “Poderia ter se machucado”... “Pode ser perigoso para você”. Ele de fato se preocupou comigo assim para dizer duas vezes para que eu tomasse mais cuidado? “I-impossível... só pode ser imaginação minha...”. Subi as escadas cautelosamente, e voltei ao meu trabalho, ainda com pensamentos confusos rodando por minha mente.


Distanciei-me dela à passos curtos e rápidos; naquele instante senti a temperatura do meu rosto aumentar brevemente, juntamente com os batimentos do meu coração, que não diminuía, pelo contrário, apenas aumentava. “Por que ela tinha que ser tão atrapalhada?”, pensava, enquanto recostava-me na parede, escondendo-me da vista de Maylene. “Por assim ela ser que eu tanto a amo...”. O que sentia era que estava escondendo mal meus sentimentos por ela. Apenas ao me aproximar de Maylene, mesmo sendo uma aproximação pequena, acabo por sentir ansiedade, e então meu coração dispara em uma velocidade inigualável. Às vezes ele chega a acelerar tanto que fico incapaz de sentir o coração de Maylene; se sinto, o meu não resiste, e minha palpitação aumenta ainda mais, causando-me desejos de tocá-la carinhosamente, deslizar os dedos por seu rosto em uma carícia, roçar os lábios em suas mandíbulas e percorrer todo o seu rosto, e beijar seus lábios com todo o amor que possuo dentro de mim, que está sendo guardado e escondido de todos, principalmente dela.

Eu sentia uma enorme falta em tocá-la. Seus cabelos, seu rosto, seus olhos, seus lábios... Tudo o que eu mais queria e necessitava era de seu toque, de nosso toque. Eu precisava de uma carícia profunda, uma junção de sentimentos que acalmaria nossos corações agitados dentro do peito. Os seus cabelos – queria poder deslizar os dedos por suas mechas novamente... O seu rosto – queria acariciá-lo e vê-lo corar por minha causa... Os seus olhos – queria livrá-los dos óculos, ao menos que fosse por uma fração de segundos, e olhá-los brilhar e por amor... Os seus lábios – queria poder repousar os meus sobre eles; poder beijar Maylene e notar seu prazer ao estar comigo apenas por me retribuir e se arrepiar dos pés à cabeça. Queria envolver seu corpo em um abraço caloroso e confortador, para que nossos corações se encontrassem e tivessem um último momento de felicidade ao se debaterem dentro de ambos os peitos, tornando-se apenas um, formando um ritmo adorável. E então eu poderia sentir o aroma de seus cabelos sedosos mais uma vez, e também sentir suas mãos finas e delicadas acariciarem minha nuca e minhas costas...

Ergui a cabeça um instante e ouvi a voz de Maylene cantarolar alguma música aleatória. Não pude deixar de esboçar um sorriso bobo, e minha vontade de olhá-la mais uma vez me corroía. Ligeiramente escondido, espreitei os olhos nela, em seu corpo que se contorcia para limpar um canto mais distante de si, tombando a escada, expondo-se a um ato perigoso mais uma vez. No mesmo instante o meu senso de heroísmo me atentou, porém seria muito atrevimento salvá-la novamente, não passados no mínimo cinco minutos em tê-la salvo pela primeira vez. Apenas a observei, preocupado, enquanto ela tombava-se para o lado direito, tremendo as pernas. Até o instante no qual a escada tombou mais do que suportava e, num movimento rápido, ela agarrou-se à cortina, dependurando-se nela e berrando desesperada. Aquela cena fora de fato divertida, e provocara um riso meu, afinal, não pude me conter.

– Haha... Ela está bem. – dei as costas em seguida, mantendo o mesmo sorriso nos lábios, afastando-me dali.


Fora um sufoco para descer da cortina naquele estado, já que estava num local um tanto longe do chão, nada agradável. Porém, ao final das contas, acabei por descer dali, mesmo com dificuldades; de uma forma ou de outra, eu teria que descer dali. Já havia quebrado as argolas que prendiam as cortinas daquela janela, e quase havia caído junto, sendo que da forma como havia saído dali, fora caindo mesmo. Ao menos após aquela cena de sufoco nem ocupara tanto o meu tempo, e por fim consegui terminar o trabalho sem me quebrar por inteira, mas sim algumas coisas que enfeitavam mesas e estantes.

Alguns dias se passaram, e eu continuava a ter sonhos com Sebastian-san, todos parecendo ser tão reais. As sensações eram tão fortes, parecia até que eu realmente havia vivido aqueles momentos bons, e estava recordando com sonhos. Nem eu mesma compreendia o modo como meu coração saltitava, parecia querer me dizer algo, como também os sonhos mesmos me pareciam o fazer. Eles se repetiam, e a cada vez que sonhava, acrescentavam-se ainda mais detalhes e também mais cenas diferentes, com sensações ainda melhores. Mas, ao final de cada sonho, eu sentia uma estranha sensação de tristeza, uma agonia tomava meu peito, e eu sentia uma enorme vontade de chorar. Mas no momento em que eu despertava, passava a me sentir normal novamente, mas não conseguia me lembrar do motivo o qual me sentia mal ao final do sonho. Eu simplesmente, a cada dia, levantava contente e contava cada sonho, cada detalhe para Finny, e quando me empolgava muito, para Bard também. Eles sempre me apoiavam, ainda mais Finny, e isso me animava ainda mais.

Sebastian-san havia me dado ordem para que tirasse pó do lustre, e trocasse uma vela, que já estava praticamente no fim. Apanhei a escada de madeira novamente e a carreguei até o lustre do Hall de entrada. Mas, antes mesmo de subir nela, fitei os olhos vermelhos de Sebastian-san, gaguejando ora ou outra, temendo o que viria a ocorrer.

– S-Sebastian-san... é... é um p-pouco alto, e...

– Suba. Não há perigo algum. Caso algo aconteça, eu estarei aqui em baixo, sim?

Calei-me no mesmo instante, com o rosto completamente corado; por pouco não contenho minha hemorragia nasal. Virei-me em direção à escada, escondendo meu rosto corado de Sebastian-san, e logo em seguida subi apressada alguns degraus, quase tropeçando em um ou outro deles. Rapidamente, subi os últimos degraus, enquanto Sebastian-san segurava a escada lá de baixo. Concentrei-me e comecei a tirar o pó dali, pouco a pouco, evitando qualquer desastre imaginado ou até mesmo inesperado. Passava uma escovinha seca nos vãos, do modo como o mordomo havia ensinado, calma e concentrada, uma cena rara de se ver. Repentinamente ouvi a voz de Sebastian-san falando comigo, num tom calmo e despreocupado.

– Está tudo certo aí em cima, Maylene? Não precisa de alguma ajuda para a retirada da vela?

– Eh...? Ah, não, não! Estou bem, acho que consigo fazer tudo sozinha!

Respondia e em seguida olhava para baixo, para mandar um sorriso tranqüilo mostrando que estava mesmo tudo bem, e notava que ele olhava diretamente para mim. De repente meu rosto começou a ficar extremamente corado, com os pensamentos pervertidos que surgiam a cada milésimo de segundo. Tapei o nariz com uma das mãos, e com a outra segurei o vestido do uniforme, escondendo as pernas, constrangida. “S-será que Sebastian-san o-o-olhou...??? Q-Que... QUE VERGONHA!!” Pensava, eufórica, enquanto o sangue do meu nariz começou a escapar, e isso fez com que eu me desequilibrasse para o lado, e antes que eu percebesse, já estava tombando para o mesmo lado e, apoiando-me no lustre, dependurei-me nele, deixando a escada, e em menos de um segundo ele acabou soltando-se do teto e caindo juntamente comigo.

– Maylene...!!

Naquele instante, fechei meus olhos em desespero e não pude ver mais nada, e apenas ouvi a voz de Sebastian-san chamar-me pelo nome; logo senti as suas mãos segurar-me ligeiramente pela cintura, e nossos corpos rolaram uma vez. Mal sabia o que havia acontecido. A cena se repetia: eu causando uma situação desastrosa, e ele vindo me salvar, tudo acontecendo em tão poucos segundos rápidos. Antes que pudesse abrir os olhos novamente, ouvi um estrondo de cacos, e rapidamente abri os olhos assustada, e vi Sebastian-san por cima de mim; com o impacto, seu rosto trombou com o meu, fazendo com que seus lábios encostassem sobre o canto dos meus. Nossos corações aceleravam-se, nossos lábios praticamente se beijavam. A sensação de sentir uma parte, mesmo pequena, dos lábios dele sobre uma também pequena parte dos meus, era inexplicável. Meu coração só faltava escapar pela boca, por tanto pulsar em meu peito. Meu rosto estava completamente corado, o sentia ferver a cada instante. Sebastian-san havia quase me beijado por um acidente tão idiota meu! Eu mal sabia onde estava, não conseguia pensar em mais nada. Quando pude observar bem, havia notado, e também sentido, que ele havia me prendido com as pernas de uma forma que não conseguia ao menos me mover. Envergonhada ao mesmo tempo em que assustada, olhava finalmente para os lados e para cima do ombro dele, notando que Sebastian-san também não podia se mover, pois estava com o lustre e vários cacos dos cristais fincados em suas costas que se quebraram ao cair por cima de si. E voltando a atenção para seu rosto, notava que havia tomado certa distância do meu; parecia-me um pouco acanhado por ora, devia ser impressão minha. Não parecia sentir dor, seu rosto não demonstrava que havia se ferido; mas da mesma forma preocupei-me, e tentei mover-me para tocar suas costas com cuidado.

– O-o s-senhor me protegeu com s-seu próprio corpo...!! E-está ferido, e...

– Estou bem, Maylene. Apenas temi que se ferisse e...

Mal pude ouvir sua frase por completo por causa da gritaria de Bard e Finny, que corriam em nossa direção, preocupados. Logo se aproximaram de nós, e Finny rapidamente tirou o lustre pesado das costas de Sebastian-san, e só então ele pode reerguer seu corpo. Não parava um instante de olhar através de meus óculos, fitando meus olhos como se nunca tivesse os visto. Fiquei um tanto envergonhada com o modo como ele me fitava, até que se aproximaram os outros dois.

– O que aconteceu por aqui? Vocês dois estão bem? – Bard se aproximava primeiro, ajudando-me a levantar.

– Sebastian-san, o senhor está ferido! – Finny deixava o lustre em cima do tapete, e se aproximava em seguida para ajudar também – Precisa fazer curativo!

– E você, Maylene, se machucou?

– Deve estar ferida também!

– Ora, mas o que é que aconteceu aqui? Que barulheira é essa? – desta vez era bocchan, que nos fitava do andar de cima, e nos interrogava impaciente. Mal o pude responder, e também mal soube se alguém de fato havia o respondido; estavam todos falando tanto e tão alto, que chegavam a ajudar a atordoar minha cabeça, além do que já estava. Os meus amigos ajudaram a me deixar de pé, e me perguntavam se eu estava bem, se algum caco havia me atingido. Quando dei por mim, girei procurando por Sebastian-san, o encontrando já de pé, como se nada tivesse acontecido. Ele havia tirado todos os cacos de si e os juntado aos outros, tão rápido e calmo que nem nós mesmos havíamos notado quando o fizera. Agradeci a preocupação dos meus colegas, e logo me aproximei dele, ainda com o rosto corado e o coração agitado.

– S-S-Sebas... tian... san... – gaguejava por timidez, mas logo dei continuidade ao que dizia – O... o senhor está f-ferido, e...

– Já disse para que não se preocupasse, eu estou bem. Enfaixarei meu tórax com a ajuda dos primeiros socorros que há em meu quarto, ficarei bem.

– D-desculpe... mas... e-eu... fico muito preocupada com o senhor...

– Ah, Maylene. Não é necessário. Tire esta expressão preocupada de seu rosto, sim?

– H-hai... Obrigada...


Aquele tom de voz fazia meu coração bater cada vez mais forte, e aquele rosto corado e ainda preocupado quase me obrigava a beijá-la. “Ela não precisava agradecer com aquele rosto tão belo...” Ela não precisava se preocupar tanto comigo. Eu chegava a não conseguir me concentrar nas tarefas rotineiras. Ela me tirava a atenção, me atraía. Daquela forma, eu não podia esconder meus sentimentos, esquecê-la seria impossível. E, por acidente, nossos lábios praticamente se encontraram, enquanto estava por cima do seu corpo, mantendo-a presa até que os cacos cessassem de desabar e se espalharem pela sala, para que ela não se ferisse. Meu coração saltava feito louco em meu peito, me forçando a permanecer mais tempo por cima dela; se ficasse apenas alguns poucos segundos a mais com o tórax debruçado sobre seus seios, cobrindo seu corpo pequeno com o meu, não imagino o que faria...

Caminhei até meu quarto e, recostando à parede, ergui a cabeça e permaneci daquela forma por um longo instante, relembrando o momento que nossos lábios parcialmente se recostaram, e seu corpo macio era prensado pelo meu, fazendo com que fosse impossível de Maylene se mover. Mesmo tudo ocorrendo tão rápido, mais uma vez, fora uma sensação inesquecível, e incomparavelmente maravilhoso. Meu coração teve novamente um momento de felicidade...

Mais dois dias se passavam, e eu dava continuidade à rotina, fazendo as tarefas com o mesmo esmero. Porém, a cada manhã nova, notava uma estranha agitação entre os empregados, e Maylene era a mais eufórica. Estavam todos muito animados, enquanto a ruiva parecia contar algo aos seus colegas de trabalho; isto despertou certa curiosidade sobre o motivo de tanta euforia entre eles. “Estão escondendo algo a respeito de Maylene de mim...” Nunca uma curiosidade tão forte havia tomado conta de mim daquela forma. Quando dei por mim, estava à espreita, ouvindo, escondido, a conversação dos três empregados. “O que estou fazendo...?”, pensei, enquanto arqueava as sobrancelhas, indignado; porém permaneci ali, enquanto a curiosidade me corroía. Eu precisava saber, eu necessitava escutar tudo sobre ela. Posso parecer um tanto abusado e precipitado, mas me sinto de alguma forma responsável por seus atos, sentimentos e acontecimentos. Sinto que devia protegê-la dos males que a guardavam, e também apoiá-la nos sonhos que a empolgavam. “Esta mulher me deixa maluco...” Recostando a orelha direita sobre a porta, fiquei atento a qualquer ruído. Uma situação vergonhosa, de fato, mas necessária para um alívio meu. Começando a ouvir algumas risadas tímidas de Maylene, estreitei os olhos e prestei atenção.

– Wohoho! Calma!! Não teve nada disso, Bard! S-seu pervertido...!!

– Ne, Bard, não fale assim de Maylene-san! Ela não faria uma coisa dessas, que eu saiba...

– Ou não, hehee...

– P-parem com isso! E-e-eu n-não faria!! – ela gritava aflita, com uma voz rouquinha de vergonha – S-se for assim, e-eu não conto mais os sonhos...

Do que estavam falando? Por qual motivo Maylene chamaria Bard de pervertido? Para meu alívio, Finny apoiava Maylene, dizendo que “ela não faria uma coisa dessas”. Mas... Que tipo de coisa? Ela citara algo sobre “sonhos”... “Maylene havia sonhado com alguém?” Não sabia por qual motivo pensava tantas coisas enquanto ouvia toda a conversa; o modo como estava agindo chegaria a ser até engraçado para quem visse. Persisti e, ainda com a orelha colada na porta, prestei ainda mais atenção.

– Ooh, mas era tão bom! Mesmo ele rindo de mim ao fazer brincadeiras bobas, me acariciava e me tocava com tanto carinho! Tudo tão real, eu podia sentir tudo como se estivesse acontecendo de verdade!

– E a cena da chuva? Repetiu mais uma vez?

– Hm, sim... Teve alguns momentos rápidos que aparecíamos na chuva, as cenas dele cuidando da minha febre, todos os toques, todos os beijos...

Beijos? Toques? Chuva, febre, carinho? Ela... Não poderia estar sonhando com outro homem. Maylene estaria se recordando de tudo o que vivemos juntos? “Impossível...!”, pensei naquele instante, e, estático, permaneci ouvindo a conversa.

– Mas... estranhamente, todas as vezes que acordo, sinto uma sensação ruim, como se todas aquelas maravilhosas cenas fossem tiradas de mim... – a voz dela diminuía o tom, parecendo entristecer-se, porém prosseguia – Mas não consigo me lembrar o motivo de tanta tristeza, o sonho era sempre tão bom, mas no final de todos sempre tudo escurecia, e após isto não sonhava mais nada, e o que me restava era abrir os olhos e despertar...

– Woaah... que ruim...

Ela realmente se lembrara de tudo, apenas em sonho. Pelo visto, Maylene imaginava que era apenas um sonho, mesmo que lhe pareça tão real. Mesmo assim, poderia ser perigoso. Se ela se recordasse de fato, todo o meu esforço iria por água abaixo. Eu apenas queria vê-la feliz, nada mais; se ela se lembrasse de tudo, seria infeliz, e nunca poderia ser uma mulher feliz com sua família, como todas as outras mulheres.

Ao ouvir alguns ruídos próximos à porta, afastei-me dela rapidamente e, dando as costas, saí do corredor, pretendendo prosseguir com os afazeres. “Terei como objetivo retirar sua memória novamente, sem que perceba, antes que seja tarde e que Maylene se recorde realmente de tudo...”

As horas daquele dia se passaram rápidas, e as tarefas diárias de Maylene estavam se cessando; as minhas eram sempre as rotineiras, porém todos os dias eu possuía uma tonelada de tarefas extras para fazer, já que os empregados nunca conseguiam terminar uma sequer. Isto tudo significava que, por dia, eu possuía poucas horas livres para poder disfarçar e retirar as memórias da ruiva. Tudo o que eu precisava ter era paciência, discrição e precisão. O final da tarde era o momento ideal de ociosidade dos empregados; se eu conseguisse uma pequena brecha do meu tempo, antes que a noite e o horário do jantar se aproximassem. “Neste instante ela deverá estar recolhendo as roupas do varal. Será o momento certo, enquanto estivermos sozinhos.” Averigüei o horário em meu relógio de bolso e contei os poucos minutos que levaria para fazer o que precisava. Era exatamente o horário que eu precisava. Apressei-me e corri até o jardim, onde Maylene estaria recolhendo as roupas. Caminhei a passos silenciosos, mesmo antes de notar sua presença. Logo a vi, estreitando os olhos e, ainda mais cauteloso, aproximei-me dela por trás. Vagarosamente, ainda silencioso, retirei a luva da mão esquerda, deixando que o contrato aparecesse e pudesse tirar as memórias de Maylene. Ergui a mão até sua cabeça, e...

– Ooh, mas tinha mesmo que cair!

No mesmo instante em que estava prestes a tocar sua cabeça e começar a me concentrar, Maylene se abaixou e me acertou com seu quadril ao inclinar seu tronco à sua frente, olhando-me logo em seguida. Rapidamente vesti minha luva, escondendo o contrato antes que ela visse.

– Wooooh, Sebastian-san, o senhor estava aí? G-gomen nasai!! E-eu... a-ah...

– Iie, não foi nada, Maylene. Não era minha intenção lhe assustar desta forma.

– Wuuh... – abaixava a cabeça, tímida, e interrogou-me em seguida – P-por que o senhor veio para cá...? E-eu fiz algo errado??

– Não, desta vez nada há de errado. Para ser franco... – acabei por dar uma pequena pausa e, fitando o cesto de roupas, prossegui – Para ser franco, eu decidi lhe ajudar, por ter ainda tantas roupas e lençóis, e com certeza me chamaria para que carregasse o cesto para você, estou certo?

– Oh, sim, realmente... O senhor tem toda a razão, Sebastian-san. Huhu...

Pude presenciar seu lindo rosto levemente corado sorrir timidamente, tapando os lábios como uma criança. Não contive um espontâneo sorriso bobo nos lábios, por sorte ela havia se virado para apanhar mais uma roupa, e não viu. Permaneci um instante apreciando sua beleza inocente, enquanto meu coração disparava dentro do peito. Fechei os olhos, soltando um riso, acompanhando-a na graça sem motivos que havia encontrado na situação; se não fosse por rir junto dela, não saberia o porquê de estar sorrindo ao fitar seu rosto tímido e encantador. Porém logo a ajudei, recolhendo as últimas peças do varal, depositando-as no cesto, e eu apanhava-o em seguida. “Uma boa oportunidade se perdera. Não fora desta vez, porém da próxima não haverá erros.”, pensei, enquanto caminhávamos até a entrada dos fundos da Mansão. Eu não conseguia me aborrecer com ela, por incrível que possa parecer; pelo contrário, todas as vezes que estava perto dela, presenciava-a fazer alguma trapalhada, sempre me sentia bem, e apenas sorria, fitando-a sem cansar. Mal podia dar-lhe bronca, não me conteria com sua expressão tristonha e temerosa que ela faria, por medo do que eu fosse dizer; no fim, acabava por apenas mandar que prossiga com seu trabalho.

Então acabei deixando para o dia seguinte. Talvez após o horário de almoço, teríamos tempo suficiente. Esperei ansioso a noite passar, e finalmente poder retirar suas lembranças vagas...

A noite logo chegou, e o brilho da lua já chegava aos pontos onde a janela deixava iluminar o lado de dentro da Mansão. Já chegara o horário de dormir, o horário o qual eu mais apreciava, já que todas as noites estava tendo sonhos tão maravilhosos com Sebastian-san. Corri até o quarto, troquei-me rapidamente e me deitei com um sorriso nos lábios, animada ao apenas imaginar qual seria o sonho daquela vez. Não tardei a dormir, e logo os sonhos começavam. Novamente os sonhos se repetiam como nas ultimas noites; mas desta vez eu sonhava com algo a mais, num cômodo escuro, onde só se podiam ver com nitidez os belos olhos vermelhos de Sebastian-san. O restante era pouco visualizado, e havia pouca iluminação. Então, um momento divertido é tomado pelo sonho, e a cena se muda, em seguida, para uma no mesmo cômodo, já claro. Sebastian-san me erguia do chão e me abraçava carinhosamente, como se fôssemos um casal íntimo. Meu coração saltava loucamente em meu peito; as sensações nunca deixavam de tomar meu corpo, e eu chegava a sentir até mesmo as batidas do coração de Sebastian-san. No sonho nós nos beijávamos, demonstrando enorme afeto e amor um pelo outro, com carícias e sentimentos. Mas a cena mudava rapidamente, e mostrava bem nítidas todas as nossas cenas anteriores de beijos, aproximações e toques, passando tão velozmente, parecendo até fugir de mim, escurecendo conforme iam passando, e, repentinamente, tudo escurecia por completo. Surgia então, em seguida, o rosto de Sebastian-san, em meio à enorme escuridão, fitando-me com olhos fixos e frios; ele estendia a mão até mim, e escurecia tudo novamente com sua mão.

– AH!

Acordando assustada, ergui-me na cama, com o rosto completamente úmido de suor misturado com lágrimas escorridas. Levei a mão até o rosto e o enxuguei, levando-a até a cabeça em seguida, enquanto sentia o coração pulsar doído no peito. Sentia uma imensa vontade de chorar, e mal sabia o motivo de tal sentimento. As lágrimas simplesmente rolavam sem parar por meu rosto, saltando em desespero dos meus olhos, enquanto eu já chegava a soluçar. “Por quê? Por que me sinto assim? Por que meu coração tanto dói?” Sentia meu corpo arrepiar-se por inteiro, tremendo; era uma sensação muito ruim.

Já não era madrugada, e o sol já começava a raiar no momento em que já havia acordado. Solucei ainda mais algumas vezes, enxugando meu rosto mais uma vez. Logo em seguida ouvi três toques na porta, e uma voz masculina chamava-me em tom preocupado.

– Maylene, está tudo bem...?

– H-hai...!!! E-eu já vou levantar... eu...

Era Sebastian-san, certamente ouviu minha voz trêmula e sutilmente soluçante. Pior seria se estivesse me ouvido dizer algo enquanto ainda dormia... Estava desesperada, meu corpo não cessava de tremer, minhas mãos estavam tão suadas e geladas que mal conseguia deslizá-las por meus cabelos. Eu mesma não sabia o motivo de tais sentimentos e reações...


Apenas por sua voz eu sabia que havia algo errado, pois podia perceber que estava chorando profundamente, em desespero; seu tom estava trêmulo e baixo. Seus soluços me preocupavam, principalmente por anteriormente ter acordado com seu próprio grito abafado em seu quarto. Não contive minha preocupação, e mais do que depressa abri a porta do quarto e a fitei, enquanto cobria-se até os lábios, apertando a ponta do lençol entre seus dedos trêmulos; suas lágrimas escorriam pelo seu rosto franzido e entristecido, e isso me partiu o coração. Provavelmente teria sonhado com algo ruim. Ou melhor, teria se recordado sobre algo como quando retirei sua memória da primeira vez; isto significava que ela havia se lembrado realmente de tudo, até mesmo de eu ser um demônio. Pedi por sua licença e aproximei-me de sua cama a passos lentos, e, já próximo dela, abaixei-me por alguns instantes, procurando fitar seus olhos.

– Sei que não está tudo bem. O que houve, Maylene?

– E-eu... não sei... – ela falava entre soluços, e ainda chorava profundamente, e não conseguia completar o que dizia – Eu... não consigo me... lembrar... estava tudo... tão... escuro... o senhor...

Tapando o rosto com o lençol, Maylene evitava que eu olhasse em seus olhos lacrimejantes e em seu rosto úmido de lágrimas escorridas. Aproximei-me um pouco mais, tocando carinhosamente sua cabeça e deslizando brevemente meus dedos por algumas mechas de seu cabelo macio. Repentinamente, um estalo me fez recordar de que deveria tirar sua memória, e num momento como aquele seria simplesmente perfeito. Ela se esqueceria de tudo novamente, e ficaria tudo bem. Agindo rapidamente, comecei a retirar a luva da mão esquerda, onde havia o contrato. Prestes a retirar suas lembranças, ouvi sua voz soluçante pronunciar algumas palavras novamente.

– O... o senhor... estava fitando-me... tão frio... e... e... de repente... tudo escureceu... tudo... escureceu... S... Sebastian... san...

No mesmo instante parei, ainda com a mão próxima à sua cabeça, estático. Maylene ainda escondia seu rosto, não me via como estava, como era minha expressão naquele instante. Eu não podia tirar sua memória daquela forma, me sentiria extremamente mal, com enorme peso na consciência. Detive minha mão, vestindo a luva novamente. Naquele instante, a retirada de sua memória seria de fato impossível de acontecer, seria rude de minha parte aproveitar a deixa de uma mulher, indefesa, enquanto chora, desabafa. A única coisa que deveria fazer naquele momento era, no mínimo, acariciar seu cabelo e confortá-la, e foi exatamente isto que fiz.

– Acalme-se, Maylene. Eu estou aqui, estas lágrimas não são necessárias, sim?

Os soluços aumentavam ainda mais, e o choro abafado dela me causava enorme arrependimento por pensar em retirar sua memória num momento fraco seu. Não me contive, meu coração me obrigava a consolá-la até que cessassem suas lágrimas e seus soluços. Envolvendo-a com meu braço direito, puxei-a para perto de mim, fazendo com que se recostasse em meu peito. Tive a liberdade de agir desta forma com ela, mesmo que se recordasse apenas em sonho de tudo o que nos aconteceu em tão pouco tempo. E então, com delicadeza, descobri seu rosto e o ergui, fazendo com que olhasse em meus olhos.

– Não chore. Quero ver um sorriso seu, apenas isto me deixará aliviado. – permaneci fitando seus olhos úmidos, desta vez com ainda mais firmeza – É um pedido meu.

Eu precisava vê-la sorrir, ao menos que fosse um riso forçado, apenas um sorriso. Era meu dever confortá-la daquele estado, não estava bem, sei que precisava de mim.

– Vamos, me dê um sorriso. – mostrei um sorriso enquanto ainda fitava seu rosto levemente assustado

– S-Sebas... tian... san...!

Repentinamente, Maylene puxou-me para um abraço, apertando-me contra si, segurando fortemente minhas vestes, enquanto chorava ainda mais. Suas lágrimas umedeciam meu fraque, e seus soluços abafados quebravam o silêncio do ambiente. Primeiramente constrangi-me, assustado com sua reação tão precipitada; porém logo soltei um sorriso, enquanto sentia os batimentos de meu coração aumentar a cada segundo. Retribuí seu abraço, deslizando as mãos pelas suas costas, carinhosamente. “Quanta falta eu senti deste seu abraço forte, minha Maylene...” Finalmente a possuía em meus braços novamente, e a sensação era incomparável. Mantive-a o máximo tempo possível em meus braços, consolando-a da melhor forma que podia. Ouvi sua voz sussurrando novamente, desta vez sem tartamudear.

– Desculpe por te abraçar assim tão de repente, Sebastian-san... eu...

– Shh, não se preocupe. Se isto for melhor para você, faça sempre que precisar, sim? Eu estarei aqui.

Toquei seus cabelos novamente, fazendo uma breve carícia; em seguida afastei-me dela, deixando que meus lábios desenhassem um sorriso aliviado e sincero. Pedi por licença novamente e saí do quarto, deixando-a se acalmar melhor, e também se trocar para mais um dia de trabalho. “Mesmo sendo tudo tão puro, sem beijo ou nada mais, foi bom sentí-la próxima de mim mais uma vez...”


Aquela sensação novamente tomava-me dos fios de cabelo até a ponta dos pés. Não sei como fui capaz de atrever-me em puxá-lo para perto de mim daquela forma, sempre fui tão tímida...! Tive a liberdade de agir daquela forma, apertando-o tão forte contra meu peito, amassando seu fraque sempre em tão perfeito estado! Como não notei naquele instante? Estava tão abalada que mal sabia o que fazia. “Ele deve pensar que sou uma abusada!! Sou tão boba...” O que me deixa confusa é que ele agiu de uma forma tão carinhosa comigo, mesmo comigo encharcando o seu colarinho e amassando seu fraque, por um simples pesadelo, que me deixou, mesmo assim, tão abalada. Meu coração batia forte, porém calmo, aliviado por sentir o corpo de Sebastian-san envolver-me com o mesmo carinho que eu o abraçava. “O desejo que eu tenho era ter permanecido abraçada daquela forma, envolvida por seus braços compridos, por toda a eternidade...” Aquilo de fato havia me acalmado, meu coração já não mais doía, apenas batia docemente enquanto eu me recordava da cena, comparando-a com meus sonhos: o mesmo modo como ele me tocava, o mesmo carinho, o mesmo toque, as mesmas palpitações dos corações. Tudo coincidia tão bem... Eu tinha em mente que ele nunca faria algo semelhante aos meus sonhos. Mas, ainda assim, algo me dizia que aquilo não era simplesmente uma coincidência...

Troquei-me rapidamente para não atrasar-me ainda mais, pois já havia enrolado demais na cama. “Não posso demorar ainda mais para o trabalho, se não Sebastian-san ficará bravo, e isso não seria legal...” Já pronta, corri para o Hall de entrada, encontrando apenas Sebastian-san lá.

– S-senhor Sebastian! E-eu... er... desculpe-me...

– Oh, Maylene. Eu quem devia lhe pedir desculpas por não tê-la esperado para dar as ordens.

– Eu... demorei muito, e...

– Não tem problema, não se preocupe. Está melhor?

– H-hai...!

Sebastian-san era o único que era capaz de me fazer bem daquela forma, fazer com que eu melhorasse em dois tempos. Era preciso apenas uma palavra, um consolo, um abraço, para que eu me sentisse melhor, muito melhor, estando eu com qualquer problema. Eu estava encantada, mal sabia o que ele falava naquele instante; eu admirava seus olhos, o quanto eram belos e puxados, que piscavam conforme Sebastian-san explicava algo, concentrado. Não cheguei a nem ao menos notar que em meus lábios formava um sorriso bobo, enquanto me perdia nos olhos atraentes de Sebastian-san. Desci ligeiramente os olhos até seus lábios grossos, que se movimentavam sem parar, e fixei minha visão ali, apreciando cada detalhe, seu formato, sua espessura, sua perfeição e beleza. Mordendo meu lábio inferior, sentia meu coração saltitar loucamente dentro do peito, enquanto pensava comigo mesma. “Quando foi exatamente que eu descobri que a admiração que sentia por ele havia virado amor...?”

–... Assim retirará qualquer resíduo dos ladrilhos, Maylene. Compreendeu tudo como nos conformes?

– A-AH?! H-HAI, e-entendi sim!!

Não, eu não havia compreendido, nem ao menos escutado absolutamente nada do que Sebastian-san dissera! Pelo visto, explicava-me como limpar os ladrilhos, coisa que eu não sabia fazer sozinha. Mesmo assim, corri em disparada para a cozinha, desesperada por não saber o que fazer. Teria que limpar tudo mesmo sem saber, e ainda sem ajuda! Mas não tinha escolha, deveria seguir com meu trabalho de qualquer forma. “N-não deve ser tão difícil assim...”, pensava, enquanto apanhava os utensílios para a limpeza, escolhendo tudo com muito cuidado, para não causar nenhum dano. Com a escovinha, comecei a limpar os vãos dos ladrilhos, espalhando água sanitária por todo ele, pouco a pouco. Enquanto limpava, avistei uma crosta de gordura, grudada entre um ladrilho e outro, próximo a um dos vãos que eu escovava. Ajeitei os óculos no rosto, tentando firmar a vista embaçada, para poder enxergar melhor o que fazia.

– Whooo, uma crosta! Tenho que tirá-la daqui!

Esfreguei no mesmo instante a escovinha ali, mas meu esforço foi em vão. Encarei a crosta por alguns instantes e em seguida esfreguei ali mais uma vez. Repeti a ação várias vezes seguidas e, não conseguindo resultado algum, encarei-a novamente, pensando em uma solução para aquilo. Só então me lembrei de uma ferramenta que facilmente retiraria aquela crosta dali: a talhadeira. Corri o mais rápido que pude até o jardim, buscando a ferramenta e voltando para a cozinha novamente. Medi as circunstâncias, olhei para os outros ladrilhos, procurando saber se havia mais alguma crosta; calculei exatamente o local para a retirada daquilo, apoiando a talhadeira ali e, fazendo uma enorme pressão, avancei rapidamente com o martelo até a talhadeira e...

– NÃO!

Sebastian-san me interrompera antes mesmo que eu fizesse uma enorme besteira, segurando firmemente em meu pulso direito, o mesmo da mão que segurava o martelo, impedindo-me que prosseguisse. Assustei-me com a ação repentina dele, e permaneci olhando-o assustada, preocupada se anteriormente havia feito algo errado.

– S-S-S...!!!

– Desta forma quebrará o azulejo, Maylene!

– Ah-AAAAH, G-GOMEN NASAI, SEBASTIAN-SAN!!!


Francamente, Maylene de fato não prestara atenção em absolutamente nada do que eu lhe dissera. “No que ela estava pensando naquele momento? O que lhe tirou a atenção enquanto explicava...?” Eu mesmo terminaria aquela tarefa em poucos minutos; o trabalho nem era assim tão difícil e demorado, mas para Maylene, a tarefa não era também tão fácil quanto para mim. A minha intenção era retirar sua memória enquanto estivesse concentrada com a crosta e com os ladrilhos, e essa seria uma ótima oportunidade que, afinal, falhou. Arqueando uma sobrancelha, soltei seu pulso, rapidamente vestindo a luva, escondendo novamente o contrato, para que não piorasse a situação, e fizesse com que Maylene se recordasse ainda mais. Disfarcei, em seguida, já irritado, expliquei novamente a Maylene como retirar aquilo de lá, que não se devia agir com brutalidade com algo, mas sim com paciência.

– Maylene, você usou água sanitária, não é?

–S-sim, por quê...?

– Temos que retirar toda ela, já que usaremos ácido muriático para amolecer a crosta. Não podem misturar os dois, causaria danos à saúde.

– Whoo, eu não sabia!!

Expliquei-lhe com calma como deveria aplicar o ácido na crosta, que devia aguardar um tempo até que se amolecesse. Por fim, mesmo com muito esforço, acabei por eu mesmo retirar aquela gordura do azulejo, e limpei também o restante dos vãos, deixando-os em perfeito estado, causando um sorriso aliviado nos lábios delicados da ruiva; apenas isto me acalmava naquele instante, impedindo que eu desse qualquer bronca nela. Mas eu não podia me distrair com sentimentos, mesmo eles sendo tão fortes. O necessário a ser feito era ser frio como da primeira vez, e evitar que ela recordasse ainda mais do que já havia recordado em sonho. “É para o próprio bem dela, e sua felicidade é o que realmente importa...” Após isto, direcionei-me à Bard, que se aproximava naquele instante, já que a limpeza ali havia terminado.

– Bard, aproveite para cortar os legumes após Maylene os ter lavado, sim? Levarei o chá para bocchan, e despertarei seu sono. – dei as costas e, antes de sair da cozinha, disse, arqueando uma das sobrancelhas – Tentem deixar tudo nos conformes. Não quero ver nenhum estrago quando voltar.

Só então pude ter ao menos um pouco de certeza de que na cozinha não haveria tanto estrago; ameaçar com uma futura perda de paciência amedronta os empregados, e sempre que usava esta tática, nenhuma vez falhou. Caminhei até o quarto de bocchan, acordando-o e servindo-o o chá de amendoim, fresco e saboroso, preparado com esmero. Servi seu chá, troquei suas vestes e em seguida lhe servi o café da manhã.

Tudo estava bem adiantado, já havia revisado todo o trabalho da Mansão, havia sobrado uma hora de adiantamento. Seria o momento certo para fazer com que o futuro de Maylene fosse verdadeiramente feliz, e sem preocupações de um relacionamento forte com um demônio. Todos já haviam almoçado, quando avistei Finnian e aproveitei para perguntar por Maylene.

– Onde está Maylene?

– Ah, Sebastian-san! Ela está lá fora, foi colocar as roupas de bocchan e alguns lençóis no varal!

– Obrigado, Finnian. Tenho um trabalho para ela.

Afastei-me dali e segui em direção ao jardim, pela porta dos fundos. Vagarosamente abri a porta e avistei Maylene sentada, completamente distraída. Silencioso, senti meu coração bater ligeiro enquanto fitava-a, com os olhos em um ponto distante. Parecia também adiantada no trabalho. Fechei a porta sem causar ruído algum, aproximando-me dela sem que percebesse. Parecia não ouvir nada ao seu redor, e nem ao menos ver. Sua feição de distração era de fato encantadora; ao mesmo tempo em que meu coração batia forte por amor, também doía por temer o que aconteceria dali em diante. Aproximei-me um pouco mais, retirando a luva rapidamente, aproximando minha mão de sua cabeça lentamente, concentrado, estreitando os olhos. Ouvia a respiração tranqüila da ruiva, e isso não deixava com que me concentrasse como queria. Meu coração acelerava a cada instante, o desejo que eu realmente possuía era lhe dar um abraço e lhe encher de beijos como quando ela ainda tinha todas as memórias... Algo mais cortava o silêncio que ali prevalecia, um som agudo e pouco distante. “Não, agora nada mais pode me atrapalhar, este caso é sério...” Voltei a tentar me concentrar, com os olhos presos à minha mão. Porém, aquele som não deixava que eu me concentrasse por um tempo grande. Era uma oportunidade rara, eu não poderia perdê-la por nada! Mas o som era tão dócil, soava em meus ouvidos como uma linda canção; repetia-se como um choramingar de um bebê recém-nascido. “Miiiiiuun... Miiiiiiuuuunn...” Não, não poderia ser. Naquele momento tão aguardado, não poderia ser realmente o que imaginava ser. “Miiiiiuun... Miiiiiiuuuunn...” A curiosidade me corroía à ponto de ser impossível permanecer com a atenção em apenas Maylene, e ser inútil o meu esforço. Ela estava com uma distração tão grande que não notara até aquele instante a minha presença. “Miiiiiuun... Miiiiiiuuuunn...” Era uma oportunidade única! Se eu a perdesse, dificilmente acharia alguma semelhante. Mas aquilo me chamava, e eu já não podia mais me conter. “Miiiiiuun... Miiiiiiuuuunn...” Direcionei os olhos ao local de onde vinha o som e, de fato, era o que imaginara. Um gato filhote, de pêlos completamente negros, agachado a brincar com um pássaro Rolinha saltitante. “Não posso. A felicidade de Maylene é muito mais importante do que a beleza de um filhote de gato.”, pensava, apertando os olhos fechados, voltando a abrí-los somente para fitar Maylene novamente. “Miiiiiuun... Miiiiiiuuuunn...” O belo felino não cessava suas manhas, e aquilo estava me deixando louco. Logo, sem notar, já estava com os olhos presos ao filhote novamente, que lambia suas patas macias e levava aos olhos, ao mesmo tempo em que rolava no gramado, brincalhão. Respirei fundo, e voltei os olhos à Maylene novamente, procurando saber se ainda estava distraída; não estava só assim como também cochilando, o que era um alívio para mim. “Espere um instante apenas, pequenino... Apenas o tempo da retirada da memória de Maylene, sim? Não me distraia... Apenas espere... Um só instante...”, pensava enquanto fitava o felino, que retribuía o olhar, confiante. Só assim consegui voltar os olhos à Maylene e concentrar-me novamente, sem preocupações com o gato. Erguendo a mão novamente até a cabeça de Maylene, fitei-a por um instante, e logo fechei os olhos a meio de não perder a atenção dela e poder concentrar-me melhor. Porém, estrondos e latidos altos que se aproximavam conseguiram tirar minha atenção novamente, e para piorar, seguia com um grito do filhote que me apavorou. Arregalei os olhos no mesmo instante e rapidamente direcionei-os até o felino; para minha surpresa, Pluto corria atrás do gato, e estava prestes a devorá-lo. Desta vez não havia como continuar concentrado. Vesti a luva rapidamente e, ligeiro, corri atrás do cão-demônio, parando apenas ao estar à sua frente; com um salto, alcancei seu focinho, apertando-o enquanto olhava firmemente em seus olhos também vermelhos.

– Não ouse roçar um fiapo de pêlo seu sequer naquele felino, Pluto! Ou arranco-lhe este focinho e nunca mais lhe darei Inukkos!

Ameaçando-o, pude ouvir um choramingar seu e só então o ordenei para que fosse para outro lugar, irritadiço. Logo voltei os olhos até Maylene, que ainda cochilava tranquilamente, como se nada estivesse acontecendo. Sorri e caminhei até o gato, acolhendo-o em meu colo, sentindo seu corpo pequeno estremecer por inteiro. Acariciando seu pêlo curto e macio, deitei-o em meu peito, abrigando-o ali carinhosamente, enquanto massageava suas patas macias. Voltei até Maylene, sentando-me ao seu lado; ressonava baixinho, o que voltava a causar batimentos acelerados em meu coração. Fitei sua feição inocente, tão confiante ao cochilar numa tarde fria como aquela. Toquei sua mão com a minha desocupada, acariciando sua pele brevemente. “Está fria... Será que sente frio?”, pensava, enquanto ainda a fitava adormecida. Estava tão linda daquela maneira... Não me contive, e sem mesmo saber, retirei seus óculos, e passei a fitar seus olhos melhor. Os longos cílios que cobriam uma pequena parte de seus olhos me prenderam facilmente. Os seus lábios entreabertos deixando que a respiração entrasse e saísse sem impedimentos era amável. Aproximei-me aos poucos de seu rosto e simplesmente esqueci tudo ao meu redor. Toquei seu rosto com a mesma mão, deslizando-a suavemente até sua nuca, em uma carícia que a muito tempo sentia falta de fazer. Pouco a pouco, aproximei meus lábios dos seus ainda mais, começando a fechar os olhos. Estava prestes a roubar-lhe um beijo, sem ela saber, e sem mesmo eu perceber! Porém, antes que pudesse recostar meus lábios sobre os dela, senti uma leve arranhada no punho, e em seguida um ronronar quase imperceptível. Abri os olhos e rapidamente voltei o rosto para minha outra mão, lembrando que o filhote ainda estava ali.

– Oh, me desculpe. Eu me esqueci completamente de você. Logo lhe darei uma porção de leite, e...

– Ah... Senhor Sebastian...?

– Maylene, despertou...!

O pequeno gato havia me salvado, e eu não havia dado por mim que ela poderia despertar se eu a beijasse. Fitei-a nos olhos, com o rosto brevemente corado, e o coração acelerado. Por poucos segundos, todo o meu esforço iria por água abaixo. Disfarçando, decidi comentar do gato, aproveitando para pedir à Maylene que tomasse conta do menor enquanto buscava um recipiente com leite para o felino.

– Pode tomar conta dele por alguns instantes? Buscarei leite.

– C-claro...!

Ergui-me e afastei-me deles, adentrando a Mansão e buscando uma porção de leite como prometido. Voltei rapidamente com a vasilha, abrindo a porta dos fundos e avistando uma cena adorável. Os únicos seres que eu mais amava no mundo dos humanos estavam juntos, brincando. Era uma das cenas mais lindas que eu havia visto em toda a minha existência. Não pude evitar um sorriso tímido e orgulhoso, enquanto aproximava-me aos poucos, para poder ver aquela cena mais alguns instantes.

– Ela é uma gracinha, Sebastian-san!! – dizia Maylene enquanto brincava com as patas fronteiras do felino – Ela não para de brincar com meu avental! Hahaa!

O meu sorriso fora espontâneo, era impossível contê-lo. Entreguei a vasilha para que Maylene mesma lhe desse o leite. Ela, ao mesmo tempo em que pegou o recipiente de minhas mãos, estendeu-o ao filhote, que antes de tudo se deliciou, saciando sua fome o quanto antes. Enquanto Maylene se encantava em alimentar o pequeno gato, eu fitava-a com um sorriso preso nos lábios; não podia mais desfazê-lo. Tive um rápido pensamento de que poderia retirar sua memória naquele exato momento; seria perfeito, de fato, mas não obtive a mínima coragem para fazê-lo, seria muita rudeza. Permaneci apenas observando Maylene, seu sorriso bobo, enquanto acariciava o pêlo do pequeno felino.

Não ficamos ali sentados por muito tempo, pois após alimentar o gato, tínhamos que voltar ao trabalho. O modo como Maylene agia parecia impedir-me de retirar sua memória; ela parecia fazer de tudo para que meus planos dessem errado, mesmo não sabendo disso. Era sempre por um triz que eu não conseguia fazê-lo, me parecia ironia do destino. Eu apenas não queria deixá-la sofrer por minha causa, isso que decidi era para seu próprio bem. Mas eu imaginava, “Será que realmente devo? Ela se lembra apenas em sonho, e imagina que não seja nada mais além disso...” Possuía temor em prejudicar sua memória de alguma forma, fazendo-a esquecer dos nossos momentos. “Será possível? Ela seria capaz de se recordar realmente de tudo, não só em sonho?” Eu não deveria pensar tanto assim, o que de fato deveria fazer era retirar sua memória novamente, isso resolveria tudo em poucos segundos. O que eu precisava era de mais uma oportunidade, e não desperdiçá-la de forma alguma.

O dia não tardou a chegar ao fim, foi tudo igualmente calculado, e eu acabei por não conseguir mais nenhuma chance durante o restante da tarde, já que aquele era o dia em que bocchan sempre tinha aulas de cálculos comigo; meu mestre é sempre o mais importante, sempre prioridade. O sol já abaixava, e a noite já tomava conta. O momento de todos irem dormir seria perfeito, onde tudo estará calmo e ninguém saberia o que iria acontecer. “Exatamente como da primeira vez... Mas desta, nem mesmo ela saberá.” O planejado era esperar todos dormirem, principalmente Maylene. O maior silêncio possível precisava ser alcançado, para que ela não sentisse minha presença.

– Bocchan, está na hora de dormir.

– Bah, Sebastian. Ainda está cedo, tenho que assinar mais esses papéis...

– O senhor precisa descansar, para amanhã poder acordar cedo, sem reclamações. Sim?

– Mattaku... – erguendo-se de sua poltrona, caminhou até mim, esperando que o trocasse – Ande logo e me ponha para dormir, então.

– Yes, my lord.

Enquanto trocava calmamente suas vestes, notei um rápido e disfarçado bocejo do jovem mestre; não pude deixar que um pequeno sorriso se desenhasse em meus lábios. “Bocchan... é tão teimoso!” Eu sabia que já estava com sono, era uma criança, precisava de um bom descanso. E isso ajudava a fazer com que meu coração ficasse mais tranqüilo; o jovem Conde não despertaria tão cedo para reclamar de alguma coisa durante a noite. Após vestí-lo com seu pijama, deixei que se deitasse sozinho, e por fim o cobri. Mal terminara de o ajeitar em sua cama e já ressonava baixinho, com sua feição inocente e despreocupada.

– Ah, já dormiu. – disse, seguindo ao assoprar a vela, deixando o quarto escuro o suficiente para uma boa noite, e logo meu sorriso se desfez, enquanto fitava um ponto qualquer do quarto – Boa noite, bocchan.

Os empregados ainda estavam acordados, porém estavam prestes a irem dormir. Eram poucos instantes em que podiam prosear entre si. Aproximei-me da cozinha, logo que notei que todos estavam reunidos ali. Recostei o corpo na parede para ouvir uma parte da conversa, a qual era Maylene quem tomava a palavra.

– ... E os cantos de nossos lábios se recostaram q-quando caímos com o lustre! Meu coração bateu forte na hora, mas, conforme foi passando os segundos rápidos, eu não me sentia mais agitada e desesperada como sempre! Meu coração parecia tão acostumado com os nossos corpos juntos daquela maneira, que em vez de seus batimentos aumentarem em desespero, saltava de uma forma tão gostosa de sentir...! E-eu cheguei a sentir até mesmo o coração dele...

– Mesmo, Maylene?

– Woaah! E batia forte, mais do que o seu?

– Batia forte... realmente muito forte... – Maylene falava isso baixo, timidamente – Eu... pareço não ficar muito nervosa lembrando desta situação. Fico, um pouco, mas essa sensação não é a mesma, tão maravilhosa quanto as com que sonhei... O que sinto é que todos estes sonhos que andei tendo são lembranças pouco distantes, que realmente aconteceram! Mas, ao mesmo tempo... não. Quando acordo, recordo que “foi apenas um sonho”...

– Maylene-san, não fique assim...

– Hey, e você foi contar esta história do lustre para a gente só agora, hein?

– A-aaah!! M-mas é que... não sei... e-eu... como já disse... Na hora, fiquei um pouco nervosa. Mas eu não fiquei me recordando o tempo todo daquela cena, como se fosse a coisa mais normal do mundo! Eu mesma acho estranho tudo isso...

– Maylene-san gosta muito mesmo de Sebastian-san, ne...?

– Hai... estou... e... sempre fui... ap-paixonada por ele...

Mesmo não recordando completamente, ela sabia que tudo aquilo realmente aconteceu. Seu coração, seu corpo; ela toda já estava acostumada com o meu carinho, e isso não era bom. Mesmo que meu corpo e meus sentimentos pedissem pela presença dela junto de mim, eu não poderia deixá-los falarem mais alto. Ao ouvir a ruiva falar tão abertamente sobre seus sentimentos por mim, estremeci, e senti meu coração pulsar fortemente em meu peito. Ela realmente me amava, e eu possuía os mesmos sentimentos por ela. Ela precisava de mim, e eu também precisava dela. Nossa necessidade de um para o outro não poderia ser saciada. Eu estava amando aquela mulher mais que tudo. Mas, infelizmente, este amor não poderia crescer, não poderia ser alimentado; se fosse, seria apenas para fazer crescer as tolas esperanças, para depois ser fatiada cruelmente. Exatamente como uma rosa no auge de sua beleza, sendo regada todos os dias, com o carinho de seu criador, para um dia morrer, pisada por seu destino cruel. Posso parecer frio com este pensamento, mas é a pura realidade. Uma relação impossível de se tornar um “final feliz” não poderia ser alimentado. Exatamente por este motivo queria retirar a sua memória, mesmo que me doa no fundo do coração. “Eu apenas quero ver um sorriso contente em seus lábios doces, por toda a eternidade...”

Logo os três mudavam de assunto, o que não me interessava, por sinal. Dei as costas antes que me vissem ali, precavido. Procurei distrair-me com alguma coisa que me ocupasse, até que todos fossem dormir. Segui até o jardim e, avistando o felino que há pouco fora alimentado por Maylene e por mim, aproximei-me vagarosamente.

– Oh, venha comigo. Assim lhe alimentarei todos os dias, sim?

Acolhi-o entre minhas mãos, recostando o menor em meu peito em seguida. Adentrei a mansão da mesma forma como havia saído, silenciosamente. Segui até meu quarto e, abrindo a porta do armário, repousei-o com cuidado em uma das poucas frestas desocupadas, enquanto os outros filhotes e adolescentes vinham conhecê-lo. Sorrindo, depositei uma vasilha de leite para cada gato que ali estava, acariciando-os por alguns instantes. Logo averigüei o horário em meu relógio de bolso.

– Meia noite e sete. Maylene deve estar em um sono profundo nesta hora.

Ergui-me do chão, em seguida depositei os felinos novamente no armário, um por um, com carinho. Só então após o feito pude sair daquele cômodo para finalmente seguir até o de Maylene. Descendo as escadas, logo segui para o longo corredor, parando apenas próximo ao meio dele, frente à porta do quarto dela. “É agora...” Respirei fundo e girei a maçaneta, abrindo a porta com cautela, evitando qualquer ruído. E lá estava Maylene, completamente descoberta, de costas para baixo, uma perna esticada e a outra dobrada, com o joelho alto, o pé apoiado no colchão; segurava com um dos braços o travesseiro, e mantinha a cabeça deitada no colchão, sem apoio. “Só ela mesmo para dormir desta forma...”, pensei, enquanto tapava os lábios com a ponta dos dedos, evitando um riso alto. Fechei os olhos e retirei as luvas rapidamente, para também evitar a demora ou o fracasso. Em seguida abri os olhos mais uma vez e, antes, parei para observá-la, observando-a por longos segundos, apreciando sua beleza, não apenas seu rosto, mas também seu corpo, tão bem contornado e torneado. Tomei liberdade para aproximar-me dela, ajeitando seu travesseiro debaixo de sua cabeça. Desci a mão até sua cintura, sorrateiro, colocando-a deitada de forma mais aconchegante, para que não causasse dores em sua coluna quando viesse a despertar. Deslizei a mão por sua cintura mais uma vez, fazendo-lhe uma carícia agradável, sem poder resistir. Logo percorri os dedos por sua perna, desdobrando-a então com cuidado, juntando-a com a outra já estendida. O aroma doce que exalava de seu corpo fazia com que meu coração saltasse fortemente em meu peito. Havia pouca iluminação no quarto, e a luz da lua que penetrava sutilmente o cômodo refletia parcialmente em seu corpo, mais fortes em seus contornos e saliências, deixando-me pouco visualizar o lado pouco iluminado que envolvia boa parte de seu corpo. O pulsar de meu coração aumentava a cada instante, a cada detalhe provocante que me envolviam os olhos, que eram sempre cobertos pelo seu uniforme de empregada. Rocei os dedos pelo seu ombro, descendo num acariciar até sua mão, apoiada no começo do quadril. Notei que a cada local que passeava com os dedos era tomado por um longo arrepio, e isso fazia com que meus lábios se desenhassem com um sorriso apetecível. Ainda delicado, toquei sua cintura com uma leve mudança, firmando os dedos, acariciando-a agora desta forma, vagarosamente, enquanto subia pelas costelas. Com a outra mão eu me apoiava em um canto da cama, enquanto fitava seu rosto abrindo um sorriso, lentamente; mesmo dormindo, eu sabia que podia sentir aquelas carícias. Então repentinamente ergui-me, ficando assim de pé, ajeitando os cabelos para trás; havia me esquecido de que tinha ido para o quarto de Maylene para retirar suas memórias, tanto que já havia até tirado a luva da mão esquerda...! “Como fui distrair-me assim?”, pensava, enquanto levava a mão esquerda até a testa, estalando ali a palma. Franzindo o cenho, abaixei-me até ela novamente, e levei as mãos até sua testa, começando então a me concentrar, com os olhos fechados. Prestes a retirar sua memória, ouvi murmúrios baixos, e notei que Maylene se movia na cama. Recolhi a mão rapidamente, temendo que ela pudesse despertar. Fitei seu rosto, preocupado, analisando-a ainda a dormir. “Ah, está apenas resmungando algo enquanto sonha, comigo, provavelmente...” Sorri de forma brincalhona, gabando-me; logo soltei um suspiro aliviado, vendo-a dormir tranquilamente, enquanto movia as sobrancelhas e os lábios. Quando resolvi preparar-me novamente, Maylene pronunciou então algumas palavras indecifráveis, puxando-me repentinamente para perto de si, num abraço bruto. Espantei-me com sua ação inesperada, com os olhos brevemente arregalados e as sobrancelhas arqueadas com o susto.

– Humm... Zzsebvazdjiiannh-zsaann... huhuu~...

Era então o meu nome que ela pronunciava...! Permaneci estático, em meio aos braços dela que me envolviam com tanta força. Como sairia dali? Estava preso, se tentasse me desvencilhar dela, despertaria-lhe do sono; se ela me visse ali quando acordasse, como me explicaria? Apenas permaneci daquela mesma forma, com o coração acelerado, enquanto ouvia Maylene ora ou outra murmurar. Estava com a face recostada em seu queixo, e todo o meu tronco era pressionado pelo dela, mesmo tão pequeno e delicado perto do meu. Sentia o seu coração bater, nem tão forte quanto o meu, mas batimentos confortáveis de se sentir. Mas eu não poderia permanecer a noite toda ali...! Precisava escapar dos braços dela e resolver o que deveria desde que adentrei aquele cômodo. Resolvi tentar desvencilhar-me vagarosamente, com o máximo de cuidado, retirando um braço por vez de cima de mim; porém, as únicas partes de meu corpo que conseguiram libertar-se foram apenas meus braços, pois, conforme eu tentava me desvencilhar, mais ela firmava os braços em volta de minha cintura. Estava praticamente dependurada em meu peito, e eu já não sabia mais como sair dali. Ou era preso pela cintura, ou pela gravata, ou braço, cabelo, nuca. Sentia o meu rosto levemente quente, e não era para menos, já que tive praticamente que me deitar ao lado dela, sem poder me soltar de forma alguma. “Desta forma não há como criar qualquer concentração...”


Eu sonhava naquele instante que abraçava Sebastian-san de forma tão forte, como se algo realmente acontecesse entre nós. As sensações eram cada vez mais fortes, como uma recordação. Era tudo tão real, como se eu o tocasse de fato; o desejo que eu possuía era de permanecer sonhando daquela forma eternamente, já que seria impossível um romance com Sebastian-san. A noite era o momento mais especial para mim, já que eu podia tocá-lo sem medo, e sentir as sensações como se fossem reais, como se fossem recordações. Eu ainda desconfiava que fossem de fato lembranças, mesmo parecendo ser tão impossível. No sonho, eu estava prestes a beijar os belos lábios de Sebastian-san, mas por algum motivo abri os olhos, despertando lentamente. De repente...

– Ah-AAAAAAAHH!! S-SEBAS...!!!

Fora apenas o tempo de eu abrir os olhos e ver aquele homem deitado ao meu lado, com o rosto tão próximo ao meu, para que eu caísse da cama, soltando um grito de espanto e surpresa. Eu estava abraçada a ele, apertando-o pela cintura! Mas ele olhava-me tão calmo, esperando eu despertar por completo e passar o susto...! Afinal, o que ele estava fazendo àquela hora da madrugada em meu quarto, e deitado ao meu lado, na mesma cama...? Soltei a voz mais uma vez, gritando loucamente; ao menos tentava, já que mal o notava tapar meus lábios, abafando minha voz.

– HMM, HMMMMM...!!!!

– Acalme-se, Maylene! Desta forma irá acordar a todos!

Meu rosto estava completamente vermelho, e fervia a cada segundo. Por qual motivo estava ali? Eu estava muito assustada, e podia sentir meu coração saltar fortemente dentro de meu peito. Não sabia como agir, apenas pensava em gritar ou correr dali, esconder-me de alguma forma, tapar o rosto, o que fosse.

– Acalme-se. Eu vim até aqui apenas para saber o que estava acontecendo com você. – dizia ele em meio a um sorriso, fitando meus olhos – Quando abri a porta de seu quarto, você falava alto, sonâmbula.

– A-aah... sim, mas... – dizia eu, então, enquanto finalmente estava livre para poder falar; desesperei-me em seguida ao lembrar da situação que me deixara aflita daquela forma – M-MAS POR QUE O SENHOR ESTAVA DEITADO... C-C-COMIIIGO????

– Ora, não possuo culpa alguma se a senhorita quem é a sonâmbula, não é mesmo? Lembre-se de que era eu quem estava preso aos seus braços.

– YAAH!! GOMEN NAS...!!!

– Shh! – tapando meus lábios novamente, Sebastian-san fitava-me firme nos olhos, dizendo-me em seguida em meio a um sussurro – Já disse para não gritar.

– G-g-gomen... nasai...!

Sentia a temperatura de meu rosto aumentar a todo instante, e eu já não conseguia mais olhar nos olhos vermelhos de Sebastian-san, que me intimidava ainda mais por não tirá-los de mim um instante que fosse. Fitava agora o chão, sem saber o que fazer, ou como agir; o homem que eu tanto amava estava em meu quarto! Ele agora estava de pé, enquanto eu permanecia sentada no chão em conseqüência do tombo. “Será que foi apenas por este motivo que ele veio até meu quarto? E quanto ao fato dele estar deitado ao meu lado?” Vários pensamentos invadiam minha mente naquele momento, e eu não conseguia mover mais nenhum músculo.

– Maylene, pode pegar um resfriado se continuar neste chão frio. – estendeu a mão para mim, com um sorriso doce nos lábios – Venha para a cama. Melhor dormir e descansar, senão amanhã dificilmente acordará no horário exato.

– Ah... arigatou...!

Peguei em sua mão como apoio e me ergui do chão, ajeitando os cabelos e a camisola por efeito do nervosismo. Logo deitei-me, cobrindo-me até o queixo. Envergonhada, evitei fitá-lo novamente, porém, mesmo sem olhá-lo, notava-se que em nenhum momento tirava os olhos de mim. Só consegui voltar os olhos para Sebastian-san novamente ao ouvi-lo pedir por licença, ainda com um sorriso nos lábios. Fitei-o sair do quarto, e permaneci olhando para a porta por um longo instante, sem mesmo acreditar no que havia acabado de acontecer. “S-Sebastian-san estava mesmo no meu quarto...? Será que... não foi simplesmente um sonho meu...?” Por fim, acabei ficando o restante da noite acordada, recordando da situação, e também comparando-a com as sensações dos sonhos, que eram exatamente as mesmas. “Isso não pode ser apenas coincidência...”

Meu coração pedia loucamente por mais, e aquela situação pareceu o atiçar ainda mais do que o comum. Recostei na parede do lado de fora do quarto de Maylene, levando a mão até o rosto ao sentir o coração acelerar. Eu queria tocá-la com meu carinho mais uma vez, meus sentimentos quase me forçavam a demonstrar meu enorme afeto por ela. Mas eu deveria me conter, como o prometido. Sofreria sozinho, e não a envolveria em circunstância alguma. Eu não podia me aproximar pouco mais do que o comum dela, não deveria deixar o sentimento tomar conta; porém eu não conseguia me conter, era mais forte do que eu. Ao mesmo tempo em que eu tentava retirar as lembranças da ruiva, eu possuía um sentimento forte de que ela se recordasse de tudo, e podíamos então saciar o nosso desejo novamente...

O dia não tardou a raiar, e mais uma vez eu não pude conseguir qualquer outra oportunidade, pois logo após bocchan tomar seu café da manhã, recebeu uma ligação de um empresário, para que fosse até sua casa e pudessem negociar uma “pequena mudança no preço da venda dos doces”, como aquele senhor mesmo o citou.

– Sebastian, iremos agora de manhã, enquanto ainda é cedo. Sua residência nem é tão distante daqui como imaginamos, mas pelo visto, não iremos voltar tão cedo.

– Como quiser, bocchan.

– Venha logo trocar minhas vestes.

Subi com bocchan para seu quarto e, agindo da forma mais rápida que pude, o vesti com roupas mais formais para que fôssemos rapidamente para lá, para que o jovem mestre negociasse ou não com o empresário e pudéssemos voltar o quanto antes para a Mansão. Algo me dizia que se eu não retirasse as memórias de Maylene naquele dia, algo aconteceria. Evitei pensar nela enquanto seguíamos pela estrada.

A viagem não fora tão longa como imaginava, fora tempo o suficiente para chegarmos por volta das 12 horas, à tempo de bocchan poder ter um almoço de negócios com aquele senhor. Apenas permaneci ao seu lado o tempo todo, sem falar absolutamente nada e de postura respeitosa, com uma constante seriedade facial. Enquanto permanecia ao seu lado de pé, ora ou outra vinha Maylene em minha mente, e eu me perguntava se estaria bem, ou se havia se recordado de algo mais, ou até mesmo outra coisa pior; isto me preocupava demais...

A pequena reunião não chegou a tardar mais de três horas, e até mesmo bocchan estava ansioso para voltar o mais rápido possível para a sua Mansão. De fato, parecia estar realmente cansado, por demonstrar nos olhos a irritação que sentia.

– Bah, Sebastian. Esses empresários querem fazer negócios comigo, sendo que o lucro vai completamente para eles!

– Faz bem em não negociar, bocchan.

– Nenhuma porcentagem eu ganho com isso, sendo o que ele queria investir era na minha fábrica.

Conversávamos sobre aquele negócio fajuto por todo o caminho da volta. Tudo friamente calculado. Chegamos num horário perfeito, em horário de preparar um esplêndido chá para o jovem mestre. Servi-lhe um chá de morango, pouco adocicado para prevalecer o sabor natural da fruta; juntamente com o chá, preparei Macarons com recheio de ganache de chocolate, que sempre lhe fora de enorme agrado.

Entardeceu, e a lua já surgia aos poucos. Meu peito saltava de tal forma que chegava a preocupar-me. Estava pressentindo algo, impossível não ser algo relativo. Fiquei atento a qualquer ruído que vinha de todos os lados, e naquele fim de tarde não consegui planejar em momento algum uma chance, e era isso em primeiro lugar que mais me afligia. O dia passava lentamente, e a cada instante pressentia uma situação perigosa. Poderia ser perigoso principalmente para bocchan, o que me preocupava muito. E então, em um momento que menos esperava...

– SEBASTIAN!!!

Usufruí de minhas habilidades demoníacas e corri até o quarto de bocchan e, numa fração de segundos, saltei sobre ele o protegendo de um tiro que seria certeiro se não chegasse a tempo. Agarrei-o a mim, e, permanecendo agachado, fitei o jovem mestre, preocupado.

– Bocchan, está bem?

– Sim, sim... Agora vá logo e livre-se desses homens! Mate-os, se for preciso. É uma ordem!

– Yes, my lord.

Avancei pela janela, saltando para o jardim, avistando vários homens mandados, com armas de fogo em mãos, atirando nos empregados que já estavam a postos, onde até mesmo Pluto atacava alguns dos homens, que por sinal estavam em uma quantidade média. Logo notava vários golpes certeiros vindos da Mansão e, ao voltar os olhos em direção a eles, não pude conter um sorriso de aprovação e orgulho. Todos com uma enorme precisão, concentrados no que faziam. Logo me voltei aos assassinos, golpeando-os com os pés e atirando talheres cortantes. Os gritos de dor e tiros abafados ecoavam pelo ar. Faltavam poucos homens, e todos se esforçavam ao máximo que podiam. Porém algo me forçou a olhar em direção onde estava Maylene, e meu coração repentinamente disparou. Algo me fez correr até ela, sem mesmo saber o porquê. Ao aproximar-me, notei que a ruiva se escondia, e se atrapalhava um pouco com a carga de sua arma. Antes mesmo que pudesse lhe dizer algo, virei-me para trás e notei que um dos capangas permanecia escondido em meio a um arbusto, pouco distante de nós, apontando uma espingarda para ela, enquanto distraía-se por questões de segundos. Rapidamente voltei-me à Maylene, empurrando-a para a parede ao ouvir o som dos tiros. Ao tê-la recostada na parede, fitando-me assustada, protegia-a dos tiros que vinham em nossa direção da forma como melhor podia fazê-lo, e a maioria deles acertava minhas costas. Logo a arrastei para um esconderijo melhor, onde realmente ninguém poderia nos ver. Encurralando-a entre meus braços e minhas mãos apoiadas na parede, uma de cada lado de Maylene, fitava seus olhos ainda assustados, as sobrancelhas arqueadas, enquanto estranhamente fitava os meus olhos. Meu coração saltava feito louco dentro do meu peito, ao protegê-la com meu próprio corpo, cobrindo-a completamente... Demorei alguns segundos para dizer algo, por ficar hipnotizado com os olhos grandes e castanhos dela.

– Fique bem aqui, irei matar o capanga que nos acertou.

Distanciei-me dela e rapidamente apanhei novamente alguns dos talheres que haviam sobrado, armando-os para atacar aquele homem. Caminhei macabro, lentamente, em direção a ele, desviando dos tiros com movimentos simples, logo me aproximando e arrancando-o dos arbustos e causando-o ferimentos graves com apenas garfos, facas e algumas balas que segurei com as mãos enquanto o outro atirava; deixei-o sofrer em vez de matá-lo, quem sabe aprenderia melhor a lição da forma como ensinei?

Estava estática, e as únicas partes de meu corpo que se moviam eram meus olhos, que seguiam Sebastian-san até quando não o pudessem alcançar mais. Fora apenas ele jogar-me na parede daquela forma, e no exato momento em que o fitei no fundo dos olhos, um estalo repentino, que me pareceu tão demorado ao mesmo tempo: um filme inteiro rodou por minha mente, e eu respirava arfante, sufocada. Todas as cenas que eu sonhava, as lágrimas, os sorrisos, as carícias, o amor, a realidade... Tudo então passou a fazer sentido, tudo era a pura verdade; eu havia me recordado, e só então soube que os sonhos que tivera até aquele dia fora apenas uma “prévia” do que logo viria a recordar, e não simplesmente uma coincidência como pensava ser. Fitava um ponto qualquer do horizonte, com o olhar parado, não podia conter as lágrimas em enorme quantidade, que rolavam a todo instante por meu rosto. “Por que ele retirou minha memória? Por quê? Eu havia pedido, implorado para que não fizesse... Ele não deveria ter feito uma coisa dessas comigo, eu o amo tanto... Por quê...?” Quanto mais eu ligava os sonhos com a realidade, principalmente os finais deles tão sombrios, com quando aconteceu de verdade, mais meu coração doía, mais as lágrimas brotavam e escorriam como uma cachoeira sem fim, mais eu soluçava. Tudo estava claro, tudo estava compreensível, mas tudo doía. Agachei-me no chão, com as mãos na cabeça, em enorme desespero. O que fazer em um momento como aquele? Não sabia como olhar nos olhos de Sebastian-san após aquilo, não conseguiria perdoá-lo sem um motivo certo, uma explicação. Eu estava arrasada. “Sebastian-san não possuía o direito de apagar minhas memórias sem minha permissão... Ele quis arrancar de mim algo tão precioso, que nunca, mas nunca gostaria de perder! Teria aquelas memórias por toda a minha vida, a mais importante, a que me deixava feliz, a que me fazia viver...” Eu estava tão inconsolável que nem mesmo sentia as dores das feridas poucas em meu braço, de um ou dois tiros de raspão. As dores de meu coração eram muito mais fortes do que as físicas. Fiquei um momento não tão longo agachada no chão, apoiada na parede de tijolos, chorando sem parar. Até o instante em que Sebastian-san voltava, vendo-me naquele estado, aos prantos e aos soluços.

– Maylene, o que houve...? Está chorando...! Está sentindo muita dor? – dizia baixinho, aproximando-se de mim, abaixando-se e erguendo meu rosto com a ponta dos dedos, olhando-me nos olhos – Aconteceu alguma coisa...?

– Sim, tudo realmente aconteceu... Sebastian-san, eu me lembrei de tudo. Tudo... – desviei os olhos para o lado contrário dele, derramando ainda mais lágrimas dolorosas – tudo o que eu planejava guardar para o resto de minha vida, as lembranças tão preciosas, o senhor quis tirá-las de mim...! Como teve coragem para fazer isso comigo? Aliás, o senhor mesmo...

– Foi para sua própria felicidade, Maylene.

– Minha própria felicidade? O senhor acha que eu seria mais feliz não recordando de algo tão especial?

– Vamos para dentro da Mansão, está ferida, precisa estancar este sangue. – e, olhando para os lados, procurando saber se ainda havia mais capangas por perto, porém logo voltou os olhos á mim – Conversaremos sobre isso depois; precisamos estancar seu sangue e tratar da ferida.

Permaneci evitando o fitar nos olhos, com a cabeça e os olhos baixos. Notei-o se reerguer, parando à minha frente, e estendendo sua mão para ajudar-me a levantar. Estendi minha mão, apoiando-me na dele, levantando só então do chão e ainda evitava olhar para seus olhos rubros. Logo nos distanciamos dali, e adentramos a Mansão juntamente com os outros empregados, que estavam todos pouco feridos, como eu. Cada um foi para seu respectivo quarto, e eu fiz o mesmo, aproveitando para limpar a ferida e preparar um remédio, enquanto Sebastian-san preocupava-se com bocchan. “Minha única felicidade é estar ao seu lado, e essa única coisa valiosa ele tentou tirá-la de mim?”, pensava, enquanto já espalhava o remédio caseiro na ferida. Repentinamente, ouvi alguém bater na porta de meu quarto, perguntando se poderia entrar. Não parei para prestar atenção em de quem seria aquela voz, e acabei permitindo a entrada. Estava séria e ainda sem os óculos; quando ergui os olhos finalmente, era o próprio Sebastian-san quem estava ali.

– Com licença, Maylene. Cuidei de um pequeno ferimento que bocchan possuía, de um tiro de raspão que lhe atingira a ponta do ombro; toda a Mansão já está em perfeito estado, tratei de retirar as balas e retirar as madeiras estragadas, e troquei-as por outras; já fui até o quarto dos homens para ajudá-los com o que precisavam com seus ferimentos. Finnian mesmo possuía um ferimento um pouco profundo, porém não era nada grave. – aproximando-se de minha cama, onde estava sentada, fitando meus olhos, mesmo que eu não correspondesse – Agora é a sua vez, e estou aqui para ajudá-la se precisar, e também para combinarmos um horário para conversarmos.

– Estão todos bem agora...?

– Sim, Maylene. Todos tiveram ferimentos leves, nenhum preocupante.

– Ah, e obrigada. Estou bem, já cuidei de minha ferida, Sebastian-san...

Vi o homem que eu tanto amava quieto, então, após eu lhe ter dito aquilo, tão friamente. Estava agindo de forma muito seca com ele, mesmo não sendo necessário. “Eu o amo tanto...” Meu coração estava acelerado, saltava fortemente dentro do meu peito. Eu estava louca de vontade de saltar nos seus braços e abraçá-lo forte para não soltar mais. Mas naquele instante eu estava tão atordoada, tão confusa, que acabei por ter uma reação tola, agindo daquela forma. Fitei Sebastian-san, de pé, próximo a mim, perguntando-lhe:

– O senhor quer conversar durante a madrugada?

– Se não lhe for incômodo, sim.

– Pode vir, quando todos dormirem...

Ao dizer a última frase tão baixa e rouca, abaixei a cabeça e deixei que algumas lágrimas rolassem por meu rosto, levando as mãos até o mesmo em seguida. Após poucos segundos, senti umas das mãos de Sebastian-san tocar-me, deslizando seus dedos por algumas mechas de meus cabelos, acariciando vagarosamente ali. Meu corpo arrepiou-se no mesmo instante, enquanto meu coração rebatia-se alegremente, pedindo por mais carícias. Logo a outra mão de Sebastian-san alcançou meu rosto, retirando minhas mãos de frente com carinho, para poder olhar em meus olhos novamente.

– Eu gosto muito de você, Maylene, e você sabe disso. A última coisa que quero em toda a minha existência é ver seu rosto magoado, principalmente se for por minha causa, ou por algo que lhe fiz de mal. Nunca me perdoaria se algo assim acontecesse. Eu te amo, Maylene...


E então, a cada palavra que saía de seus lábios, era uma aproximação maior entre nossos rostos. Estava tão hipnotizada por seus olhos e lábios que não possuía palavras certas para respondê-lo. Apenas deixei que deslizasse os dedos por meu rosto, retirando os cabelos que me escondiam e colocando-os para trás com uma carícia irresistível. Fechei os olhos lacrimejantes, sentindo os lábios de Sebastian-san recostando-se nos meus, depositando um beijo rápido, como por impulso. Separou então seus lábios dos meus, fitando meu rosto, com expressão preocupada, enquanto acariciava meus cabelos mais uma vez. Após isso, ergueu-se com postura novamente, afastando-se aos poucos, entristecido. Logo abriu a porta, reforçamos o que havíamos combinado.

– Voltarei aqui à madrugada, faltam poucas horas...

Afirmei com a cabeça, ainda sem fitá-lo nos olhos. Logo em seguida saiu, fechando a porta atrás de si. Deixei então de me conter, e as lágrimas saíram uma a uma, escorrendo por meu rosto, mostrando o quanto estava confusa e desesperada. Eu de fato havia gostado muito daquele beijo, mesmo sendo ele tão rápido. Meu coração agradecia, meus sentimentos gritavam por ele. Sentia que estava sendo injusta com Sebastian-san, ficando aborrecida com ele daquela maneira; a partir daí passei a me sentir um pouco mais calma. Até me peguei esboçando um sorriso bobo nos lábios, com o rosto corado. Era mesmo maravilhoso poder recordar-me de tudo, com tanta clareza; mas não apenas com sonhos. Isso significava que o que sentia por Sebastian-san era mais forte até mesmo do que seu próprio poder de Demônio...


Atravessei a porta de seu quarto, fechando-a logo em seguida. Naquele instante parei, em frente ao quarto de Maylene, fitando o nada, com as sobrancelhas arqueadas para baixo, triste, enquanto tirava os cabelos de frente de meu rosto com os dedos, e a palma da mão recostada na testa. Não cabia em mim pelo enorme erro cometido. “Eu fui tolo o bastante em aumentar as esperanças deste amor...”, pensava, incrédulo. Realmente, eu estava certo: aquilo apenas aumentaria nosso desejo de um ao outro. Os meus sentimentos eram mais fortes do que eu, e lidar com esta circunstância era difícil. Ter que resistir a sua feição tristonha era praticamente impossível.

Evitei permanecer muito tempo ali em frente, pois ainda tinha coisas para fazer naquele final do dia. Os empregados estavam feridos, ao menos naquela noite precisavam descansar, evitando fazer qualquer esforço para que não tivessem alguma hemorragia. Teria que preparar todo o jantar, lavar os pratos e ainda outras coisas mais, fazendo o meu trabalho e terminando o de todos os empregados. E aquela madrugada seria a certa. O único modo com que eu poderia retirar suas lembranças era conversando calmamente e convencendo-a de uma vez por todas. As horas tardavam a passar, e a ansiedade corroía meu coração palpitante. A todo instante eu averiguava as horas em meu relógio de bolso. Os minutos pareciam nunca andar. Minhas mãos chegavam a suar por debaixo das luvas, conforme minha ansiedade aumentava...

Mesmo as horas demorando tanto a passar, enfim a que eu tanto esperei chegou. E todos praticamente estavam dormindo, por estarem todos tão exaustos; naquele momento eu já havia colocado bocchan para dormir. “Possuo tempo o suficiente para poder convencê-la.” Todas as velas já haviam sido apagadas, provavelmente Maylene estaria esperando por mim. Carregando um candelabro, caminhei a passos cautelosos pelo corredor, em silêncio total, com uma seriedade estampada no rosto, de puro nervosismo. Parei em frente ao quarto da ruiva e dei três toques na porta, pouco abrindo os lábios para pedir por licença. Ao abrir a porta, percorri os ligeiros olhos por todo o quarto, e apenas parei na bela figura de Maylene, vestida apenas com sua longa camisola branca, tão fina, que deixava seu corpo realçar mais do que o normal. Pelo visto, trocara as vestes por seu uniforme ter algumas manchas pequenas de sangue; mesmo que tivesse que me esperar, ficaria no quarto, e não poderia sujar sua cama. Permaneci longos segundos fitando-a daquela forma, e, apenas ao cair em mim, lembrei-me de que não deveria tardar daquela forma, distraído. Aproximei-me de sua cama, onde Maylene estava sentada, esperando por minha chegada, e então pedi por sua licença mais uma vez, para que então eu pudesse me sentar ao seu lado. Logo que o fiz, Maylene tomou a palavra antes mesmo que eu.

– O senhor acha que eu seria feliz sem o senhor?

– Maylene... – pronunciei seu nome em tom baixo, e só após prossegui com a resposta – Já lhe expliquei tudo com toda a paciência, antes mesmo de te retirar as memórias...

– Sim, senhor Sebastian, eu me lembro de tudo isso. – rapidamente voltou os olhos para os meus, fitando-me enquanto franzia o cenho – Mesmo que seja um demônio, Sebastian-san, eu nunca seria feliz sem o senhor...!

Aquelas palavras faziam meu coração saltar com uma força incomparável, o qual fazia com que meu peito doesse por ter tomado aquela decisão novamente. Olhar seu rosto corado, notando seu nariz vermelho por ter tanto chorado, e seus olhos formando rápidas lágrimas, não havia como manter a frieza. O desejo que eu possuía era envolvê-la em meus braços e consolá-la. Isto seria um erro, o culpado consolando a vítima; e isto apenas alimentaria nosso amor. Eu apenas não queria arruinar sua vida humana... Por um impulso que nem eu mesmo pude notar, levei uma de minhas mãos até seu rosto, roçando os dedos por sua face levemente rubra, enxugando uma lágrima que havia escapado.

– Eu não quero arruinar seu futuro por apenas capricho meu. De fato, sou um demônio, e seria impossível uma relação entre um humano e um demônio se dar um bom resultado. – permanecendo alguns segundos fitando seus belos olhos, enquanto apenas os batimentos cardíacos tomavam conta, pude finalmente tomar coragem para dizê-la o que há muito tempo deveria ter dito – Eu preciso fazer-te esquecer de tudo novamente, para que não sofra, Maylene. Quero apenas ver-te feliz longe de mim, pois perto de um demônio feito eu, apenas lhe sobrará lágrimas dolorosas.

Agindo de forma frágil e, provavelmente, espontânea, a ruiva saltou em meus braços, apertando-me com sua força feminina, prendendo-me contra si, livrando-se das suas lágrimas inacabáveis. Permanecemos um longo instante daquela forma, os soluços e os corações quebravam o silêncio. Passei lentamente a retribuir seu abraço, acariciando suas costas enquanto a mantinha recostada em meu peito, aos prantos.

– Eu não vou deixar, Sebastian-san! Eu... eu... não vou deixar... O senhor não irá arrancar as lembranças... as lembranças mais importantes de mim!!! Não vou deixar!!

Cravando suas unhas de tamanhos médios de uma de suas mãos em minha face, olhava-me agora nos olhos, firmemente, as sobrancelhas franzidas e o rosto corado e úmido das numerosas lágrimas que escorriam sem parar. Tombei levemente a cabeça para o lado, retribuindo o olhar, cujas pálpebras prevaleciam estreitas, e os olhos moviam-se a todo instante, fitando cada olho dela, alternando. Quando dei por mim, já estava tão próximo, que não pude me conter. Avancei bruscamente e beijei os lábios macios da ruiva, um beijo forte, um beijo quente, um beijo suficientemente perfeito para satisfazer nosso desejo de um pelo outro. Sentia o deslizar de seus dedos por minha nuca, uma carícia irresistível, que me causava longos arrepios por todo o corpo. Levei a outra mão até seus cabelos, percorrendo com carinho por suas costas em seguida, descendo e subindo, alternada e aleatoriamente, pretendendo causar-lhe o mesmo prazer. Era tudo o que precisávamos naquele instante. Beijávamos-nos como nunca, com uma enorme paixão, chegando até a esquecermos completamente do tempo, trocando beijos e carícias como há muito tempo não fazíamos. Sentíamos muita falta um do outro, e aquela aproximação quente estava finalmente distanciando de nós a saudade, concedendo nosso enorme desejo, que pulsava louco por todas as veias. Permanecemos ainda um longo instante daquela maneira, com toques, carinhos e beijos deliciosos, distribuídos sem cálculos, com enorme afeto; tudo ao nosso redor não importava mais, apenas nossos corações unidos e saltitantes eram o essencial. A sensação e o momento se tornaram tão especiais, que era quase impossível nos separarmos. Com muito esforço, separei meus lábios dos dela, pelo simples fato de ter me lembrado de que Maylene estava ferida, mesmo que pouco, o descanso era necessário. Afastei-me pouco a pouco, depositando ainda alguns beijos rápidos, sentindo o toque de seus lábios macios pelas últimas vezes naquela noite. Abrindo vagarosamente as pálpebras, mantendo-as então estreitas, fitei os belos olhos bem contornados da ruiva, ainda com uma das mãos acariciando-lhe nos cabelos. Eu simplesmente não possuía coragem de cessar as carícias em sua pele macia e em seus cabelos sedosos.

– Maylene... Agora você precisa descansar. Está tarde, e ainda está com pequenos ferimentos.

– Sebastian-san... – recostada em meu peito, sua voz agora estava abafada, contradizendo-me – Eu apenas quero aproveitar todo o tempo possível ao seu lado... Eu estou bem, estes ferimentos não são graves, são apenas arranhões...

– Não, você precisa descansar como os outros empregados também o fizeram. Eles também não possuem ferimentos graves, estou certo? Darei um jeito para que amanhã possamos ficar juntos novamente, sim? Agora descanse.

– Hai, Sebastian-san.

Ergui-me da cama após ele, ajeitando ligeiramente a camisola em meu corpo. Logo arrumei a cama de modo que me agradasse, entrando debaixo das cobertas, tentando ser mais rápida possível. Já deitada, fitava Sebastian-san de pé, ainda próximo à minha cama, também me fitando, tão sereno, com um sorriso lindo desenhado em seus lábios grossos. Acabei por sorrir também, por tê-lo ali ao meu lado como antes de perder as memórias. Já fazia tanto tempo, e as sensações de estarmos juntos continuavam tão maravilhosas, como das outras vezes. Meu sorriso aumentou ainda mais ao notar a aproximação de Sebastian-san, ao abaixar-se em direção a mim: rapidamente fui tomada em seus braços, e não pude conter uma gargalhada baixa e tímida; ele me puxou para si e roubou um beijo meu de uma forma tão deliciosa que, com toda certeza, faria-me dormir muito melhor aquela noite. Retribuí seu beijo aos risos, com um abraço forte em seguida. Logo nos separamos, e então fitamo-nos por um instante.

– Este foi um beijo de boa noite, agora vá dormir.

– Mas foi um beijo surpresa! Hoho~! – soltei ainda mais um riso, e só após cessá-lo, prossegui – Tudo bem, eu vou dormir. Boa noite para o senhor, Sebastian-san!

– Boa noite, Maylene.

Ele ainda mantinha seu sorriso, e agora mostrava seus dentes, deixando também que seus lindos caninos pontiagudos aparecessem e me seduzissem, fazendo meu coração acelerar mais uma vez. Apreciar aquela feição tão bela no rosto do homem que amo era confortador. Então ele logo me ajeitou na cama e me cobriu de modo perfeito e agradável. Aproximou em seguida seu rosto do meu novamente, roçando seus dedos pelo topo de minha cabeça, como uma massagem, fitando meus olhos com os seus tão brilhantes; eu podia observar variados tons do vermelho de suas pupilas, cada detalhe.

– Durma bem, Maylene.

Logo que terminou sua frase, depositou um beijo delicado em minha testa, percorrendo os dedos por algumas mechas de meus cabelos. Logo se ergueu de volta, afastando-se de mim; segui-o com os olhos até que chegasse à porta, até que nossos olhos se encontraram mais uma vez. Sorrimos, e então Sebastian-san saiu do meu quarto, fechando a porta em seguida, sem causar ruídos, deixando-me, então, com um sorriso bobo nos lábios, feito uma criança que assiste algo animado de seu agrado. Após tanto recordar das cenas maravilhosas que acabara de viver, fechei os olhos quase sem notar e dormi; aqueles sonhos não mais voltaram a se repetir, e voltei finalmente a ter sonhos comuns, sem precisar me preocupar com o fim do sonho, que sempre me assustava com a escuridão de Sebastian-san retirando minhas memórias preciosas. Dormi sentindo uma sensação sublime no peito; talvez estive sorrindo e falando enquanto dormia, tamanha era a felicidade que pulsava em meu peito. Era prazeroso estar ao lado de Sebastian-san novamente...

(... Fim da primeira parte... )


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Sono Shitsuji: In Love?" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.