No fim, acabamos saindo da cidade e indo para a praia. Ele parecia gostar das minhas histórias, e pela primeira vez, elas não eram um monte de entulho na minha mente. Era bom desentalar tudo da minha garganta, ver tudo como um todo. Como cada coisa aconteceu. Austin era um bom ouvinte e eu gostei da companhia dele.

            -Nossa... Acho que falei demais não é?

            -Gosto de te ouvir falar. Sua história é interessante. Daria um bom livro.

            Tremi quando o ar frio entrou em contato com a minha pele nua. Ele viu, levantou um lado do seu sorriso, tirou sua jaqueta e colocou por cima dos meus ombros. Encarei seus olhos verdes com surpresa. Ele deu de ombros com toda a sua marra e recomeçou a andar sobre a areia macia que fazia um barulho gozado enquanto ele andava.

            Sorri e fechei mais o casaco em torno dos meus ombros. Caminhei atrás dele calmamente, observando seus músculos naturais por baixo da regata branca. O frio da noite nem o arrepiava.

            -Sabe que eu moro na fazenda com vocês?

            Ele disse, colocando as mãos no bolso e desacelerando para ficar ao meu lado novamente.

            -Ah jura?

            -Sim. A mulher que você chama de Sra. Gilbert, eu chamo de Tia Gilbert.

            Olhei-o desconfiada.

            -Interessante...

            -Minha mãe... E a mãe de Tex eram irmãs e elas conseguiram perceber a invasão bem rápido. Digo, a minha mãe percebeu rápido...

            Olhei curiosa para ele. Era a primeira vez que ele falava sobre si próprio.

            -O que aconteceu?

            -A mãe do Tex ficou grávida da alma que estava no corpo do pai dele. Ela morreu no parto e a minha mãe cuidou dele. Um ano depois, minha mãe conheceu um rebelde e cá estou eu.

            Dei um risinho.

            -E onde entra a tia Gilbert na história?

            -Na mais triste dela. Minha mãe e meu pai foram capturados e eu e Tex fugimos. Ele ficou muito ferido e eu... Bem eu só tinha cinco anos na época. Nos escondemos no barco da tia Gilbert. Quando nos demos conta estávamos em Pangeia. Tex não se lembra do que aconteceu, por isso, sra. Gilbert é teoricamente a tia dele. Ela que cuidou de nós.

            -Que história...

            -Triste? Sim... Todos nessa ilha têm uma história triste, Roxanne.

            -Acho que sim... Esse lugar é tipo uma segunda chance...

            -É, pode ser.

            Caminhei mais devagar, ficando para trás novamente. Fui para mais perto do mar e observei meu reflexo na areia molhada pela água do mar.

            -Tudo bem?

            Parei e me abaixei pagando um punhado de areia. Caminhei até ele, ainda olhando para baixo. Parei de frente para ele e encontrei seus olhos confusos.

            -Sabe, eu tenho 16 anos, e eu nunca fui realmente adolescente. Talvez só uma vez.

            Completei pensando em Vince. Com um sorriso repentino, atirei nele o mote de areia que estava na minha mão. Ele ficou estático por um segundo e depois sorriu maliciosamente.

            -Você... Está perdida.

            Eu ri, joguei a jaqueta dele por sobre a sua cabeça e rapidamente joguei outra bola.

            Corremos pela areia noite adentro, nos sujando e engolindo areia por entre as risadas. Voltar ao mar para buscar areia acabou se tornando mais ousado, fomos tirando os sapatos e antes que percebêssemos, estávamos nadando na água fria.

            Voltamos andando até onde deixamos os sapatos, as meias, e a jaqueta dele. Agora nós dois tremíamos mas apesar disso ele jogou seu casaco sobre meus ombros novamente. Caminhamos descalços e no escuro, e toda a ilha dormia.

            -Tia Gilbert vai me matar por chegar tão tarde.

            Ele sussurrou.

            -E tão sujo. – Eu ri. Ele riu também e seu sorriso continuou no seu rosto quando terminou – Você tem um sorriso lindo, sabia?

            Ele diminuiu o sorriso, escondendo os dentes.

            -Até agora não.