Novamente encontro com aquela garota no elevador. Quase não o uso, mas como fiz compras e estava com muitas sacolas...

Fiquei meio sem graça de olhar muito, mas já era a segunda vez que a via aqui no prédio, esbarrei com ela outro dia no corredor da entrada. E novamente a vejo... Com esse olho roxo.

- Oi... - Falo baixo, tentando ser agradável. - Você mora aqui a muito tempo?

Ela está com a cabeça baixa, nem me olha, mas responde.

- Me mudei a pouco tempo. Moro no segundo andar. Você já me viu antes...

Fiquei mais sem graça ainda. Da outra vez que a vi, eu disfarcei e virei o rosto. Seu olho também estava roxo. Não quis me meter, mas é difícil não encarar.

- É verdade... - Respondi bem baixinho. As vezes eu ouvia barulhos à noite, como uma briga. O som sempre vinha do andar de cima.

Ela tinha aquela expressão triste, vazia. Ela continuava encarando o chão.

- Se você ouvir algum barulho vindo do andar de cima, um tipo de confusão parecendo ser uma briga... Por favor, não me pergunte o que foi.

A porta do elevador se abriu e eu saio. Olhei para ela. Ainda com a cabeça baixa ela me diz:

- Meu nome é Luka....

E a porta se fecha. Fique ali parado, pensando no que havia acontecido ali. Eu devia ter perguntado? Devia ter dido algo mais amistoso?

 Alguns dias se passaram e eu novamente ouço barulhos de coisas se quebrando e gritos. Eram sons de uma briga vinda do andar de cima. Senti um aperto no meu coração, mas não era problema meu, não iria me meter nisso.

No outro dia, esbarro com Luka, no hall do prédio. Seu rosto está machucado, seu pescoço tem arranhões. Tento não encarar, mas já era tarde.

- O que foi? - Disse ela, ríspidamente.

- N-Nada... Você está bem?

Ela olha para o chão.

- Como sou desastrada, vivo me machucando. Até tento não falar demais... Talvez eu seja louca mesmo...

Sua voz tinha a frieza de alguém sem alma. Chegou a congelar meu coração.

- Mas por que você não... - Ela me interrompe, com raiva no olhar.

- Isso não é da sua conta! Não tem nada quebrado, então está tudo bem!

Fiquei completamente sem graça com aquela reação. Mas eu sabia que não devia me intrometer nesse assunto. Mas eu não conseguia entender aquilo.

 - Acho que quero ficar sozinha agora... - Disse isso se afastando de mim. E não olhou para trás.

 Muitos dias se passaram até que eu escutasse aquela briga de novo. Não sei bem o por que, mas naquele momento eu quiz bater na porta de Luka e conhecer quem lhe fazia tanto mal. Mas não fiz nada. De novo.

 - Olá, Luka. - No outro dia, não tentei ignorá-la.

Ela não me respondeu. Imaginei que não tivesse me ouvido. De repente, ela me olhou nos olhos. Tinha um olhar vazio.

- Eles só te batem até você chorar... Depois disso, você não discute mais...

Não parecia que ela estava falando comigo. Parecia que ela estava tentando explicar para si mesma tudo aquilo que estava acontecendo com ela. Tentando dar uma razão para o seu sofrimento.

Não tive coragem de dizer mais nenhuma palavra depois daquele dia. Pouco tempo depois as brigas pararam. Soube por outro vizinho que Luka havia se mudado.

 Mas nunca deixei de pensar um único dia sequer que eu poderia ter feito alguma coisa para aliviar o sofrimento de Luka. Nem que fosse apenas um abraço...