Saudades escrita por Nina_Auras


Capítulo 1
Único




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Olhares perdidos, sonhos despedaçados, corações desalmados e palavras murmuradas com angústia engarrafada no fundo do peito. Heathcliff não sentiria saudades de nada disso, das traições, de ter sido rebaixado e praticamente escravizado, das surras e das noites insones que passara, longe da lareira e no frio – não se permitiria sentir saudades, ódio nem nada referente à Wuthering Heights.

Podia se enganar, podia mentir, tentar esquecer-se, podia negar. Mas, no fim, Catherine era a única coisa que o mantivera são (se é que ainda o era, após aquelas horas matutando sobre o que fazer – e era uma decisão tão difícil, deixá-la após sentir-se traído e ainda mais rebaixado, ou não deixá-la.) e que o prendera por tantos anos naquela maldita casa, que odiava desde a morte do velho Earnshaw.

Pôs um pé na estrada, hesitando sobre o caminho a se seguir, mas era certo que um ele seguiria. Vingança, bem, esse era o básico, a raiz de seu plano. Mas, contra quem? Catherine? Ela o traíra, afinal. Devia odiá-la, agora? Fechou os olhos, enquanto uma palavra vinha à sua mente.. "Não".

Odiando Catherine, estaria odiando a si mesmo. O máximo de sentimento que guardara para ela era repulsa, pois a sentia sobre ele próprio. Apesar de tudo, de suas metas e objetivos, não era capaz de odiá-la – pois havia, sim, uma coisa da qual Heathcliff sentiria saudades em Wuthering Heights.

E essa "coisa" era Catherine Earnshaw.

(...)

Amor. O que sentia quando estava perto dela.

Raiva. O que sentira dela, ainda naquela mesma noite.

Ciúmes. O que sentia sempre que ela preferia a companhia de Edgar Linton à dele, o que acontecia com freqüência.

Repulsa. O que sentia quando ela o destratava ou desviava-lhe o olhar por conta de sua nova classe social ou por sua aparência maltrapilha e vagabunda.

Inveja. O que sentia de sua beleza, altivez e liberdade.

Medo. O que sentia quando pensava em sua vida sem ela, no caminho que estava tomando e no jeito como a estava deixando, deixando que ela se casasse com.. Aquele.

Tristeza. O que sentia toda vez que ela lhe dava as costas (e o irônico era que, agora, ele estava dando as costas para ele, e não o contrário).

Vergonha. O que sentia ao olhar para si próprio no espelho e realizar, perceber, sentir, imaginar que não era bom o suficiente para ela – e ao sonhar ser.

Morto. Como ele se sentiu quando ouviu-a confirmar suas suspeitas à respeito de seu repulso dele e dizer "sim" para a proposta de Linton.

E, finalmente, saudades – o que Heathcliff, mesmo menos de meio-caminho andado em meio àquela escuridão incessante, sabia que sentiria de sua Catherine ao longo do tempo que planejava ficar fora.

(...)

Saudades. Aquela palavra, que nunca havia sequer passado pela cabeça do cigano, tinha tilintado, incapaz de encontrar a saída de sua mente, o tempo inteiro – o tempo que durou a trilha, longa, até Londres. E ele prometeu a si mesmo, no silêncio da noite, no escuro e na solidão, de que "saudades" era um sentimento humano, e que ele nunca mais iria sentir outro sentimento, pois sentimentos só machucavam.

O que ele não esperava, em seu coração cheio de sentimentos (mesmo que ele tentasse escondê-los o melhor, o mais profundo possível, eles ainda estavam lá, regorzijando-se com as tentativas frustradas do rapaz de tirá-los de lá), era que, em algum lugar – mais precisamente, um lugar do qual ele acabara de fugir -, alguém sentia saudades dele.

Porque, no coração de Catherine, não havia espaço para nada além de saudades e Heathcliff, naquele instante e para sempre.



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Notas finais do capítulo

Ok, a verdade é que eu escrevi isso no meu caderno, durante a aula de Geografia, então perdoem ♥