Alice

Depois de o Jasper ter ido embora, comi tudo num instante e fui para o meu quarto. Tinha adorado a tarde com ele. E o cinema. Ela fazia-me sentir feliz, nunca ninguém tinha conseguido fazer isso comigo. Adormeci a pensar nele. Dormi como não dormia há muito tempo.

Acordei na manhã seguinte, tarde e não me estava a apetecer levantar da cama. Estava com preguiça. Deixei-me ficar na cama. Ouvia muito barulho. Não sabia o que estava a acontecer, mas também não me apetecia ir ver. Acabei por adormecer outra vez.

Só voltei a acordar quando alguém entrou no meu quarto. Virei-me de barriga para cima e esfreguei os olhos para afugentar o sono.

- Ainda a dormir? – Perguntou o Jasper divertido.

- O que tem? Não tenho mais nada para fazer. – Defendi-me. Ele riu.

- Temos muito para fazer. Sabias que hoje começou a nevar?

- Sério? – Perguntei entusiasmada. Adorava neve. Todos os anos, quando começava a nevar, eu passava o dia todo fora de casa, só para ver a neve a cair.

- A sério. Vá, levanta-te, ainda tens de almoçar.

- Almoçar? – Perguntei confusa.

- Sim, são quase duas da tarde, Alice. – Disse ela divertido.

- Ok. Vou vestir-me num instante. – Disse levantando-me da cama.

- Está bem. Fico à tua espera na cozinha. – Disse ele, saindo do quarto. Vesti algo quente, o mais quente que tinha que não era assim muito quente. Depois fui para a cozinha comer. A instituição estava muito silenciosa e muito vazia. Não havia praticamente crianças na instituição. Estranhei. Era férias.

O Jasper já estava a comer e eu fui servir-me. Sentei-me ao lado dele e comi em silêncio. 

- Onde estão as crianças? – Perguntei intrigada.

- Nesta altura do ano, as crianças são levadas por famílias de acolhimento para passarem o natal com uma família. Elas adoram ir e como há muitas famílias a acolherem crianças, a instituição fica praticamente vazia. – Explicou ele. Não sabia que isso acontecia. Mas sabia perfeitamente que ninguém me ia acolher. Sabia que ia passar o Natal, sozinha, aqui na instituição.

- Ahh ok. Não sabia. – Disse meio triste. Dentro de mim, havia uma parte que queria que alguém me acolhesse para ter um Natal normal, mas sabia que isso não ia acontecer. Perdi o apetite e deixei a comida de lado.

- Não vais comer mais? – Perguntou o Jasper. Eu mal tinha tocado na comida mas não me apetecia comer.

- Não, não tenho fome. – Respondi.

- Tenta comer mais um pouco. – Pediu o Jasper.

- Não tenho mesmo fome. – Respondi.

- Mas Alice, ainda não comeste nada, hoje. Tens de te alimentar. – Avisou o Jasper.

- Está bem. Eu como mais um pouco. – Cedi. Ele sorriu para mim. Comi mais um pouco e depois fui arrumar o meu prato. O Jasper não disse mais nada sobre a comida. Depois de comermos fomos lá fora. O chão estava todo branco, coberto de neve. Devia ter nevado a noite toda. Só de ver a neve, um sorriso formou-se no meu rosto. Peguei num pouco de neve e quando apanhei o Jasper desprevenido, atirei-lhe com a neve. Ele assustou-se mas depois percebeu logo e entrou na brincadeira. Também pegou num pouco de neve e atirou-me. Assim começou a nossa guerra de neve. A meio da guerra comecei a ficar com frio. Estava a gelar. Parei.

- O que foi, Alice? – Perguntou o Jasper preocupado quando eu parei.

- Estou com frio. – Disse tímida. Estava com as roupas frias, devido à neve e mesmo sendo a roupa mais quente que tinha, não era assim tão quente. Pelo menos para a neve.

- Anda para dentro para te aqueceres, antes que fiques doente. – Disse o Jasper. Fomos os dois para dentro – Senta-te no sofá, vou buscar um cobertor, ok?

- Está bem. – Disse sorrindo. Ele saiu da sala e foi buscar o cobertor. Liguei a televisão e fiquei a ver o filme que estava a passar. Estava mesmo a começar. Tinha que aproveitar, quando as crianças não estavam cá. Elas nunca me deixavam ver televisão. Quando o Jasper chegou com o cobertor, tapou-me.

- Melhor? – Perguntou sorrindo.

- Muito melhor! – Disse parando de tremer. – Obrigada, Jasper. – Agradeci sorrindo.

- Então o que queres fazer? – Perguntou ele.

- Podemos ver um pouco de televisão? Normalmente, não consigo ver. – Disse-lhe envergonhada.

- Podemos. – Disse ele sorrindo. Ficámos a vero filme que estava a dar na televisão. Encostei a minha cabeça ao ombro dele e ficámos ali a tarde toda a ver televisão. Às vezes falávamos de coisas banais ou então estávamos em silêncio.

Esme

Nunca tinha percebido o quanto a Alice queria, alguém que a amasse. Ela não se abria e não mostrava sinais que me indicassem o que se passasse com ela, como acontecia com as outras crianças. Sentia-me um pouco culpada por não ter percebido isso. Nunca pensei que ela precisasse de alguém que a ouvisse por isso nunca falei muito com ela. Nunca me aproximei muito, sempre dei mais atenção às outras crianças. Agora, arrependo-me. Só quando ela se tentou suicidar é que eu comecei a perceber que algo se passava com ela.

Estava agradecida ao Jasper, por tentar faze-la feliz. Ele tem ficado muito tempo com ela. Gostava de conseguir-me aproximar como o Jasper fez. Queria ajuda-la mas não sabia como.

Hoje, só ia passar pela instituição para ver se estava tudo bem. Pelo que a Ellen me disse as crianças foram todas acolhidas por famílias. As famílias aqui eram muito generosas e no Natal, acolhiam sempre uma criança para lhe proporcionar uma noite de Natal em família. Já eram cinco e meia da tarde, quando fui para a instituição. Quando entrei na sala, deparei-me com a Alice e com o Jasper a verem televisão. A Alice estava com a cabeça encostada no ombro do Jasper. Ela parecia-me um pouco pálida mas devia ser do frio. Aquilo entre eles era mais do que amizade. Eu percebia isso mas eles não. Gostava tanto que eles ficassem juntos.

- Boa tarde, queridos! – Disse entrando na sala.

- Boa tarde. – Disseram eles.

- O que fazes aqui, mãe? – Perguntou o Jasper.

- Vim ver se estava tudo bem por aqui. – Respondi. – Querida, estás bem? Estás um pouco pálida. – Disse.

- Estou. É do frio. – Respondeu ela.

- Ok, querida. Querem que eu prepare alguma coisa para comerem?

- Pode ser, mãe. – Respondeu o Jasper. Fui para a cozinha e fiz-lhes um lanche. Depois despedi-me e fui para casa.

Alice

A Esme veio cá e fez-nos um lanche. Estava óptimo, já uma vez tinha comido algo que ela fez e achei delicioso. Ela cozinha mesmo bem. Comi satisfatoriamente e depois fui outra vez para o sofá. Estava frio e debaixo do cobertor estava quentinha.

O Natal estava mesmo aí, daqui a dois dias era Natal e acho que este ano ia ser o pior Natal que já tive. Ia passar o Natal, sozinha, numa instituição e quando digo sozinha, é mesmo sozinha. Ouvi a Ellen a falar ao telemóvel e ouvi ela a dizer que ia passar o Natal com a família.

Passado uma hora, o Jasper teve que ir embora. Não queria que ele fosse mas também não podia obrigá-lo a passar o dia comigo. Ele disse-me que a avó dele estava a chegar e tinha que estar em casa.

- Adeus. – Despedi-me.

- Adeus, Alice. – Disse dando-me um beijo na bochecha. Ele saiu e eu fiquei sozinha. Fui preparar o jantar. Pelo menos distraia-me. Quando acabei comi e depois fui deitar-me no sofá e ver televisão. Acabei por adormecer no sofá com a televisão ligada. No dia a seguir, acordei às três da tarde. O Jasper não tinha vindo. Fui à cozinha e comi qualquer coisa, estava esfomeada. Fiquei o resto da tarde à espera do Jasper mas eram oito da noite e ele não apareceu. Nunca pensei que ficasse tão triste por o Jasper não vir ter comigo. Não sabia o que se estava a passar comigo. Eu desejava estar com ele todos os minutos. Sentia algo diferente em relação a ele mas não sabia o que era. Apenas queria que ele estivesse comigo. Fiquei deprimida o resto da noite e passei a noite toda a tossir e a espirrar. Devo ter ficado constipada. Deitei-me no sofá e tapei-me com o cobertor. Acabei por adormecer, outra vez com a televisão acesa mas na manhã seguinte acordei muito cedo. Sentia-me febril e estava com frio. Foi um bom começo para a véspera de Natal. Deixei-me estar deitada e passei o dia todo assim. Não tinha fome e não me apetecia fazer nada. Continuava deprimida. Queria que o Jasper viesse, sentia a falta dele. Ele é que alegrava os meus dias. Não sei… mas eu acho que estava a começar a gostar dele. Nunca antes sentira isto. Aii, o que estou a pensar. Claro que não gosto dele, mesmo que gostasse o que adiantaria? Ele nunca gostaria de mim, pelo menos dessa maneira. É apenas tua imaginação, Alice. Deve ser por estares doente. Acabei por dormir um pouco, voltei a acordar por volta das duas. Como estava com fome, tive que me levantar e preparar algo rápido para comer. Comi rapidamente e voltei para o sofá. Estava entediada. Não tinha nada para fazer. Fui buscar um livro ao quarto e pus-me a ler mas nem o livro me afastava os pensamentos. Não parava de pensar no Jasper. O que estava a acontecer comigo? Porque não paro de pensar nele? Deixei o livro de lado e tentei concentrar-me em ver o filme que estava a passar na televisão. Mas também não conseguia. Pronto, definitivamente eu sentia algo em relação ao Jasper. Não queria sentir. Não queria sofrer, sabia que isto só me ia fazer sofrer e afastar-me do Jasper. Pois, ele não gosta de mim e provavelmente vai-se afastar para não me dar esperanças. Normalmente é o que acontece nos romances que eu leio. Eu não quero perder a amizade do Jasper… Estava a desesperar. Queria estar com ele mas depois não sabia como reagiria se estivesse com ele. Tinha medo que ele percebesse e depois se afasta. Tentei outra vez afastar esses pensamentos. Estava a gelar. Fui buscar mais um cobertor e tapei-me com os dois. Provavelmente estava com febre mas não sabia onde estavam os medicamentos e mesmo que soubesse não sabia o que tomar. Deixei-me estar quietinha e fiquei deitada no sofá. Estava muito mole, acabei por voltar a adormecer.