Hidden escrita por jduarte


Capítulo 70
Imensurável


Notas iniciais do capítulo

Desculpa ter demorado...
Espero que gostem
Beijooos,
Ju!



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   Conforme meus olhos se acostumaram, percebi que sua pele estava pálida, quase translúcida quando a Lua refletia sua luz prateada e sinistra. Havia objetos que pairavam no ar ao seu lado, e pude ver que uma delas era um dos candelabros da parede.

   Meu Deus! Ele tem dez anos, não pode ter feito isso, pensei aturdida.

   Mas quando olhei para fora, na direção dela, a Lua me parecia avermelhada, quase da cor de sangue, e me dava calafrios de certo modo. Ela parecia imponente, fria, sanguinária. E Rubens parecia um servo.

   Meu irmão estava em estátua, como se estivesse hipnotizado por algo.

- Rubens? – o chamei gentilmente.

   Ele ainda não parecia me ouvir.

   Andei até ele, com relutância, temendo o pior.

   Seus olhos estavam abertos, e a pupila dilatada, a pele fervendo, o rosto suado, e uma poça de suor embaixo de seu corpo. Ele definitivamente não estava bem. Meu instinto foi pegar meu irmão, e levá-lo ao banheiro, e quando o tirei do chão, quase o libertando do transe, ouvi todos os objetos que ele controlava se chocarem com um barulho alto no chão. Liguei a água extremamente fria, e coloquei-o embaixo.

   Seus olhos haviam fechado, e sua pele avermelhada, – pude ver por causa da claridade do banheiro – deixava queimaduras de primeiro grau em minha pele. Mas não iria abandonar meu irmão. Não numa hora daquelas. Não necessitando de mim.

   Ele pareceu gemer alguma coisa, e abriu os olhos, assustado. Respirei profundamente, quase como fosse de alívio, ao ver seus olhos normais. Dei pequenos tapinhas em seu rosto, e ele pareceu despencar.

   Meu casaco estava completamente ensopado, e pesado. A temperatura do quarto caiu drasticamente, e pude perceber, pois todo meu corpo se arrepiou de tal forma, que tive que me controlar para não tirar Rubens de dentro do chuveiro gelado, e mandá-lo botar uma roupa quente, sendo que há minutos atrás estava o inferno.

- Meu Deus!, me ajude! Me ajude! – implorei com lágrimas nos olhos. – Eu juro nunca mais vou deixar meu irmão sozinho, mas me ajude!

   Abri os olhos esperando ver Rubens com uma carinha de anjo, me dizendo que tudo não passava de uma brincadeira de mal gosto, e que eu podia ficar despreocupada, mas não foi isso que aconteceu. Ele ainda continuava na mesma, e talvez – remotamente – ele estivesse melhor em alguns pontos.

   O tirei do banheiro, tendo o cuidado de desligar o chuveiro rapidamente, e o coloquei na cama. Peguei o telefone, e o fiquei segurando nas mãos, decidindo para quem ligar. Não tinha muito tempo, pois meu irmão começou a se debater na cama, e gemer de dor.

   Liguei para a única pessoa que eu confiava e conhecia sem ser humano.

- Chen?- perguntei.

- O que? – ele retrucou mal-educado.

- Preciso de sua ajuda. Rubens está mal!

   Ele pareceu rir.

- E?

- E daí que eu não vou levá-lo em um hospital que não seja especifico para mutantes, ele podem nos achar e nos matar.

   Ele bufou.

- Então o deixe morrer. O azar é seu!

   A raiva brotou em meu peito.

- Olha aqui, sem mutante desgraçado, ou você vêm aqui me ajudar, ou eu acabo com a sua raça de uma maneira bem dolorosa!

- Onde você está?

   Apertei a ponte do nariz.

- Você sabe onde me encontrar – disse desligando logo após.

   Rubens começou a ter uns ataques estranhos, e uma rajada de vento invadiu o quarto.

- Me ajude! – exigi.

   Um par de mãos pegou meu irmão, e os olhos de Chen me encararam. Ele iria me matar, mas primeiro iria salvar meu irmão!

   Não esperou que eu lhe perguntasse para onde o levaríamos, somente... levantou e saiu, como se estivesse levando um saco de arroz, e não uma criança que se debatia em seu colo.

- Para onde? – perguntei.

   Ele não respondeu, e acho que não iria falar comigo tão cedo. Não depois de tantas ameaças.

   Depois de dez minutos, estávamos na frente de um dos hospitais mais xulos que eu já tinha visto na vida. A cruz vermelha que piscava na fachada causava dor de cabeça. Alguma coisa me dizia para olhar para a Lua, mas quando já estava na metade do caminho, Chen me avisou com a voz letárgica.

- Olhe e morrerá desnutrida e com a pele parecendo papiro.

   Não tive coragem de desobedecer a sua ordem. Ele parecia falar sério.

   Quando entramos, o cheiro de formol e doença invadiu minhas narinas, deixando-me tonta por algum tempo.

   “Precisamos de emergência phetoprobolis agora!” uma voz feminina invadiu meu ouvido. E pela sua urgência, falava conosco – ou com Chen.

   Alerta máximo. Vocês estão em perigo agora! Cuidado, estou esperando você aqui fora, uma voz invadiu minha mente, me pegando desprevenida.

- Vamos? – Chen perguntou tocando meus ombros. Ele deve ter percebido que meu rosto não aparentava normalidade, e me perguntou: - Está tudo bem?

   Assenti de leve.

- Vamos.

   Andamos por aqueles corredores lotados de macas e pessoas tomando soro, e até enfaixadas. Algo me dizia que eu deveria ficar de olhos bem abertos, e atentos a tudo que ocorria à minha volta.

   Depois de alguns minutos de caminhada, paramos na frente de um quarto com dez macas – nove já habitadas -, e senti que todos eram mutantes. Havia somente uma menina – devia ter seus seis anos – deitada no leito ao lado de meu irmão, cheia de agulhas, respirando com dificuldade. Ela tinha tranças no cabelo loiro, e pele clara. Ela somente olhou para mim uma vez, e pude sentir toda sua dor. Ela era latejante, e emanava de todos os lugares, subia por minha perna e não parava.

   Agarrei meus cabelos, agachando em um canto. Pare!, ordenei, e assim aconteceu. Foi rápido. Tão rápido que achei que a dor pudesse ser obra de minha imaginação, mas não era. O suor que grudava meu cabelo em meu rosto declarava isso.

- Ele vai ficar bem. – disse a enfermeira com olhos muito gentis.

- Quem são eles? – perguntei levantando calmamente, esperando a sala parar de girar.

   A moça pareceu hesitar antes de responder, e isso me incomodou.

- Mutantes.

   Revirei os olhos, sorrindo amarelo.

- Eu sei. Quero saber por que estão aqui...

   Ela apertou os lábios.

- Posso falar com você aqui fora? – perguntou quando viu que duas pessoas vestindo jalecos com manchas azuis chocantes.

- Meu irmão ficará bem? – perguntei.

   Ela sorriu amigavelmente. Isso seria um sim?


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Notas finais do capítulo

continua...