Skater Girl escrita por sisfics


Capítulo 15
Capítulo Quatorze: Ombros Fortes.




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Ele terminou de descer os degraus devagar por causa de Joseph que ressonava nos seus braços. Cruzou a oficina, entrando no escritório e indo até Victoria. Ela se levantou, pegando o pequeno bebê de seu colo, mas não foi nem um pouco discreta tentando ficar entre mim e James.


Ele colocou a mão em suas costas para que tivesse espaço para passar, mas ela fingiu não perceber.

- Não sei mais se quero ir. - sussurrou só para ele.
- Porque isso agora, Vicky? - preguntou dando um beijo em sua testa.
- Estou atrapalhando? - perguntei na esperança de que estivesse e precisasse ir.

Ela saiu do caminho dele, andando pelo pouco espaço para ninar Joseph e negou com a cabeça.

- Deixe de besteira, Bê. O que veio fazer aqui? - ele perguntou.
- Você é sempre tão delicado assim? Tinha me esquecido.
- Se viesse aqui mais vezes, não esqueceria tão fácil. - ele abraçou a esposa - Vou levar Vicky no ponto de ônibus. Você espera aqui numa boa?

Dei de ombros. Ela pegou sua bolsa em cima da mesa, a cruzando nos ombros, e deu a bolsa do bebê para que James carregasse.

- Eu ligo assim que chegar na minha irmã. Acho que nos vemos depois, Bê. - saí da frente para que os dois passassem.

Me sentei numa das cadeiras de frente para a mesa, apoiando a cabeça no tampo para esperar. Ia seguir o plano original: primeiro preparar, depois começar a contar desde antes da gravidez.

- Isso vai dar merda. - remunguei sozinha.

Fechei os olhos, respirando na tentativa de acalmar meu coração e colocar as idéias no lugar. O cansaço do dia puxado começou a tomar conta de mim e, não sei em que hora, caí no sono por alguns minutos. Foi como uma válvula de escape, mas acordei logo com alguém mexendo no meu cabelo. Levantei a cabeça, esfreguei o rosto com as mãos e me encolhi sentada.

- Está cansada mesmo. - James falou se sentando no tampo de madeira ao meu lado.

- Um pouco. Eu tive muita coisa para resolver hoje na Spitfire.
- Porque está tão sumida, hein? Acho que já faz quase três semanas que não te vejo.
- Estou com alguns problemas para resolver. Só não tive tempo.
- Novidades? - odiaria estragar aquele sorriso.
- Algumas, mas acho que a gente pode falar sobre isso depois.
- Você não está com uma cara muito boa. O que aconteceu? - engoli em seco por causa do nó cada vez maior no meu peito.
- Eu... não aconteceu nada sério. Quero dizer, não recentemente. Eu vim aqui porque-

Minhas mãos estavam suadas, por isso as esfreguei no jeans da calça, mas isso só o fez notar ainda mais meu nervosismo.

- Não te vejo assim há anos. Fala logo ou vou começar a achar que alguém morreu.
- Acho que o que eu tenho para falar é um pouco mais sério do que isso. - minha voz saía num fio - Vai parecer estranho de início, mas se você me ouvir até o fim, talvez não seja tão difícil.

Travei mais uma vez e tentei não olhar em seus olhos quando levantei da cadeira e caminhei até a parede contrária.

- Queria falar sobre uma coisa que aconteceu há muito tempo, James. Eu sei que é passado para você, mas não é para mim. Estou numa fase de querer resolver todos os meus problemas que antes eu só achava melhor deixar para lá, entende?
- Eu sou um problema para você?

- Não. - respondi depressa - Só ouve que você vai entender. - acho que ele assentiu, mas não vi porque abaixei de novo o rosto - É sobre a época que a gente namorava, James. É sobre isso que quero falar com você.

Seu silêncio me deixou mais apreensiva, só que não tinha coragem de continuar, e uns segundos depois percebi que ele desceu da mesa e deu dois passos na minha direção. Me imprenssei ainda mais na parede sem ter lugar para onde fugir.

- Você quer falar sobre isso? - perguntou vacilante, ficando ainda mais surpreso quando assenti.
- Tinha que esperar um momento que pudesse conversar sozinha com você, principalmente longe de Victoria porque não quero que ela saiba do que já tivemos, talvez ela não se sinta bem.
- Victoria sabe que namoramos. - o choque me fez acordar para o motivo óbvio de estar me tratando daquela forma todos esse tempo.

Antes que James dissesse mais alguma coisa, perguntei:

- Desde o nascimento de Joseph, não foi? - assentiu confuso - Porque fez isso? Porque contou para ela? Você me prometeu que nunca contaria pra ninguém.
- Ela é minha esposa. - respondeu como se fosse óbvio - Eu não ia ficar mentindo sobre algo tão pequeno para ela. Victoria não tem motivos para sentir ciúmes.
- Ainda bem. - respondi sem paciência.

Não conseguia entender porque estava me sentindo traída.

- Olha, Bella, eu não sei sobre o que quer conversar, mas acho que está claro o motivo pelo qual nunca falamos nada daquilo todo esse tempo, né? Se quiser ir embora. - apontou para a porta.
- Vai me expulsar agora?
- Quantos anos você tem?
- James, disse que queria conversar. - respirei fundo e contei até dez - Eu só quero colocar algumas coisas em pratos limpos, na verdade, eu estou precisando muito fazer isso ou vou enlouquecer, então me escuta, tá?

- Porque deveria, Isabella? - seu tom de voz aumentou e soube naquela hora que não queria ouvir seu desabafo - Quando você voltou daquela viagem maluca há cinco anos disse que nunca mais queria tocar nesse assunto, que não queria nunca mais falar do que aconteceu e que não era para ninguém saber que um dia ficamos juntos... Não sei nem como consegui me manter na sua vida, você me manteve longe dela por tanto tempo, me evitando. Você disse que vai enlouquecer se não falar o que quer, mas acho que já ficou louca ou não teria outro motivo para...
- Não sabia que você guardava tanto rancor assim de mim. - o cortei.

Um sorriso confuso brotou no canto de seu lábio. Ele levou uma mão na cabeça, bufou de maneira divertida, então se sentou na cadeira onde antes eu estava.

- Acha que eu guardo rancor de você?
- É o que parece falando desse jeito comigo.
- Mas está enganada. Eu não guardo nenhum sentimento ruim de você, Bella. Nenhum mesmo. É só que você me deixa nervoso.
- Ner-vo-so? - ele deu de ombros antes de olhar para o chão com um sorriso triste.
- Fala logo o que você quer, Bella.

Me apoiei na parede por causa das minhas pernas que ameaçavam fraquejar na hora que mais precisasse delas. O pensamento "quanto mais rápido, menos indolor" passou pela minha cabeça e me fez sorrir.

- É sobre essa viagem que fiz. Essa que você chamou de maluca. Você nunca entendeu bem porque eu e minha mãe fomos morar com a tia dela durante aquele tempo. Você jamais imaginou que tivesse tanto de você naquela viagem, James.
- Tanto de mim?
- Sim. Metade de você para ser mais precisa. Eu passei um ano fora, tempo suficiente para que você me esquecesse e ficasse com Victoria, mas apesar de você achar o contrário eu jamais poderia ter esquecido você ou ter te tirado da minha vida porque aquela viagem só serviu para manter um pedaço de você... vivo.
- O que?

Não devia ser sutil. Cruzei os braços, trinquei os maxilares quando as palavras vieram.


- Eu estava grávida quando viajei. Grávida. De. Você.

Fechei os olhos para não ver sua reação. Me mantive o mais parada possível, sentindo a adrenalina e o medo percorrerem minhas veias em jatos. Eu devia ter feito alguma coisa errada. James não respondia ou dava qualquer sinal de que estava me ouvindo. Tentei juntar todos os restinhos de coragem que ainda sobraram, os amontoei e numa lufada abri os olhos, levantando o rosto diretamente para ele. Seus olhos claros estavam tão assustados que pareciam por um instante não me olhar de verdade. Alguns segundos depois, ele inclinou sua cabeça, quebrando o contato visual e enrugou o cenho.

- Acho que não ouvi direito. Você disse o que mesmo? - meus ombros caíram de desânimo.
- Você ouviu certo. Pare com isso, por favor. Está sendo muito difícil para mim contar, então não me faça repetir.
- Repetir? Mas, isso é impossível. Bella você está brincando. Você grávida? Mas éramos só duas crianças.
- Não. Eu era a criança.
- É algum tipo de brincadeira de mal-gosto? - me interrompeu.
- Acha que eu faria uma brincadeira como essa? - senti que uma lágrima estava escapando pelos meus cílios e escorregava até meu queixo.

Torci para que não a visse e não me achasse uma fraca, por isso não levei a mão até o rosto para secá-la. Mas uma outra parte de mim queria que ele a notasse e percebe-se o quanto eu estava tratando aquilo com seriedade. Poderia ser só medo, mas pensei que talvez fosse mágoa de James, apesar de não guardar rancor dele assim como ele disse que não guardava de mim.

Só queria entender o que estava passando comigo e com ele. Me desencostei da parede ainda com receio de cair, então respirei fundo e soltei:

- Você vai acreditar em mim ou não? É melhor se decidir logo se quer me ouvir ou vai zombar de mim.
- Não estou zombando de você. Só que você vai concordar que isso é impossível. - se levantou quase gritando - Bella, é melhor desmentir essa loucura, tudo bem? Diga que não é verdade.

Era pior do que uma facada nas costas.

- Isso mesmo, James. - gritei também - É mesmo uma mentira. Uma mentira tão grande que anda, fala e pensa e é a única coisa que não me fez desistir de v-
- Você está falando da Nessie? - só notei que ele estava próximo daquela forma depois que agarrou meu braço e me sacudiu.

Parecia tão assustado e acuado quanto eu, mas eram duas formas diferentes de reagir.

- Você não está falando da Nessie, está? - não respondi tentando tirar sua mão que me apertava - Isabella, a Nessie é minha filha? - uma lágrima surgiu em seus olhos - Anda, Bella, a Nessie é minha filha?
- O que você disse, James? - Victoria perguntou da porta.

Nós dois olhamos na direção de sua voz escondida atrás do portal com seus filhos nos braços.

- Entendi errado. Filha? Mas que história é essa? Você tem uma filha? - ela gritou essa última parte, fazendo o bebê em seus braços se remexer inquieto.
- Vicky. - James sussurrou na tentativa de acalmá-la.

Mas Victoria olhou para mim com tanto ódio e ao mesmo tempo com tanta percepção que logo entendeu a história, ou talvez já estivesse ali dentro nos ouvindo há tempo suficiente para te entendido melhor até do que James. Ela abaixou o rosto amarga e murmurou:


- No fundo eu sempre soube que estava de fora.

Ele tentou mais uma vez dizer alguma coisa, mas não tinha nada para se dito. Então ela continuou olhando de mim para ele, deu um passo para trás, e mais outro. James não pareceu reagir até que Victoria tivesse saído da oficina chorando. Abaixei minha cabeça nas mãos, sentindo o peso do turbilhão de pensamentos. Estava me sentindo péssima porque ela não merecia ter ficado sabendo da história daquela maneira. O que mais pensei foi em poupá-la e acontece isso. Me sentia uma traidora, uma idiota, culpada por ter sido tão preciptada, não ter mantido a calma, e ter escolhido uma péssima hora para contar. Levantei o rosto, sentindo as conseqüências de toda aquela raiva escapar pelos meus olhos, até que vi James ainda parado na minha frente. Me encarava sem ação. Eu só queria que ele saísse de lá e fizesse o que realmente importava que era seguir Victoria e seu filho.

- O que você ainda está fazendo parado aí, seu idiota? Vai atrás dela.

Só depois do que disse, James correu até a porta. Tive que sair dali com a mesma rapidez. Tranquei a oficina com minha chave e fui o mais depressa que pude para casa. Estava nervosa, não conseguia parar de andar de um lado para o outro da cozinha, imaginando o que tinha acontecido com ela, no que estava sentindo e pensando de mim. Se eu tivesse causado ainda mais problemas, acho que não suportaria. Quando dei por mim, o copo de água que estava na minha mão foi parar na parede.

- Covarde. Burra. Medíucre. - gritei, fazendo outro se espatifar.

[...]

Edward tirou um outro fio de cabelo solto pelo meu rosto e o prendeu atrás da minha orelha. Seus olhos preocupados me avaliavam de cima à baixo, medindo a reação de cada um de seus gestos. Suspirei vencida pelo cansaço de esperar Andrew. As pessoas passavam por nós no aeroporto, sem realmente olhar uma para as outras, sempre com tanta pressa e isso fazia o tempo parecer mais lento. Edward segurou minha mão, entrelaçando nossos dedos e a puxou para o seu rosto. Tentei forçar um sorriso, mas não fui muito bem-sucessida. Tinha sido difícil contar os detalhes da discussão com James para ele e a preocupação com o que tinha acontecido depois daquele dia não me abandonava nem na hora de dormir. James não tinha entrado em contato, muito menos aberto a oficina, não que eu o tenha procurado. Edward disse para que eu aguardasse não com tanta ansiedade e só pensasse agora na viagem, mas era bem difícil. Alguém tocou o ombro dele, que se virou, me dando espaço para ver quem era. Phill sorriu primeiro para mim, depois deu um aceno de cabeça para Edward.

- Acho que tenho que pedir desculpa pelo atraso. Mas ainda está em tempo do voô.

Abriu a mochila, tirando dela todos os meus documentos que tinha deixado com eles para que lidassem com toda a burocracia para mim.

- Aqui está. Seu passaporte, a passagem, e o resto dos documentos. - peguei os papéis e sorri.
- Obrigada.
- Pensei que Andrew fosse com ela. - Edward disse me abraçando.
- Mudanças de planos. Não deu tempo de avisar, mas não precisa se preocupar porque eu vou cuidar dela tão bem quanto meu amigo. Espero que vocês já tenham se despedido, porque precisamos entrar.

Ele pegou sua própria passagem e a sacudiu com um sorriso.

- Te espero lá dentro. - disse para mim antes de se despedir de Edward.

Passei meus braços por sua cintura e lhe dei um beijo na bochecha.

- É melhor eu ir logo. Prometo que volto sã e salva se é esse o seu medo. - debochei de sua cara emburrada.
- Sabe que não é isso que me preocupa. Só não queria que estivesse se sentindo dessa maneira. Quero que aproveite sua chance.
- Eu prometo que vou. Juro que vou esquecer tudo assim que entrar no avião. - tentei ser convincente, mas nunca fui tão boa assim em mentir.

Só em omitir, por isso Edward fez outra careta e me deu um beijo no alto da testa.

- Prometa que vai se cuidar enquanto estiver fora e que vai tentar pelo menos me mandar notícias uma vez.
- Prometo. Agora eu tenho mesmo que ir. - puxei seu rosto para dar um último beijo e depois entrei pelo portão de embarque.

Sabia que ele ainda estaria lá, olhando atentamente para mim até que eu sumisse de sua vista, por isso tentei parecer confiante e não derrotada ao entrar. Meu ânimo estava ficando cade vez pior por saber que teria longas horas de martírio dentro do avião. Ao entrar, ao invés de virar para a direita, a aeromoça mandou que eu fosse para a esquerda. Jamais na minha vida sonhei em entrar na primeira classe de lugar nenhum. As seis fileiras solitárias já estavam com quase todas as cadeiras ocupadas.
Me senti uma estranha como sempre, até me sentar ao lado de Phill.

- Primeira classe? - perguntei assustada - Tem alguma coisa errada. - ele assentiu parecendo satisfeito consigo mesmo.
- Tantas horas de viagem. Eu não quero ficar na classe econômica. Cada vez com mais poltronas para satisfazer a gula dos empresários e com cada vez menos espaço para ferrar com os que viajam.

- Mas porque não comprou lá para mim? Duvido que o patrocínio vá cobrir isso.
- Ah, Isabella, relaxa. Pensa que foi tudo uma recompensa pelo seu desempenho. Não sabia que minha companhia era tão insuportável assim. Acho que o Andew tinha razão. - dei uma risada fraca, tentando relaxar mais no banco, o que não era tão difícil.

Em menos de vinte minutos, o avião estava taxeando na pista e em seguida estávamos voando. As primeiras três horas do voô foram silenciosas, cheguei a pensar que Phill estava dormindo, até que começou a cantarolar uma música do Foo Fighters. Eu sabia que ele estava tentando me fazer rir e conseguiu.

- Ora, um sorriso finalmente. Pensei que você estava atrofiada.
- Só preocupada com algumas coisas. Nada de importante.
- Eh, a vida é cheia de problemas e eles sempre andam acompanhados. Você ainda é bem novinha, mal sabe como é isso. - isso era uma bela de uma ironia.
- Você está tentando me animar?
- Ao contrário, na verdade. Você não parece o tipo de menina presa numa realidade paralela, mas ainda precisa de um pouco de experiência. É por isso que eu quis vir com você nessa viagem.
- Mas o Andrew-
- Sei que eu disse isso, mas foi só para não prolongar o papo. Você tem que concordar comigo que o Andrew é um perfeito idiota, apesar de ser bom no que faz. Mas você ia precisar de uma pessoa um pouco mais ágil nessa viagem e que prestasse mais atenção nos detalhes. Por exemplo: saber que você não pode continuar com esse ânimo quando chegarmos no aeroporto em São Paulo. Ele não captaria isso nem que esfregassem naquela cara redonda. Vamos, garota, é melhor reagir.
- Só estou cansada.

- Não, não está cansada. Não estou pedindo que me conte nada do que está acontecendo, se você está passando problemas com a sua família, com o seu namorado, com seus amigos ou com o resto da humanidade. Na verdade, não me importa muito, eu só quero que absorva até a última gota que suportar nesses dias, tudo bem?
- Como assim? - Andrew não tinha vindo com aquele papo quando me convenceu a vir, estava pensando que aquela viagem seria completamente informal e agora Phill estava me assustando.
- Por livre e espontânea pressão, Bê. Você vai voltar dessa viagem e vamos subir sua categoria para profissional. Então em seguida, vai participar de da competição em Los Angeles e, se não for bem o quanto eu espero, vamos cancelar o contrato.
- O que? - acho que falei alto demais.

A mulher da fileira ao lado de Phill levantou seus olhos de sua Vogue e me avaliou antes de abaixá-los de novo fazendo uma negação de leve com a cabeça.

- Você leu no contrato e sabe que uma das cláusulas diz que seu desempenho será observado e se não for mantido satisfatoriamente a Spitfire pode cancelar o patrocínio.
- Mas como assim, vocês disseram que...
- Que essa viagem era algo informal e eu não menti dizendo isso. Só não será mais quando voltarmos e é por isso que estou te avisando logo agora para que você não diga depois que foi enganada.
- Mas eu fui. - rosnei

- Não, não foi Bella. Coloque a mão na consciência um pouco e vai ver que tenho total razão. Só quero o seu bem. Quero antecipar as coisas para você, até porque sinto que não está no lugar certo. - abaixou a cabeça, coçou o queixo como se estivesse formulando o que ia dizer em seguida - Não fique chateada comigo. Você vai entender porque estou fazendo isso no futuro. Quando você nem estiver mais com a gente, vai saber que isso foi melhor. É por isso que assim que te vi fiquei um pouco preocupado com o seu estado. Quero que esteja ótima para não se prejudicar em breve.
- Claro, obrigada. - tentei ser o mais irônica possível.

Me virei para a janela, olhando para as nuvens cinza claro que formavam um tapete abaixo de nós. Minha raiva aumentou tanto que tive vontade de gritar com ele e dizer o quanto idiota tinha sido. Me sentia rodeada de imbecis.

- Terá tempo suficiente de rezar até nosso destino, Bê. Não reclame das suas cargas, só peça ombros mais fortes. De qualquer jeito, sei que vai conseguir.

Não respondi, apenas me cobri com o edredom, me virei ainda mais para a janela e fingi que estava dormindo até que aconteceu de verdade.

[...]

O calor era praticamente infernal. Final de verão na América do Sul e mal consegui acreditar que ainda estava no mesmo planeta. Phill só riu da minha cara assim que descemos do táxi e entramos no hotel que ficava no centro de São Paulo.


Os quartos reservados eram espaçosos, bonitos e - o mais importante - tinham um ótimo ar-condicionado. Um funcionário colocou minha mala em frente a minha cama e me desejou um bom dia num inglês melhor do que o esperado. Me desfiz das roupas quando fiquei sozinha, mas fui interrompida por um telefonema.

- Te encontro lá embaixo em cinco minutos, certo?
- O que? Cinco minutos para quê?
- Vou te levar para ver toda a estrutura da competição. Não quero que fique perdida amanhã já que não vou ficar o tempo todo colado em você.

- É, tudo bem. Já vou descer. - desliguei o aparelho e arranjei na mala a roupa mais fresca que trouxe.

Agora ele também me deixaria sozinha amanhã. As notícias estavam melhorando cada vez mais. Vesti a camiseta branca, a bermuda jeans e meu boné verde escuro. Desci o mais depressa que pude e mesmo assim Phill não estava com a cara muito satisfeita.


Um táxi nos buscou na frente do hotel, nos levando para um lugar que ele indicou ao motorista com um português mal arranjado. Demorou até conseguir falar "sambódromo do Anhembi" e eu demorei para entender que ele tinha dito aquilo. O trânsito da cidade era infernal, o céu estava nublado e o tempo abafado. Me sentia presa por horas numa sauna, uma salmora. Meu cansaço e o aborrecimento que tive no avião também não melhoravam meu humor. Quando chegamos, a organização do evento deixou que entrássemos, mas pediu que fossemos logo embora. Phill me puxou até a pista, além das arquibancadas para me mostrar a rampa. Era alta demais, meu queixo quase caiu.

- No Brasil, eles chamam a "Big Air" de Megarampa. Apareceu pela primeira vez em Oklahoma, mas foi uma empresa de telefonia brasileira que patrocinou o primeiro campeonato na América. Estrutura de madeira e aço. - murmurou, apontando para as vigas gigantescas - 105 metros de extensão e 27 metros de altura. Lyn-Z Adams Hawkins foi a primeira mulher a descer a rampa. Você também vai fazer isso um dia. - arregalei os olhos de susto, o fazendo rir - No campeonato de 2008, Bob Burnquist ganhou em casa. E esse ano está praticamente garantido. 2009 é dele com certeza. - deu de ombros - Quero te mostrar mais algumas coisas. Vem. - segurou minha mão e me puxou do início até o final da rampa.

Explicou tantas coisas que era difícil de assimilar tudo de uma vez. Ele explicou sobre a história da Big Air, mostrou os pontos que devia parar enquanto estivesse assistindo, me mostrou onde ficaria as pessoas interessante segundo ele e me mostrou um ponto de encontro para nós. Disse que queria me apresentar a uma pessoa no final do segundo dia e que aquilo seria uma surpresa. Não criei muita expectativa, ainda estava aborrecida com a surpresa desagradável do avião.

- Gostou? - perguntou quando terminou de falar.
- Legal. Acho que entendi tudo para amanhã.
- Certo. Então a gente pode voltar para o hotel agora. Não esqueça de vir com roupas frescas amanhã e eu vou te dar um guia turístico inglês-português para você treinar coisas básicas essa noite. Agora melhora essa cara e vamos. - com a mão no meu ombro, me puxou de novo para a saída.

Estava tão cansada que dormi no táxi durante todo o congestionamento. Tive vontade de mandar notícias para Edward, mas estava tão cansada e precisava arrumar tudo para o dia seguinte, então desisti. O hotel me ligou às seis da manhã para me preparar para sair. Tomei banho, me vesti, treinei de novo algumas palavras que tentei decorar ontem a noite e aproveitei para ligar para Edward. Depois que o hotel completou a ligação, ele logo atendeu com uma voz sonolenta.

- Alô?
- Sou eu. Te acordei?
- Não, tudo bem, Bells. Eu só estava... er... Você está bem? Como foi a viagem e o primeiro dia?
- Foi tudo ótimo. Fui de primeira classe com Phill, não cheguei muito cansada e logo fomos ver como era a estrutura da "Big Air". Eu vou sair daqui a pouco para assistir a competição.
- Ah, claro. Boa sorte lá e não se esqueça de fazer tudo que o Phill pedir. Ele sabe o que...
- Ele é um bom filho-da-puta, Edward.
- Porque isso agora, Bells? - perguntou assustado.

- Porque ontem no avião ele me disse que vai subir minha categoria para profissional depois dessa viagem.
- E você está reclamando?
- Ele pode me tirar o patrocínio se eu não corresponder as expectativas dele.
- Sério?
- É. Eu sempre disse para eles dois que ainda estou crua e que não quero ser tão preciptada. O Phill praticamente me enganou dizendo que isso aqui ia ser uma viagem de diversão, mas eu estou mais pressionada do que antes.
- Logo agora. - murmurou.
- Logo agora, Edward. Tenho tanta vontade de socá-lo que quase não estou me aguentando.
- Mas vai ter que aguentar. Ou vai estragar tudo? Você é tão forte. Pensa que serão só mais dois dias e logo estará em casa. Isso é só mais um motivo para você aproveitar bem hoje e poder provar para ele que pode.
- Vocês conversaram antes, certo? - debochei com raiva, enquanto ele ria baixo - Acho que eu preciso desligar e tentar achar o Phill para o café-da-manhã ou vou me atrasar.
- Tudo bem. Se acalme, okay? Tudo vai dar certo. A gente ainda se fala antes de você voltar?
- Se eu tiver tempo, sim. Fica bem. Tchau. - desliguei o telefone.

Peguei minha mochila e desci para comer antes de sair. Encontrei Phill um tempo depois que já reclamava que estávamos atrasados. Fomos de novo de táxi até o local das provas. Me assustei um pouco com a quantidade de pessoas que estavam na arquibancada, com as câmeras de uma rede de tv e quando percebi já estava sozinha.


Caminhei um pouco desconfiada pelas pessoas, escapando de seguranças, chegando mais perto da rampa e das arquibancadas.

Tentei ir até um dos lugares que Phill tinha dito para eu estar. Só que um segurança me barrou, falando coisas que eu não entendia, só me livrando dele quando caí fora e pedi desculpas em português. Um tempo depois, achei um skatista inglês e uma brasileira que cometavam sobre o primeiro a descer. O cara falava que jamais teria coragem de descer uma rampa daquele tamanho. Nós começamos a conversar até que alguém sentou ao meu lado com um sorriso enorme. Phill estava acompanhado de um homem loiro que parecia ter um pouco mais de trinta anos. O inglês que conversava comigo arregalou os olhos e se virou para frente.

- Bê, quero te apresentar uma pessoa. - falou, puxando meus ombros para que eu me inclinasse.

Dei um aceno de cabeça para o homem que me observava atentamente.

- Isabella, esse aqui é Peter Jenkins, um dos diretores e organizadores da "Oi Vert Jam", e nós dois queremos discutir uma proposta sobre criar um espaço só para garotas competirem no Circuito Mundial da World Cup Skateboarding de 2010 e você meio que seria nossa inspiração. - Phill piscou para mim sem que o homem ao seu lado visse.

Meu coração palpitou de repente como se eu estivesse ouvindo o maior absurdo e ao mesmo tempo a melhor coisa do mundo. Ele estava querendo criar um circuito novo de competição para o ano que vem, me usando como cobaia?

- A gente pode atrapalhar um pouco você para conversar sobre isso ou tem outros planos?

[...]

- Acho que já é o suficiente. - Peter afirmou, girando nos calcanhares para ficar de frente para mim - Acho que agora podemos nos apresentar da forma certa, estamos longe o suficiente para falarmos e sermos ouvidos.

Eu sorri sem-graça, enquanto Phill parava ao meu lado com a mão no meu ombro. Já estávamos longe o suficiente da multidão e poderíamos falar à vontade, mas isso não me ajudava muito. Eu estava completamente paralisada sem motivos compreensíveis.

- Bem, será que eu posso te chamar de Bella como o Phill? - Peter perguntou.

Assenti nervosa, então Phill deu dois tapinhas nas minhas costas como se tentasse fazer com que eu falasse.

- É claro. - desengasguei.
- Bem, Bella, espero que você não tenha ficado chateada por sair no meio da competição. Acho que vai ser recompensador.
- É claro que ela não está chateada e sabe muito bem o quanto isso significa, Peter. Uma garota esperta desse jeito não deixa esse tipo de oportunidade escapar. - aquilo era uma indireta.

Era para que eu ficasse com os ouvidos e os olhos bem abertos. E agora, talvez eu pudesse entender um pouco mais do que ele tinha dito no avião.

- Então, Bella, eu queria saber um pouco mais de você. O Phill disse que seria mais fácil que você contasse para mim do que ele.
- É que ela é um pouco mais modesta do que eu.
- Mas é justamente a falta de modéstia que eu quero ver. Ser um pouco iludido também é bom de vez em quando. Dependendo do resultado, é claro. - Phill deu uma risada - Então, Bella, é verdade que você fugiu de casa para ficar com seu skate?

Aproveitei um instante que ele dava uma espiada para os lados para olhar para Phill com o rabo-de-olho e despejar ali todo o meu ódio por ter contado uma história tão pessoal para um completo desconhecido. Ele me catucou para que eu continuasse a falar e parasse de olhá-lo daquela maneira.

- Na verdade, é bem mais do que isso. Fugir de casa seria só um capricho. Eu resolvi sair de vez e meu pai aproveitou a oportunidade para limpar um pouco a própria dignidade e me expulsou, o que ele sempre quis fazer.
- Tudo pelo skate?
- Posso dizer que a última gota d'água foi o contrato com a SpitFire.
- Ah... você não viu mais seu pai depois disso?
- Nem meu irmãos. - um nó aumentou na minha garganta ao lembrar de Nessie, o que era uma reação inevitável.
- Que história, Bella. Quando o Phill falou...
- Na verdade, ele não sabia. Quero dizer, não da história toda. Mas não vi problemas em responder já que você perguntou. Posso te chamar de 'você', certo?
- Claro, mas então, o Phill me disse que você anda desde os nove anos. - assenti ainda fria - E porque você não pensou em competir profissionalmente mais cedo? - porque eu tive uma filha.
- Problemas na família. Deu pra perceber que meu pai nunca foi muito a favor dessa história. Quando aparecia de vez em quando só para ganhar dinheiro em cima de mim era aceitável, mas quando apareceu a oportunidade para viver disso, ele resolveu cair fora.
- Não é uma história muito incomum. - deu de ombros - Pais são pais em qualquer lugar do mundo. Então, porque acha que poderia ser você?
- Eu? - não sabia sobre o que ele estava falando.
- Na verdade, eu ainda não tinha contado sobre nada disso para a garota, Peter. Eu tive um pouco de medo de que ela fugisse assustada da proposta.
- Mas você disse que ela tinha muita gana.
- E tenho. - me intrometi - É claro, se souber pelo que estou indo atrás.
- Eu pensei que seria melhor fazer uma surpresa, Bê. Achei que reagiria melhor.
- Ah, entendi, mas então do que estamos falando? - deixei apenas Phill notar a minha falsa animação.
- Bem, como eu tinha dito na arquibancada o projeto do Peter no momento é fazer um campeonato só para garotas.

- Deixa que eu explico, Phill. - o interrompeu - Bem, como ele disse eu sou só um dos diretores, então qualquer projeto que eu tenha precisa primeiro ser aprovado por todos os outros para começar a funcionar de verdade.
- É como uma empresa normal? Engravatados e relatórios?
- Não. Mas quando o dinheiro entra tudo acaba ficando desse jeito mesmo como você descreveu. - fiz uma careta, confirmando o que eu estava pensando - É claro que em qualquer competição garotos e garotas podem participar. Não existe nada determinado, pelo menos eu nunca vi.
- Também não.
- Mas você vai concordar que são poucas as garotas que você encontra para competir com você, não é? - assenti - Bella, você não sabe a quantidade de garotas que eu conheço como você que gostam, praticam, mas não competem por medo, vergonha, ou por acharem que não podem competir sendo garotas. Outras que não proseguem porque as famílias dizem que isso não é esporte, ou então não é feito pra elas, entende?
- Melhor do que você imagina. - ele deu um sorriso torto.
- É por isso que se criássemos uma competição só para garotas talvez elas se sentissem muito mais confortáveis para entrar nessa e até mais corajosas para enfrentar esses problemas que você conhece tão bem.
- Okay. Eu já entendi que o seu ato humanitário vai ajudar muitas meninas como eu a entrar de verdade nesse mundo e fazer o que elas querem, mas onde é que eu entro de verdade nessa história?

Peter cruzou os braços como se fosse óbvio demais, então olhou para Phill que puxou meus ombros me fazendo ficar de frente para ele para que continuasse com as explicações.

- Quando eu disse que você era boa, garota. Eu não estava mentindo. A gente quer te usar não só como uma espécie de cobaia para mostrar aos organizadores da World Cup Skateboarding que vocês tem tanto potencial quantos eles, mas ele precisa de uma garota para apresentar o projeto e além disso uma que sirva de inspiração para todas as outras.

- Inspiração?
- Eu estou falando de marketing, a alma do negócio.
- Então, você quer que eu seja uma garota propaganda?
- Não, Isabella. - Phill parecia ja com menos paciência, mas estava difícil de sacar a verdade já que ele mudava seu ponto de vista a cada minuto - Eu nunca quis transformar você em uma boneca de comercial até porque você não tem capacidade para isso.
- Ah, obrigada. - despejei um sorriso amarelo, enquanto os dois riam de mim.
- Você tem capacidade para mais do que isso. É isso que eu quis dizer.
- Então, sem querer auto-insultar minha inteligência, eu vou ser a garota propaganda, sem ser a garota propaganda.
- Eu diria que sim. - Peter riu - Você vai ser meu primeiro ensaio. Vai servir para eu mostrar para os outros o que você pode fazer.
- E tudo na competição será profissional. Até a premiação. - Phill recomeçou.
- Vinte e três mil como premiação. O mesmo prêmio que os outros competidores recebem para o primeiro lugar. Você sabe, Isabella, algumas meninas tão boas quanto você ou melhores e se escondem nesse mundo com um certo receio. Você pode abrir as portas para novas carinhas como a sua.
- Abrir as portas?
- Será como uma inspiração. - Peter lembrou.
- Vinte e três mil dólares? - eu estava assustada.
- Não. - riu alto - Vinte e três mil euros. Bobinha.

- Euros? - eles assentiram - Acho que entendi. Posso fazer outra pergunta?
- Quantas mais quiser.
- Além da premiação, tudo vai acontecer como nos outros, eu digo, inscrição, rampa, publicidade ...?
- Tudo igual. - os dois me avaliavam, enquanto eu tentava encaixar toda a novidade na minha realidade - Então, qual sua resposta?
- Eu preciso dar essa resposta agora? - Phill quase me estapeou ali mesmo.
- Eu esperava que sim, mas se preferir esperar. A única diferença é que se decidir por isso agora talvez eu já possa te apresentar a pessoas muito interessantes aqui e se você quiser esperar voltar para Nova Iorque para decidir, talvez já tenha passado tempo demais...

Phill beliscou minhas costas, fazendo eu me inclinar para frente.

Sem perder tempo, Peter segurou minha mão e a sacudiu quando eu respondi:

- Vai ser maneiro.

Edward Pov

Dois dias depois.

Alguns passageiros começavam a sair com suas bagagens nos carrinhos e seguiam as mais diversas direções. Estava ansioso para ver Bella saindo por ali até que a avistei com seu jeans muito largo e sua t-shirt preta. Ela usava um boné preto que eu nunca tinha visto na vida e um casaco cinza aberto com o capuz levantando sobre o boné.

Ela carregava sua mochila nas costas, enquanto Phill empurrava o carrinho com duas malas. Eles conversavam tão animados que cheguei a sentir uma pontadinha de ciúmes. Afinal desde quando eram tão amigos assim? Assim que me viu, Bella abriu um sorriso de orelha-a-orelha, soltou a mochila sobre o carrinho e correu até mim.

- Você é o melhor namorado do mundo. - ela gritou, pulando no meu colo.

As pessoas em volta olharam assustadas, algumas rindo e outras tentando ignorar a reação absurda de Bella ao sair do portão de embarque. Phill vinha logo atrás dela e apenas riu com toda a situação, enquanto eu tentava a equilibrar com suas pernas em volta da minha cintura.

- Mas o que eu fiz? - perguntei temendo outra reação como aquela.

Bella me beijou com vontade, depois afastou o meu rosto e explicou com os olhos brilhando:

- Você não tem idéia das portas que escancarou pra mim, seu idiota!
- Idiota? Quanta consideração. - ela riu e me beijou mais uma vez.

Só que dessa vez era algo calmo e apaixonado. De uma forma que Bella nunca tivera a iniciativa de me beijar e pela primeira vez eu fiquei tão feliz que até me esqueci que estava segurando minha namorada no colo, a beijando incontroladamente no saguão do aeroporto.

- Pessoal, assim, eu meio que estou me sentindo muito estranho com essa situação. Vocês poderiam fazer isso quando chegassem em casa?

Bella me soltou com um enorme sorriso estampado no rosto e desceu do meu colo. Mesmo com o olhar repressivo e envergonhado de Phill, ela ainda passou os braços pela minha cintura, e ficando na ponta do pé, aproveitou para dar um beijo logo abaixo do meu ouvido.

- Obrigado mesmo, mauricinho.
- Será que você pode me contar porque todo esse sentimento de gratidão? Talvez eu repita minha façanha para ganhar mais um beijo desses.
- Eu conto, mas sem o beijo. Obrigado. - ele resmungou, fazendo uma careta - Acho que a Bella vai poder te explicar melhor quando chegarem em casa e é claro que eu não quero atrasar esse encontro de vocês, por isso falando por alto sua namorada é agora uma pioneira nos campeonatos de skate femininos. Isso mesmo que você ouviu: só para mulheres.
- É sério? - perguntei para ela.
- Sim. Phill me apresentou um organizador do evento e ele também participa da World cup Skateboarding e ele tem um projeto de fazer um campeonato só feminino dentro do campeonato que já existe e eu serei uma espécie de cobaia para os dois.
- Cobaia?
- Ela te explica em casa. - ele disse tirando a mala dela de cima da dele e a colocando no chão.
- Eu explico no carro, em casa eu vou querer outra coisa. - ela disse sem nenhum pudor, enquanto me puxava para baixo pela gola e me dava outro beijo.
- Gente, por favor, esperem até chegar em casa. Hormônios adolescentes são assim mesmo, mas vamos ter um pouquinho mais de considerção com os amigos e afins, okay? - eu nos separei, tentando não rir - Eu tenho pena do taxista que for levar vocês. Sério mesmo.
- Tchau, Phill. A gente se vê amanhã. - Bella cantarolou.

Eu busquei sua mala, me despedi dele também, então caminhamos para a saída e pegamos o primeiro táxi que apareceu. Bella me explicou toda aquela história maluca com tanta excitação que era engraçado vê-la falar. Eu ouvia um 'muito obrigado' a cada final de suas frases e sempre respondia do mesmo jeito dizendo que ela jamais precisaria me agradecer nada.

A história de início parecia meio maluca, principalmente porque Bella recontava os diálogos com cuidados, mas nunca o conteúdo principal. Por isso levamos a viagem toda falando sobre aquilo. Quando chegamos em seu apartamento, eu joguei sua mala no canto da sala e me sentei no colchão para terminar de ouvir o que ela tinha para dizer.

- Nesse próximo campeonato que eu vou na California será o meu primeiro como profissional, então finalmente o tal do Peter Jenkins e outros caras que forem lá para me ver vão poder me levar a sério e é claro que eu vou ter que simplesmente arrasar ou caio fora da jogada toda. - ela passou cada perna ao lado do meu corpo e se sentou no meu colo - É por isso que Phill queria subir minha categoria e tinha me dado aquele susto enorme no avião, eu o odiei de primeira, mas agora vejo que foi melhor. Com o susto que eu já tinha tomado o que viria depois seria fácil de ouvir. Ele é incrível.
- Ele é incrível?
- Isso é ciúme na sua voz?
- E se for? Você não respondeu minha pergunta. Quer dizer que o Phill é incrível? Eu vi vocês dois descendo do avião cheios de papinho e risadas. O que foi aquilo?
- Papinhos e risadas. Você fica lindo morrendo de ciúmes desse jeito. - seu lábio repousou devagar no meu - Não consigo acreditar que esteja com ciúme mesmo depois do que fiz quando desci do avião.

Nos beijamos devagar, enquanto ela escorregava suas mãos pelos meus ombros e tirava o meu casaco e minha blusa de manga cumprida. Enquanto interrompeu o beijo para tirar aquelas peças, Bella olhou em volta como se estranhasse alguma coisa.

- Você esteve aqui enquanto eu estava no Brasil?
- Na verdade, eu vim aqui para lhe fazer um favor sim.
- Favor?
- Não percebeu que está um pouquinho mais quente aqui? - eu tinha levado alguém para consertar o aquecedor - É claro que não teria percebido. Sempre fica mais quente quando eu estou por perto, certo?

- Além de ciumento é convencido. Se eu fosse você, procuraria um psiquiatra.
- Não preciso. Já sei o que me atormenta. - sussurrei antes de a beijar.

Como no aeroporto, ela se entregou àquele beijo de forma que não costumava fazer. Era o tipo de carinho que o muro dela jamais permitiria acontecer, mas agora sim eu sabia que aquele muro tinha cedido completamente.

- Você só não me contou como é o Brasil.
- Quente, cheio, quente, pessoas alegres, quente e receptivo.
- Tinha muitas mulheres bonitas de biquíni por onde você passou?
- Na verdade tinha, mas os homens sem camisa estavam na frente, mal deu para ver. - ela tentou não rir, mas não conseguiu.

Logo depois me jogou no colchão, se deitando por cima para beijar meu pescoço.

- Você consertou o aquecedor, mas que diabos, terei que pagar o conserto. - murmurou.
- Eu consertei com minhas próprias mãos. - menti para que ela não entrasse naquele assunto de não querer meu dinheiro de novo.

Bella ergueu o tronco, cruzou os braços e mordeu o lábio de forma pensativa.

- Edward, não insulte minha inteligência. - dei uma risada alta.
- Tudo bem, tudo bem, mas qual o problema em pagar o conserto do seu aquecedor? Você vai concordar que quando estávamos embaixo do cobertor juntos até era legal essa história, mas levantar para pegar um copo d'água na pia era quase torturante.
- É, vou ter que confessar que depois que você ia embora ficava mesmo bem difícil.
- Sempre fica. É o que todas dizem.
- Todas quem, garoto? - ganhei um tapa no ombro - Com quem pensa que está falando, hein?

Agarrei seus ombros e a joguei na cama. Ela relutou um pouco mais, mas cedeu quando passei a beijar seu pescoço. Eu estava morrendo de saudade de cada mínimo pedaço da minha Isabella.

[...]

- Viu? Não é mais tão torturante assim. - ela resmungou, abrindo o cobertor para que eu entrasse embaixo.

Lhe entreguei um copo d'água, ela sorriu, se sentou e tomou tudo.

- Obrigada. - disse pondo o copo ao lado do colchão.
- Tudo bem. Agora volta para cá. - bati no espaço ao meu lado e ela se deitou de novo com a cabeça encostada no meu peito e os braços ao meu redor.
- Você fica carente demais quando eu vou viajar. - resmungou, escorregando o indicador pelo meu peito até minha barriga depois o subindo de novo até tocar meus lábios.
- Agora é você a convencida. Nem vem com essa. Eu só estou contente em saber que você conquistou muitas coisas nessas viagem e está mais feliz.
- É, é claro que estou. - deu de ombros, enquanto traçava a linha do meu queixo - Você quer passar a noite aqui comigo ou Rosalie ainda está te encobrindo toda vez que vai me buscar no aeroporto?
- Ela ainda me encobre. - falei com pesar.

Eu sabia que já estava na hora de ir embora, ou me atrasaria para o jantar, mas não queria dizer isso a ela.

- Promete que dorme comigo um dia desses? - pediu beijando meu abdomen.
- Eu prometo. - a puxei para cima, enrosquei meus dedos entre seus cachos e a beijei.

Ficamos assim por mais algum tempo até o limite do meu atraso e eu precisei mesmo me levantar. Catei minhas roupas no chão, enquanto ela me observava em silêncio.

- O que houve? - perguntei, quando só me faltava vestir o casaco.
- Você é cabeça- de vento. O maior que eu já conheci. Vai esquecer o que prometeu.

Se sentou, deixando o lençol cair de lado e vestiu sua calcinha. Depois foi até sua mala e tirou dela uma grande camiseta branca que gostava de usar como uma espécie de camisola para dormir. Ela a vestiu, então se levantou, indo na direção da porta. Mas eu a peguei pelo braço e pela cintura, a colando no meu peito e a levando até a parede.

- Hey, é você agora que está dizendo besteiras. Eu disse que viria. Não vou esquecer. - me ofereceu um meio sorriso, então me empurrou, fazendo cara de durona.
- Cai fora logo, mauricinho. Antes que as ruas fiquem perigosa demais para um rapaz como você. - ela adorava me zuar.
- Ah, sim, claro. Me desculpe? - eu abri a porta, me despedi dela com um beijo e parti para casa.

Sabia que me atrasaria, teria que mentir para meus pais e eles não acreditariam, mas simplesmente não importava mais.


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