Por Você Vale a Pena Viver: Novamente! escrita por Automatic


Capítulo 2
Parte II


Notas iniciais do capítulo



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Sorrindo, adentrei o pequeno banheiro de meu quarto, parando frente ao espelho.

– Claro que você ficaria decepcionado. - Disse ao meu reflexo.

Todos estavam. Todos tinham o direito de desistir. Então, por que eu não podia desistir?

Desviei os olhos. Eu mesmo tinha vergonha de mim. Vergonha do que me tornei.

Lavei o rosto com as duas mãos. Em seguida, saí do banheiro, caminhando para o interior do quarto. Peguei meu casaco vermelho. Tirei a carta do bolso e a tranquei na gaveta do criado mudo. Dirigi-me a porta, abrindo a mesma. Não me preocupei em fechá-la. Desci as escadas lentamente, degrau por degrau. Eu já não tinha mais pressa.

Adentrei a sala e a pequena Sofia agora chorava no colo de minha mãe. Senti meu coração se apertar, mas não dei atenção a isso. Tratei de sair da casa antes mesmo que minha mãe me visse.

Estava escuro, eu nem me dei conta. Não sei quanto tempo passei dentro de meu quarto, encarando meu reflexo no espelho.

Eu andava sem rumo. A cabeça baixa, os olhos vermelhos e o coração esmagado. Cheguei ao ringue de patinação e passei a observar o prédio do lado de fora, vendo que algumas luzes estavam acesas.

Adentrei o lugar em passos lentos, automáticos, pois minha real vontade era sumir dali. Logo cheguei à pista de gelo, vazia. As luzes estavam acesas. Comecei a ter flash's de memórias dos tempos em que Dimmy aprendeu a patinar comigo. No começo ele só caia. Era engraçado.

Eu nunca poderia imaginar que dali a alguns meses eu perderia a pessoa mais importante do mundo. Sem nem ao menos perceber, as lágrimas molhavam minha face, enquanto eu ainda encarava a pista de gelo.

– Que bom que veio. - A voz séria e indiferente soou atrás de mim. Tratei de secar as lágrimas, enfiei as mãos no bolso e me virei para ela.

– Eu não consigo entender por que você gosta tanto de ouvir um não. - Cruzei meus braços, a encarando com um sorriso que me forcei a enfiar no meio da cara.

– Prometi que não desistiria de você. Você já se esqueceu? - Ela continuou séria.

– Ele não vai saber se você quebrar a promessa. - Meu tom de voz ficou amargo, mas meu rosto ainda continha o sorriso irônico.

– Isso não é motivo para o que você está fazendo com sua vida, Leonardo. - Ela estreitou os olhos para mim. Por fim eu percebi que não me livraria daquela conversa.

– Nada do que você disser vai mudar alguma coisa, então não perca seu tempo. - A olhei, também ficando sério.

– Você está digno de pena, Leonardo. - O ar decepcionado, o qual eu já estava acostumado, tomou conta de sua feição.

– Diga algo que eu ainda não saiba. - Tentei ser indiferente.

– Quando você vai abrir os olhos? Olhe para você. Você está se acabando. Pare de fugir da realidade. Você não enxerga. Não vê que você está definhando e nos levando com você. Se fazer de rebelde não o trará de volta. - Sua expressão era triste e os olhos, marejados.

Meu coração já havia dado mil nós em meu peito. Minha garganta doía, assim como minha alma e cada pedaço de mim.

– Acha que eu não sei disso? - Ergui meu rosto molhado pelas lágrimas

Ela continuou a fitar-me.

– Se sabe, faça algo logo! Você é o único que pode se salvar, Leonardo. Existem muitas pessoas querendo lhe tirar do fundo do poço, mas você tem que querer sair, ou não adiantará nada. - Ela me deu as costas, me deixando parado em meio aquele espaçoso e vazio lugar.

– Haverá uma exibição de patinação no gelo amanhã, em comemoração ao Natal. Se eu ainda puder ter um fio de esperança na sua recuperação, venha e faça o que nasceu pra fazer. Se não o fizer, será com muita dor no coração... Mas eu desistirei de você. - Não pude evitar encarar suas costas. Com a face virada para algum canto do salão, as lágrimas também deixavam seus olhos.

– Eu... Não virei. - Continuei a encarar o chão, com o coração em pedaços e as lágrimas invadindo meus olhos. Apenas a ouvi suspirar e seguir pelo longo corredor, até sumir de diante dos meus olhos.

Mais uma vez voltei meus orbes para a pista de gelo. Os fechei, apagando minha mente, tentando me livrar das memórias.

Em passos lentos e precisos deixei o local, voltando para casa. O caminho, que eu já conhecia tão bem, poderia fazer com os olhos fechados.

Passei pelo parque, observando as árvores iluminadas pelo anoitecer. Dirigi meus olhos ao centro do local. Mais precisamente, para o chafaris iluminado. Vi Sofia parada diante do mesmo, de cabeça baixa e apertando forte algo contra o peito.

Não a encarei por muito tempo. Girei nos calcanhares, enfiei as mãos nos bolsos e continuei andando. Logo percebi que um vento forte e familiar soprou, brincando com meus cabelos loiros. Parei, olhando de imediato para a copa do Ipê. As folhas caiam e dançavam de acordo com o vento. Algumas, vindo de encontro ao meu rosto.

Fechei meus olhos e fui tocado pelas flores. Por um mínimo segundo, tive a sensação de sentir o perfume dele. De senti-lo envolvendo meu rosto com as mãos grandes e macias...

Uma tremenda vontade de chorar já me invadia, eu não ia segurar. Deixei as lágrimas rolarem, incapaz de acreditar na promessa que ele havia feito.

– Eu realmente lhe queria aqui. - Sussurrei, ainda com os olhos cerrados e o rosto em prantos.

– Então abra os olhos. - Ouvir a voz sussurrada fez todo meu corpo tremer de imediato.

Abri meus olhos, me deparando com os orbes castanhos a minha frente. Mas o susto me impedira de mover qualquer parte de meu corpo.

– Q-quem é você? - Minha voz saiu como um sussurro e meu rosto ainda estava sendo segurado gentilmente por suas duas mãos.

Em seus lábios, um mínimo sorriso era exibido.

– Incrível! Mesmo estando com meus olhos, você continua cego como nunca. - O sorriso aumentou.

Demorou um pouco para que eu entendesse o que estava havendo. Continuei a encarar o sorriso maravilhoso a minha frente, considerando firmemente a hipótese de ter enlouquecido.

– Você não é louco. E nem está sonhando. - Ele disse calmamente, enquanto uma de suas mãos passeava por meus cabelos.

Depois de um tempo imóvel, lancei-me em seus braços, o apertando forte e chorando descontroladamente, como se em todo este tempo, não houvesse chorado uma lágrima sequer.

– Como... Como é possível? - Perguntei em meio aos soluços, com o rosto escondido em seu peito.

Suas mãos acariciavam meus cabelos e costas.

– Alguém quis que você tivesse esse presente de natal. - O ouvi sorrir.

Após alguns minutos, ele me puxou para sua frente, segurando-me pelos ombros. Olhou em meus olhos.

– Quando foi que deixou de acreditar em mim? - A voz gentil atingiu-me direto no coração.

Me lembrei de imediato das palavras de Sofia e comecei a me sentir mal. Abaixei a cabeça.

– Com o tempo, não pude mais sentí-lo perto de mim. - Tentei explicar.

– Mas eu sempre estive ao seu lado. Mesmo que você não pudesse me sentir, eu estava cuidando de você. Mas você deixou de acreditar, você fechou seus olhos para mim. - O tom de voz era sempre calmo e sem variações.

– Me desculpe. - Sussurrei patéticamente, enquanto sentia meu estômago e minha cabeça dar voltas e voltas.

Minhas vistas pareciam embaçadas e minhas forças estavam sumindo.

– Não se desculpe. - Foi a última coisa que ouvi antes dele desaparecer de diante de meus olhos. E eu não enxerguei nada mais do que meu corpo caindo em uma total inconsciência.


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