Ameno Dore escrita por MyKanon


Capítulo 16
XVI - Revolta




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Itacy olhou para cima rapidamente... “Droga!”.

Estava escrito em letras garrafais: Necrotério.

Enzo a havia visto sair do necrotério do hospital.

Sem coragem de encará-lo nos olhos, mirou os próprios pés quando repetiu a pergunta, dessa vez, mais controlada:

_ O que está fazendo aqui, Lorenzo?

Enzo continuava a olhar repetidamente da placa, para a garota à sua frente. Até que se deu conta que ela havia lhe feito uma pergunta.

_ Elas... Estão aqui. Suas amigas estão aqui.

_ Como elas estão?

Esquecendo momentaneamente da humilhação que sentia, Itacy levantou os olhos para ele e quase deu um passo em sua direção.

Enzo continuou a encará-la por mais alguns segundos antes de responder:

_ Estão bem. A Francine já está consciente. A Míriam ainda não, mas não corre perigo.

_ Que bom. Já vou vê-las. Bem, obrigada pela ajuda, mas acho que já é hora de você ir.

_ Ainda não.

Itacy observou-o tirar uma caixa de chicletes do bolso e levar um à boca. Atentou para a embalagem, e descobriu que não se tratava de um doce comum, mas um auxiliar para a dependência de nicotina.

Sentiu-se satisfeita com a descoberta.

Preferia seu cheiro realçado pela hortelã que pelo tabaco.

Ele colocou as mãos nos bolsos e a encarou fixamente. Itacy hesitou, mas não podia mais permitir que ele a tivesse nas mãos.

Cruzou os braços numa postura defensiva, e sustentou seu olhar.

_ O que fazia aí dentro? - ele por fim perguntou.

_ O que te leva a acreditar que eu responderia?

Enzo esfregou o queixo, olhando mais uma vez para o mórbido letreiro.

_ Seu orgulho. Se você não responder... Vou tirar minhas próprias conclusões. E garanto que são realmente assombrosas.

_ Eu já te disse tudo o que podia. Só me resta lamentar suas conclusões fantasiosas.

Itacy pensou que ele havia desistido quando deu um passo atrás.

_ Aquele cara também está aí dentro?

Quando Itacy entendeu a quem ele se referia, Enzo já estava com a mão sobre a maçaneta.

_ O que pensa que está fazendo?! - perguntou irritada enquanto afastava sua mão da porta.

_ Quero saber o que está acontecendo.

_ Nada! Não está acontecendo nada!

_ Se você não me contar, eu vou descobrir. Não hoje. Mas vou descobrir.

Itacy meneou a cabeça... Se ele soubesse, preferiria não saber...

_ Você não entenderia.

_ Tente.

_ Shhh!

+

Enzo percebeu claramente quando o semblante de Itacy passou de desalentado para atemorizado.

_ O quê...?

_ Shh! - Itacy impediu-o de continuar a pergunta.

A jovem inclinou a cabeça na direção da porta metálica, e parecia cada vez mais assustada.

Voltou-se para ele com os olhos arregalados em espanto.

_ Ta-

Itacy tampou-lhe a boca com uma das mãos e agarrou seu braço com a outra.

A escuridão do corredor, aliada à rapidez com que tudo aconteceu, não permitiu que Enzo entendesse como fora parar no corredor dos quartos.

Sentiu-se sugado por um furacão por milésimos de segundos, até que tudo voltou ao normal.

Itacy ainda estava à sua frente, e ainda lhe tapava a boca. Com a outra mão, a garota imobilizava seus ombros contra a parede fria do hospital.

Enzo não ofereceu resistência. Ela deveria ter uma boa explicação para o que estava acontecendo.

Itacy tinha os olhos presos no fim do corredor, na curva que levava à porta do necrotério e ainda parecia apreensiva.

Enzo manteve-se imóvel e em silêncio por alguns minutos, até que sentiu a pressão das mãos de Itacy diminuírem.

Finalmente ela afastou-se dele e suspirou profundamente enquanto massageava as têmporas com as mãos.

Enzo nada perguntou. Mas estão Itacy deixou as mãos caírem ao lado do corpo, e voltou a ficar tensa.

_ Tacy? O que está acontecendo?

Enzo voltou-se para o garoto. Era evidente que se tratava de seu irmão.

Tinha o mesmo rosto fino, as mesmas sobrancelhas arqueadas e os mesmos intensos olhos azuis. Seus cabelos dourados estavam informalmente penteados para trás, mas alguns fios se desprendiam e ornavam sua testa.

_ Nada, Eloy. Encontrei com um colega de classe.

_ Me pareceu que você-

_ Estou ótima! - Itacy interrompeu-o.

_ Isso é muito bom. - disse uma quarta voz.

Enzo percebeu que Itacy parou de respirar por alguns segundos quando aquele homem alto e de aparência imponente juntou-se ao trio.

_ Nos apresenta seu amigo? - ele perguntou em seguida.

Itacy pareceu hesitar, antes de dizer:

_ Lorenzo. Estudamos juntos. Ele também toca no balé.

Voltando-se para Enzo, Itacy apontou para cada um de uma vez enquanto apresentava:

_ Eloy, meu irmão, e Nicolai, nosso tutor.

Enzo respondeu com o mesmo aceno de cabeça que recebeu de ambos.

_ Bem, parece que estamos todos prontos. Podemos ir? - perguntou Nicolai tão suavemente que mais parecia um convite, e não uma ordem, como Enzo desconfiava que fosse.

_ Nicolai... O Lorenzo acaba de me contar que minhas amigas sofreram um ataque esta noite, e estão nesse hospital. Se não se importar... Eu gostaria de dar uma olhada nelas...

Parecendo muito à vontade, o homem respondeu:

_ Certamente. Esperaremos no carro. Diga-lhes que estimamos as melhoras.

Itacy confirmou com um aceno e aguardou que ambos deixassem o hospital para desabafar:

_ Mas que droga...

_ O quê?

_ Torça para que ele nem desconfie do que te contei.

_ Por quê? O que ele faria comigo?

_ Não sei. Não sei nem o que faria comigo.

Itacy bufou e deu-lhe as costas, caminhando pelo corredor silencioso que dava acesso aos quartos.

Enzo a seguiu, sem dizer mais nada.

Quando chegou na porta do quarto de Míriam, Itacy parou. Enzo fez o mesmo, alguns passos à suas costas.

+

Míriam estava de olhos fechados, mas seu semblante parecia pesado. Talvez fosse dor, ou medo.

Tinha um curativo ao redor do pescoço, e uma máscara de oxigênio sobre o nariz. Alguns aparelhos mediam seus sinais vitais, enquanto seus pais os assistiam cheios de expectativas.

Itacy levou uma mão à boca, impedindo-se de lamentar em voz alta.

Por muito pouco sua amiga não fora sugada até a morte...

Nicolai tinha que descobrir o autor daquela atrocidade.

_ Não vai entrar? - sussurrou Enzo atrás de si.

Itacy jogou o corpo para trás, até que suas costas encontrassem a parede do lado de fora do quarto.

_ Não.

Sentiu sua garganta arder e ofegou.

_ Você está bem?

Itacy apertou os olhos, para impedir as lágrimas de aflorarem.

_ É o cheiro? Quer sair daqui?

Imediatamente, Itacy abriu os olhos e o encarou revoltada.

_ Eu não quero beber dela!

Mas tinha de aceitar sua reputação. Seria para sempre, aos olhos de todos, o que era. Um monstro.

Empurrou-o para o lado e caminhou duramente até a saída.

Estava tão irada que não sentia nem vontade de usar a velocidade para fugir dele. O único poder que tinha vontade de usar naquele momento, era a força.

_ Tacy, para com isso.

Itacy não deu ouvidos, e continuou caminhando resoluta.

_ Tenho muito a aprender para deixar de ser impertinente. Se você me deixar te conhecer...

_ Não tem nada de bom para conhecer em mim.

_ Não disse que tem que ser bom. Eu também não tenho nada de bom. Negativo com negativo não dá positivo?

Itacy diminuiu o ritmo. Não porque se convencera de suas palavras, mas porque não suportava mais resistir. Estava sucumbindo à pressão. E no seu íntimo, era o que sempre buscara: alguém que pudesse ouvi-la.

Não que fosse permitido a Enzo saber de seus segredos, mas não tinha muita escolha. Não era possível hipnotizá-lo...

+

Finalmente parou. Enzo fez o mesmo, apreensivo com o que viria a seguir.

Itacy abriu a pequena bolsa que trazia consigo. Vasculhou seu interior e de lá tirou alguma coisa.

Virou-se para Enzo e estendeu à frente de seu rosto uma ampola com um líquido incolor dentro.

_ O que é isso? - perguntou o rapaz.

_ Heparina.

Enzo continuou a observar a ampola estendida à frente de seu rosto. Tinha uma leve noção da ação daquele medicamento.

_ Você sabe para que serve? - a garota perguntou friamente, voltando a guardar o pequeno frasco na bolsa.

_ É um anti-coagulante.

_ Exato.

Aguardou um momento para ter certeza que queria perguntar:

_ Para quê precisa dele?

Itacy sorriu. Mas era um sorriso frio e cruel. Diferente de seu habitual sorriso irônico ou debochado.

_ Não faz a mínima ideia?

Itacy aproximou-se até quase tocá-lo.

_ Não. - Enzo respondeu firmemente, começando a sentir certo arrepio na espinha.

Itacy aproximou-se mais ainda. Enzo sentiu o perfume de seu cabelo quando ela disse ao seu ouvido, num tom rouco e provocante:

_ Você gosta da minha proximidade, Lorenzo?

Enzo fechou os olhos, aproveitando a textura dos cabelos da garota roçarem-lhe o rosto.

_ Vamos ver se o seu desejo permanecerá inabalável depois do que eu te contar...

Continua


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